Vida e Obra de Bernardo Guimarães
  poeta e romancista brasileiro [1825-1884 - biografia]

 
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Descendência e colaterais
Armelim Guimarães

Eduardo Frieiro fala da “estirpe muito literária dos Guimarães, que principia com Joaquim da Silva Guimarães, homem público, autores de vários poesias e prosas, pai do romancista Bernardo” (páginas de Crítica, Belo Horizonte, 1955, páginas 165/166). Francisco Badaró disse que o “estro poético nessa família de Silva Guimarães é um dom da natureza”

“No formoso talento de Bernardo Guimarães –- é Basílio de Magalhães quem o afirma – observa-se o fenômeno na herança, que também se lhe verifica na descendência. A características de toda a família, desde o século XVIII até a hora presente, é a feição intelectual.” Idênticas observações fazem Milton Pedrosa. Em suplemente do “Minas Gerais”, de Belo Horizonte, conclui em 1925: “É, com efeito, uma dinastia de poetas”.

Foram oito os filhos de Bernardo Guimarães: João Nabor, Horácio, Constança, Isabel, Afonso, José, Bernardo e Pedro. Nabor morreu ainda criança, com 10 anos, em 1º de abril de 1878, envenenado com estricnina.

Dos filhos, Horácio Bernardo da Silva Guimarães é o mais velho e foi o último a morrer. Nasceu na fazenda da Rancharia, a cerca de duas léguas de Ouro Preto, de propriedade de Dona Felicidade Gomes de Lima, sua avó materna. Morreu quase nonagenário em 29 de novembro de 1959. Morou em Ouro Preto, Belo Horizonte e Santa Luzia.

Horário começou na vida literária com José do Patrocínio, trabalhando com ele, na antiga capital do país, na folha “Cidade do Rio”. Depois militar por muitos anos na imprensa carioca e paulista, mudou-se para Belo Horizonte, onde se aposentou como funcionário da Secretaria das Finanças.

Em Belo Horizonte, colaborou no “Diário de Minas”, com trabalhos em prosa e em versos. Boêmio como o pai, Horácio jamais se preocupou em reunir em volume as suas composições, perdendo-se, assim, quase tudo. Alphonsus de Guimaraens, o primo que muito o estimava e admirava, dedicou-lhe a primeira produção de seu Kiriale.

Foi Horário, com Edgard da Matta, Alfredo de Sarandi, Álavaro Vianna e Carlos Raposo, um dos fundadores da revista literária “Minas Artísticas”, lançada em julho de 1901. Foi a primeira publicação no gênero editada em Belo Horizonte, segundo registrou Eduardo Frieiro. Horário também colaborou na revista “Horus”, lançada em 1902 por Álvaro Vianna.  Poemas deles foram publicados no livro Outonais, mas como autor assina Raul do Valle, com o consentimento de Horário.

Horário casou-se com Ana Rocha Franco (Nhá Nica, na intimidade), mas não deixou descendência.

Constança e Isabel

Constança e Isabel foram as duas meninas que levaram, em Ouro Preto, numa bandeja de prata, ao Imperador D. Pedro II, os livros até então publicados por Bernardo Guimarães.

A primeira, a Constancinha (assim ela era chamada na família),  morreu em 28 de dezembro de 1886, em Ouro Preto, com 17 anos de idade. Ela foi a musa inspiradora do seu primo, também poeta, Alphonsus de Guimaraens. O poeta místico e simbolista muito a amou, mas os dois não chegaram a se casar, embora até hoje haja quem escreva que houve a união. Alphonsus se casou em 20 de fevereiro de 1897 com dona Zenaide, nove anos após a morte de Constança, a primeira noiva.

Constança foi o nome tradicional na família de Bernardo Guimarães. Era como se chamava a mãe dele, Constança Beatriz de Oliveira Guimarães. Em homenagem a ela, a primeira filha do romancista também recebeu o mesmo nome.

A terceira Constança –a Cicinha, como era chamada entre os parentes– foi uma neta de Bernardo, filha de Isabel. Uma quarta Constança foi a filha de Alphonsus de Guimaraens, nome que o autor de “Dona Mística” e da “Escada de Jacó” deu a sua caçula sob o impulso da saudade a sua prima pelo qual foi tanto tempo apaixonado.

João Alphonsus, no volume das Poesias de seu pai (Edição do Ministério da Educação e Saúde, 1938), assim escreve:

“A última filha nasceu em 8 de março de 1920; o casal lhe deu o nome de Constança. Desde logo o apelido familiar ficou sendo Constancinha. Mas em 16 de maio de 1921, depois de uma doença rápida, morre Constancinha, menina risonha e carinhosa, já com o conhecimento afetivo perfeito – o único filho do casal a morrer. Estefânia, a irmã mais velha de Alphonsus, que morava em Mariana desde que lhe havia falecido os pais, e sua tia Maria Eugênia, atribuíram a morte à fatalidade do nome, cuja escolha censuraram. Alphonsus não acreditava nisso, mas o golpe lhe combaliu o espírito e o corpo em que o coração descompassava. E na madrugada de 15 de julho de 1921, quando ia fazer dois meses da morte da filha, ele também se foi.”

Uma quinta Constança existiu na família, apelidada, entre os parentes, de Ia. Era filha de Joaquim Caetano da Silva Guimarães, irmão de Bernardo Guimarães.

Isabel, a segunda filha de Bernardo, casou-se cm o advogado Albino José Alves Filho, também poeta e jornalista, que, por muito tempo, desempenhou o cargo de Procurador Geral da República. O  casal teve oito filhos, dos quais, assim como ocorreu com a prole de Bernardo, seis foram homens e duas mulheres: Domingos, Fábio, João, Roberto, José, Bernardo, Constança e Lívia. Isabel Guimarães morreu na Bahia em 19 de novembro de 1915.

Constança (Cicinha), filha de Isabel e Albino, era casada com o engenheiro Alfredo Carneiro Santiago, diretor da Companhia Construtora Alcasan, de Belo Horizonte. Lívia Guimarães Alves casou-se com o advogado e jornalista Laércio dos Prazeres, que morreu no Rio de Janeiro em 17 de setembro de 1971.

Dos filhos de Isabel, destacou-se João como primoroso poeta. Infelizmente, os seus versos, admiráveis todos, ainda permanecem inéditos. Morreu  muito moço. Ainda um adolescente, já compunha excelentes sonetos, como o que segue:

Natal. Os olhos úmidos de pranto...
E, através  das pupilas embaciadas,
Vejo, em desfile, as ilusões passadas,
E sinto um misto de amargo e encanto.

Quantas recordações daquele canto
Onde ouvia as histórias encantadas,
De príncipes, de duendes e de fadas,
Que me faziam trêmulo de espanto.

E minha mãe, contando-as de memória,
Olhava-me vaidosa e enternecida,
Como se eu fosse o príncipe da histórica.

E hoje, quanto saudade dolorida,
Daqueles tempos em que eu tinha a glória
De para alguém ser príncipe na vida.

Assim era a lira espontânea e original de João Guimarães Alves, neto de Bernardo Guimarães. João morreu com 34 anos, em junho de 1934, no sul de Minas. Seu irmão José foi jornalista em Belo Horizonte.

O quinto filho de Bernardo Guimarães foi Afonso. Nasceu em 30 de abril de 1876 em Queluz de Minas, a antiga Vila dos Carijós, hoje Conselheiro Lafaiete, porque foi lá em que também nasceu Lafayette Rodrigues Pereira, companheiro de jornalismo de Bernardo Guimarães na Corte. Pereira morreu em 1917.

Afonso morreu em Belo Horizonte, onde morava, no dia 24 de novembro de 1955. Ele foi funcionário da Delegacia Fiscal do Tesouro Federal, em Minas Gerais. Além de trabalhos publicados em jornais e revistas, ele publicou dois volumes de contos, gênero em que se notabilizou: Ossa Meã, O Noviço, A Boa Fada, O Panegírico do Senhor Cura, O Pedrês, Venanço e ùltimos Bifes. Imprimiu-o Beltrão & Cia. em 1905. O segundo livro, editado pela Tipografia Athene, de Belo Horizonte, em 1921, contém quatro produções: Venanço, Imigrantes, Meu Filho e Mancha.

Victor Silveira, em seu Minas Gerias em 1925, assim informava sobre Afonso:

Causer admirável, esse filho de Bernardo Guimarães herdou do pai a imaginação criadora que o imortalizou como o primeiro romancista de seu tempo.  Algumas novelas de Silva Guimarães encantam pela pureza do estilo e impressiona pela ousadia dos temas escolhidos, desenvolvidos com grande brilho. Os seus personagens são seres vivos que encontramos a toda hora na rua e nos bares. Nunca, em nova (conto) de Silva Guimarães, encontramos um tipo postiço. Nunca ninguém descreveu como ele um homem de taverna. Santini e Gervásio, personagens de “Os Borrachos”, são figuras da vida real. A descrição do físico de Gervásio, presa do vício da embriaguez, que lhe depauperava o organismo, é página que poderia ser assinada por um médico que fosse m grande escritor.”

Afonso da Silva Guimarães foi casado, primeiramente, com sua prima Júlia, filha de Joaquim Caetano da Silva Guimarães, irmão de Bernardo. Em segundas núpcias, com Petrina Marcelina. Do primeiro matrimônio não houve filho; do segundo vieram-lhe Elvira, Isabel Afonsina, Sílvia, Flúvio, Lívio, Célio, Norma, Décio e Luísa.

O sexto filho de BG foi José da Silva Guimarães. Nasceu em 5 de setembro de 1882, em Ouro Preto. Morreu em Belo Horizonte em 16 de novembro de 1919. Foi o mais erudito dos filhos de Bernardo Guimarães. Mais inclinado a investigações científicas e filosóficas, produzi algumas colunas de jornais e revistas. Não teve tempo, contudo, de publicar um só volume de suas pesquisas e estudos, porque morreu com 37 anos. Era agrônomo. Não se casou.

O penúltimo dos filhos de BG foi Bernardo Guimarães Filho, o Didico, como lhe chamavam os parente e amigos. Victor Silveira, em 1925, assim o registrou: “Poeta como seu pai, o grande Bernardo Guimarães. Seus versos são admiráveis. Como poeta humorístico e o primeiro de Minas. Publicou, com Djalma de Andrade, Ditosa Pátira, livro de quadras patrióticas, que obteve elogios da crítica. Reside em Belo Horizonte, onde é funcionário da Administração dos Correios. Conhece profundamente História. Tem inédita uma Corografia do Estado de Minas. É professor de inglês, língua que conhece muito bem”.

Didico colaborou em vários jornais e revistas. Escreveu o romance “O Valentão das Gerais”, publicado em capítulos no folhetim do “Correio do Dia”, de Belo Horizonte. Nasceu em 1883, em Ouro Preto, e morreu em Belo Horizonte em 1956. Não se casou.

O caçula do autor de “A Escrava Isaura” foi o engenheiro e geógrafo e professor Pedro de Alcântara Bernardo Guimarães. Não conheceu o pai, pois, quando o poeta e romancista vila-riquense morreu, Pedro ainda não tinha nascido.  Dona Teresa estava no segundo mês de gravidez. Pedro nasceria postumamente sete meses após a morte do pai, em 19 de outubro de 19884, no velho sobrado da família, no Alto das Cabeças, em Ouro Preto.

Dos filhos do romancista, foi o único que se dedicou à política, tendo sido deputado do Congresso Mineiro, “notabilizando-se na Câmara pelos seus discursos e pela sua independência de caráter”, diz Victor Silveira em sua obra Minas Gerais em 1925.

Foi também, da prole bernardiana, o que mais escreveu, não só em jornais e revistas, como em livros. Teve intensa atividade jornalística, que se assinala desde a meninice até os últimos minutos de sua vida, então como colaborador  do “O Repórter”, diário de Uberlândia, dirigido por João de Oliveira.

Fundou diversas folhas, em diversas localidades, e colaborou em dezenas de bons diários e semanários de todo o país. Em Belo Horizonte foi, durante muito tempo, o diretor da sucursal de “A Capital”, vespertino paulistano de Gustavo de Aquino e João Castaldi.

Dedicou-se também ao magistério, atividade na qual começou ainda jovem, em 1904, com Godofredo Rangel e Plínio Mota, no Colégio do Coronel Jerônimo Guedes Fernandes – educador várias vezes mencionado por Monteiro Lobato em “A Barca de Gleyre” – de Carmo de Minas, cidade então chamada Silvestre Ferraz. Pedro destacou-se ainda em oratória.

Mudando-se para Itajubá, cidade sul-mineira, tornou-se professor da Escola Normal Sagrado Coração de Jesus, das Irmãs da Providência de Gap, e do Ginásio de Itajubá. Nessa cidade foi redator do jornal “Gazeta de Itajubá”;

Também tinha interesse pelas pesquisas históricas. Publicou cinco volumes: “Fastos da História de Minas”, que teve duas edições e chegou a ser obra adotada oficialmente nas escolas mineiras, “Nada”,  livro de contos, “A Escravidão”, conferência, “O Que Nos Resta do Pindorama”, estudo dos vestígios que nos deixaram os índios nos nosso costumes, crendices e língua, “Município de Itajubá”, obra fartamente ilustrada, em formato de álbum, editada pela Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, que mereceu elogios do Barão Homem de Mello, presidente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

O folclorista Joaquim Ribeiro, na sua obra “A Tradição” e as Lendas”, recorre freqüentemente a “O Que  Nos Resta do Pindorama”, de Pedro Bernardo Guimarães, para fundamentar o seu livro.

Era Pedro casado com Gabriela, dileta filha do farmacêutico português Miguel Mariam Armelim. Como ocorreu com Dona Teresa Guimarães, fizera Gabriela, moça de fina educação, voa cultura e decidida vocação artística, um casamento por admiração literária, e, tal como correu com Dona Teresa, sua sogra, foi um exemplo de esposa e mãe, de movo que os seus filhos não fossem prejudicados pela boêmia característica dos Bernardo Guimarães.

Pedro morreu no dia 16 de agosto de 1948 em Uberlândia, onde era professor em várias escolas, nos meus braços, tendo ainda, ao lado de seu leito de moribundo, a assistência de sua filha (minha irmã) professora Maria de Lurdes Guimarães. No dia seguinte ao de sua morte, 17, a Câmara Municipal de Uberlândia se reuniu para homenagear o meu pai. 

Do casal Pedro Bernardo e Gabriela Armelim vieram seis filhos: Bernardo Guimarães Neto, Isabel, Bernadete, Altair, Maria de Lourdes e José. Destes, seis netos do poeta e romancista de Ouro Preto só chegaram à maioridade os dois últimos: Maria de Lourdes, normalista, que depois de aposentada como professora passou a dedicar-se à pintura acadêmica, participando de algumas exposições e já com algumas telas premiadas; e José, autor desta biografia.

Bernardo Guimarães teve 23 netos. A bisneta Isabel Teresa Guimarães Alves Prazeres destacou-se no teatro, no Rio, e fez algumas novelas. É filha de Lívia Guimarães Alves, neta do romancista, e do dr. Laércio Prazeres, jornalista e advogado, filho do desembargador João Cândido da Costa Prazeres e um dos fundadores de “O Estado de Minas”. Ele foi diretor da Imprensa Oficial de Minas Gerais. Um outro filho seu, Sérgio Bernardo Guimarães Alves Prazeres, dedica-se à musica e é formado pela Academia de Praga e tem ainda Curso de Extensão de Salzburg.

Dois irmãos de Bernardo Guimarães produziram excelentes versos e boas páginas de prosa: o padre Manuel e o Conselho Joaquim Caetano.

O Padre Manuel Joaquim da Silva Guimarães, no qual a veia poética se salientou, nasceu em Ouro Preto em 1821. Foi vigário das paróquias de Araxá, Uberaba e Santo Ângelo, esta última no Rio Grande do Sul. Foi capelão militar e prestou serviços na guerra do Paraguai. Desejando premia-lo por esses feitos, D. Pedro II nomeou-o cônego da Capela Imperial da Corte. Mas acabou não ocupando esse cargo, porque surgiu um trampolineiro que ficou com o régio galardão. Um outro padre com o mesmo nome (Pedro Guimarães) se apresentou à Corte como sendo o capelão de Curupaiti e Lomas Valentinas. E o irmão de BG não quis desmascarar o impostor. Apenas aumentou o seu nome, e passou a assinar padre Manuel Joaquim da Silva Guimarães Araxá, para evitar outro qualquer embaraço.

O padre irmão de BF foi deputado à Assembléia Provincial no biênio 1854-1855. Morreu no Rio em 1870, “tendo-lhe feito os funerais o Barão de Paranapiacaba, que foi quem lhe salvou os versos manuscritos”, informa Basílio de Magalhães.

Confirmando essa informação, assim escreveu o próprio Bernardo Guimarães na apresentação das duas poesias do seu irmão sacerdote –Saudade de minha Aldeia e o inválido de Caseros– que ele acrescentou no final das Folhas de Outono:

“O motivo que me leva a dar publicidade em seguida ao pequeno volume de poesias, que agora publico, algumas produções de meu pai e de meu irmão, ambos já há bem tempo falecidos, não é tanto o desejo de oferecer ao público essas poucas amostras do talento daqueles dois cultores das musas, como mais ainda para tributar uma homenagem de saudade e respeito às cinzas de dois entes, que me foram tão caros, e que podendo deixar de si, não só no percurso da vida, como na memória dos pósteros, vestígios luminosos de sua carreira literária, finaram-se deixando seus nomes envoltos no olvido e na obscuridade.

“Infelizmente são bem poucas essas produções, que consegui salvar, e essas mesas ter-se-iam de todo perdido, se não fosse o delicado e obsequioso cuidado de um distinto e particular amigo meu, o sr. Conselheiro João Cardoso de Meneses e Sousa.

“Este bom e generoso amigo, poeta distintíssimo, cujo nome tão vantajosamente conhecido na república das letras e uma das mais brilhantes glórias da poesia contemporânea no Brasil, sabendo do falecimento repentino de meu irmão, do qual também era amigo, falecimento que teve lugar no Rio de Janeiro em 1870, estando o falecido longe dos parentes, e em estado de grande pobreza, além de encarregar-se do seu funeral, teve a delicada e feliz lembrança de arrecadar alguns poucos papéis, que deixou, e de obsequiosamente mos remeter. O meu amigo bem compreendeu que esses poucos papéis, a que olhos indiferentes nenhuma importância ligariam, não podiam deixar de ser para mim de inestimável e subido valor. São flores mirradas e sepulcrais que ele, o prestimoso e excelente amigo, o mavioso poeta do sentimento, colheu com mão piedosa à margem de um jazigo, onde dois outros poetas descuidosamente as largaram, e veio oferecer àquele, a quem sobretudo incumbia guarda-las, e fazê-las reflorir à luz da publicidade.

“Minha gratidão para com João Cardoso é inexprimível, só posso dizer que essa circunstância veio estreitar mais, se é possível, os laços de gratidão e amizade, que desde os bancos da Academia de São Paulo, apesar da ausência, me ligam ao ilustre poeta.

“Os papéis que o meu amigo arrecadou constatavam de rascunhos de poesias, entre as quais só posso dar publicidade agora a duas poesias de meu irmão, e a um número mais considerável de poesias de meu pai, das quais meu irmão estava de posse.

“Os autógrafos, tanto de um como de outro, não eram cópias, a que tivessem dado a última demão; eram simplesmente rascunhos, cheios de emendas, de palavras riscadas, e substituídas por outras, etc.

“Mas como a letra de ambos era bastante clara e legível, não me foi difícil decifrá-las, fazendo algumas correções ou alterações, que não vale a pena mencionar.

“Seja-me lícito agora dizer algumas palavras a respeito do mérito dessas poesias: Se fosse confortável o juízo que delas faço, é escusado dizer que as não publicaria. Mas entendo que elas têm mérito real, e que não é só o estreito laço de parentesco que me liga a seus autores, que me leva a fazer elevado conceito e julga-las dignas de luz da publicidade.”

Nesse mesmo prólogo, depois de referir-se à pessoa e ao mérito literário de seu pai, e de fazer alguns comentários esclarecedores sobre os versos de João Joaquim referentes a D. Pedro I, volta o poeta a falar de seu irmão sacerdote:

“Alguma coisa também poderia aqui dizer sobre a índole e qualidades do talento poético de meu irmão; mas creio que seria inteiramente descabido entender-me sobre este assunto, não podem infelizmente oferecer agora ao leitor senão duas de suas produções, e essas mesmas não sendo das mais primorosas de entre tantas que escreveu. Inspirava-o principalmente a musa do idílio Os enlevos da solidão, o espetáculo da natureza risonha e grandiosa de nossos sertões, as cenas singelas e as puras emoções da vida campestre namoravam-lhe as fantasias, e lhe extraiam da lira canções cheias de suave harmonia e da mais encantadora simplicidade. Não reinava nelas o cansado tom bucólico das églogas antigas, e nem tampouco esse indianismo que por algum tempo se pretendeu enxertar na literatura como uma espécie de poesia nacional. Eram, a meu ver, um brilhante ensaio do que se poderia chamar de idílio brasileiro.

“Infelizmente, a não ser uma ou outra dessas produções, que por ventura tenham sido divulgadas nos jornais do Rio Grande do Sul, onde meu irmão residiu ultimamente, todas elas sumiram-se para sempre nas trevas do sepulcro com seu infeliz autor.

“Não devo terminar sem fazer aqui públicas a restituição de umas lindas estrofes, que roubei a meu finado irmão. Elas figuram neste volume no começo de uma poesia minha, que tem por título “Não queiras morrer”. Entre os poucos papéis aproveitáveis que deixou, deparei o rascunho das oito ou nove estrofes de que me apropriei, e a que o autor parecia querer dar seguimento. Achando-as lindíssimas e perfeitamente aplicáveis ao assunto de que eu tinha de tratar, servi-me delas como de uma epígrafe, a que dei mais amplo desenvolvimento”.

Tal escrito de BG está com a data de 15 de março de 1883, Ouro Preto.

Além dos poemas que sei irmão incluiu no volume das “Folhas do Outono”, conhece-se ainda uma outra, “O Ipê, rei das florestas”, que o dr. Antônio Joaquim de Macedo Soares inseriu nas “Harmonias Brasileiras” (São Paulo, 1859, páginas 27 e 33).

Joaquim Caetano

O mais velo dos irmãos de Bernardo Guimarães foi Joaquim Caetano da Silva Guimarães. Nasceu em Ouro Preto, em 6 de maio de 1813. Fez os estudos secundários no Caraça. Bacharelou-se pela Academia de São Paulo, pela qual também passaram os irmãos Bernardo e Padre Manuel; este chegou a freqüentar o curso jurídico.

Foi Joaquim Caetano juiz municipal e de órfãos de Uberaba, de Paracatu e de São Romão, e juiz de direito da comarca do Paraná, localidade da então Província. Em 1853, foi removido para a comarca de Itapicuru-Mirim, no Maranhão, e depois para o Cabo Verde. Foi ainda juiz de direito de Patrocínio, Formiga, Caldas e Campanha, tendo também exercido o cargo de chefe de Polícia de Minas Gerais. Em 1874, assumiu o exercício de desembargador da Relação de Minas Gerais, mudando-se então para Ouro Preto, sua terra. Em 1887 era ministro do Supremo Tribunal de Justiça, preenchendo a vaga ocorrida com a aposentadoria do Barão de Mucuri. Em 1888 estava aposentado. Foi agraciado com as condecorações das Ordens de Cristo e da Rosa, e o título do Conselho.

Joaquim Caetano escreveu “um compêndio de Filosofia e tinha os elementos essenciais, pelo brilho do talento, para ser  escritor de nota em livros úteis. Talvez as vicissitudes de sua vida agitada não permitisse tal conquista, honrosa para si e para a terra de seu berço” (Laurênio Lago, Supremo Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, Rio de Janeiro, 1940, páginas 134/135).

O “Dicionário Bibliográficos Brasileiro”, de Sacramento Blake, tomo IV, página 115, informa que Joaquim Caetano “escreveu vários dramas e comédias, que foram representadas cm muitos aplausos pelos estudantes”. Publicou ainda um opúsculo sobre “A Agricultura em Minas” (1865) e um romance intitulado “João e Francisco”, editado em 1878.

Eduardo Friero, que oferece um resumo de “João e Francisco” e deixa longa apreciação em torno dessa obra, pondera:

“Na opinião do Sr. Basílio de Magalhães, o romance “João e Francisco”, de Joaquim Caetano da Silva Guimarães, ‘é obra de pouco mérito literário e, por isso mesmo, há muito imersa no olvido’. Li há dias esse romance esquecido, um velho exemplar bichado que veio ter às mãos. A impressão do livro, que não traz no rosto o nome in extenso do autor, mas apenas as iniciais J.C.S.G., foi feita na tipografia de Joaquim Afonso Rodrigues de Moraes, em Mariana, em 1878. Li o livro com certa curiosidade. Consegui levar a leitura até o fim de suas 382 páginas largas e altas, compostas em petit romain. Ao terminá-lo, repeti para mim mesmo a velha sentença de que ‘não há livro tão mau, que não tenha alguma coisa útil’. O romance do irmão mais velho de Bernardo não me parecei inteiramente destituído de qualidades literárias, e se o pude ler é porque lhe achei algumas virtudes. O que o prejudicou mortalmente, tornando-o quase ilegível, foi a falta total de revisão. São incontáveis os monstruosos erros tipográficos que pululam no texto, pobremente impresso numa indigente tipografia de roça. Desventurado autor! Quem se imprime se oprime.”

Com esse romance se deu um episódio cômico. A Bernardo, já aplaudido como novelista e romancistas, Joaquim deu a ler os manuscritos de seu livro, pedindo-lhe a sugestão para melhorar o epílogo da história, já que estava inda indeciso sobre o destino a dar a “João e Francisco”. Bernardo achou fraco o trabalho do irmão. Não gostou principalmente do morticínio da história. Zombeteiro, aconselhou Joaquim Caetano que atasse ao pescoço de João a mó de um moinho e o atirasse, à meia-noite, a um dos lugares mais profundos do Tripuí; quando a Francisco, achava melhor dar-lhe um fim judanesco, enforcando-o numa figueira, depois de tê-lo feito assentar, durante vinte e quatro horas, em cima de um furibundo e assanhado formigueiro. Joaquim não gostou nenhum pouco da zomba e, enraivecido, mandou o livro para o prelo.

O apelido do irmão de BG era Joaquim Careca; ele começou a ser chamado assim na Faculdade São Francisco, em São Paulo. Ele foi músico, um virtuose do violão e do rabecão.

Genros

Ele teve genros ilustres. A sua filha Fanny era casada com  dr. Alcides Medrado, que foi secretário por muito tempo da Escola de Minas de Ouro Preto e professor da Escola Normal da mesma cidade, entre outros cargos nas atividades de ensino.

A filha Canuta casou-se com Paul Ferrand, um mineralogista francês, autor de várias obras e artigos sobre a sua especialidade, destacando-se o volume “L’Or à Minas Gerais”. Canuta tinha pender para as letras. Publicou o romance “Mancha Negra”, com o pseudônimo de Paula Nelle, volume lançado em Belo Horizonte, em 1937.

Nas “Folhas de Outono”, Bernardo Guimarães dedicou a sua sobrinha as Décimas, assim apresentando esse poema: “Ao aniversário natalício de minha sobrinha Maria Canuta, habilíssima pianista e cantora, filha de meu irmão desembargador Joaquim Caetano da Silva Guimarães.

Constança, outra filha de Joaquim Caetano, casou-se com Henry Gorceix, também um famoso mineralogista. Ele foi o fundador da Escola de Minas de Ouro Preto, da qual foram diretor durante 15 anos. Ele cunhou uma frase memorável: “Minas tem um coração de ouro metido em um peito de ferro”. Nasceu em Limoges, França, em 1842, e morreu em 1919. Gorceix foi aluno de Pasteur, em Paris, do qual recebera elogios.

A filha Elisa, ou Sinhoca para a família, casou-se com João Pandiá Calógeras, que foi Ministro da Guerra de Epitácio Pessoa. Também foi historiador e autor de várias obras.

E sobre a Júlia, a Julinha, já foi registrado aqui que ela se casara com o seu primo Afonso da Silva Guimarães, autor dos livros de contos e filho de BG.

Joaquim Caetano teve outras filhas, que morreram solteiras: Eleonora (Nurica) e Ana (Niquita), ambas poetisas. Filho só teve um, o dr. Luís Guimarães, que morreu como juiz aposentado. Sua comarca ficava em Caeté.

O irmão de BG morreu no dia 20 de agosto de 1896.

Um seu neto se destacou como cientista, o dr. Djalma Guimarães, mineiro de Santa Luzia, onde nasceu em 5 de novembro de 1894, filho de Luís Caetano da Silva Guimarães e de Dona Evangelina Teixeira Guimarães (filha do senador Manuel Teixeira da Costa).

Engenheiro pela Escola de Minas de Ouro Preto, Djalma descobriu um mineral – óxido complexo de tântalo, cálcio, urânio e nióbio – que, em sua homenagem, recebeu o nome de djalmaíta. Ele foi o primeiro presente da Sociedade Brasileira de Geologia. Foi também membro da Academia Brasileira de Ciências e entidades científicas internacionais, como a Societé Géologique de France, da qual foi vice-presidente. Morreu aos 78 anos de idade.

Jaques da Silva Guimarães, Maria Fausta e Francisca

Bernardo Guimarães teve ainda um terceiro irmão, Jaques da Silva, que morreu quando era adolescente. Bernardo o estimava, tanto que no seu primeiro livro publicado, os Cantos da Solidão, incluiu a poesia “Visita à sepultura do meu irmão”, na qual evoca, com saúde, o Jacques, “no albor dos anos tenros, quando a esperança, com donoso riso, nos braços o afagava”, e “que tão cedo” veio “pedir pousada na mansão dos mortos”.

BG também teve irmãs: a bela Isabel, que foi educadora em Entre Rios (Minas) e Maria Fausta, casada com Inocêncio de Faria Alvim. Desse casamento, nasceu Francisca, a Dona Chiquinha Alvim, mãe do imortal Alphonsus de Guimaraens, o mais festejado dos poetas místicos e simbolistas do Brasil.

Francisca, portanto sobrinha de Bernardo Guimarães, casou-se com Albino da Costa Guimarães, lusitano nascido na aldeia de Cepães, do distrito de Braga. Ele era comerciante em Ouro Preto, estabelecido na rua São José. Morreu em 5 de março de 1908, e Francisca, sua esposa, em 8 de janeiro de 1910.

O nome de família Guimarães, da linhagem de Albino, foi coincidência, e explicado fica que, enquanto Alphonsus de Guimaraens tinha sido sobrinho-neto de Bernardo, o seu alatinado Guimaraens provém de outra raiz genealógica. Houve a necessidade de alatinar Guimarães, tornando-se Guimaraens, para que houvesse diferença do primo Afonso Guimarães.

Alphonsus Guimaraens

Alphonsus, ou, por inteiro e na forma original, Afonso Henrique da Costa Guimarães foi apaixonado pela sua prima Constancinha, filha de BG e musa inspiradora de muitas de suas poesias – conforme já se assinalou aqui. Do casamento dele com Zenaide, em 1897, nasceram 14 filhos – oito mulheres e seis varões. Dentre estes, destacam-se escritores e poetas como João Alphonsus, o criador da “Galinha Cega”, de “Totônio Pacheco”, de “Rola Moça”,  e de “Eis a Noite”. Já Alphonsus de Guimaraens Filho é autor de “Lume de Estrelas” e da “Santa Solidão”. E Nazareno Alphonsus é o contista de “Alexandre”, “Velho Amigo”.

Eis o que era e o que sempre foi Alphonsus, ou melhor, Dom Alphonsus, como seria chamado alguns depois por seus discípulos  mais chegados: um artista de raça, da estirpe muito literária dos Guimarães, que principia no sabarense João da Silva Guimarães”, escreve Eduardo Frieiro em “Páginas Críticas” (Editora Itatiaia, Belo Horizonte, 1955).

 Alphonsus teve também irmãos poetas, simbolistas como ele mesmo, destacando-se Archangelus Guimarães, autor de “Coroa de Espinhos”, e cantor inspirado de “Cristo de Marfim”.

Depoimento de descendentes
Parentesco dos Guimarães com os Guimaraens
 
A Escola de Minas muda a dinâmica dos Silva Guimarães:
Gorceix e Ferrand, Calógeras e Medrado

xxxx
Índice do livro "Bernardo Guimarães, o romancista da abolição", de Armelim Guimarães

O ano do nascimento
xxxxxxxxxxxxxxx
x

Em São Paulo (1)

Em São Paulo (2)

Em São Paulo (3)

No sertão goiano

De volta a Ouro Preto

No "Atualidades" (Rio)

De volta ao sertão goiano

A profecia de Brasília

Nos saraus de Otaviano

A vida nômade

Um anjo à espera do poeta

No reino da felicidade

Professor em Congonhas do Campo e em Andaluz

E assim nasceu "A Escrava Isaura"

O caipira e o índio Irabuçu

Egresso das cátedras

Barão sem baronato

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"Pollice verso"

A morte de BG; e Teresa, a companheira de sempre

O sucesso da telenovela "A Escrava Isaura"

Descendência e colaterais


A cabeça de Tiradentes

O precursor do sertanismo no romance

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Qual foi o maior: o romancista ou o poeta?

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As pedradas dos puristas

O independente

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