Continue se movendo até não saber porque ficar", Gaz Coombes explica o motivo do amadurecimento do Supergrass. O clima é estradeiro e é fácil visualizar o vocalista apertando os olhos por baixo dos óculos escuros com o sol se pondo ao horizonte. Por baixo do vocal, orquestra e violão recriam um casamento abandonado nos anos 70. Entrando nos vinte anos, Gaz, o baixista Micky Quinn e o baterista Danny Goffey (e o quarto Supergrass, o tecladista Bob Coombes, irmão de Gaz), encaram um futuro amplo para seu grupo, casando o vigor ainda vivo da adolescência com uma avidez pelo rock clássico, dos anos 70.

O humor, contudo, se foi. O refrão de Moving, a primeira faixa do novo disco do grupo, Supergrass, sai do ambiente horizontal da primeira parte e cai num groove roqueiro, misturando partes iguais de funk e rock clássico a la Steely Dan. "Há um sentimento triste à minha volta/ E um calafrio por dentro/ Não consigo deixar de me confundir ou gastar meu tempo", o grupo canta antes de um solo ao violão. O sentimento agora é triste, cético e passa longe daquela banda que cantava à mil por hora o azar de ter sido pego fumando maconha (Caught by the Fuzz) ou o prazer de estar vivo (Alright) no primeiro disco, I Should Coco.

Supergrass, o disco, opta por aprofundar-se no caminho aberto pelo segundo álbum - In It For the Money, de 1997. Lá, o Supergrass deixava de ser a versão inglesa dos Monkees que Steven Spielberg queria pra sua coleção (sério, o diretor convidou o grupo para estrear um seriado de humor - e eles disseram "não") para assumir sua persona de rock clássico. Tá certo que eles mal saíam da adolescência e seus olhares ainda eram de filhotes de esquilo, mas o disco redimensionava o rock do grupo, canalizando a potência elétrica num dínamo de referências que se misturavam à espontaneidade da puberdade. No novo disco, a espontaneidade deixa as piadas de lado para concentrar-se no som. O resultado é um conjunto amadurecido, coeso, promissor. E apesar os adjetivos podem ir de encontro ao espírito livre dos dois primeiros discos, maduro, aqui, não é cerebral.

A voz de Gaz lembra algo como Thom Yorke (ou Billy Corgan, sei lá) encarnando um jovem Mick Jagger - o que torna-o capaz de encarnar a visceralidade do rock sem parecer caricato (como o Radiohead ou os Smashing Pumpkins tentando soar "rock’n’roll"). E o trio, como um conjunto (auxiliado pelas teclas do irmão de Bob, onipresentes), se transforma em quem eles quiserem - e sua especialidade são bandas de rock dos anos 70. Os chamados anos clássicos.

Your Love continua a mesma atmosfera, casando rock sulista americano com glam rock inglês, e é igualmente realista, cantando o amor de forma pouco romântica: "Quando disse que precisava de amor/ Você me empurrou pela janela", canta antes de um solo de cravo. What Went Wrong (In Your Head)? junta um refrão altamente grudento (com direito a la-la-las e tudo mais) e um trecho intermediário sério, mas idealista: "Deus salve os instáveis, eles estão só/ Não fizeram nada de errado, a vida é tão bela". Beautiful People, cantada por Mick, é o que aconteceria se John Lennon fosse parceiro de David Bowie na fase Ziggy Stardust (com o próprio Lennon no lugar do guitar hero Mick Ronson). Shotover Hill são os Rolling Stones gravando No Expectations como se essa música fosse de Bob Dylan, não de Robert Johnson - mesclado a um clima mezzo country mezzo Rain Song (do Led Zeppelin), por baixo de tudo.

Æon, um dos melhores momentos do disco, começa crescendo aos poucos, numa levada psicodélica que logo transformasse em um oceano de tranqüilidade sônica - o mesmo que os Beatles e o Pink Floyd navegaram entre 1969 e 1970. Camadas de guitarras se superpõem em uma canção que poderia estar dentro de OK Computer, caso polida adequadamente por Nigel Godrich.

Mary contrapõe microfonia e boogie soul, numa balada bubblegum que faz o clichê "I got a girl and her name is..." parecer ter sido inventado neste disco. Jesus Came From Outta Space retoma o clima glitter com guitarras country e balanço disco. Pumping On Your Stereo, o primeiro single do disco, é Rebel Rebel, se esta tivesse sido composta pelos Stones. O irresistível groove da faixa é determinado pelo mantra robótico que pergunta: "Pode nos sentir pulsando no seu estéreo?".