Se você quiser escrever para o 1999 sobre QUALQUER coisa que tenha a ver com música (um show legal que você viu, um carinha que você conseguiu entrevistar, um disco que você queria mostrar pras outras pessoas, qualquer tipo de teoria, contar qualquer parte da história do rock), basta escrever para a gente.

12.SET.1999

RESENHAS
GRENADE
Shortwave Younglove Kingdom
(Ordinary)
Por Alexandre Matias

Quem faz música sabe: chega uma hora que você levanta a tampa do baú da criatividade e só consegue encontrar coisas velhas. Tentativas de canção, refrões soltos, riffs largados, melodias sem letra, letras espalhadas... Uma bagunça semelhante àquela que se junta no quarto do fundo, no fundo do armário, embaixo da cama: coisas que você quer utilizar, mas não sabe como.

A maioria dos artistas costuma fazer uma faxina na cachola e deletar a maioria destes cacos de música. Outros preferem guardá-los minuciosamente, com a esperança de que algum deles faça sentido um dia. Outros ainda tomam estes pedacinhos diariamente, como um quebra-cabeças montado como terapia, que não precisa ficar pronto. É o exercício mental que conta, não o objetivo final.

Rodrigo Guedes está nesta última categoria. E juntou os pedaços de canção que não entraram no último disco do Grenade - o excelente It’s an Out of Body Experience, pela Low Tech - e tenta dar uma nova chance a eles. O novo disco de sua banda-de-um-homem-só - Shortwave Younglove Kingdom (Ordinary) - é apenas uma amostra da ótima fase que ele atravessa.

Sobras de luxo, as músicas de Shortwave... poderiam ser um álbum, não fosse o rígido controle de qualidade imposta por ele mesmo. Então Rodrigo disfarça-as de outtakes e compõe, mais lo-profile que lo-fi, mais um belo álbum.

O disco abre com a caótica faixa-título, um emaranhado de sons colados aleatoriamente que finge ser o “tema” do disco. Ao superpor efeitos sonoros, uma guitarra matadora, gaita de blues, violão barroco, cítaras, tablas e ruídos como se fosse uma canção, Rodrigo explica o próprio disco como um aglomerado de referências estranhas entre si, em oposição a um álbum com começo, meio e fim.

A bateria que abre Vampire prova que ele já se desvencilhou do peso que o gênero lo-fi causava sobre suas costas. A própria Vampire entrega-nos a principal influência de Guedes, a carreira solo de John Lennon. E como Lennon, disfarça seus problemas pessoais com metáforas pseudo-surreais.

“Veja: estamos em uma missão de Deus”, alguém se impõe antes de In Nine Days (Number Nine) e lembra do aspecto espiritual que Rodrigo tenta passar no som do Grenade. Um lamento bucólico típico do ex-beatle: “Eu não quero começar a ser outra pessoa de novo/ Eu não quero começar a ter que mentir”, Nine Days lembra-se
de uma depressão passageira com uma simpática ironia que torna-se um pequeno refrão. Antes do fim da música, uma torrente de barulho (alguns pinçados do Álbum Branco) que justifica o número 9 no título da canção.

Bastard, que vai virar clipe, dá o tom que o Grenade quer para seu som. Ao violão, com belos arranjos folk, ela é tímida, triste e cética ao mesmo tempo. The Son segue a mesma linha, embora seja uma canção dos tempos do Killing Chainsaw.

O disco continua alternando experimentalismo hermético (Growing Sun - Part II, White Noise, a lisérgica The Cake, This Place is a Hole, Manhunter) e doçura cerebral (Cast and Love the Youth, Dogs, Dying Friend, uma tensa versão para Demons, a assustadora Backseat), mesclando barulho, psicodelia e melodia na medida, alimentando o próprio status como uma das bandas mais importantes do cenário independente brasileiro - e um dos melhores sons já feitos no rock nacional. Peça o seu pela Ordinary através do correio (Rua Visconde de Inhomirim, 714. São Paulo-SP. CEP 03120-001) ou email ([email protected]).

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1999 é feito por Alexandre Matias e Abonico Smith e quem quer que queira estar do lado deles.

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