O texto a seguir foi digitalizado do livro "Complexidade e Caos"
organizado por H. Moysés Nussenzveig, páginas 51 a 82
Rio de Janeiro: Editora UFRJ/COPEA, 1999

MÉTODOS DE GERAÇÃO DE FRACTAIS

Existem muitos métodos de geração de estruturas fractais através de modelos matemáticos simples. Vamos aqui dar destaque a dois deles, pela sua importância e caráter bastante genérico: a geração de fractais por agregação e o método IFS (Iterated Function System). Outro importante método de geração algorítmica de fractais provém dos autômatos celulares; não o consideraremos aqui, já que outro artigo deste livro é especialmente dedicado a eles.

Geração de fractais por agregação

Vários procedimentos, sugeridos pelos processos de agregação de materiais que são observados na natureza, têm sido imaginados dentro desta perspectiva de construção de fractais. Entre os processos naturais em que podem ocorrer fenômenos de agregação mencionam-se: a eletrodeposição, a junção de partículas de fumaça ou poeira, os aglomerados de galáxias e até a formação de colônias de bactérias. A idealização desses processos leva a modelos matemáticos simplificados, que são construídos computacionalmente, através de um algoritmo; apesar de sua simplicidade, eles podem conter elementos essenciais do processo natural que se pretende descrever e produzir estruturas bastante complexas. Vamos nos limitar a dois deles.

Modelo DLA (Diffusion-Limited Aggregation)

Neste modelo, introduzido por Witten e Sander em 1981[11], uma partícula, que dará início ao agregado, e é por isso chamada de semente, é colocada inicialmente no centro de uma rede (no computador, no centro da tela). A cada vez é introduzida na borda do domínio considerado (na borda da tela) uma nova partícula que se move em movimento aleatório. Quando a partícula encontra um sítio vizinho ocupado por outra partícula, fica grudada nele. Então, outra partícula é liberada nas bordas, numa posição inicial aleatória. Figuras complexas e similares a estruturas naturais provenientes de deposição de materiais, como a da Figura 29, emergem nesse processo.

FIGURA 29 - Figura construída pelo método DLA (Diffusion-Limited Aggregation)

Na sua forma básica, esse modelo leva à produção de estruturas fractais com dimensão 1,71 no plano e 2,5 no espaço, aproximadamente. Entre suas aplicações podemos citar: a eletrodeposição (formação de depósito no catodo pela passagem de corrente elétrica), que leva a uma dimensão fractal aproximada de 2,43; o problema da ruptura dos dielétricos, quando submetidos a diferenças grandes de potencial, cuja dimensão fractal característica fica em torno de 1,7. A agregação de colóides e o crescimento de cristais são outros domínios onde o modelo tem sido aplicado. Como todo modelo, este também apresenta limitações no seu domínio de aplicabilidade: em vários casos reais de formação de agregados, não existe a semente fixa e os agregados individuais também se movem simultaneamente. Um exemplo disso ocorre no caso da deposição de poeira, cuja dimensão fractal (espacial) fica em tomo de 1,7. Várias generalizações desse modelo são também possíveis; assim, pode-se, por exemplo, atribuir probabilidades diversas para a partícula grudar ou não em uma partícula vizinha.

Modelo de junção de agregados

Neste modelo, criado por P. Meakin, M. Kolb, R. Botet e R. Julien, em 1983[12], as partículas são inicialmente distribuídas ao acaso em uma rede de pontos e passam a se deslocar aleatoriamente sobre ela. Quando se encontram, elas se fundem formando agregados cada vez maiores (Figura 30). O processo termina quando se tem um único agregado final. A dimensão fractal das estruturas produzidas por esse processo é 1,45 (no plano) e 1,75 (no espaço).

FIGURA 30 - Figura construída pelo método de junção de agregados

A dimensão fractal dos agregados tem importância em muitos fenômenos físicos; por exemplo, nos fenômenos de absorção e dispersão da luz pelas partículas suspensas na atmosfera. Michael Berry, em 1989, calculou que a queda dessas partículas, quando dotadas de dimensões fractais não-inteiras, é mais lenta do que a queda de partículas sólidas[13]. Por exemplo, um agregado com mil grãozinhos esféricos, com dimensão fractal d = 1,8, cai dez vezes mais lentamente do que se eles estivessem compactados em uma esfera com d = 3. Isso pode levar a um inverno nuclear muito mais prolongado do que o estimado anteriormente, em situações em que ocorram lançamentos de grande número de partículas na atmosfera.

IFS (Iterated Function Systems)

Este é um procedimento de geração de estruturas fractais baseado em operações da geometria clássica: translação, rotação, contração, etc. Vamos iniciar com o exemplo de um joguinho simples e ilustrativo: comece escolhendo um triângulo eqüilátero em um plano. Marque os vértices A, B e C do triângulo e um ponto P qualquer no seu interior. Agora escolha aleatoriamente um dos vértices A, B ou C. Se o vértice B for o escolhido, mova o ponto P para o ponto médio entre sua posição inicial e o vértice B. Repita o processo, escolhendo aleatoriamente um novo vértice a cada vez. Uma seqüência de pontos, que pode ser facilmente calculada por um microcomputador e representada no monitor, será obtida por esse processo dinâmico. Quando esse joguinho é implementado, uma surpresa: a figura final que aparece (se desprezados alguns pontos iniciais da fase transiente do processo) é um fractal bem conhecido: o Triângulo de Sierpinsky (Figura 31). Esse fractal pode ser obtido também por vários outros processos e sua dimensão fractal, como você poderá verificar, vale dcap = log(3)/log(2).

Uma pergunta que se pode formular é: quais as operações matemáticas que estão subjacentes a esse jogo ou a procedimentos similares? O que se está fazendo é efetuar, em seqüência, um conjunto de transformações {Wi} no plano (transformações lineares e que preservam as linhas retas), com a forma:

(3)
onde a, b, c, d, e, f são números reais fixos.

A transformação será uma contração se a2 + c2 < 1, b2 + d2 < 1 e a2 + b2+ c2 + d2 < 1 + (ad - cb)2. Um conjunto Wl, W2, W3,... de transformações contrativas desse tipo constitui um sistema de funções iteradas (IFS). Atribui-­se a cada uma dessas transformações uma determinada probabilidade. Se o resultado médio final dessas operações for contrativo, a figura inicial tenderá para uma figura final, de área menor que a inicial, o atrator. As transformações {Wi} dão a geometria, e as probabilidades {Pi} fornecem a medida (distribuição dos pontos no atrator).

FIGURA 31 - Triângulo de Sierpinsky

Os modelos IFS têm produzido muitas modelagens interessantes de formas naturais: nuvens, plantas, paisagens, etc., dependendo da escolha das regras e das probabilidades associadas. Um exemplo é exibido na Figura 32, onde uma folha é construída no computador por esse processo. Esses modelos têm encontrado aplicações nas modelagens de objetos e de paisagens em computação gráfica, sendo utilizados em filmes, especialmente de ficção científica (um exemplo é o filme Star Wars). Outra aplicação interessante e útil ocorre no domínio da compressão de imagens, onde vários procedimentos daí decorrentes ajudam a compactar imagens com maior eficiência.

Resultados particularmente significativos sobre os IFS foram demonstrados por Barnsley e outros, em 1985[3]. Um dos teoremas afirma que cada IFS está associado com um único fractal. Outro, denominado teorema da colagem, permite que se analise o procedimento inverso de se construir uma imagem dada qualquer (que chamaremos de figura alvo) a partir de um processo de IFS. O teorema resulta no seguinte: ao se cobrir a figura alvo A, da melhor maneira possível, com cópias transformadas dela mesma, o atrator de um IFS que usa essas mesmas transformações será 'visualmente' próximo da figura-alvo A.

FIGURA 32 - Estrutura de uma folha gerada por um processo IFS

---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

FRACTAIS
O QUE SÃO FRACTAIS?
O QUE SÃO E COMO MEDIR AS DIMENSÕES FRACTAIS?
Um método de se medir a dimensão fractal de um conjunto: a contagem por caixa
Outras definições de dimensões fractais
MÉTODOS DE GERAÇÃO DE FRACTAIS
Geração de fractais por agregação
Modelo DLA (Diffusion-Limited Aggregation)
Modelo de junção de agregados
IFS (Iterated Function Systems)
APLICAÇÕES DOS FRACTAIS
LIGAÇÕES DOS FRACTAIS COM OS SISTEMAS CAÓTICOS E COMPLEXOS
Dimensão fractal de atratores
Bacias fractais
Conjuntos de Julia e de Mandelbrot
Outras questões significativas
APÊNDICE: ALGUNS PERSONAGENS E SUAS CONTRIBUIÇÕES PIONEIRAS NO ESTUDO DOS FRACTAIS
NOTAS BIBLIOGRÁFICAS

 

Instituto de Física da Universidade Federal de Goiás © Todos os direitos reservados
Contato

Página Inicial

 

1