Perambular pelas gravações do Lado B que vai ao ar hoje à meia-noite na MTV (com reprise na sexta, às 10h30 e no sábado, às 11h) era assistir o rock independente brasileiro às vésperas da consagração. Reunindo bandas do Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná, o programa alternativo da MTV brasileira abria mais uma vez suas portas à mais de uma dezena de bandas do underground nacional, mais uma vez não só mostrando a qualidade quanto à amplitude da qualidade musical do nosso indie.

Mesmos bandas que ainda não foram consagradas mostraram-se eficazes. Casando punch com melodia, o Shed (de SP), as Staples (do Rio), o Automatic Pilot (de Sorocaba) e o Foolish (de Maringá) apresentaram-se com vigor e determinação, não apenas suando a camisa, como mostrando serviço. Todos ainda estão na primeira fita ou CD, mas já ultrapassaram o estágio amadorístico com que o gênero costuma ser confundido devido à maioria relapsa.

Outras mostraram seus primeiros momentos de brilho ali. O Crush Hi-Fi, que já havia condensado sua doce agressividade guitarreira no excelente EP Introducing, do ano passado, foi preciso e contundente em sua apresentação. Sem deixar a peteca cair em nenhuma das passagens de som e iluminação (fazer TV é um saco), o quarteto piracicabano mostrou-se impecável e um dos prováveis grandes nomes do underground no ano que vem, se seu disco for pelo menos metade do que se viu.

O Comespace, de São Paulo, optou pela avalanche de microfonia estática que derrama da cabeça de Kevin Shields. Mas indo além do estereótipo sub-My Bloody Valentine que assolou o começo da década, o grupo avista o horizonte do pós-rock e cogita novas possibilidades em terras brasileiras. Mais rock que space se o assunto é space rock, o Comespace provou pronto para o estúdio, se seus integrantes não fossem tão exigentes consigo mesmos.

As cordas do antigo Weed estão sozinhas no Astromato. Abandonados pelo posto de baterista inconstante, Pedro, Armando (guitarras) e Frebs (baixo) adotaram a bateria eletrônica para assumir seu powerpop em português e estão longe de fazer feio. Com canções dignas do Teenage Fanclub e do Weezer, só que à brasileira, se o trio de Campinas o material que o Armando me mostrou quando lançou seu projeto solo - Electric Tonic - correm o risco até de ver uma brecha abrindo-se para eles no mercadão fonográfico.

Do primeiro escalão, as melhores apresentações foram do Grenade, 4-Track Valsa e PELVs. A banda do ex-Killing Chainsaw Rodrigo Guedes optou por uma versão pesada de Vampire, mas arriscou Rubber Made Heart num intervalo e esta gravação foi pirateada para a recente edição do Audiozine. O 4-Track Valsa foi com a inédita Samba Dada sentados em banquinhos e armados de guitarras, mas quem estava lá viu a cozinha do grupo brincar com canções do Weezer e dos Cardigans. Vale ressaltar a interpretação de Cecília Giannetti - entre colares havaianos - que aos poucos se consagra uma das melhores vocalistas do indie nacional. A PELVs estava em seus bons dias (especiais em bandas de lua) e passeou por quatro excelentes e equivalentes execuções do hit Bric-A-Brac Between Aspirins.

A surpresa ficou por conta dos Cigarettes, que não constavam na lista inicial, mas que apareceu durante as gravações e, por culpa do atraso do Second Come (que havia ficado preso no trânsito), conseguiu um espaço para apresentar-se. E assim, o único membro fixo da banda, Marcelo Colares, sentou-se num tapete tirado da manga do contra-regra e, acompanhado de Eduardo Ramos (dono da gravadora Slag, que produzia a nova fita de Colares) no baixo e do cineasta Alexandre Guena (que produz um curta metragem baseado no livro Alta Fidelidade, de Nick Hornby, que conta com Marcelo no elenco), tocou uma das músicas gravadas durante a estada do carioca em São Paulo.

Correndo por fora, o alternativo dos alternativos: o eletrônico. O Tetine optou por um momento de calmaria ao escolher Let Us Glow, cantada por Bruno Verner. A faixa é uma balada pós-punk cantada com dramaticidade technopop sobre um instrumental de um Stereolab bucólico e pode fazer os puristas torcerem o nariz - mas atente à melodia e ao arranjo pessoal que o duo desenvolve e tente não gostar. O Low-Key Hackers, do produtor R.H. Jackson, não convenceu com sua fusão de funk com trip hop, efeitos e vocais industriais e um DJ. Mas problemas técnicos fizeram a banda voltar atrás e retirar sua participação do especial, dando espaço para os Cigarettes, que a princípio filmariam para um clipe à parte.

A nota triste do programa é a participação do Second Come. A segunda vinda do grupo poderia ter ficado no simples trocadilho infame mas, não, preferiram seguir em frente e mesmo sem Fábio Leopoldino, encararam o comeback. Pra quê? Sem as guitarras de Fábio (que se entretém com o ainda inédito Poly Stirene), o outro guitarrista Fernando Kamache ficou livre para sair do noise, "brindando" os presentes com pequenos solos de heavy metal nos intervalos. O resto da banda nada podia fazer senão baixar a cabeça e continuar tocando. Lamentável.

Por fim, o Violeta de Outono também não foi completo. Mas isso não é uma má notícia, uma vez que o único integrante presente é o cérebro e coração do grupo, o guitarrista Fábio Golfetti. E mesmo com dois improvisados no lugar de Ângelo Pastorello e Cláudio Souza, Fábio passou longe de um sequer tropeço. Cada vez mais íntimo de seu instrumento, ele transitou pela velha Em Toda Parte sem dificuldades, trazendo flashbacks aos presentes (entre eles, algumas figurinhas carimbadas do indie nacional).