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01.03.1999

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CINISMO ALTO-ASTRAL
O pai do rock nacional como o conhecemos
Por Emerson Gasperin

Sempre que posso, falo de Jeff Spicoli. Você sabe quem é: o mais memorável maconheiro da história do cinema, imortalizado por Sean Penn no filme Picardias Estudantis (Fast Times At Ridgemont High), até hoje exibido nos corujões da vida. A história trata das aventuras de um grupo de adolescentes às voltas com escola, praia e baladas. Lembro que, em 1997, para poder escrever sobre o assunto, cheguei a alegar que o filme estava completando 15 anos na época e uma data assim, tão crucial para o entendimento da cultura pop, não poderia passar em branco.

Uma pesquisa mais detalhada dá motivos de sobra para o culto a Picardias Estudantis. A trama foi baseada em uma história real contada por Cameron Crowe à Rolling Stone. Foi o segundo papel de Penn, que nem imaginava que um dia comeria a Madonna e se tornaria um grande ator. Foi o segundo trabalho da diretora Amy Heckerling, que depois ficaria milionária com o original e a sequência de Olha Quem Está Falando (N. do E. - E com outro retrato definitivo de outra geração irresponsável, As Patricinhas de Beverly Hills). Foi a estréia no cinema de Eric Stoltz e Nicolas Cage, que ainda apostava no sobrenome e assinava como Nicolas Coppola.

Depois do cinema, Fast Times... virou série de televisão nos Estados Unidos. Uma geração de trintões que hoje posam de homens de negócios no Silicon Valley passou pelos ensinamentos de Spicoli. Até os Beastie Boys, em sua passagem pelo Brasil, em 1995, citavam a sabedoria do surfista-doidão. A camiseta oficial da turnê do grupo trazia de um lado o indefectível furgão que Spicoli transformava em sauna com seus chapas, de outro o bordão não menos indefectível usado pelo personagem para atazanar o professor ranheta: "Aloha, Mr. Hand".

Estou falando tanto de Spicoli que quase esqueço o real motivo do cinismo alto astral deste mês: o filme Menino do Rio. Ou melhor, Ricardo Graça Mello. Ou, melhor ainda, Nelson Motta. A elite da qual pertenço, que tem TV a cabo em casa, assina a Net e ganhou o prêmio de poder assistir, pela enésima vez, o já citado filme. De cara, fica a conclusão que, se a juventude americana dos anos 80 foi moldada à imagem e semelhança de Picardias Estudantis, Menino do Rio é fundamental para se compreender o jovem silvícola que por aqui pululava naquela década.

Naqueles tempos pré-açaí, surfista no Brasil era quase sinônimo de hippie. A vida ideal incluía, obrigatoriamente, emprego em uma oficina de prancha, casa em frente ao mar, cabelo pigmaleão, jipe e viagem ao Hawaii uma vez por ano. Roupa, para ser legal, tinha de ser Fiorucci, Energia, Pró-Surf e Waimea. Para assoviar, "Mania de Você". André de Biasi, no papel de Valente, personificava tudo isso. Mas quero dedicar mais espaço ao personagem vivido por Ricardo Graça Mello, Pepeu. Largado na vida, ele conserta pranchas com Valente. Até que o protagonista, revoltado com uma desilusão amorosa, vai pegar onda em um mar cabuloso e se afoga. Evandro Mesquita mergulha para salvá-lo, acompanhado por Pepeu. Nessa hora, Pepeu adquire um ar grandioso, épico até, e acaba morrendo no lugar do amigo – uma atitude tão nobre que lhe valeu um retorno na seqüência do filme, Garota Dourada, como Kid, gêmeo do falecido.

Ricardo Graça Mello é o retrato do cara bacana, "desencanado", muito antes de existir essa palavra para designar o sujeito que não está nem aí. Começa o filme como virgem e acaba azarando a Claudia Ohana. Valente, de partida para o Hawaii, diz para Pepeu procurar lugar para morar e recebe como resposta um "eu me viro". O mundo desabando ao seu redor, os amigos envelhecendo, e ele não pára de tocar seu violão. Por aí dá para sacar o quanto Pepeu ganha na comparação com Spicoli. Enquanto o americano pega o milhão de dólares que ganhou por salvar Brooke Shields de um afogamento e contrata o Van Halen para tocar em seu aniversário, o representante nacional morre para poupar a vida do amigo. Um lance bem latino, inconcebível na moral anglo-saxônica do farinha-pouca-meu-pirão-primeiro.

Menino do Rio segue resgatando figuras do limbo, provando que Sergio Mallandro e Cissa Guimarães um dia foram decentes. Na trilha sonora, painel do incipiente rock brasileiro, um nome surge com toda força: Nelson Motta, co-autor do trio de músicas que talvez mais espelhe o espírito da época, "De Repente Califórnia", "Tesouros Da Juventude" e "Garota Dourada".

Assim, como uma espécie de eminência parda por trás da criatividade dos garotos, o já coroa Motta desmente o sábio Humberto Gessinger. Em uma entrevista, o engenheiro afirmou que a maior banda do Brasil é o produtor Liminha. Discordo. Basta ver Menino do Rio para ver que tal troféu pertence a Nelson Motta.

Claro, ele sequer poderia supor que o zen-surfismo que professava iria virar o monstro conhecido como "rock brasileiro". Mas as pistas estavam, para variar, também em Menino do Rio. Em 90 minutos, as únicas referências ao rock são a jaqueta de couro que o namorado de Patrícia (a saudosa Claudia Magno) usava na hora da briga com Valente pelo amor da garota e a célebre frase de Sergio Mallando, todo de branco para um casamento: "Estou me sentindo como os Beatles no começo de carreira, quando eles usavam gravatinha".

Como é que ninguém adivinhou a merda em que estaríamos hoje?

Emerson Gasperin estreou como jornalista em uma revista de surfe e acompanhou de perto o surgimento de ícones como Teco Padaratz, Fábio Gouveia e Peterson Rosa, apesar de ser fã mesmo de Luís Neguinho. Desiludiu-se quando seus colegas entraram na Amway, ou converteram-se para o Surfistas de Cristo, ou casaram-se. Ou tudo ao mesmo tempo.

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