NOÉ
NOÉ = Repouso.
Nome do filho de Lameque, descendente de Sete, Gn 5: 28, 29.
A razão deste nome afirma-se nas palavras que tem alguma semelhança
de som. "E ele lhe pôs o nome de Noé, dizendo: Este nos
consolará em nossos trabalhos, yenahame hamenu, e nas obras das
nossas mãos na terra que o Senhor amaldiçoou." Este método
é um dos muitos que os escritores hebreus empregam. A referência
aos anos da vida de Noé sofre várias explicações, de
conformidade com os antigos métodos de organizar e construir os
registros genealógicos, que se encontram no artigo sobre
Cronologia.
A aplicação dos
primeiros dois destes métodos, referentes à idade de Noé, não
carece de explicação. O terceiro método é mais intrincado, porém
igualmente aplicável. Segundo ele, na família de Lameque, 182 anos
depois que assumiu posição proeminente entre os filhos de Sete e
constituiu a família de que descende a igreja, nasceu um filho a
quem seu pai chamou Noé, dizendo: "Este nos consolará."
Muito depois, entre os descendentes deste filho de esperança,
denominados coletivamente pelo nome de Noé, justamente como os
descendentes de Israel eram conhecidos por este nome, apareceu um em
quem se realizaram as esperanças e que provou ser realmente o
portador deste conforto, cuja conduta religiosa, Deus recompensou,
prometendo não mais amaldiçoar a terra por causa da maldade
humana, nem ferir mais vivente algum; que construiu a arca, que foi
o chefe da família e seu representante. A este se refere o nome
tribal. Seu filho mais velho tinha cem anos de idade, quando veio o
dilúvio. Deu-se este grande evento no ano 600 de Noé, isto é, 600
anos depois que a família denominada Noé, havia assumido as funções
do patriarcado. Se o terceiro método for o verdadeiro, este será o
modo de explicar o caso a respeito de Noé. Este patriarca era homem
justo e, como Enoque, andou com Deus, Gn 6: 9. Foi um tempo de
apostasia universal, de completa indiferença religiosa, em que até
os filhos de Deus haviam tomado para si mulheres dos filhos dos
homens, por causa da sua formosura, 6: 2, e quando os homens em
geral, vivendo para o mundo, casavam-se e davam-se em casamento,
comiam e bebiam até o dia em que Noé entrou na arca, Mt 24: 38.
Era também um tempo em que a terra estava corrompida diante de Deus
e cheia de iniqüidade, em que a imaginação e os pensamentos do
coração humano eram aplicados para o mal, Gn 6: 5, 11. Era tal a
corrupção, que Deus resolveu destruir a humanidade, concedendo-lhe
um prazo de 120 anos, v. 3. Noé, pela sua vida exemplar, foi
pregoeiro de justiça, 2 Pe 2: 5. A ele, o Deus criador e juiz de
toda a terra, revelou o plano de destruir a raça humana, e
ordenou-lhe a construção de uma arca para seu livramento e de sua
família e conservar a vida de várias espécies de animais,
porquanto um dilúvio de águas ia cobrir a terra. E Noé assim fez.
Terminada que foi a construção da arca, Jeová, o Deus redentor,
ordenou a Noé que entrasse na arca com sua família, prevenindo-se
com os animais necessários aos sacrifícios e à sua alimentação.
Aquele que havia criado os animais e os pássaros, ordenou que
entrassem na arca um casal de cada um para perpetuar as espécies.
Este Deus redentor fechou a arca em que Noé entrou. Depois veio o
dilúvio. Veja Dilúvio. Quando, afinal se cumpriu o juízo proposto
pelo Criador e governador do universo, lembrou-se de Noé, e fez
diminuir as águas. Quando apareceram os primeiros vestígios de
terra seca, esperou ainda outros tantos dias, quantos havia durado o
dilúvio, e soltou aves para saber se as águas haviam desaparecido
de cima da terra. Certo disto, esperou ainda que Deus lhe desse
ordem para sair da arca. No dia do novo ano, removeu a coberta da
arca e viu que a terra havia secado, mas isto se deu oito semanas
depois da ordem que Deus lhe havia dado. Saindo da arca, Noé
edificou um altar ao Senhor e tomado de todas as reses e de todas as
aves limpas, as ofereceu ao Deus da sua redenção, que aceitou as
suas oferendas e os propósitos de seu coração, e resolveu não
mais amaldiçoar de novo a terra, nem ferir de morte as criaturas
viventes por causa da maldade dos homens. Deus continuou a revelar
este seu propósito. Do mesmo modo por que depois de criado Adão,
Ele o abençoou, ordenando-lhe que crescesse e se multiplicasse
sobre a terra, assim também deu preceitos à nova raça. Dos sete
preceitos de Noé, como assim se chamam, e que os judeus diziam
anteceder a lei a cujas observâncias se obrigavam os prosélitos,
somente três são expressamente mencionadas aqui: Não comer carne
com sangue, não matar e reconhecer a autoridade civil, Gn 9: 4-6.
Os outros quatro preceitos, proibindo a idolatria, o incesto, a
blasfêmia e o roubo, faziam parte da consciência humana em geral.
Deus ainda, revelando os seus propósitos de não mais amaldiçoar a
terra por causa do homem, comprometeu-se a não destruir a carne por
meio das águas do dilúvio e deu como sinal deste pacto, o
aparecimento do arco íris sobre as nuvens, 8-17.
Noé dedicou-se,
naturalmente, à agricultura e plantou uma vinha, bebeu do vinho que
fabricou e embriagou-se. Seu filho Cão motejou-o vendo-o
descomposto; os outros dois filhos o defenderam cobrindo-lhe a
nudez. Despertando Noé, e sabedor do que se tinha passado e
conhecido intimamente o caráter humano, e iluminado pelo
conhecimento das ordenações divinas anteriores ao dilúvio de que
as propenções más dos pais passam aos filhos e que Deus abençoa
os justos até mil gerações, Ex 20: 5, 6, profetizou a degradação
da raça de Cão, e por algumas razões, separando somente um dos
filhos de Cão, profetizou que ele seria escravo dos escravos de
seus irmãos, pronunciou benções para as famílias de Sem e Jafé,
e anunciou que ambos seriam fiéis ao Deus de Sem, Gn 9: 20-27. Veja
Canaã, Sem.
Noé viveu 350 anos
depois do Dilúvio, ele ou os seus descendentes com o mesmo nome, Gn
9: 28. Os semitas, distintos dos outros descendentes de Noé, vieram
a ser a geração dirigente e predominante na linha de que descende
a igreja. O Salmo 29: 10, contém a palavra hebraica mabbul,
especialmente com o sentido de dilúvio, Is 54: 9 ; Ez 14: 14, ambos
fazem alusões a Noé. Nosso Senhor compara os dias de Noé aos que
hão de preceder a sua segurança vinda, Mt 24: 37; Lc 17: 26. A fé
do patriarca Noé é louvada na carta aos Hb 11: 7, e o apóstolo S.
Pedro alude duas vezes ao oitavo pregoeiro da justiça divina
trazendo o dilúvio sobre um mundo do ímpios, castigando-os com uma
total ruína, 1 Pe 3: 20; 2 Pe 2: 5. Os gregos e os romanos tinham
uma história a respeito de um dilúvio em que somente duas pessoas
foram salvas: Deucalião e sua mulher, Pirra. Este Deucalião pode
ser Noé com nome diferente. Seja como for, os babilônicos
conservaram uma tradição semelhante `a dos hebreus sobre o dilúvio,
cujo herói, denominavam Sitnapistim e Atraasis.
ABRAÃO
ABRAÃO = hebr. Pai de
uma multidão, ou pai exaltado. (ABRÃO = hebr. Pai das alturas)
A mudança de Abrão para Abraão teve por fim, reforçar a
raiz da segunda sílaba, para dar maior ênfase à idéia de exaltação.
Abraão era filho de Terá; progenitor dos hebreus, pai dos
crentes e amigo de Deus, Gn 11: 26;
Gl 3: 7-9; Tg 2: 23.
Este nome estava muito em voga entre os semitas, pelo menos duas
gerações antes do reinado de Hamurabi, que parece ser o Anrafel,
mencionado em Gn 14. Abraão será nome de tribo? ou será ele a
personificação de uma tribo? O motivo para levantar esta questão
é que muitos nomes dos registros genealógicos dos hebreus,
referem-se a tribos e não a indivíduos, Gn 10 e 24: 1-4. Não é
sempre fácil, e às vezes, é impossível saber se tais nomes se
referem a uma pessoa ou a um povo. Porém, é importante notar que o
nome da tribo inclui indivíduos cujos feitos são recordados nele,
e como atos da tribo. Noé, por exemplo, pode ser o nome de uma
tribo; se assim for, a narrativa do dilúvio denota igualmente um
membro individual daquela tribo, salvo com a sua família na arca.
No caso de Abraão, Gn 11: 26, 27; e nos primeiros dez versículos
do capítulo doze, podemos ler tanto a história original de uma
tribo, e sua emigração, como a de um cheick com sua família.
A separação de Abraão
e Ló, pode ser considerada como a separação de duas tribos, e do
mesmo modo, o pacto de Abimeleque com o patriarca Abraão.
Esta distinção entre tribo e individualidades, não vem
alterar o assunto deste artigo, referente à pessoa de Abraão. A
maior parte dos feitos aqui registrados, são atos individuais, Gn
15: 1-8; 16: 1-11; 18: 1;
19: 28; 20: 1-17; 22:
1-14; e cap. 26. As passagens citadas pertencem à mais remota
literatura de Israel, segundo o acordo de todas as escolas de crítica.
Nos séculos subseqüentes, os próprios hebreus tratam do assunto
sob o mesmo ponto de vista, Is 29: 22; 41: 8; 51: 2; Jr 33: 26; Ez
33: 24; Mt 8: 11.
I Cronologia - a) O
Patriarca tinha 75 anos quando deixou a Caldéia. Todo este tempo
viveu com seu pai e seus irmãos, em Ur. Casou-se com Sara, sua irmã
paterna. Depois da morte de seu irmão Harã, ele e sua mulher e Ló,
seu sobrinho, emigraram, sob a direção de Taré, de Ur para a
terra de Canaã, Gn 11: 27-31. A Bíblia não menciona o motivo
desta emigração. O historiador Josefo pensa que foi por causa do
falecimento de seu filho Harã, Antiguidades. 1: 6, 5.
Pensam outros, que o motivo da mudança baseia-se no desejo
de melhorar as condições de vida, em uma nova terra de liberdade,
ou talvez por causa das perturbações políticas da Caldéia,
ocasionadas pela invasão dos elamitas. Santo Estêvão interpreta o
caso referido em Gn 12: 1, do seguinte modo: "O Deus da Glória
apareceu a nosso pai, Abraão, quando estava em Mesopotâmia, antes
de assistir em Carã, At 7: 2. Esta interpretação é favorecida
pelas narrativas de Gn 15: 7, e Ne 9: 7, em que a saída do
patriarca obedece a atos providenciais. As várias causas já
assinaladas e os motivos de ordem natural, poderiam ter cooperado
como meios providenciais empregados por Deus para persuadir o seu
servo a obedecer à visão celestial.
A família saiu de Ur,
e, tomando a direção ordinária, seguiu o vale do Eufrates, para
noroeste. Chegados que foram a Harã, abandonaram a idéia de seguir
para Canaã e ficaram ali.
Quando Abraão tinha 75 anos de idade, partiu de Harã para a
terra de Canaã. Esta mudança foi feita em obediência à vontade
de Deus, que a ele se revelou em Ur. Santo Estevão, como já foi
dito, dá esta interpretação que bem se combina com a narração
de Gn 12: 1. Pelo fato de constar a morte de Taré no capítulo
anterior, não se segue que o patriarca se detivesse em Harã até
à morte de seu pai. O escritor sagrado, como é de costume, termina
o que tinha a dizer sobre Taré, antes de entrar nos pormenores da
história de Abraão. Pode-se também acreditar que Abraão se
deteve ali por mais tempo, porque as mesmas pessoas que saíram de
Ur, excetuando Taré, deixaram Harã: é isto também o que diz
Santo Estevão no seu discurso em Atos. Sendo assim, Abraão nasceu
quando Taré tinha, pelo menos, 130 anos, e não 70, como se infere
de Gn 11: 26. Nesta passagem, o nome de Abraão está em primeiro
lugar, ou porque era o primogênito, nascido quando Taré tinha 70
anos ou então, se ele era o mais moço e nascido depois dos 70 anos
de Taré. Neste caso, pode ser que, ocupando o seu nome o primeiro
lugar, seja isso por ter ele sido o progenitor do povo escolhido.
De Harã foi para Canaã.
Que caminho tomou ele?
Provavelmente a estrada de Damasco, larga via que saía da
Mesopotâmia e passava por esta cidade, em demanda de Canaã.
Abraão não se demorava muito tempo nos lugares de descanso;
caminhava sempre. Tinha 75 anos quando deixou Harã e passou dez em
Canaã, antes de tomar por mulher, a sua escrava Agar, Gn 16: 3. Aos
86 anos de idade, nasceu-lhe Ismael, Gn 16: 16, de modo que só
decorreu um ano entre a sua saída de Harã e a chegada a Canaã.
b) Residência em Canaã.
Esteve em Canaã, quando muito, dez anos. Armou suas tendas em Siquém,
Gn 12: 6, e em Betel, Gn 12: 8, continuando o seu caminho passou
ainda mais longe para o sul, Gn 12: 9, indo até ao Egito para se
abrigar da fome que assolou toda a terra. Ali, pelo receio de perder
a vida, apresentou a Sara como sua irmã. Depois regressou para o
sul do país e se estabeleceu de novo em Betel. Foi neste lugar que
surgiram os conflitos entre os seus pastores e os de Ló, por causa
do aumento de suas manadas. Deu-se então a separação, indo Ló,
para as planícies do Jordão. Abraão dirigiu-se mais tarde para as
carvalheiras de Mambre em Hebrom, Gn 12: 10-20; 13: 1, 3, 5-12, 18.
c) Residência em
Mambre. Neste lugar demorou-se cerca de 24 anos. Associado aos príncipes
da sua vizinhança, perseguiu Quedorlaomer, que foi derrotado,
reavendo toda a presa, pelo que recebeu as homenagens dos reis de
Sodoma e de Salém.
Deus anuncia a Abraão o nascimento de um herdeiro e promete
dar-lhe em herança, a terra de Canaã. Foi aqui que lhe nasceu
Ismael. Após um intervalo de 13 anos, estas promessas são
renovadas e ampliadas.
O pacto de aliança
entre Deus e Abraão é ratificado pelo sinal da circuncisão e o
nome de Abrão é mudado para o de Abraão. Destruição das cidades
de Sodoma e Gomorra, Gn 14: 13, 1-6, 17-24; cap. 15; cap. 16;
cap.17: 18, 19.
d) Residência ao sul do país. Neste lugar permaneceu Abraão
durante a infância de Isaque, cerca de 15 anos, e Sara fora levada
à corte de Abimeleque, rei de Gerara. Aos 100 anos de idade, nasceu
Isaque, e mais tarde, Ismael é despedido com sua mãe para fora da
tenda.
À beira de um poço de propriedade de Abraão, foi concluído
o tratado de paz entre ele e Abimeleque, e deu o nome de Bersabé àquele
lugar. Aos 25 anos de idade de Isaque, a fé de Abraão foi posta em
prova. O Senhor exigiu-lhe o sacrifício de seu filho Isaque. Ambos,
pai e filho, em obediência à ordem divina, dirigiram-se às
montanhas de Moriá. Quando o patriarca estendia a mão para o
sacrifício de seu filho, um anjo do Senhor mandou substituir a vítima
humana por um carneiro. Terminado o sacrifício, voltou ele para
Bersabé, Gn 20: 1-21, 22-34; 22: 6; 22: 1-19.
e) Abraão volta para
Hebrom. Passados 20 anos de vida calma, veio habitar em Hebrom, onde
morreu Sara na idade de 127 anos, Gn 23.
f) Ao sul do país, com Isaque. Depois da morte de Sara,
quando Abraão tinha 140 anos de idade, ordenou a um de seus servos
que fosse buscar à sua terra, uma esposa para seu filho Isaque,
mulher que fosse de sua própria linhagem. Foi trazida Rebeca, e
Isaque a foi encontrar no caminho - Do-que-vive-e-do-que-vê -
(Beer-Laai-Roi).
Abraão tomou outra mulher, chamada Quetura, e morreu aos 175
anos de idade, sendo sepultado na caverna dos dois côvados, Gn 24:
67; 25: 20; 25: 1-9.
g) Desenvolvimento de
sua casa. Abraão partiu de Harã com sua mulher, seu sobrinho e as
almas que lhe acresceram.
Em Canaã aumentou a sua casa com os servos que comprou, com
os que lhe deram e provavelmente, com os que lhe nasceram. Era rico
em ovelhas, bois, jumentos e camelos, servos e servas. Quando correu
para libertar Ló, levou consigo 318 homens da sua casa. Os reis com
quem vizinhava reconheceram-no como príncipe poderoso, com quem
eles se prezavam de ter aliança. Porém, quando se viu privado do
auxílio de seus aliados, ao dirigir-se para o Egito, para
abrigar-se da fome, mostrou-se fraco, escondendo a verdade a
respeito de sua mulher. Desejava a paz e era homem de paz, todavia,
em tempos de perigo e de guerra, era corajoso e forte para combater
pelos seus parentes e amigos, Gn 12: 5; 16: 1; 17: 27; 18: 7; 20:
14; 12: 16; 13: 2; 7; 24:32, 35, 59; 26: 15; 14: 14; 14: 13; 21: 22,
etc.
h) Crenças religiosas
de Abraão. Seus parentes mais chegados serviram a outros deuses, Js
24: 2. A sua adoração era, pelo menos, corrompida pelo animismo,
prevalecente em Babilônia, que emprestava um espírito a cada
objeto da natureza, dirigia o pensamento para os onze grandes
deuses, além de inumeráveis deuses menores. Os grandes deuses eram
os objetos da natureza, que pela sua majestade e grandeza,
impressionavam os sentidos, tais como: o firmamento, a superfície
da terra, a lua, o sol, a tempestade, os cinco planetas visíveis a
olho nu. Os deuses eram ativos por sua natureza, aos quais se atribuíam
cuidados especiais a favor de indivíduos e coletividades, que
ouviam e respondiam às orações. A fé de Abraão distinguia-se da
grande maioria dos seus contemporâneos: cria em Deus Todo-poderoso,
Gn 17: 1; eterno, Gn 31: 33; altíssimo, Gn 14: 22; criador dos céus
e da terra, governador moral de toda a terra, Gn 18: 25; e, de
acordo com as crenças de seus contemporâneos, cria em Deus, como
regulador de todos os acontecimentos do mundo, que vê e toma
conhecimento de tudo que acontece e que faz tudo conforme sua
vontade soberana. Nesta crença, Abraão obedecia a Deus e o
adorava, honrando o seu nome. Como conseguiu esta crença? 1. A razão
veio em seu auxílio, como vem em auxílio de muitos cristãos
inteligentes. Os politeístas têm chegado a ser henoteístas e, há
traços de henoteísmo entre os compatriotas de Abraão, em Babilônia.
Espírito lúcido e lógico, como o de Abraão, facilmente chegaria
do henoteísmo para o monoteísmo.
Melquisedeque adorava
o Deus Altíssimo, criador dos céus e da terra; as suas concepções
religiosas conduziram-no a um profundo reconhecimento para com Abraão.
Há evidências monumentais que parecem provar que um indivíduo
entre os assírios e babilônios chegava a conhecer a unidade de
Deus. Não é de estranhar que Abraão chegasse a crer em um Deus,
Senhor de todas as cousas, como Oséias e Amós creram. 2. A herança
religiosa de seus antepassados, devia tê-lo auxiliado. Em favor
desta fonte de informação religiosa temos: (a ) a crença em uma
revelação primitiva; ( b ) a existência de uma linha que
principia em Adão, e que continha os nomes de verdadeiros
adoradores, como Sete, Enoque e Noé; e ( c ) o fato histórico das
tradições sobre a criação e o dilúvio, legadas ao povo hebreu.
3. Abraão teve revelações especiais por meio de sonhos, visões e
teofanias, Gn 12: 7; 15: 1, 2, 17; 17: 1; 18: 1, 2; 22: 1, 2. As
teofanias no tempo de Abraão, são como as manifestações de Jesus
Cristo nos tempos posteriores.
i) Harmonia entre a
história dos hebreus e a história contemporânea.
1) A linguagem de Canaã. Antes da conquista do país pelos
israelitas, sob a chefia de Josué, não poucos lugares e pessoas
tinham nomes semíticos. Abimeleque e Urusalim, i.é. Jerusalém,
eram nomes em voga.
2) A narrativa histórica da vida de Abraão, combina
perfeitamente com a história do Egito. As datas cronológicas da Bíblia
dão a entrada de Abraão em Canaã, 645 anos antes do Êxodo. Esta
data explica perfeitamente a presteza com que Abraão se dispôs a
ir para o Egito, quando a fome flagelava Canaã, e nos dá a razão
por que Faraó lhe deu tão cordial acolhimento. Este Faraó reinava
no período em que o trono do Egito era ocupado pelos reis pastores
que tinham vindo da Ásia.
A cronologia bíblica
dá a visita de Abraão às terras do Nilo e a descida de Jacó e
seus filhos à terra do Egito, dentro do período dos reis pastores:
prova bem evidente do rigor das datas, como da autenticidade da
narrativa.
3) A mesma narrativa mostra-se de acordo com a história de
Babilônia. (a ) Diz ela que a população da planície,
estabelecida na foz do Tigre, era governada por uma dinastia de
elamitas, isto no tempo em que a história dos hebreus se refere à
vida de Abraão e à invasão ocidental. ( b ) Sob a soberania dos
elamitas, os reis vassalos exerciam influências como as descreve o
livro de Gênesis. ( c ) Os reis de Babilônia, nos séculos
precedentes e durante este período histórico, fizeram incursões
no extremo ocidente e não poucas vezes dominaram sobre Canaã, Cp.
Lugalzaggisi, Sargom, Gudea, Kudurmabug Hamurabi e Amimisatana. ( d
) O nome de Quedorlaomer, pertencente ao rei de Elão, é nome
genuinamente elamita. Quedor ou Kudur entra constantemente na
composição dos nomes da realeza elamita, bem como o nome Laomer ou
Lagamar, pertencente a uma divindade elamita. Vê-se, pois, que a
narrativa dos hebreus, descreve minuciosamente as condições políticas
do império babilônico, tanto como da terra de Canaã. Sob a teoria
geralmente aceita de que Anrafel, rei de Senaar, é o mesmo Hamurabi
que foi rei de Betel desde 1975 a 1921 A. C., descobre-se valioso
sincronismo com a vida de Abraão, Gn 14: 1, 13, e a data de seu
estabelecimento em época muito aproximada.
ISAQUE
= Ele riu-se.
Nome do filho de Abraão e Sara, nascido ao sul do país
talvez em Berseba, Gn 21: 14-31, quando Abraão tinha 100 anos e
Sara 90, Gn 17: 17; 21: 5. Deus lhe havia prometido este filho, e
ele se riu duvidando, 17: 17-19. Logo depois, quando a mesma
promessa foi anunciada
a Sara, ela também se riu, em sinal de incredulidade, 18: 9-15.
Quando, porém, deu à luz o filho, confessou jubilosamente que Deus
fez uma cousa de
riso; todo aquele que o souber rirá juntamente comigo, 21: 1-12.
Para manifestar a fé de Abraão, Deus ordenou-lhe o sacrifício de
seu filho Isaque que na ocasião andava pelos 25 anos, como diz o
historiador Josefo. Isaque obedientemente aquiesceu aos desejos de
seu pai. Quando Abraão o estendeu sobre o altar, pronto a lhe lançar
o golpe de morte, oferecendo a Deus tudo quanto possuía, o anjo do
Senhor impediu o sacrifício, cuja vítima foi substituída por um
cordeiro em sinal de protesto contra os sacrifícios de crianças,
praticados pelos cananeus e por outros povos idólatras, ensinando a
todos os homens que o Senhor abomina os sacrifícios humanos, Gn 22:
1-18. Isaque habitou ao sul do país no lugar Beer-laai-Roi, que
quer dizer: Do que Vive e do que Vê, 24: 62. Tinha disposições
contemplativas e afetuosas que o levaram a sentir profundamente a
morte de sua mãe, 24: 63-67. Casou-se aos 40 anos; os primeiros
dois filhos nasceram-lhe daí a vinte anos, 25: 20, 26. Por causa de
uma grande fome, mudou-se para Gerara, isto é, cerca de 92 quilômetros
para o norte, 26: 1, 6. Ali apareceu-lhe Jeová para dizer-lhe que não
fosse para o Egito, e reafirmando-lhe o pacto com seu pai Abraão,
26: 2-5. A política de seu pai, quando se achou em terra
estrangeira, fazendo passar sua mulher por sua irmã, 20: 13, foi
imitada por Isaque em
Gerara, no que foi mal sucedido, 26: 6-11. Partindo de
Gerara, levantou as suas tendas na torrente
de Gerara, 26: 17, e abriu segunda vez outros poços, os
quais tinham aberto os servos de seu pai Abraão. Daqui partiu para
Bersebe, onde habitou por largo tempo, 26: 23; 28: 10. Jeová
apareceu-lhe durante a noite e
animou-o. Neste lugar erigiu um altar, como seu pai havia
feito, 26: 24, 25. Abimeleque, rei de Gerara, visitou-o e fez com
ele um tratado de paz, 26: 26-31. Este juramento mútuo de paz,
sheba, deu lugar a se perpetuar a memória de um juramento com o
nome do lugar, Berseba ou Beer-seba, 26: 33; comp. 21: 31.
Esaú, o mais velho
dos dois filhos de Isaque, era o seu favorito, não obstante o
Senhor ter dito que o mais velho serviria o mais moço, e Jacó era
o predileto de sua mãe Rebeca, 25: 28. Quando Isaque já passava
dos cem anos, 21: 1; comp. 25: 26; 26: 34. Rebeca e Jacó,
prevalecendo-se da idade da fraqueza de
seus sentidos, enganaram-no fazendo com que Jacó se fingisse
de Esaú, e deste modo usurpasse a benção destinada ao filho mais
velho. Feito isto, à instigações de Rebeca, que desejava salvar a vida de Jacó
contra a ira
assassina de Esaú, Jacó fugiu para Labão em Padã-Harã, a
pretexto de buscar mulher, 27: 46 até cap. 28: 5. Uns vinte anos mais,
Isaque residiu em Hebrom, onde tinha passado os últimos anos da
vida de seu pai, 35: 27; comp. 23: 2. Aqui ele morreu na
idade de 180 anos, 35: 28, sendo enterrado por ambos os filhos, Esaú
e Jacó, ao lado de seus pais e de sua mulher, na cova dos dois
repartimentos, 49: 30, 31. O Novo Testamento alude a Isaque como
filho da promessa, Gl 4: 22, 23, e cita o exemplo de sua habitação
em cabanas e as bençãos sobre Esaú e
Jacó, como evidência de sua fé, Hb 11: 9, 20.
JACÓ
= Suplantador.
Nome de um dos filhos de Isaque e de Rebeca, e irmão gêmeo
de Esaú, porém nascido depois deste, e por isso mais novo do que
ele, Gn 25: 21-26. Nasceu quando seu pai tinha 60 anos de idade, v.
26. Depois de crescido, tornou-se varão simples e habitava em
tendas, 27. Era o predileto de sua mãe Rebeca, ao passo que Esaú o
era de seu pai Isaque, 28. Voltando Esáu de uma caçada, muito
fatigado e faminto, pediu a seu irmão Jacó que lhe desse de um
cozinhado de lentilhas que havia feito. Em troca dá-me, disse este,
o teu direito de primogenitura, 29-34. Quando Isaque já havia
atingido a idade de 137 anos, e quase cego, Rebeca induziu Jacó a
disfarçar-se com as roupas de Esaú, e a cobrir as mãos e os braços
com peles, e deste modo alcançou a benção destinada a Esaú, como
filho primogênito. Irritado por se ver expoliado pela segunda vez,
resolveu matar a seu irmão logo após o falecimento do velho pai,
Gn 27: 1-41. Rebeca, conhecedora das intenções criminosas de Esaú,
aconselhou a Jacó a procurar refúgio em Harã, onde havia membros
da família, a pretexto de arranjar casamento.
Em viagem, teve uma
visão de noite. Uma escada posta sobre a terra, cuja sumidade
tocava o céu, com os anjos de Deus subindo e descendo por ela. O
Senhor firmado no topo da
escada, renovou a promessa das bençãos do pacto feito com Abraão,
Gn 27: 42-46; 28: 1-22. Jacó esteve em Padã-Harã pelo menos vinte
anos, em casa de Labão, sendo catorze em câmbio de suas filhas Lia
e Raquel e mais seis em troca de rebanhos. Durante a estada em Harã,
nasceram-lhe onze filhos, seis de Lia, a saber: Rúben, Simeão,
Levi, Judá, Issacar e Zebulom, e uma filha, chamada Dina; e Bala
serva de Raquel, teve mais dois filhos, Dã e Naftali; de Zelfa,
escrava de Lia, teve mais dois, Gade e Aser; finalmente, Raquel deu
à luz a José, Gn caps. 29 e 30. Este último nasceu quando Jacó,
tinha noventa ou noventa e um anos de idade, cp. 47:9 com 41: 46,
47, 54; 45: 11. Seis anos depois, percebendo que Labão e seus
filhos invejavam-lhe a prosperidade, e se tornavam seus adversários,
temendo, mandou buscar as suas mulheres, atravessou o Eufrates,
fugiu com a sua família levando tudo que possuía, em direção a
Canaã, Gn 30: 36; 31: 22. Três dias depois, Labão teve notícia
da fuga do genro; estava fazendo a tosquia das ovelhas; reuniu os
servos e saiu em perseguição de Jacó. Após seis dias de jornada,
a marchas forçadas, alcançou-o no monte Gileade, entre o Iarmuque
e o Jaboque, uns 550 quilômetros aquém do Eufrates, no que deveria
ter gasto, pelo menos, dez dias de viagem, ou mais, depois da
partida de Jacó; porque Labão estava ocupado na tosquia, quando
soube da saída de Jacó, e não estava preparado para a viagem.
Deus protegeu a Jacó. Do encontro resultou a reconciliação entre
as partes adversas. Em testemunho desta aliança, tomou Jacó uma
pedra, e a levantou por padrão. E disse a seus irmãos: Trazei
pedras. E como tivessem ajuntado muitas, fizeram delas um cabeço e
comeram em cima dele, cap. 31. Jacó teve manifestações do favor
divino em Maanaim e no Jaboque, onde um varão lutou com ele de
noite até ao romper do dia, o qual se mostrou superior a Jacó,
tocando-lhe o nervo de sua coxa, mas o abençoou antes de partir,
dizendo: "De nenhuma sorte te chamarás Jacó, mas Israel;
porquanto, se contra Deus fosse forte, quanto mais o serás contra os homens. E Jacó perguntou-lhe: Como te
chamas? A que respondeu
o varão; por que me perguntas o meu nome? E abençoou-o no mesmo
lugar. E pôs Jacó por nome àquele lugar Fanuel, dizendo: "Eu
vi a Deus face a face e a minha alma foi salva" Gn 32: 22-32;
cp. 33: 20; Os 12: 4. Este acontecimento ministrou bela lição ao
patriarca. Até então confiava na sua própria força e sagacidade
para o bom êxito de seus negócios. Agora ficou sabendo que a sua
força de nada valia para lutar com Deus, e que ele deve recorrer à
oração para alcançar as bençãos divinas, sem as quais nada
poderia conseguir. Daqui em diante recorre sempre à oração. Antes
de atravessar o Jordão, encontra-se com Esaú e alcança o perdão
dos males que lhe havia causado e que determinaram o seu longo exílio.
Os dois irmãos reconciliados partem; Esaú regressa ao monte Seir,
e Jacó segue para Canaã, Gn 33: 1-18. Habitou em Salém, cidade
dos siquimitas, e comprou parte do campo, onde armara as tendas, aos
filhos de Hemor, pai de Siquém, e erigiu aí um altar, e invocou
sobre ele o Deus fortíssimo de Israel, Gn 33: 18-20. Dina, filha de
Lia saiu para ver as mulheres daquele país, vendo-a Siquém, filho
de Hemor, príncipe daquela terra, enamorou-se dela e furtou-a. Dois
dos filhos de Jacó, Simeão e Levi, exerceram cruel vingança sobre
a cidade, matando seus habitantes e despojando-a. Jacó temeu as
conseqüências deste ato imprudente; porém, uma vez que seus
filhos haviam capturado
a cidade, matado os varões, apoderando-se de suas riquezas e
cativando mulheres e crianças, deu como conquistada a cidade e dela
se apoderou, Gn 48: 22; cp. 37: 12. De Siquém, Jacó partiu para
Betel, onde morreu Débora, ama de Rebeca, e onde a sepultaram, Gn
35: 6-8. Apareceu, pela segunda vez, Deus a Jacó, depois que voltou
da Mesopotâmia da Síria (35: 9; 28: 10-22), dizendo-lhe: "Já
não te chamarás Jacó, mas teu nome será Israel!" e
confirmou as bênçãos prometidas a Abraão. Ao aproximar-se de Belém,
indo para Hebrom, nasceu-lhe o último filho, Benjamim, morrendo em
seguida sua amada Raquel e sendo sepultada na estrada que vai para
Belém, 35: 9-20. Afinal, chegou à casa de seu pai Isaque em Mambre,
27.
Isaque morreu 23 anos
depois e foi sepultado por seus
filhos, Esaú e Jacó, 28, 29. Parece que Jacó habitou em
Mambre durante os trinta e três anos seguintes, porque
esteve em Hebrom cerca de dez anos depois
de seu regresso, 37: 14; cp. 2, e ali permaneceu até o tempo
de ir para o Egito, 46: 1. Tinha 130 anos quando desceu para a terra
de Faraó, 47: 9, e ali esteve 17 anos. Antes de morrer, pronunciou
as bençãos especiais, primeiro aos filhos de José, depois, a seus
próprios filhos; tinha 147 anos, 47: 28 e caps. 48 e 49.
Embalsamaram-lhe o corpo e o levaram para Canaã, acompanhado de
grande pompa, sendo sepultado na cova de dois compartimentos, que
Abraão tinha comprado a Efrom, heteu com o campo que olha para
Mambre, 50: 1-14. Jacó manifestou evidente falta de caráter, que o
fizeram sofrer bastante. No final de sua existência, sentiu
profundamente a falta do filho José, e tacitamente reconheceu-se
grato a Deus pelas bençãos recebidas, 48: 15, 16, e crente na
fidelidade das promessas divinas, 21; Hb 11: 21.
A nação hebraica,
descendente de Jacó, é designada na Escritura pela frase Filhos de
Israel, Ex 14: 16, 29; 15: 1, etc. Os profetas empregam os nomes de
Jacó e Israel em paralelo em
suas composições poéticas, Dt 33: 10; Is 43: 1, 22; 44: 1.
Vide Israel.
O
poço de Jacó a cuja borda Jesus se encostou, quando dialogava com
a mulher samaritana, estava em Sicar, junto à herdade que Jacó
havia dado a seu filho
José. A samaritana disse a Jesus: "Foi Jacó que nos deu este
poço, do qual ele mesmo bebeu, e seus filhos e seu gado" Jo 4:
5, 6, 12; cp. Gn 33: 18-20; 37: 12. Uma tradição corrente entre os
peregrinos de Bordeaux, ano 333 de Cristo, aceita pelos judeus,
pelos samaritanos, pelos cristãos e pelos maometanos, identifica o
poço de Jacó com o Bir Yakub, situado à entrada oriental do vale,
entre o monte Ebal, ao norte, e o monte Gerizim ao sul, a três quilômetros
e meio a sudeste do Nablus, que é a moderna Siquém, e cerca de 900
metros a sudoeste de Ascar, que muitos acreditam ser a antiga Sicar.
Maundrell, que é muito exato em suas investigações, diz
que o poço, tem 2 metros e 97 centímetros de diâmetro e 34m 65cm
de profundidade. O Dr. John Wilson, medindo uma linha de sonda lançada,
dentro do poço, com uma lanterna, em 1843, achou que a profundidade
é de 24 metros e 75 cm. Conder relata que a profundidade do poço,
medida em 1875, é exatamente de 24 metros e 75cm. Atualmente deve
ter diminuído em virtude da queda de terra de suas paredes. A água
é boa, mas difícil de a tirar, Jo 4: 11. A parte superior é
revestida de alvenaria de pedra, e daí, para baixo, é cortada em
rocha calcárea muito mole. Sobre a boca do poço, construíram uma
abóbora baixa e subterrânea de 6 metros e 60 cm. de comprimento na
direção leste, oeste, e 3 metros e 30 cm. de largura que serviu de
cripta a uma antiga igreja cristã, e cuja entrada se acha reduzida
e vedada por uma ou mais grandes pedras. Um pouco a oeste, existe
uma linda fonte, e muitas outras espalhadas pelo vale. O poço foi
aberto, talvez, porque as fontes eram de propriedade particular.
Desde o quarto século se julga que nas vizinhanças deste poço
deve existir o túmulo de José.
JOSÉ,
Possa ele acrescentar.
1. Nome do undécimo filho de Jacó e o mais velho de Raquel,
a qual, quando o deu à luz, disse: "O Senhor me de ainda outro
filho", e por isso lhe pôs o nome de José, Gn 30:22-24.
Nasceu em Padã-Harã, seis anos antes de Jacó voltar para Canaã,
25; cp 31:41, quando Jacó tinha 90 ou 91 anos de idade. Era o
favorito de seu pai, por ser o filho de sua velhice e por ser filho
de Raquel; fez-lhe uma túnica de várias cores, semelhante à que
usavam os jovens da boa sociedade, 37:3. Por ser o filho predileto
de Jacó, suscitou a inveja de seus irmãos, sentimento este que se
tornou mais intenso por causa dos dois sonhos que ele teve, nos
quais previa o tempo em que seu pai e sua mãe e seus irmãos se
curvariam na sua presença. Chegando à idade de dezessete anos,
37:2, foi a Siquém, onde seus irmãos apascentavam os rebanhos,
para saber como passavam. Chegando ali, soube que haviam partido
para Dotaim, e para lá se dirigiu.
Quando os irmãos o
viram, resolveram tirar-lhe a vida e dizer ao velho Jacó que uma
fera o devorou. Rúben opôs-se a isso, propondo que o lançassem
vivo em uma cisterna, pensando em depois tirá-lo de lá e levá-lo
ao pai. Na ausência de Rúben, passava uma caravana de ismaelitas
que descia para o Egito. Uns negociantes midianitas que iam junto à
caravana, o compraram. Tomaram então os irmãos a sua túnica e a
tingiram no sangue de um cabrito que mataram, enviando homens que a
levassem a Jacó e lhe dissessem: "Nós achamos esta túnica, vê
se acaso é a túnica de teu filho, ou não." Jacó concluiu
que José havia sido devorado por alguma fera e desatou a chorar, Gn
37:1-35. No entanto os midianitas levaram José para o Egito e o
venderam a Potifar, oficial de Faraó e general de seus exércitos.
Os grandes dotes morais do jovem escravo não podiam por muito tempo
ficar escondidos. Potifar o pôs no governo de sua casa. Por causa
de falsas acusações de sua senhora, foi metido na prisão, onde
esteve por alguns anos. Ali mesmo ganhou a confiança do carcereiro
que lhe confiou a guarda dos presos. Deus lhe concedeu a graça de
interpretar os sonhos proféticos do padeiro-mor e do copeiro-mor de
Faraó, que estavam com ele na prisão. A interpretação
realizou-se em todos os seus pormenores. Dois anos depois, Faraó
também teve dois sonhos proféticos que ninguém era capaz de
interpretar. O padeiro-mor, que havia reassumido as suas funções,
lembrou-se de José, e contou o que se tinha passado com ele na prisão.
Faraó mandou buscar logo a José que interpretou ambos os sonhos de
Faraó que tinham o mesmo sentido. Haveria sete anos de grande abundância
que seriam seguidos por outros sete anos de grande fome. José
aconselhou o rei a que nomeasse pessoa competente para armazenar os
excessos produzidos nos sete anos para servirem aos sete anos de penúria.
Faraó aprovou o plano, e convencido da sabedoria de José, 41:9-13;
25-36, nomeou-o superintendente de todo o Egito, o segundo abaixo de
Faraó, 41:39-44, José tinha 30 anos de idade, 41:46, de
sofrimentos e provações. Faraó deu-lhe Asenete, filha do
sacerdote de Om por esposa. Antes de começarem os sete anos de
fome, nasceram-lhe dois filhos, Manassés e Efraim, 41:50-52. A fome
chegou como havia sido profetizada, estendendo-se a todo o mundo
conhecido, especialmente na parte ocidental em torno do Mediterrâneo,
41:54, 56, 57. No Egito havia provisões armazenadas. Os irmãos de
José foram lá comprar trigo. Não reconheceram a seu irmão José,
mas foram reconhecidos por ele. À proporção que eles o veneravam
e lhe obedeciam conheceu ter chegado o tempo em que se realizariam
os sonhos que tanto o haviam feito sofrer. Tendo experimentado o seu
caráter por várias maneiras, quando fizeram a segunda
viagem ao Egito, descobriu-se a eles e perdoou-lhes o mal que lhe
haviam feito, e convidou-os a virem habitar no Egito juntamente com
seu velho pai. Faraó recebeu-os muito cordialmente. Segundo o
historiador Euzébio, este Faraó devia ser Apepi II, ou Apofis.
Qualquer que fosse, pertencia a dinastia do Hicsos ou reis pastores,
oriundos da raça semítica, o que naturalmente contribuiu para a
boa recepção da família de Jacó. José morreu com 110 anos.
Embalsamaram o corpo e o sepultaram no Egito, sob promessa de ser
transportado para Canaã logo que se desse o êxodo, Gn caps. 42 a
50; Hb 11:21. A sua vontade foi religiosamente cumprida. Os restos
de José descansam em Siquém, bem no centro da terra prometida, Êx
13:19, Js 24:32.
Os particulares da
vida de José, que se relacionam com os costumes dos egípcios, são
conhecidos pelos monumentos e pelos papiros. Sabe-se, pelo que se
contém na Pedra de Roseta, que os reis costumavam dar liberdade aos
prisioneiros por ocasião de seu natalício ou grandes festas
nacionais. Dava-se muita importância às artes mágicas e de
adivinhação e principalmente aos sonhos, como mensagens divinas.
Quando mandaram buscar a José na prisão, apesar da urgência,
gastou o tempo necessário para se barbear e vestir roupas limpas,
Gn 41:14. A tosquia era particularmente feita entre os sacerdotes
como ato religioso. O termo "Senhor de Toda a terra",
encontra-se só uma vez em um monumento depositado no museu de
Turim, mas a investidura de um oficial de alta patente, encontra-se
sempre descrita, combinando com a narração do Gênesis, como seja
o anel, a opa de linho fino e o colar de ouro à roda do pescoço. A
frase "Sem o teu mando (boca) não moverá ninguém, mão ou pé
em toda a terra do Egito", representada na escritura hierográfica
por uma boca, símbolo do mando. A situação econômica do país
transformou-se inteiramente. Em conseqüência das medidas de salvação
pública postas em prática por José, a terra passou a ser
propriedade do rei e dos sacerdotes até pouco antes do
estabelecimento do novo império. Veja Egito, II, 5.
O Gênesis refere-se
à distinção de classe estabelecida pela pragmática dos egípcios.
José foi servido à parte e seus irmãos também à parte, e bem
assim os egípcios que comiam com ele, porque não era permitido
entre os egípcios, comer com os hebreus, Gn 43:32. José comia
sozinho por ser pessoa de alta categoria social e membro da classe
sacerdotal, que se apartava do povo leigo. Os egípcios comiam à
parte para não se misturarem com os estrangeiros, e os sacerdotes não
comiam nem bebiam cousas que viessem de fora do país, Porfírio 4.
7. O povo considerava abominável fazer uso de objetos gregos no
serviço de copa, Heródoto 2. 41. Os egípcios detestavam todos os
pastores de ovelhas, criadores de porcos e possuidores de gado,
porque tais ocupações eram consideradas incompatíveis com a
civilização e com a pureza de costumes exigida pelos padrões de
bom tom social, Gn
46:34; Heród. 2. 47; cp. 164. Foi este o motivo por que o filho de
Jacó localizou a seu povo na terra de Gósen, onde podia evitar o
contacto com os naturais do país. Existiam na Palestina alguns
lugares com os nomes de Joseph-el e Jacob-el, dados pelo
conquistador Totmés II, muito depois da entrada de Jacó e de seus
filhos no Egito e um século antes do êxodo. Não há certeza se
estes nomes tinham alguma relação com o patriarca Jacó e seu
filho José. São denominações semelhantes a Jiphthah-el, ou
Iphtah-el nome de um vale no território de Zebulom, Js 19:14. Estes
nomes têm a significação de "Deus suplanta e Deus
tira", e era costume em Babilônia usá-los como nomes próprios
individuais.
Uma lenda egípcia,
conhecida pela História dos Dois Irmãos, narra as tentações
sofridas por um jovem, em casa de seu irmão mais velho, muito
parecida com a de José em casa de Potifar, Gn 39. O pobre moço
escapou às iras de seu irmão, graças à intervenção do deus sol
que lançou entre ambos, um rio cheio de crocodilos como barreira
defensiva. Posteriores aventuras dos dois irmãos, finalmente,
operaram a reconciliação recíproca. Este final da lenda é
igualmente fabuloso, e foi copiado no reinado de Seti II, da décima
nona dinastia, séculos depois da vida de José. Ignora-se quando e
por quem foi elaborada. Cousas como estas encontram-se com freqüência
nos contos da antiguidade, Homero, Ilíada 6:155 e seguintes.
As duas tribos de
Manassés e Efraim descendem dos dois filhos de José. As bênçãos
que Jacó pronunciou sobre José no leito de morte, estenderam-se às
duas tribos, Gn 48:8-22; 49:22-26. No Salmo 80:1-3, existe uma
designação poética referente às tribos de Manassés e Efraim,
representando a pessoa de José.
MOISÉS
MOISÉS= Derivado do
egípcio mes, ou mesu, filho.
Nome de um grande legislador hebreu, pertencente à tribo de
Levi, da família de Coate e da casa de Anrão, Ex 6: 18-20, filho
de Jacobede, sua mãe, 20. Esta expressão deve ser entendida no
sentido de antecessora. Anrão a Jacobede, foram os fundadores da
casa tribal em que Moisés nasceu. Veja Egito.
O edito que mandava matar todos os meninos que nascessem das
mulheres hebréias, pôs em grande risco a vida do infante Moisés.
Sua mãe, vendo-o tão perfeito, escondeu-o durante três meses em
sua casa. Não podendo ocultar por mais tempo, tomou um cestinho de
junco, barrou-o com betume e pez, meteu dentro o menino e o expôs
num canavial que estava na ribanceira do rio. Ao longe ficou Miriã,
a observar o que sucederia. Ao mesmo tempo, eis que descia a filha
de Faraó para se banhar no rio. Segundo Josefo, chamava-se Termútis,
a princesa egípcia, Antig. 2: 9, 5. Euzébio diz que o nome dela
era Merris, que soa como Meri, uma das filhas mais novas de Ramsés
II. Os rabinos identificam-na com Bitia, filha de Faraó, 1 Cr 4:
17. Vendo ela o cestinho no canavial, mandou uma das suas criadas a
trazer-lho. Abrindo-o, e vendo nele um menino que chorava,
compadecida dele, disse: Este é algum dos meninos dos hebreus. Miriã
adiantou-se e disse à filha de Faraó: Queres que vá e que te
chame uma mulher hebréia que possa criar este menino? A princesa
consentiu e o menino foi criado pela própria mãe. Sendo já
adulto, entregou-o à filha de Faraó que o adotou por seu filho e
lhe pôs o nome de Moisés, dizendo: Porque eu o tirei da água, Ex
2: 1-10.
O filho adotivo de uma
princesa deveria ter educação principesca e, por isso, foi ele
instruído em toda a literatura dos egípcios, At 7: 22, que nesse
tempo excediam em civilização a qualquer outro povo do mundo.
Deste modo se preparou para exercer missão mais elevada do que a de
ser herdeiro do trono dos Faraós. Deus o estava preparando para
servir de condutor dos hebreus. Moisés possuía grandes dotes
naturais, aperfeiçoados por uma cultura especial, que o preparavam
para exercer a grande missão destinada para ele. Familiarizou-se
com a vida na corte, privou com os príncipes, contemplou a
grandeza, as pompas e os rituais do culto; entrou no conhecimento do
simbolismo convencional, fez-se tal quanto o permitiam as idéias do
tempo. Presidiu à administração da Justiça e familiarizou-se com
as artes em uso na vida civilizada daquela época. Contudo, não
perdeu de vista a sua origem, acreditava nas promessas reservadas ao
povo hebreu. Antes mesmo de terminar a sua estada no Egito, já
tinha descoberto que Deus o chamara para ser juiz e libertador dos
israelitas, seus irmãos. Viu um dos egípcios lutando com um dos
hebreus, e matou-o, escondendo o cadáver na areia. Tendo saído ao
outro dia, viu a dois hebreus rixando, e disse ao que fazia a injúria:
"Por que maltratas tu o teu próximo?" o qual respondeu:
"Quem te constituiu a ti príncipe, e nosso juiz? Acaso queres
matar-me como mataste ontem ao egiptano?." Faraó tendo notícia
do caso, procura matar a Moisés; mas este, fugindo da sua vista,
retirou-se para a terra de Midiã. Não quis ser chamado filho da
filha de Faraó e lançou a sua sorte com o povo de Deus, assumindo
as funções de salvador e juiz sobre ele, Ex 2: 11-15; At 7: 24-28;
Hb 11: 24, 25. Tinha ele a idade de quarenta anos, At 7: 23. Chegado
que foi a Midiã ajudou as filhas de Jetro a dar água aos rebanhos.
Por este ato, foi ele apresentado ao pai das moças que era
sacerdote e o casou com uma das filhas. Deste casamento teve dois
filhos, Gérson e Eliezer, Ex 2: 22; 4: 20; 18: 3, 4. Demorou-se em
Midiã, cerca de quarenta anos, At 7: 30, associado intimamente com
o povo que era descendente de Abraão e que talvez adorasse ao Deus
de Abraão, cp. Ex 18: 10-12. Este lapso de tempo serviu-lhe de
escola preparatória, convivendo com homem que exercia funções
entre os midianitas, homem de bom senso e sacerdote, Ex cap. 18.
Neste meio, Moisés alargou seus conhecimentos religiosos e
familiarizou-se com as formas de culto, ficou conhecendo os caminhos
do deserto, os recursos que ali havia, estudou o clima e os costumes
do povo. No meio da grandeza solene do deserto e de sua profunda
solidão, teve tempo para meditar e refletir. Ao terminar este período,
foi ele surpreendido com o incêndio de uma sarça, que ardia sem se
consumir. Aproximando-se para observar o fenômeno, o Senhor o
chamou no meio da sarça para ir libertar o seu povo. Moisés opôs
a sua incapacidade para tal empresa, Ex 3: 11. Eis aqui eu irei,
disse Moisés, aos filhos de Israel, e lhes direi: O Deus de vossos
pais me enviou a vós outros. Mas se eles me disserem: Que nome é o
seu? que lhes hei de respoder? 13. Não me darão crédito, nem
ouvirão a minha voz, 4: 1. Alegou também Moisés a falta de eloqüência
para persuadir, 10. Todas estas dificuldades foram removidas, e Moisés
teve de ceder ainda que contrariado. Deus se desagradou e
prometeu-lhe o auxílio de Arão, 14. Moisés tomou a sua mulher Zípora,
com os dois filhos, e voltou para o Egito, 20. Um dos filhos, o mais
moço, não havia sido circuncidado ainda,
porque Zípora considerava este rito muito bárbaro. Cedendo
à resitência de sua mulher , Moisés revelou incapacidade, não só
para governar a sua casa, como para desempenhar-se de tão elevada
missão junto de seu povo. Deus desgostou-se de Moisés por haver
negligenciado o sinal do pacto. E quando Moisés ia no caminho, o
Senhor se lhe pôs diante na pousada e queria matá-lo. Zípora
percebendo a causa, tomou logo uma pedra agudíssima e circuncidou o
prepúcio de seu filho, e disse a Moisés: "Tu és para mim
esposo sanguinário," Ex 4: 24-26. Chegando ao Egito, Moisés e
Arão repetidamente compareceram à presença de Faraó, como
enviados por Deus para conduzirem ao deserto o povo hebreu. A resistência
de Faraó atraiu sobre si e sobre o povo egiptano sucessivos
castigos com o nome de as dez pragas do Egito, caps. 5 a 13: 16.
Quando chegou a hora da partida, Moisés tomou o comando do povo. No
Sinai foi ele admitido a íntimas relações com Deus, cuja voz se
fez ouvir no acampamento articuladamente, e Moisés viu a Deus que
falava com ele, cara a cara, como um homem fala com o seu amigo, Ex
24:9-11; 23:11, 17-23; 34:5-29 que lhe revelou a sua vontade para
instruir o povo, do modo por que o fez mais tarde por meio de seus
profetas. Em comunhão com Deus, obteve dele os estatutos, baseados
nos dez mandamentos. Logo depois de uma estada de quarenta dias
sobre o monte, recebeu instruções para a construção do tabernáculo
e o modo de ser adornado, e bem assim as tábuas de pedra. Durante a
longa ausência de Moisés, o povo fez para si um bezerro de ouro.
Sabedor deste grande pecado, Moisés indignado atirou ao chão as tábuas
de pedra e as quebrou. Por este ato, significou ele que o pacto
feito com Jeová, expresso nas dez palavras da lei, havia sido
anulado pelo pecado do povo, que teve de sofrer pesados castigos.
Todos quantos se achavam perto do lugar em que se adorou o bezerro e
que não retiraram, quando Moisés os explorava pelo seu pecado,
foram mortos às mãos dos levitas que voluntariamente se ofereceram
para este fim. Tendo agido simbólica e judicialmente, Moisés
passou a agir como mediador, intercedendo pelo seu povo. Depois do
que, Deus promete enviar o seu anjo para servir-lhe de precursor. O
Senhor chamou outra vez a Moisés ao monte, onde recebeu novas
instruções sobre o culto e as ordenanças, tão grosseiramente
violadas, e recebeu também outras duas tábulas de pedra iguais às
primeiras que Moisés havia quebrado, caps. 19, 20, 32 até 34.
Em uma destas ocasiões
jejuou quarenta dias e quarenta noites, Ex 24: 18; Dt 9: 9-18, como
Elias fez mais tarde, 1 Rs 19: 8, ambos prefigurando o jejum de
Nosso Senhor, Mt 4: 2. O nome de Moisés acha-se para sempre
associado às leis promulgadas no Sinai e à peregrinação pelo
deserto. Veja Levítico e Números.
Quando Moisés desceu do Sinai, depois de lá estar quarenta
dias pela segunda vez, trazendo consigo as tábuas da lei, do seu
rosto saíram uns raios que lhe tinham ficado da conversação com
o Senhor, de que o povo se arreceou, evitando aproximar-se
dele, Ex 34: 29. Chamados por ele, vieram os filhos de Israel aos
quais expôs todas as ordens que tinha recebido do Senhor no Monte
Sinai e cobria o rosto com um véu todas as vezes que lhes falava.
Mas quando Moisés entrava à presença do Senhor, tirava o véu até
sair, 33, 34. A nova versão inglesa, seguindo os Setenta e a
Vulgata e traduzindo corretamente o texto hebreu, diz o contrário:
"E quando Moisés tinha acabado de falar com eles, punha um véu
sobre o rosto." Ele não usava o véu, nem quando falava com o
povo, nem com o Senhor. Ele cobria o rosto, não para esconder o seu
esplendor, e sim para ocultar a ação deslumbrante do seu brilho e
só o retirava quando entrava de novo à presença do Senhor, e
nessa ocasião o brilho se tornava mais intenso. Moisés punha um véu
sobre o rosto para que os filhos de Israel não fixassem a vista no
seu semblante, cuja glória havia de perecer, 2 Co 3: 13.
No segundo ano da
viagem pelo deserto, desposou uma mulher cusita, Nm 12: 1. É quase
certo que Zípora havia falecido no ano anterior, apesar do silêncio
da história, cp. Ex 18: 2. Corria entre os judeus, em tempos
posteriores, que a segunda esposa de Moisés era uma princesa etíope,
chamada Tarbis, que se havia enamorado dele por ocasião de comandar
um exército egípcio para a Etiópia, quando ainda fazia parte da
casa de Faraó, Ant. 2: 10, 2. Evidentemente não passa de uma
lenda. O segundo casamento deu-se no deserto, quando Miriã e Arão
se mostraram invejosos da superioridade de Moisés na direção dos
negócios públicos. Ambos dirigiram as hostes, tomavam parte nos
negócios públicos e ambos eram profetas como Moisés, e por este
motivo se julgavam com direito a fazer oposição ao casamento de
Moisés com mulher estrangeira, que talvez fizesse parte da multidão
mista que acompanhou os israelitas, quando saíram do Egito, Ex 12:
38.
Logo depois de
largarem de Cádes, Coré e outros príncipes revoltaram-se contra a
autoridade de Moisés e Arão, pelo que foram severamente punidos
por Deus, Nm 16. Veja Coré. No segundo acampamento, em Cades, Moisés
e Arão pecaram contra Deus, Nm 20. Quando Deus ordenou a Moisés
que ferisse a rocha, congregou o povo diante da pedra e disse:
"Ouvi, rebeldes e incrédulos, acaso poderemos nós fazer sair
desta pedra água para vós outros?" Os dois irmãos perderam
de vista a sua posição dependente e subordinada a Deus.
Julgaram-se únicos guias do povo, de quem dependia tudo o que lhe
era necessário; esqueceram-se de que foi Deus quem tirou o povo do
cativeiro do Egito e que o sustentou durante quarenta anos no
deserto. Tomaram para si a honra que só a Deus pertencia. Deus os
chamou para seus delegados e eles empregaram a sua autoridade para
se engrandecerem, por isso Deus os privou de entrar na terra
prometida. Este duro castigo não alterou a fidelidade de Moisés ao
seu Deus. Depois da sentença condenatória, continuou a ser fiel
como dantes. Recomeçando a sua marcha para Canaã, levou Arão ao
cimo do monte Hor, despojou-o suas vestes oficiais e transferiu as
suas funções a Eliezer. Deste modo, ele próprio auxiliou a
executar a sentença. Quando o povo era mordido pelas serpentes
venenosas, ele intercedeu com Deus que lhe ordenou levantar a
serpente de metal que servia para curar todos que fossem mordidos e
que para ela olhassem. Conduziu as tropas de Israel ao território
de Seom e de Ogue e o conquistou para Israel. Quando acamparam em um
vale entre as montanhas de Abarim e avistaram a terra prometida a
Abraão, a Isaque e a Jacó, as emoções da alma de Moisés
contidas até então, irromperam como em outras ocasiões desde que
havia pecado, encontraram alívio na oração: "Senhor Deus, tu
começaste a mostrar ao teu servo a tua grandeza, e a tua mão
poderosa... passarei pois, e verei essa excelente terra além do
Jordão, e esse notável monte e o Líbano." A isto o Senhor
respondeu: "Basta, não me fales mais nisto, porque tu não
passarás este Jordão", Dt 3: 24-27. Levantou-se o acampamento
para o vale de Sitim, e Moisés pôs em ordem a sua casa e,
preparando-se para morrer, fez as despedidas a seu povo. Veja
Deuteronômio. Levou a Josué destinado pelo Senhor para seu
sucessor e apresentou-o ao sumo sacerdote na presença da congregação,
e lhe impôs as mãos e o investiu no cargo que ele havia exercido
durante quarenta anos, com tanta distinção e eficiência, Dt 34.
Depois levou-o à porta do tabernáculo para receber de Deus a
investidura de seu cargo. Ensinou ao povo um cântico para que ele
conservasse na memória palavras de sabedoria religiosa e as tivesse
prontas na língua; era o cântico de despedida em que ele
registrava as bênçãos para cada uma das tribos. E subindo ao
monte Nebo, ali morreu na idade de 120 anos. Nunca a vista se lhe
diminuiu, nem os dentes se lhe abalaram. O Senhor o sepultou no vale
da terra de Moabe, defronte de Bete-Peor, Dt 34. Durante os quarenta
anos, que passou no deserto é que ele produziu as suas obras literárias.
Registrou o nome dos vários
acampamentos, Nm 33, a batalha com Amaleque, Ex 17: 14, mandou
escrever as leis baseadas no pacto, 24: 4-7, conservou uma cópia de
sua última despedida, Dt 31: 24. Possuía também imaginação fértil,
pensamentos profundos, idéias claras, para escrever naquele idioma
hebraico de estrutura tão simples, e ao mesmo tempo tão apropriado
a servir de veículo a ardente impressões. O mais espontâneo de
seus poemas, escrito sob emoção do momento, foi o cântico que
serviu para celebrar a derrota de Faraó no Mar Vermelho, Ex 15:
1-18, no qual atribui a Jeová, a glória do feito, 1-3, descreve o
espantoso acontecimento, 4-12, antecipa os seus efeitos sobre os
inimigos de Israel, 13-15, e prevê as garantias asseguradas para
Israel na terra prometida, 16-18. Este cântico foi composto em
alguns momentos, ao passo que o Sl 90, representa o produto de
reflexão e tranqüilidade de espírito, em que se acham
incorporadas as lições dos quarenta anos que o precederam; é um
poema didático destinado a ser retido na memória do povo de Deus,
Dt 32, cp. 31: 19-22. As bênçãos por ele pronunciadas por ocasião
de seu último adeus, assemelham-se às palavras de Jacó ao
despedir-se de seus filhos, e tem a forma poética, Dt 33. Moisés
possuía cabedal literário; nas suas várias produções
descobrem-se os traços de seus predecessores egípcios. Descobre-se
que ele possuía as mesmas idéias literárias operando nele, de
parceria com os exemplos da história daquele povo extraordinário,
aliadas ao despertamento da vida nacional dos hebreus e os
acontecimentos emocionantes que se desenrolaram a seus olhos, para
guiá-lo na organização da história de seu povo, tão bem
concatenada como se vê no Pentateuco.
Como organizador de um
povo, Moisés, guiado por Deus, dotou a Israel com instituições
civís e religiosas de primeira ordem. Estas instituições tinham
oportunidade, visto como eram consideradas pelos povos daquele
tempo, como essenciais a qualquer povo normalmente constituído,
cujos caracteres correspondiam aos ideais da época, expressões da
mais elevada moral e das verdades religiosas que a humanidade jamais
possuiu. As leis, no seu todo não eram novas. O pacto fundamental
eram os dez mandamentos. Havia muito que os israelitas sabiam que a
idolatria condenada pelo segundo mandamento, era ofensiva a Jeová,
Gn 35: 2. É evidente que a observância do sábado já existia
muito antes que o quarto mandamento fosse promulgado no Sinal. Desde
muito, que o povo de Israel sabia que o assassínio, o adultério, o
roubo e o falso testemunho, constituíam crimes condenados e punidos
pelos homens. O valor da constituição judaica consistia no
reconhecimento das obrigações morais que serviam de lei
fundamental do reino, e que a ação dos dez mandamentos que
caracterizavam os atos externos, penetrava no interior do homem,
apontando o coração como o centro de todos os maus desejos que dão
origem ao pecado. A parte principal do Livro do Pacto consiste de
leis oriundas do Decálogo, Ex 21: 1 até cap. 23: 19. Em certos
casos pelo menos, as antigas leis eram reafirmadas e os costumes
velhos convertiam-se em leis do reino. O código de Hammurabi (Veja
Anrafel) habilita-nos a traçar grande parte das ordenanças a um
período mais remoto, do que Moisés seria capaz de fazer, e prova
que a idéia de codificação, tão saliente no Livro de Pacto, século
antes de Moisés, já havia tido execução. A legislação eclesiástica
de Moisés tinha sua oportunidade; preparando um santuário,
subordinado a um plano fundamental, semelhante ao tipo predominante
dos templos do Egito, edifício permanente, simétrico em suas
proporções, empregando um simbolismo de acordo com o estilo da época,
conforme os fins a que se destinavam, e organizando um ritual com
uma corporação sacerdotal, cujas funções se assemelhavam em
geral, às que se usavam nos povos contemporâneos. Era uma casa
santa, um culto que representava o bem, segundo o pensamento e a prática
do mundo civilizado, acessível à inteligência, tanto dos
israelitas como dos gentios, que professavam o monoteísmo e o
espiritualismo, patenteando o modo por que o pecador se podia
aproximar de Deus. Moisés era homem inspirado, mas um código de
leis e uma forma de culto inteiramente ignorados desde a criação
do mundo, não lhe foram revelados. Moisés era profeta e recebeu
inspirações como os outros profetas. Sob as influências do Espírito
Santo constituiu-se veículo da mente e da vontade divina para com
as suas criaturas. Despendeu soma de dias em comunhão com Deus, que
lhe iluminou o entendimento para conhecê-lo e a natureza de seu
reino, que o guiou no modo de discernir as leis apropriadas às
condições do povo e adaptadas a discipliná-lo no espírito das
instituições divinas. Em comunhão com Deus, habilitou a organizar
leis e a fundar instituições com elementos antigos e velhos
modelos, porém muito diferentes das analogias que eles tinham nos
povos contemporâneos. Distinguiam-se deles pelo modo de exibir a
natureza espiritual e a santidade de Deus, pelo modo de desembaraçar
o proceder do homem das relações civís e trazê-las também em
contacto com Deus, e pelo poder de adaptar a vida secular ao serviço
de Deus.
Moisés possuía dotes
de estadista, facilmente descobriu a oposição que lhe faziam os
membros de sua própria família, Nm 12; notou o ciúme de outras
tribos e mesmo da sua, por causa da posição elevada que ele e Arão
tinham, cap. 24; as considerações mundanas que influíam sobre a
vida do povo, cap. 32, a sua falta de fé em Jeová nos momentos críticos
e a facilidade com que se fazia idólatra. Meditou muito sobre estas
fraquezas, que ameaçavam a existência nacional. Por isso, ao
preparar o seu discurso de despedida, insistiu muito sobre a existência
de um só altar e sobre a espiritualidade da religião como sendo os
grandes meios de eliminar esses defeitos, impregnando a vida moral,
por um lado, e por outro, conservando a pureza do culto e da
doutrina, unificando o povo em um só corpo, e fazendo com que a
religião sirva para manifestar a grandeza de suas instituições em
confronto com os altares do paganismo. Veja Altar e Deuteronômio.
Depois de sua morte, a estatura grandiosa de Moisés veio a ser
reconhecida universalmente e a sua reputação cresceu século após
século. Teve ainda a distinta honra de lhe ser permitido reaparecer
como representante do Antigo Testamento juntamente com Elias, para
conversar com Jesus a sua saída deste mundo, no Monte da
Transfiguração, Mt 17: 3, 4.
DAVI
= Amado.
Nome de um dos filhos de Jessé e segundo rei de Israel. A
sua vida divide-se em diversos períodos distintos:
1. A sua mocidade passada em Belém de Judá. Era o mais moço
dos oitos filhos de Jessé, 1 Sm 16:10, 11; 17:12-14. No registro da
tribo de Judá, 1 Cr 2:13-15, somente consta o nome de sete destes
filhos por ter morrido um deles, antes de ser registrado. A mãe de
Davi notabilizou-se pela sua ternura e piedade, Sl 86:16; 116:16. A
história de seus antepassados é colorida de cenas pitorescas
dignas de imitação e merecedoras de louvor, ainda que às vezes
manchada pelo pecado, Gn 37:26, 27; 38:13-29; 43:8, 9; 44:18-34; Nm
1:7; Js 2:1-21; Rt 4:17-22. Pessoalmente era ele ruivo e formoso de
rosto e de gentil presença, 1 Sm 16:12. Na idade juvenil e como o
mais moço de seus irmãos, tomava conta das ovelhas de seu pai;
mostrava a sua fidelidade e coragem na defesa dos rebanhos, matando
um leão e um urso, 1 Sm 16:11; 17:34,36. Era grandemente dotado de
gosto pela música, tocando maravilhosamente a harpa, seu
instrumento predileto; e mais adiante, compondo salmos. Quando o rei
Saul foi rejeitado, Deus enviou o profeta Samuel a Belém para ungir
a Davi, rei em lugar de Saul, para ser o seu sucessor. O ato não
foi publicamente conhecido para não provocar as hostilidades de
Saul. Quando muito, foi presenciado pelos anciãos da cidade, e
quanto parece, ninguém soube para que fim havia ele sido ungido,
16:4, 5, 13, a não ser o próprio Davi e seu pai. O Espírito do
Senhor veio sobre ele, todavia continuou no seu posto humilde de
pastor.
2. Davi em presença
de Saul. Este rei, abandonado por Deus, foi atormentado por um espírito
maligno, sofrendo de melancolia e de insanidade; aconselhado por
seus servidores, mandou vir um músico harpista para lhe amenizar os
sofrimentos. Alguém indicou-lhe o jovem Davi, como hábil músico,
moço de valor, pronto para a guerra em razão de sua idade,
corajoso, apesar de ainda não ser experimentado na guerra;
discreto, airoso e cheio de piedade, 16:14-18. Saul reteve-o em seu
palácio, agradou-se da sua música e do seu caráter; pediu a Jessé
que o deixasse em sua companhia e nomeou-o o seu escudeiro, 19:23;
comp. 2 Sm 18:15. A nova posição serviu de boa escola para o jovem
Davi; aprendeu a arte da guerra e do governo; cultivou relações
com altas personagens e conheceu a vida palaciana em todos os seus
aspectos. Davi não esteve continuamente com Saul. As condições do
rei melhoraram, e de quando em quando, Davi ia a Belém para olhar
as ovelhas de seu pai, 1 Sm 17:5. Numa destas visitas, os filisteus
invadiram a tribo de Judá e se acamparam a 28 quilômetros a oeste
de Belém. Saul mobilizou as forças militares para encontrar com as
do inimigo. Três dos irmãos de Davi estavam na linha do exército
já há seis semanas. O pai mandou Davi para saber do estado de seus
irmãos. O desafio de Golias às forças de Israel, produziu em Davi
profunda indignação. Sentiu em si que Deus, por meio dele, havia
de desafrontar o seu povo, e perguntou quem era aquele incircunciso
que assim afrontava o exército do Deus vivo. As palavras de Davi
foram levadas ao ouvido do rei. Aproveitando-se das disposições
ardorosas do jovem pastor que se dispunha a um combate singular com
Golias, cobriu-o com a sua armadura de guerra, que não Ihe casava
bem em razão do excessivo peso.
Golias dificilmente se movia sob a carga de sua armadura e o
peso da grande espada. Todo ele era uma fortaleza, tendo apenas a
face descoberta, que pela altura estava fora do alcance das armas de
Davi. Este, livre da armadura do rei, que Ihe embaraçava os
movimentos, armado de uma funda que muito bem sabia manejar, e com
cinco pedras no seu boldrié, não temeu o encontro com o poderoso
inimigo, certo como estava de combater por uma causa justa, e de ter
o auxílio de Deus. Os doestos trocados entre contendores, era nota
característica dos combates singulares dos tempos antigos. Golias,
caiu abatido por uma pedra que Ihe entrou na fronte, impelida pela
funda de Davi. Após o combate, seguiu para a côrte de Saul,
levando consigo a cabeça de Golias que foi exposta à vista dos
inimigos juntamente com a sua armadura, 1 Sm 17:54. A espada foi
posta no tabernáculo, 21:19.
Ao tempo que Saul viu
partir Davi contra os filisteus, disse para Abner, general de seu exército:
"De quem é filho este rapaz?" E quando Davi voltou
triunfante, fez-lhe a mesma pergunta, a que ele respondeu: "Eu
sou filho de teu servo Jessé, o belemita. A resposta encerra a
substância da entrevista, 17:55, e 18:1. Os pais do pequeno herói não possuíam tradições guerreiras. A
pergunta do rei visava descobrir a procedência e as condições
materiais da família, daquele a quem ia dar a mão de sua filha,
17:25; 18:18. Conheceu logo que não havia incompatibilidade que
estorvassem o consórcio. A vitória alcançada sobre os filisteus
criou nova situação para Davi. O valor, a modéstia e a piedade
que havia revelado, ganharam-lhe o amor desinteressado e constante
de Jônatas, 18:1. Não pode mais repetir as visitas aos rebanhos de
seu pai; teve de permanecer na corte de Saul, 2. As ovações que
recebeu após a sua vitória, produziram em Saul um sentimento de tão
profunda inveja, que doravante, se tornou rancoroso inimigo do jovem
guerreiro, 6-9. Sabendo que
Samuel havia profetizado a transferência de sua coroa para um
melhor do que ele, 15:17-29, e que Davi seria o escolhido, empregou
todos os meios para que tal vaticínio não se realizasse. Uma vez
tentou atravessar a Davi com a sua lança, 18:10, 11. Falhando esta
tentativa, mandou-o para frente do exército comandando mil homens,
13. A mulher que havia prometido a Davi, deu-a a outro 17-19, e
pretendeu servir-se de sua filha Mical para ruína de Davi, 20-27. A
proporção que ele crescia no conceito e que seu nome se tornava célebre,
mais cresciam os temores do rei
e mais disposto ele se mostrava a tirar-lhe a vida, 19:1. Os
planos de Saul nunca surtiram efeito, e sempre foram contrariados
por uma parte dos seus cortesãos, 19:9; Sl 8. Acalmado por um pouco
em breve, reviveu o seu ódio e mais uma vez tentou atravessar a
Davi com a sua lança, 1 Sm 19:4, 9. Outra vez mandou prende-lô
para ser morto na sua presença, o que foi evitado mediante o artifício
de sua esposa, Mical, 10-17. Por esta ocasião, Davi fugiu para
Samuel, em Ramata, onde Saul o mandou prender, 18-24, e de lá
procurou auxílio junto de Jônatas, cap. 20.
3 O herói fugitivo.
Faltando-lhe a confiança de Deus e acabrunhado pelas constantes
perseguições, Davi fugiu de perto de Saul para Nobe. Desamparado
de fé, recorreu à mentira, 21:1-9, saindo para Gate a
refugiar-se na corte do rei Aquis inimigo de Saul. Os
oficiais filistinos se opuseram à sua estada entre eles, alegando a
humilhação lançada sobre eles pela morte de Golias, v 14;
Sl 56. Fingindo-se louco, o rei Aquis o mandou sair de sua presença,
Sl 34. Readquirindo a fé em Jeová, voltou para Judá e foi
acolher-se à cova de Adulão, 1 Sm 22:1, deixando seus pais aos
cuidados do rei Moabe, 3:4. Uma companhia de homens desocupados e
oprimidos de dívidas em número de 400, que em breve se elevou a
600 se ajuntou a ele. Entre estes estava o pontífice Abiatar, o
sobrevivente de Nobe, que trouxe consigo o Êfode, juntamente veio
também o profeta Gade, que Davi havia encontrado em Ramá, 5:20;
23:6. Com estes elementos melhorou grandemente a sua situação. Da
cova de Adulão saiu ele para socorrer a cidade de Ceila que os
filisteus estavam desponjando, 23:1-5.
Saul dispunha-se a ir
a Ceila em busca de Davi que se retirou para o deserto de Judá, 14;
Sl 63. Ali o foi perseguir o rei a instância do povo de Zife.
Noticiada nova incursão dos filisteus, deixou Saul de perseguir a
Davi, 1 Sm 23:14-29. Conjurado o perigo, voltou a perseguí-lo pelo
deserto de En-Gedi, e neste lugar foi ele conquistado pela bondade
de Davi, que tendo-o em suas mãos, lhe poupou a vida, cap. 24; Sl 5
e 14. Davi com seu bando armado defendeu as propriedades dos
israelitas ameaçadas pelos filisteus, 1 Sm 23:1; 25:16, 21; 27:8, e
fazia presa nas cidades dos amalequitas, não lançava impostos, nem
exigia contribuições regulares. Chegado que foi ao Carmelo, mandou
seus criados à casa de Nabal à procura
de provisões, que lhe foram negadas em termos desabridos.
Tomado de grande indignação, dispunha-se a tomar tremenda
desforra, quando Abigail, mulher de Nabal, lhe saiu ao
encontro, evitando assim os intentos sanguinários de Davi.
Depois da morte de
Nabal, Davi a desposou, cap. 25. Davi voltou às vizinhanças de Zife, onde novamente foi perseguido por Saul. Ainda desta vez
foi-lhe poupada a vida. Passando ao acampamento de Saul, encontrou-o
dormindo na sua tenda, levando de perto da cama a lança e o copo
cap. 26. Não julgando possível escapar a tão tenaz perseguição,
pediu acolhimento ao rei Aquis para residir na cidade de Ziclague,
fronteira ao deserto pelo lado do sul. Ali esteve um ano e quatro
meses, protegendo os filisteus contra as tribos do deserto, cap. 27.
Quando os filisteus vieram a Gilboa para guerrear contra Saul, os príncipes
dos filisteus não consentiram que Davi os acompanhasse na guerra,
cap. 28:1, 2 e cap. 29. Retrocedendo, encontrou Davi e a cidade de
Ziclague devastada; perseguiu os invasores em retirada e recobrou
todos os despojos, cap. 30. Na batalha de Gilboa pereceram Saul e Jônatas,
cuja morte foi celebrada em belíssima elegia, 2 Sm 1.
4. Davi rei de
Judá. Pela morte de Saul a tribo de Judá a que pertencia
Davi, elegeu-o rei, e fixou residência oficial
em Hebrom, 2 Sm 2:1-10, tendo 30 anos de idade, 5:4. As
outras tribos dirigidas por Abner elegeram rei a Isbosete, filho de
Saul, resultando dali uma
guerra civil que durou dois anos, terminando pelo assassinato de
Abner e de Isbosete, 2:12, até cap. 4:12. O reinado
de Davi em Hebrom continuou durante sete
anos e meio, e ali nasceram das diversas mulheres entre
outros filhos, Amom, Absalão e Adonias, 2:11; 3:1-5; 5:5.
5. Davi, rei de todo o
Israel. Morto Isbosete, foi eleito Davi rei de todo o Israel.
Imediatamente procurou consolidar o reino, 5:1-5. Várias cidades
dos território de Israel estavam ainda guarnecidas por forças dos
filisteus e outras em poder dos cananeus. Davi começou a sitiar
Jerusalém que era o grande baluarte dos jebuseus, e fez dela a
capital do reino, onde edificou um palácio auxiliado por artífices
vindos de Tiro. A nova capital ficava na linha divisória de Judá e
Israel, ponto estratégico, que ligava os pontos extremos do país.
A expulsão dos cananeus abria o caminho entre Judá e o Norte,
facilitando as comunicações e preparando a futura consolidação
do reino. Os filisteus por duas vezes invadiram o país e em ambas
foram repelidos perto de Jerusalém, cap. 5:17-25; 1 Cr 14:8-17.
Rebentou de novo a guerra com os filisteus, que foram de tal modo
derrotados, que cessaram de perturbar a Israel por alguns séculos,
2 Sm 21:15-22. Estabelecido o reino, Davi voltou suas vistas para os
negócios do culto; trouxe a arca com grande cerimonial desde
Quiriate Jearim, Js 15:9; 2 Cr 1:4, e colocou-a no tabernáculo que
havia erigido na cidade de Davi, 2 Sm 6:1-23; 1 Cr 13:1-14; 15:1-3.
Em seguida organizou o serviço cultural
com grande magnificência, 1 Cr 15 e 16, e planejou a construção
de um templo majestoso, 2 Sm 7:1-29; 1 Cr 17:1-27; 22:7-10. Com o
favor divino, o reino
progredia. Para prevenir a contaminação pela idolatria e vingar as
afrontas cometidas pelas nações vizinhas, entrou em guerra contra
elas e subjugou os moabitas, os aramitas de Zobá e Damasco, os
amonitas, os edomitas e os amalequitas, 2 Sm 8:1-18; 10:1-19;
12:26-31, estendendo o reino até aos limites antes prometidos a
Abraão, Gn 15:18. Foi durante a guerra com os amonitas que Davi
cometeu o grande pecado com a mulher de Urias, o heteu, pelo qual
foi repreendido pelo profeta Natã, por cuja causa nunca mais a
espada se apartaria de sua casa, 2 Sm 11:1 até cap. 12:23. Davi
sinceramente se arrependeu, Sl 51, mas não escapou às conseqüências
naturais do seu pecado. O filho, fruto de seu amor impuro, morreu, 2
Sm 12:19. Os mesmos atos de luxúria
e de vingança aparecem em sua própria casa, cap. 13,
acompanhado da ambição de um filho perverso que disputava a posse
do reino, lançando em todo o país a guerra civil, caps. 14 a 19. O
espírito de revolta fomentado por Absalão irrompeu mais uma vez
com a sedição de Seba, cap. 20. Davi solenemente satisfez à justiça,
segundo as idéias do tempo, vingando as violações sanguinárias
de Saul e contra os gabaonitas, cap. 21. Cometeu o pecado de ordenar
a contagem do povo de Israel, sendo punido
com a peste que assolou o povo, cap. 24; 1 Cr 21.
Preocupou-se muito com a organização dos negócios internos e com
os preparativos para a construção do templo. Terminou o seu
governo assegurando a Salomão a posse do trono, 1 Rs 1, e
providenciando para que não escapassem ao castigo devido, todos
quantos estavam sob a ação da justiça, 2:1-11. Morreu aos 71 anos
de idade, tendo reinado 40 anos e meio, sendo sete e meio em Hebrom
e trinta e três em Jerusalém, 2 Sm 2:11; 5:4, 5; 1 Cr 29:27.
Davi recebeu a
distinta classificação de excelente cantor de Israel, 2 Sm 23:1. A
antiga tradição hebraica corrente em seu tempo e confirmada
depois, atribui-lhe a composição dos salmos direta ou
indiretamente.O seu gosto pela música é mencionado nos livros históricos,
tocava harpa com maestria, 1 Sm 16:19-23; 2 Sm 6:5, organizou o
serviço de canto para o Santuário, 1 Cr 6:31; 16:7, 41, 42; 25:1,
compôs uma elegia sobre a
morte de Saul e de Jônatas e sobre Abner e bem assim as suas últimas
palavras, 2 Sm 1:17-27; 3:33, 34; 23:1-7. À sua atividade musical,
referem-se vários escritores sagrados como, Am 6:5, Ed 3:10, Ne
12:24, 36, 45, 46, e o filho de Siraque, Ecclus, 47:8, 9. Esta
qualidade artística do grande rei, desenvolveu-se sob as influências
da época; a poesia e a música eram muito cultivadas pelos hebreus,
pelos egípcios e babilônios, Nm 21:14; Jz 5. Setenta e três
salmos tem o nome de Davi no texto
hebraico e em muitos casos, onde o nome dele não aparece, nem por
isso perdem o colorido de sua imaginação
privilegiada (comp. salmos 3, 7, 34:51, etc.). O salmo 59 e o 7
pertencem ao mesmo tempo em que ele demorava no palácio de Saul; os
salmos 35, 52, 54, 56, 57, 63 e 142, pertencem ao período
angustioso de sua vida sob a perseguição de Saul, e os salmos 3,
17, 30, 51 e 60 pertencem ao período de suas várias experiências
como rei.
Apesar dos lamentáveis
desvios, conseqüências inevitáveis
àquele período escuro da história da Igreja em que ele
viveu, e de que legou eloqüentes provas de arrependimento,
constitui brilhante defesa à sua fidelidade a Jeová, que lhe
granjeou o título de
"homem segundo o meu coração", 1 Sm 13:14. Geralmente
falando, ele fez o que era reto aos olhos do Senhor, exceto no caso
de Urias heteu, 1 Rs 15:5. Serviu no seu tempo, conforme a vontade
de Deus e morreu, At 13:36. Os efeitos de sua influência na
humanidade são incalculáveis. Ele mais que Saul, foi o fundador da
monarquia judaica. Os salmos que ele compôs são cantados por toda
a cristandade, séculos após séculos, alimentando e revivendo a
sua espiritualidade; e formou
um dos elos da cadeia dos ascendentes daquele que se chama o Filho
de Davi, Mt 22:41-45. |