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05.04.1999

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De novo, é tudo culpa dos Beatles. Foram eles que chegaram nos Estados Unidos destroçando impiedosamente o inevitável estrelato e massificação do rock instrumental que assolava o país. Afinal de contas as mortes de Buddy Holly e Eddie Cochran, as prisões de Chuck Berry e Jerry Lee Lewis e as conversões de Elvis (pro exército) e Little Richard (pra igreja) não mataram o rock no fim dos anos 50. Resistente à catástrofes o gênero encontrou habitat nos bailes de adolescência - numa época em que esse tipo de celebração era tão importante e tradicional como o dia das crianças. Aos poucos, bandas brancas e molecas de rock instrumental substituíam os grupos negros nos bailinhos, colocando a guitarra para solar no lugar do sax. E não estamos falando só de surf music: o rock instrumental era realmente um gênero vigente no começo dos anos 60.

Mas a história quis enobrecer a chegada dos Beatles à América - salvando-a da depressão gerada pelo assassinato de Kennedy - e apagou o rock dos EUA nos anos 60. O problema é que os Beatles não só cantavam como o principal instrumento eram as vozes, duas ou três, que se casavam com harmonia. Logo, a canção deixava de ser uma levada pra ser uma melodia. Seguindo o quarteto de Liverpool, diversas bandas inglesas passaram a freqüentar os cenários rocker nos Estados Unidos, num capítulo que ficou conhecido como British Invasion, a invasão britânica.

Depois dos Beatles vieram os Rolling Stones, os Animals, o Who, o Them, os Yardbirds, os Kinks, entre outros. Todos estes tinham uma diferença crucial em relação ao grupo de John e Paul: a influência de música negra. Enquanto os Beatles eram pop e comerciais, os passageiros de seu sucesso acreditavam na crueza vinda do blues, do rhythm’n’blues, da soul music. Eram europeus descobrindo e relendo um passado americano que boa parte dos adolescentes americanos não conhecia.

O que funcionou como uma luva pra aquela geração perdida. Adotando o rhythm’n’blues e o soul como nova alternativa, novas bandas americanas começaram a aparecer em faculdades, tocando em festinhas de república. Assim, o rock era feito de forma amadora e tosca, uma cópia mal feita e improvisada sobre cópias legais de músicas pra dançar. Mas quem queria saber de meios quando os fins eram atingidos? O ímpeto adolescente daquelas bandas (todas que tocavam Louie Louie em seus shows) revelava a principal qualidade do rock: que ele está disponível a quem quiser ouvi-lo e - principalmente - fazê-lo.

E o que estas bandas aos poucos foram descobrindo foi justamente isso. Não era preciso de muitos acordes pra fazer uma boa canção. Não era preciso saber tocar guitarra pra tocar um solo. Um bom refrão, um bom riff, uma levada precisa - é isso que faz uma boa canção. Logo a folk music que tomava conta do rádio cedeu à emergente psicodelia, que era uma festa sem regras onde tudo era possível. Até mesmo fazer sucesso.

Pois a psicodelia permitiu a diversas bandas de garagem verem a luz do sucesso, por pelo menos uma canção. Em tempos de pura ebulição criativa no ar, bandas nasciam como espinhas na cara de um adolescente, explodindo com um sucesso e cedendo à obscuridade na maioria das vezes. E este sucesso sempre se justificava. Eram canções perfeitas, cheias de energia e atitude, esfregando hits feitos da forma mais caseira possível, na garagem de casa.

Da garagem para a fama. Logo o rock permitia este sonho acontecer com mais velocidade que acontecera artistas de outra época. E excitados com esta possibilidade, várias bandecas suavam todo o tipo de possibilidades de canção. Aumentaram o volume, distorceram as guitarras, brincaram com ruídos, mexeram com a estrutura da canção, cantavam sobre estar numa banda de rock - tudo de forma crua e despojada, músicas simples e fortes como uma cadeirada na cabeça. Só que em vez de fazer desmaiar, estas canções apenas incentivavam outras bandas a nascer.

O que começou a perturbar a indústria fonográfica. Ora bolas, eram dezenas de gravadoras minúsculas vendendo rios de discos de artistas menores que elas. Então eles aprenderam uma lição que perdura até hoje e corrói o rock por dentro. Quando um artista surge no underground, dê-lhe a chance de lançar um disco de forma massiva, competindo com outros grandes. Se ele não der certo, dispense-o e mande-o de volta pra casa, diga-lhes que seu negócio não é música. Se der, mime-o com dinheiro e luxo que ele fará tudo que a gravadora quiser. Assim, no fim dos anos 60 o rock estava domado nos Estados Unidos e as rádios cediam ao country rock (Allman Brothers, Lynyrd Skynyrd) e ao bittersweet (Paul Simon, Carly Simon, James Taylor).

Isso incomodava Jac Holzmann. Dono da gravadora Elektra, Holzmann merece todas os louros ao apostar no fim dos anos 60 num rock ainda mais duro e indigesto que o garageiro. Foi ele quem ofereceu contratos a bandas completamente diferentes das que existiam na época - Doors, Stooges, MC5 e Nico, entre outros. Foi o primeiro dono de gravadora a perceber o potencial em um mercado alternativo e encher seu elenco de outsiders que não vendiam o suficiente.

Holzmann resolveu reagir usando ferramentas anteriores à ditadura das rádios, que começavam a se juntar, formando redes que monopolizavam o som que os americanos - e, por tabela, o mundo ocidental - ouvia. Chamou o jornalista Lenny Kaye (que, ao lado de Lester Bangs, defendia o ímpeto inicial do rock contra qualquer outra intenção dentro da redação da Rolling Stone) e lhe incumbiu com a tarefa de compilar num álbum duplo as melhores jóias daquela época de ouro do rock de garagem. Jóias mesmo, gemas, pedras preciosas de música pop e adolescência desenfreada selada em três ou quatro minutos dentro de sulcos de vinil. Lenny, historiador do rock e futuro guitarrista do Patti Smith Group, estalou os dedos e espalhou sua vasta coleção de compactos no chão de sua sala, escolhendo os discos que mais o haviam tocado em seus 14, 15 anos.

O resultado é Nuggets - traduzindo, pepitas -, talvez a compilação mais importante da história do rock. O disco não só apresentou ao mundo de forma digna e moderna (afinal, era um álbum) bandas como 13th Floor Elevators, Chocolate Watch Band, The Seeds, Barbarians e Leaves, como serviu de trilha sonora pra vários festinhas em garagens inglesas e em casas de show americanas como o CBGB’s e o Max’s Kansas City. Isso mesmo, o punk cresceu ouvindo Nuggets.

A coletânea, que originalmente tinha 27 faixas, é só o primeiro disco da caixa Nuggets - Original Artyfacts from the First Psychedelic Era - 1965-1968 (Rhino, importado). A coleção pega o espírito da coletânea original e o extende para impressionantes 118 (!!) faixas, saindo com uma compilação tão divertida - só que mais longa - que o disco de 1972. São mais de quatro horas com pelo menos uma centena de bandas desfilando hits tão curtos quanto mágicos. Misturando referências das mais diferentes, todas as bandas conspiram em prol da energia primária do rock, resultando numa festa perfeita, em qualquer época.

Pela quantidade de bandas, é um tanto em vão tentar discorrer sobre cada uma delas. Mesmo porque são histórias curtas. Algumas exceções são encontradas com os Sonics (cujo legado se extende até hoje), os Beau Brummels, o Blues Project (com Al Kooper), os Turtles (que mais tarde tocaram com Zappa), os Amboy Dukes (com Ted Nugent), Kingsmen (com a versão definitiva de Louie Louie), entre outras. Existem outras dezenas, sem tanta importância histórica e com uma história parecida com a das outras, mas com o mesmo gás. Mas os Barbarians merecem uma atenção à parte. Eram uma banda como as outras - a única diferença é que o baterista Monty não tinha mão e usava um gancho pra segurar uma das baquetas. O dono da gravadora deles incentivou a fazer uma música falando disso. Eles gravaram Monty, cantada pelo próprio, um hino à perseverança e na fé nos próprios sonhos, em que o baterista conta como perdeu sua mão e que se apegou no sonho para continuar firme, culminando com o potente refrão de "NÃO DESISTA!".

As músicas que estão nesta excelente compilação encontraram a fama mais tarde pelas vozes de artistas que um dia sonharam o mesmo sonho das bandas aqui presentes. Psychotic Reaction, do Count Five, ficou mais conhecida na versão dos Cramps, Mr. Pharmacist, do Other Half, é idêntica à versão que o Fall gravou anos mais tarde, Hey Joe foi regravada ainda na época por Jimi Hendrix e os Ramones tocaram The Shape of the Things to Come, de Max Frost & The Troopers, e Journey to the Center of Your Mind, dos Amboy Dukes, em seu disco de covers, Acid Eaters.

Mas o principal legado de Nuggets é descobrir que o mais importante no rock é pegar um instrumento de qualquer jeito, cantar algo legal sobre um barulho intenso e fazer as pessoas dançarem e quererem estar lá no palco. Fazendo rock por eles mesmos.

Os textos só poderão ser reproduzidos com a autorização dos autores
© 1999

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