Disputas pela posse da Ermida de S. Sebastião. 1805.
No início do século XIX a Câmara da Moita e o Prior da
Freguesia, Padre Custódio José de Andrade, desentendem-se sobre a
propriedade da ermida de S. Sebastião, pois ambos reivindicavam a sua
posse.
Em 6-7-1805, pretende a Câmara tomar posse da Ermida e
ordena ao seu Escrivão que vá a casa do dito Padre, pedir-lhe as chaves. O
Padre Custódio respondeu que não as dava, pois nada tinha com a Câmara.
Visto esta atitude, decidem os vereadores e procurador da Câmara arrombar
as portas da ermida e tomar a sua posse, cumprindo com todas as
solenidades de Direito, ou seja: abrindo e fechando portas que se achavam
fechadas, passando as mãos por paredes, sobrados, ornamentos e cálices;
entrando no quintal cortaram ramos às árvores; jogaram terra ao ar e
passaram as mãos pelo tanque e dez colmeias que aí havia.
Para evitar posteriores contendas a Câmara determina
que fosse intimado o padre Custódio ou qualquer outra sinistra
pessoa, que se pretendesse obter a ermida de forma violenta, seria
condenado na pena de 400 000 reis, que revertiam para as reparações da
própria ermida e para cativos, pagos na prisão, de onde não poderiam sair
sem a referida verba ser depositada nos cofres da Câmara, e sem
determinação de Sua Alteza Real. São também intimados os oficiais da
Câmara para não se comprometerem com as disposições das casas e
logradouros anexos à ermida, sem consentimento e aprovação da Câmara,
debaixo das mesmas coimas e penas.
Para tomar esta decisão a Câmara da Moita entendeu que
a ermida era sua propriedade. Justifica que as pertenças e administração
da ermida, fora nos tempos passados, direito da Câmara de Alhos Vedros, (o
que se demonstra desde as visitações de 1521 da Ordem de Santiago e nos
séculos seguintes em diversos autos de vereação), e que esta posse se
transferira para a Moita pela desanexação desta vila, acrescido pelo facto
de ser propriedade real, ou seja, sobre a qual a coroa tem direitos, pois
as regalias que pertencem às câmaras nunca acabam, e em toda a ocasião tem
lugar.
Todavia o padre Custódio não se intimou com a Câmara,
pois dirigiu-se à ermida, tirou as chaves ao guarda nomeado pela Câmara, e
pô-lo na rua, o escrivão registou que o guarda era um
homem preto.
Face a esta atitude do padre Custódio, o procurador do
concelho, António de Sousa Freire foi à Corte na cidade de Lisboa
informar-se junto do seu advogado e outros, sobre a legalidade do acto do
padre. As informações recolhidas eram de opinião que a Câmara tinha toda a
autoridade para citar o padre a responder pelo caso. Os vereadores e
procurador optaram por esta via, por maioria de votos, dando conta do
sucedido a Sua Alteza Real através da Mesa do Desembargo do Paço.
Dias depois a Câmara volta a ocupar a ermida com as
solenidades do costume e de direito, já atrás descritas, e determinam
elaborar o inventário dos bens e ornamentos pertencentes à ermida, que
eram os seguintes: 1 cálix de prata doirada com patena e colher doirada
dentro de uma saquinha; 1 missal; 1 par de galhetas de estanho com um
pratinho, 1 campainha, 2 alvas de pano de linho entre fino em bom uso
guarnecidas de renda; 3 amitos, 2 de renda e 1 liso; 1 cordão de linho; 2
toalhas de pano de linho; 4 toalhas de pano de altar, 1 sobrepeliz de pano
de rei; 3 balsas de corporais; 5 palas, 2 sanguinhas, 2 mantos tércios; 1
manto azul claro; 2 cazulas; 1 pano de púlpito; 2 sanefas; 4 cortinas, 1
frontal; 1 cobertura de altar; 1 frontal já velho; 14 castiçais de
estanho; 6 castiçais com uma cruz; 1 banqueta de pão doirado; 1 imagem de
Nª Sª dos Anjos com uma coroa de prata; 1 imagem de S. Amaro com
resplendor de prata; 1 imagem de S. Roque, 1 imagem de Nª Sª do Paraíso
com o Menino Jesus, 1 imagem de S. Luzia com seus olhos de prata na mão e
resplendor de prata; 1 imagem de S. António com o Menino e resplendor de
folha; 1 imagem do mártir S. Sebastião, padroeiro da ermida; 1 agnus
dei metido em uma redoma de pau doirado, 10 ramos de flores secas de
guarnecer o altar; 5 setas de prata; 1 lâmpada de latão amarelo lavrado; 1
escada de mão pintada; 1 estante do missal; 1 banca grande de pau de
pinho; 1 banquinho de pau, de caixa com gaveta; 1 cadeira de encosto de
pau de pinho pintada de verde; 1 imagem de Santo Cristo; 1 nicho com a
imagem de S. Sebastião de folha-de-flandres com que o ermitão fazia os
peditórios; 1 imagem de S. Pedro de Alcântara; 10 colmeias de abelhas no
quintal; 1 alcatifa já velha; 6 bancos de pau.
No final desse mês os rendeiros e foreiros da ermida
são avisados pelo porteiro, para comparecer na Câmara para prestar
reconhecimento e mostrarem se são ou não devedores dos seus foros.
No ano seguinte os novos vereadores repetiram a tomada
de posse e elegeram Domingos José Mendes como novo depositário dos bens da
ermida sob compromisso de os entregar sempre que lhe fossem pedidos.
Notícias da Moita. 15 /4 /1996.