O rock no Portugal dos 60

"O rock portugu�s dos anos 60 sempre foi um mist�rio para os brasileiros e, acreditamos, para o resto do mundo. Em meados daquela d�cada saiu no Brasil um compacto duplo com a banda Sheiks, contendo o hit �Missing You�, que os Incr�veis regravaram em vers�o instrumental. Uma das colect�neas Pebbles, por sua vez, trazia uma banda apresentada como portuguesa, mas que cantava em ingl�s. Hvia ainda a hist�ria de 'Penina', de autoria de Paul McCartney, gravada por um cantor portugu�s chamado Carlos Mendes, que vinha era membro dos Sheiks - os 'Beatles portugueses'. E praticamente resumia-se a isso o conhecimento a respeito do rock dos patr�cios. Por mais que accion�ssemos os sites de busca, inclusive os portugueses, quase nada se encontrava. A brava reda��o de Senhor F, no entanto, n�o se dobrou �s dificuldades e, depois de muita luta, encontrou o caminho das pedras. Inicialmente, por meio de um contacto aleat�rio com a directora da discoteca p�blica de Lisboa que, gentilmente, passou o contacto do jornal musical semanal Blitz. A partir do contacto com o jornal come�ou a nascer a mat�ria que se segue, assinada pelo jornalista M�rio Jorge Lopes e, de quebra, um interc�mbio promissor de informa��es e material." (Fernando Rosa)

Por M�rio Lopes - Blitz

Durante um dos concursos de grupos de �y�-y� que ocorria em Lisboa foi feito um recenseamento das bandas existentes em Portugal. O resultado da pesquisa apontou para um n�mero superior a trezentos grupos espalhados pelo pa�s. De todos eles, passados trinta anos, s�o lembrados os Sheiks e o Quarteto 1111, por um lado, e os Pop Five Music Incorporated ou os Chinchilas, por outro. Nomes como os Ekos ou os Jets, que disputavam com os Sheiks o t�tulo de reis do �y�-y� nacional, os Tit�s ou o Conjunto Mist�rio, seguidores dos ingleses The Shadows, e Victor Gomes ou Fernando Conde, roqueiros da primeira fase do rock'n'roll, popularizada por Elvis Presley ou Chuck Berry, perderam-se no tempo e s�o esporadicamente citados em ocasionais compila��es ou em �revivals� que re�nem a turma da �poca.

O mundo musical portugu�s dos anos sessenta era um pequeno universo familiar em que se consumiam avidamente as novidades que surgiam do exterior - que passavam pelo pouco que a televis�o mostrava, pelo que transmitiam alguns programas radiof�nicos, como o �Em �rbita� e a �23� Hora�, e pelos discos que algu�m trazia de Londres ou Paris. A falta de informa��o e de sintonia com o estrangeiro era tal que Filipe Mendes, antigo guitarrista e vocalista dos Chinchilas, recorda ter, na primeira vez que tomou contacto com a m�sica de Jimi Hendrix, pensado estar ouvindo �um quinteto, com dois guitarristas e um vocalista�. Mesmo uma banda de estrondoso sucesso em todo o mundo, como o Cream de Eric Clapton, Jack Bruce e Ginger Baker, chegava apenas aos ouvidos �de uma elite, � qual tive a sorte de pertencer�, recorda.

Reflexos de uma revolu��o transformadora de h�bitos e costumes, em efervesc�ncia nas ruas de Paris e na Swinging London em sessenta e oito, ou no �Summer of Love� de S�o Francisco em 67, s� se viriam a generalizar em Portugal ap�s a Revolu��o de Abril - da� viver-se, "por imita��o", como recorda Carlos Mendes, vocalista e guitarrista dos Sheiks, "a euforia coletiva e a histeria que o aparecimento das bandas gerava, mas n�o no dia-a-dia, porque eram fen�menos que estavam relacionados com o momento do espect�culo, depois dele tudo decorria normalmente. Mas, por exemplo, no nosso caso, quando havia um evento, lembro-me das meninas e dos rapazes aos gritos. Era uma imita��o que, em termos de histeria, chegava a ser um pouco exagerada. Claro que visto do palco aquilo tinha a sua gra�a".

Rea��es semelhantes provocava Victor Gomes e os seus Gatos Negros que, vindo de Mo�ambique com o t�tulo de �Supremo Roqueiro�, levava ao del�rio as plateias lisboetas com os seus famosos saltos �� Tarzan� no palco. Movimentos deste tipo n�o faziam contudo, parte da norma, estando circunscritos, em rela��o aos Sheiks, � grande popularidade que atingiram nos anos que se mantiveram na ativa, ou a alguns eventos espor�dicos, como os tais concursos �y�-y�, onde, por algumas horas, o p�blico podia se imaginar em algum dos grandes festivais que come�aram a surgir nos Estados Unidos ou na Inglaterra.

A dificuldade em organizar verdadeiros eventos do g�nero ficou patente em 1969, quando, nos Salesianos, no Estoril, foi tentada a realiza��o de um festival [ver fotografias], onde marcariam presen�a em palco, para al�m de bandas rock como o Quarteto 1111, os Chinchilas, ou os Sindikato, de cuja forma��o fazia parte Jorge Palma, e nomes importantes da m�sica de interven��o, como Adriano Correia de Oliveira ou Zeca Afonso. Filipe Mendes recorda "um ambiente muito pesado, onde se pretendia apenas um festival com v�rias bandas e muita gente para assistir, mas ningu�m chegou a tocar porque apareceu a pol�cia de choque e come�ou a bater nas pessoas". Jos� Cid, um dos organizadores do espect�culo, considera que, apesar de tudo, houve um lado positivo, o fato de "ter passado em v�rios notici�rios internacionais", recordando que "uma das cenas mais impressionantes foi a pol�cia batendo num grupo de turistas japoneses. Quando os policiais come�aram a agredir os jovens, que estavam ali pac�ficamente, numa de m�sica, os japoneses puxaram das m�quinas fotogr�ficas e come�aram a tirar fotografias; assim que a pol�cia viu aquilo ... "m�quinas para c�!" Como n�o morreu ningu�m, foram umas mordidelas e tal, acabou por ser bom ter sido not�cia no estrangeiro".

A sobreviv�ncia das bandas era garantida pelas festas universit�rias e pelos bailes de formaturas em liceus, espa�o onde imperavam as "vers�es para parzinho dan�ar". Jos� Cid, um dos mentores do Quarteto 1111, n�o tem d�vidas quanto � impossibilidade de subsistir apenas pela cria��o pr�pria, "a �nica hip�tese era mesmo os concertos em universidades e em liceus, onde t�nhamos que cantar quase tudo em ingl�s, porque a maioria dos temas que t�nhamos n�o eram liberados (pela censura), e foi o que fizemos. Nunca tivemos carro, and�vamos sempre num cami�o, de um lado para o outro, todos juntos. Ali�s, o meu primeiro �rg�o, comprei-o quando fui para o Ex�rcito, em 1968, com o primeiro sal�rio de alferes".

Outro dos problemas para uma emancipa��o criativa prendia-se ao material que havia na �poca � disposi��o. Carlos Mendes, questiona-se at� "como era poss�vel conseguirmos tocar, quando os equipamentos eram t�o prim�rios...". Concordando, Filipe Mendes recorda os primeiros concertos em que participou, "com a guitarra e os outros instrumentos, em cima do palco, ligados a r�dios". As condi��es de grava��o n�o eram tamb�m as melhores, dado o pouco tempo dispon�vel � "ao vivo, todos juntos e no primeiro take", afirma o guitarrista dos Chinchilas -, e os gravadores com apenas dois canais � disposi��o, contraste chocante com a actualidade em que os 16, os 32 ou os 48 canais fazem parte do dia-a-dia de um est�dio normal.

Um dos melhores exemplos desta precariedade � a descri��o, contida na "Enciclop�dia da M�sica Ligeira Portuguesa", dada por Zeca do Rock, um dos primeiros m�sicos portugueses a gravar em disco o t�pico �yeah� do rock'n'roll, acerca do modo como se processou, em 1961, a grava��o de �Sans�o Foi Enganado�: "o est�dio era uma sala centen�ria na Costa do Castelo. Quando passava um carro ou um avi�o, tinha que se interromper a grava��o. O cantor e os m�sicos separados por um inofensivo biombo gravando tudo ao vivo. O est�dio e os m�sicos tinham sido contratados por duas horas apenas. Eu, que estava com amigdalite e com 39� de febre, vi o meu primeiro disco surgir de uma sess�o de duas horas, iniciada �s 10h num est�dio-mansarda".

Formar uma banda no Portugal daquele tempo era, mais que um meio de vida, "uma obsess�o, t�nhamos mesmo de faz�-lo, n�o havia outra hip�tese", recorda Jos� Cid, o que Filipe Mendes completa afirmando "n�o pensar, na �poca, em quaisquer objetivos, ensai�vamos todos os dias, durante horas, isto ao longo de v�rios anos; s� isso j� era genial".

Al�m destas dificuldades, havia outra que impedia o estabelecimento de uma carreira duradoura e sistem�tica - o pa�s estava envolvido com a Guerra Colonial, que levava os integrantes das bandas para o cumprimento de um servi�o militar que reduzia o tempo dispon�vel para dedica��o � m�sica. Os Beatnicks, banda de contornos psicod�licos formada em 1965 da qual faria parte, dez anos depois, Lena d'�gua, foram o melhor exemplo de como o servi�o militar era limitante. Assim, desde a funda��o do grupo at� ao 25 de Abril, a forma��o inicial sofre v�rias altera��es, gravando apenas um EP, �Christine Goes to Town�, em 1971, que os leva a apresentar-se em Vilar de Mouros e nos �Festivales Bahia�, em Vigo.

No ano seguinte, uma vez mais, a amea�a de chamada para a Guerra Colonial leva alguns membros a emigrar para a B�lgica, obrigando os Beatnicks a mais uma das muitas reformula��es ao longo da carreira. Filipe Mendes amplia o caso dos autores de �Christine Goes to Town� � globalidade das bandas da �poca: "penso que o Ex�rcito boicotou mesmo as id�ias e a continuidade dos grupos. Cheg�vamos aos vinte anos e �ramos chamados; depois passavam tr�s anos e j� muito tinha acontecido, uns casavam, outros escolhiam outras carreiras e de um modo geral o servi�o militar acabava com as bandas". Essa � tamb�m a explica��o de Jos� Cid para, o fato do Quarteto 1111 ter lan�ado um �lbum em 1971, apesar de planejado desde 1966: "quase todos os membros estavam na tropa, por isso, todo o tempo livre que t�nhamos era para gravar". Da� serem a maioria das edi��es dos grupos da altura singles ou EP's, aparecendo os �lbuns em n�mero muit�ssimo reduzido.

Tendo o regime pol�tico em que Portugal vivia influ�ncia direta, atrav�s da censura, e indireta, na pouca abertura ao exterior, no trabalho desenvolvido pelos m�sicos poder-se-ia pensar que a ascen��o de uma faceta �contestadora� seria consequ�ncia l�gica da arte em que se envolviam. Contudo, apenas o Quarteto 1111 afronta diretamente o regime, n�o se notando nas restantes bandas essa postura. Filipe Mendes lembra que "o simples fato de fazer rock, naquela �poca, era j� algo de muito rebelde. As letras eram um complemento e um disfarce, falavam de paz, amor, mostravam aquilo que ia na alma de cada um". Carlos Mendes segue a mesma linha de racioc�nio, afirmando n�o existir, por parte dos Sheiks, qualquer tipo de interven��o pol�tica, ressalvando, contudo ter a banda "uma irrever�ncia pr�pria, pelo simples fato de tocar rock, fosse ou n�o imita��o do que se passava l� fora".

Do contato com os cantores de oposi��o n�o resulta, ali�s, um envolvimento imediato com trabalho por eles desenvolvido, "lembro-me de num dos espect�culos que fizemos com o Zeca Afonso", recorda Carlos Mendes, "algu�m me dizer: �n�o deixes de ouvir um cara que vem a� cantar, que � genial�". Ouvi e a id�ia que tive � que era um homem que cantava bem e tocava mal guitarra. Sabia que existia m�sica de resist�ncia, mas o p�blico n�o ligava porque n�o havia um movimento, era algo como, "ok, isso � genial, mas eu quero isto", algo mais forte, uma bateria, as guitarras el�tricas... Acho que a import�ncia das coisas n�o se limita ao momento em que, por exemplo, o Zeca emitia aquela voz e claro que depois n�o demorei muito a reconhecer o brilhantismo do que ele fazia". Na opini�o do vocalista dos Sheiks, a sua banda funcionava "mais como chamariz para cativar o p�blico mais jovem, enquanto o o Zeca, o Adriano ou outros expunham o assunto e mandavam os seus recados".

Acima de tudo, os pioneiros do rock em Portugal sonhavam com o colorido da Inglaterra ou dos Estados Unidos que era transmitido em preto e branco pela m�dia local, tentando transport�-lo para o �cinzentismo� do pa�s em que viviam. Os Objectivo, projecto nascido das cinzas dos Ekos - autores, em 1965, de �Esquece�, vers�o de �Hold On� de PJ Proby e um dos sucessos desse ano - chegam a inverter essa mec�nica, acolhendo, em tempos diferentes, v�rios m�sicos brit�nicos na sua forma��o. De todos eles, s� Mike Seargent acaba por se estabelecer definitivamente, pois segundo M�rio Guia, baterista original e mais tarde empres�rio do grupo, "eles vinham para c�, mas depois chateavam-se porque viam que o meio musical em Portugal era quase inexistente e nem podiam viver da m�sica".

Fruto de tudo isto surge a tend�ncia para definir o rock em Portugal como algo nascido em pleno "boom" do in�cio dos anos 80 - Jos� Cid n�o tem d�vidas ao afirmar que at� essa altura "o rock portugu�s foi um fen�meno marginal" - passando por cima de uma hist�ria que j� contava � �poca quase vinte anos de exist�ncia. Filipe Mendes, em rela��o aos reflexos que reconhece na produ��o musical portuguesa dos anos 60, diz ser mais marcante "os sentimentos de cada um ao ver os espect�culos ao vivo, ao ouvir os discos", isto porque "n�o h� d�vida que a divulga��o era muito limitada e s� chegava a alguns, que tinham de absorver o que ouviam, espalhar a filosofia e aprender alguma coisa".

Carlos Mendes tamb�m aponta reflexos extra-musicais para a import�ncia desses tempos em que o rock come�ava, lentamente, a dar os primeiros passos: "soubemos, guiados umas vezes, outras por n�s pr�prios, outras ajudados, dar vida a esta coisa e penso que os jovens da nossa �poca aproveitaram muito a nossa presen�a para poderem gritar, exigir. Acabou-se com a ideia que tocar pelos bares era coisa de vagabundos, gente marginal. A esse n�vel contribu�mos para uma mudan�a profunda. Tiveram que nos ouvir, com as nossas irrever�ncias, com os cabelos compridos, com as cal�as apertadinhas e com as botas de salto alto".

Na verdade, se pode ser questionada a validade universal do que foi criado na �poca, - apesar de, pegando num texto de Ant�nio Pires, jornalista do BLITZ (NR � jornal de Portugal), ser "quase um milagre", dados os condicionamentos existentes, "que tenha havido, sequer, m�sica gravada em Portugal que tivesse alguma coisa a ver com o rock, o pop e por a� fora" -, n�o � poss�vel eliminar de um filme quem dele � parte integrante, mesmo se surgisse apenas nas apresenta��es. O que n�o � o caso.


Os primeiros passos do rock portugu�s
Di�rio de Not�cias, 10 de Maio de 2004

Mesmo sob o dom�nio da m�sica ligeira e do fado sobre os espa�os de edi��o e divulga��o radiof�nica, o Portugal de 60 n�o ficou alheio � entrada em cena de uma nova m�sica: o rock'n'roll. Apesar do �filtro� com que se acolhiam as novidades vindas de fora, os nomes maiores da cena brit�nica e americana conheceram edi��o em disco entre n�s. N�o foi preciso esperar muito para que a assimila��o destas pistas de agita��o e novidade se traduzisse no aparecimento de artistas e bandas locais, os primeiros dos quais a reflectir essencialmente processos de decalque sobre os originais importados.

Depois da alvorada com os Babies em finais de 50, floresceram, em in�cios e meados de 60, os concursos e matin�es ao som do novo y�-y�, revelando nomes como os de Daniel Bacelar, V�tor Gomes e seus Gatos Negros, os Conchas e, mais tarde, projectos com uma linha musical mais elaborada como o Conjunto Acad�mico Jo�o Paulo, os Ekos e os Sheiks, estes �ltimos os mais bem sucedidos da sua gera��o.

� com o final de 60, e a digest�o das revolu��es musicais da �poca, que chegam os primeiros projectos verdadeiramente marcantes do rock portugu�s. Entre 1969 e 70 estreiam-se em �lbum nomes como a Filarm�nica Fraude, Pop Five Music Incorporated e o Quarteto 1111. Estes �ltimos, que tinham conhecido j� o sucesso com A Lenda D'El Rei D. Sebasti�o, ousaram ser pol�ticos no seu �lbum de estreia, valendo-lhes o corte da censura em algumas faixas do disco. De in�cios de 70 data ainda a entrada em cena de nomes como os Objectivo, Petrus Castrus ou Smoog. Todavia, as regras da �poca tra�avam a estes nomes uma vida essencialmente marginal.


Os gajos tamb�m embarcaram no i� i� i�
Texto de Jos� Teles

Durante a ditadura Salazar, Portugal passou por um longo per�odo de isolamento, o pa�s tornou-se uma esp�cie de Alb�nia de direita. A censura exercia-se, como diriam os portugueses, de forma t�o bestial, que at� o juvenil rock dos anos 50 praticamente n�o teve suced�neo luso. Nos anos 60, com a eclos�o do fen�meno The Beatles, nada pode evitar que conjuntos de rock come�assem a surgir semi-clandestinos, nos gin�sios e liceus. A m�sica que faziam foi batizada de i� i� (por conta dos yeah yeah yeah dos Beatles).

O i� i� lusitano, ent�o obscuro at� mesmo em Portugal, passou a ser agora mais conhecido, com o lan�amento, pela Movieplay, do �lbum Biografia do Pop/Rock, a primeira compila��o do rock � portuguesa anos 60. No hist�rico CD duplo (que merecia uma edi��o brasileira), est�o os principais conjuntos que tiraram um pouco da naftalina da m�sica da terrinha, e abriram caminho para o competente rock portugu�s actual.

No entanto, obedecendo a l�gica extremamente cartesiana do pa�s, foram inclu�dos grupos dos anos 80, sem afinidades est�ticas com o pop sessentista. Mesmo fora do contexto, estas inclus�es inusitadas acabam sendo importantes, para que se conhe�a mais uma m�sica que, com exce��o de alguns fados de Am�lia Rodrigues, e a pieguice de Francisco Jos�, nos anos 60, nunca foi muito divulgada no Brasil.

Assim s�o v�lidas as faixas, como a vers�o tecno de Page One, do Pop Five Music Inc, que tem entre os m�sicos Paulo Godinho, irm�o de S�rgio Godinho, �dolo da MPP (M�sica Popular Portuguesa) ou Festa, com O Corpo Diplom�tico, grupo formado em 79, surgido de Os Fa�scas, e embri�o do Madredeus.

A excep��o ao bloqueio cultural salarista era a regi�o do Algarve, at� hoje o point de veraneio preferido dos ingleses (foi no Algarve, que Paul McCartney, por exemplo, escreveu a letra de Yesterday). Foi tamb�m l� que Jos� Lu�s, um dos integrantes do Ekos, recebeu um conselho de Cliff Richard, pioneiro do rock brit�nico: "Disse-nos para cantarmos em portugu�s, porque se quer�amos conquistar o mundo t�nhamos que agradar primeiro ao p�blico nacional". Na �poca, a maioria dos conjuntos lusos achavam que pop s� se podia cantar em ingl�s.

Garimpagem

"O disco � um meticuloso trabalho arqueol�gico, j� que muitos dos conjuntos n�o passaram do compacto de estr�ia, enquanto outros nunca tocaram fora dos gin�sios. As poucas emissoras de r�dio que fizeram programas com i� i� i� portugu�s n�o se importaram em preservar os tapes. Em alguns casos, � mais f�cil encontrar o acetato da grava��o original do que uma c�pia de certos discos.

Sans�o foi enganado, com Zeca do Rock, nome art�stico de Jos� das Dores, � tido como o primeiro i� i� i� portugu�s gravado. O �nico disco de Zeca do Rock, � considerado um dos mais raros vinis da m�sica portuguesa moderna. O curioso em alguns dos fonogramas � a semelhan�a da pegada da guitarra ritmo de alguns grupos, com a do i� i� I� brasileiro. Esquece (vers�o de Hold On, de P.J Proby) com o Ekos, n�o fosse o sotaque, poderia facilmente ser confundido com algum sucesso da Jovem Guarda.

No entanto, nem todos conjuntos seguiam o padr�o juvenil. Os Jets, por exemplo, em seu �nico EP de 67, t�m uma sonoridade que nada fica a dever ao rock psicad�lico que se fazia naquele ano na Inglaterra. Eles eram o mais bem aparelhado conjunto do rock portugu�s dos 60. Outro conjunto com uma concep��o musical modern�ssima, foi os Sheiks, o �nico de sua gera��o a conhecer um relativo sucesso na Fran�a e na pr�pria Inglaterra. Seu mais conhecido hit, Missin' You, foi bastante tocado no Brasil (o The Pop's gravou uma vers�o instrumental dele).

Se Zeca do Rock deu o pontap� inicial em est�dio, um dos mais antigos m�sicos pop luso � Pedro Os�rio, que vem dos anos 50, e est� na colet�nea com "Era um biquini pequenino �s bolas amarelas" (a mesma Biquini de Bolinhas Amarelinhas, cantada por S�rgio Murilo). L� como c�, a ingenuidade campeava. E tome baladinhas e roquinhos inofensivos. Daniel Bacelar e os Gentlemen, em "Olhando para o c�u", lembra no som e nas letras o Roberto Carlos da primeira fase, com um surf, que � a �nica faixa do album em que o i� i� aparece expl�cito no corinho.


Os dias da m�sica

Cr�dito: Os dias da m�sica

Hoje queria falar de um uma coisa que me faz sorrir sempre: ver algu�m de uma gera��o mais antiga que a da juventude, falar do alto do estatuto que a idade lhe concede, e afirmar que �dantes n�o era assim�, �que o respeito era outro�, e assim por diante, fazendo o discurso da �gera��o rasca�, com o qual nunca concordei.

Por vezes d� a impress�o que a juventude s� agora � indisciplinada, contestat�ria, por vezes at�, desrespeitosa. Ora tal n�o corresponde completamente � verdade, embora, � verdade, se tenham agora chegado a extremos que nunca n�s, na nossa pretensa irrrever�ncia, ousar�amos sequer sonhar. Porque hoje deixo-vos um exemplo do que se passava no tempo em que decorreu a minha �golden era� e que pode dar uma imagem de como algumas coisas funcionavam.

� verdade que, na altura, ainda n�o havia drogas, o que, se era muito positivo, � ao mesmo tempo um motivo menos para desculpar os disparates que se faziam. Mas vamos ao assunto.

Na altura, os role-models do jovem lisboeta eram os grupos musicais ingleses, e assim as modas por eles lan�adas, eram seguidas quase com um rigor religioso. Qualquer coisa parecida com o que se vendia em Carnaby Street ou em Portobello Road, tinha sucesso garantido. Foram as cal�as boca-de-sino, as camisas de colarinho alto de 2 bot�es, os pull-overs muito curtos, acima do umbigo. E ainda me lembro do esc�ndalo que fizeram as primeiras camisas floridas para homem, vendidas nos Porfirios.

Mas houve uma moda lan�ada, penso que pelos Beatles, de todo o grupo se vestir de igual. E essa foi uma onda que logo foi seguida pelos agrupamentos portugueses. Nessa altura, o Vasco Morgado, lembrou-se de promover concursos de grupos Y�-Y�. Assim mesmo, eram assim chamados, e n�o me perguntem porqu�, porque n�o sei, a n�o ser que fosse pela recorr�ncia da palavra yeah nas letras das can��es inglesas de ent�o. Pois �, muito antes do Rock-Rendez-Vous, houve os concursos do Monumental.

E ent�o era ver chegar de todo o Portugal, conjuntos de rapazes, na esmagadora maioria, cheios de boa vontade, mas com talento nulo para a m�sica, afim de enfrentarem a multid�o exigente que se sentava nas salas do cine-teatro. E digo-vos, era preciso muita coragem. A malta queria vers�es das can��es que ouvia tocadas pelos Beatles, Stones ou Searchers, e n�o admitia desafina��es ou fugas � melodia. E quando assim era, os apupos nem deixavam ouvir nada.

Mas isso come�ou a n�o chegar. Ent�o eles vinham todos t�o aprumadinhos, vestidinhos de igual e sa�am de l� na mesma, s� com os ouvidos cheios de insultos? N�, havia que ir mais longe.

E foi assim que numa tarde de s�bado (as eliminat�rias eram nos fins-de-semana), algu�m se lembrou de levar uns tomates bem maduros, que foram arremessados certeiramente ao primeiro grupo que prestou provas. E a partir desse dia, como a malta achou piada � iniciativa, j� ningu�m ia para os espect�culos sem as algibeiras cheias de tomates e ovos.

Digo-vos que cheguei a ter pena de alguns dos rapazes a sa�rem do palco, depois de meia d�zia de notas tocadas, chorosos e a olharem para os fatinhos feitos para a ocasi�o, e que s� voltariam a servir depois de duas ou tr�s limpezas. E l� se iam eles, feridos na alma e na dignidade. Compaix�o por parte do audit�rio? Nem sinal, asseguro eu. No fim, a alegria era grande, e o dinheiro gasto era dado por bem empregue, mesmo que n�o se tivesse ouvido m�sica nenhuma.

Uma nota para dizer, que os incidentes tomaram tal propor��o que a pol�cia chegou a ser chamada, mas pouco podia fazer, porque era dif�cil localizar quem atirava o que fosse e a solidariedade era grande. Bufos, n�o havia. Uma vez os pol�cias, j� exasperados por mais uma vez verem a miss�o gorada, mandaram levantar uma fila inteira: um dos �espectadores� tinha debaixo da respectiva cadeira um saco de viagem de razo�vel tamanho, ainda meio de tomates, ovos, e at� batatas.

Agora reparo, que talvez a nossa intransig�ncia, tivesse levado a que algum promissor m�sico a desistir, levado por aquelas reac��es diria que quase irracionais.

Contudo, no meio da agita��o ainda apareceram uns grupos razo�veis, mas esses j� tinham estatuto, eram lisboetas ou do Porto, e eram habituais nas festas dos liceus. E esses eram ouvidos com muito mais respeito. Lembro-me dos Chinchilas, dos Sheiks (estes com um estatuto j� demasiado elevado para irem aos concursos), do grupo do Eduardo Nascimento (que tinha um vozeir�o e cantava bem, desde que fosse em ingl�s) ou o Quinteto Acad�mico+2, que tinha uma vers�o do Judy in Disguise, do John Fred and his Playboy Band, que chegou a ser mais divulgada que a original.

E n�o havia ningu�m que n�o tocasse o Winchester Cathedral, dos New Vaudeville Band. Acho que durante dois anos foi das m�sicas mais tocadas em todas as boites, da Lareira ao Pote. Do Forte Velho a Louisiana


Leia tamb�m sobre o rock dos anos 60 e dos anos 70.

Discografia: Biografia do Pop Rock

Outras bandas


P�gina inicial
Hosted by www.Geocities.ws

1