A Iluminação pública na Moita
A instalação de dois candeeiros junto ao cais, no ano
de 1812, foi a primeira iluminação pública no Concelho da Moita.
Desde o final do século XVIII que a Câmara tinha tomado
medidas no sentido de controlar os passageiros que viajavam para Lisboa,
para evitar que a capital fosse contagiada pela peste que afectava algumas
localidades do país. Entre as várias disposições nesse sentido, havia a
Câmara ordenado a instalação de barracas e guarnições, onde constantemente
uma patrulha de soldados fazia o controle dos passageiros, durante a noite
esse controlo tornava-se difícil de realizar, mesmo à luz de lamparinas de
azeite, também pago pela Câmara.
Por isso em Outubro de 1804 o oficial do destacamento
militar na vila, comunicou ao presidente da câmara que era necessário
instalar um candeeiro na ponta do cais, que estivesse aceso nas noites
escuras, para se examinarem os passaportes dos passageiros, e os inúmeros
passageiros. Levando o presidente esta proposta `a reunião de câmara, os
vereadores e o procurador "assentaram, que o concelho de sorte alguma tem
forças para semelhantes despesas", pois já custava a suprir a despesa
diária do azeite que os soldados gastam.
Apenas oito anos depois se reúnam condições, para
construir, não um, mas dois candeeiros. O auto de vereação de 7/1/1812,
esclarece que o Juiz de fora Presidente da Câmara da Moita, se dirigiu ao
intendente geral da polícia da corte e reino, explicando-lhe a necessidade
de estabelecer candeeiros no cais, semelhantes aos de Lisboa. Este acedeu
ao pedido, mas só daria autorização depois da Câmara estabelecer os meios
com que sustente a dita iluminação.
Nesse sentido a Câmara resolveu o assunto pela forma
mais fácil, ou seja, impondo aumentos sobre as actividades ligadas à
carreira dos barcos, que desde a sua origem é habitual pagadora das
dificuldades do concelho. Neste caso a penalização recai sobre "os homens
de ganhar", da companhia do cais, (em última análise sobre os passageiros)
pelo que foram chamados à Câmara os ditos homens, a saber: António Simões,
José Cordeiro, José Pedro, Francisco de Almeida, Bento Galego, António
Fernandes e António Luís de Sousa, e lhes foi comunicado que "eles de sua
livre vontade se comprometiam à iluminação dos dois candeeiros", contando
que a Câmara lhes permitia levar mais trinta reis de cada "costal" que
carregassem ou descarregassem dos barcos para o cais, ou deste para a
estalagem, ou inversamente, da estalagem para o cais e deste para o barco.
Em 1828 os pescadores pediam para ficar isentos deste tributo, no peixe
que embarcassem para Lisboa, em virtude de antigos privilégios, mas não
foram atendidos. A câmara aceita as condições, (que tinha imposto),
ficando a companhia do cais a tomar os candeeiros depois de estabelecidos
e consertá-los à sua custa sempre que se deteriorassem ou partissem e a
mantê-los sempre limpos, e asseados; ficava ainda obrigada a conservá-los
acessos nas noites de escuro de todo o ano desde o princípio da noite até
ao amanhecer, também à sua custa. Estas obrigações passavam aos sucessores
ou aos que viessem a fazer parte da companhia, recebendo para isso trinta
reis em cada frete. Não cumprindo o acordo ficavam os "homens de ganhar"
sujeitos a prisão.
Pe4rcebe-se pelo documento que a ideia de colocar
candeeiros no cais é do juiz de fora, e a aceitação por parte da companhia
do cais em suportar as despesas de iluminação é forçada, além de que eram
alheios e ignoravam as vantagens da iluminação e de nada lucravam com ela.
Futuramente em todas as petições que fazem à câmara vão sistematicamente
queixar-se deste encargo, referindo sempre que são despesas difíceis de
suportar. Todavia na aplicação das obrigações contratuais a companhia não
seria muito zelosa no cumprimento dos seus compromissos, pois em Janeiro
de 1816 a câmara avisa os almutacés para fazer cumprir as "observâncias"
assinadas pela companhia do cais, sob pena de 6 000 reis de multa.
A verba proveniente deste aumento é incluída nos
rendimentos da companhia do cais, entrando nas receitas da câmara sob a
rubrica de renda do cais e da iluminação, e era dessa verba que depois
eram retiradas as quantias necessárias para a manutenção dos candeeiros,
como em 1836, em que a câmara manda pagar ao vereador fiscal, Joaquim
Timóteo Afonso, 5 200 reis que foi o custo do conserto dos candeeiros da
vila, ou em 1838 quando se constatou a necessidade de vidros e o conserto
das "pombas" dos mesmos.
Nesta época a câmara nomeava indivíduos para receber as
rendas e como depositários ou tesoureiros, sendo ambos obrigados ao seu
cumprimento sob severas penas, como foi o caso de Félix António Soeiro,
preso oito dias, por não comparecer para fazer contas no dia para que
tinha sido notificado e em 1836 em que viu os seus bens serem
sequestrados, porque sendo chamado para liquidar os montantes recebidos
disse, "que não entrega o que devia por não o ter, e o ter gasto".
Não é possível saber com rigor a forma como a
iluminação se foi generalizando, por lacunas na documentação, mas foi
decerto morosa, pois só em 1840 foram instalados alguns candeeiros em
frente da praia e só em 1864 é referida a compra de mais dois para serem
instalados "nos locais mais necessários".
Inicialmente é contratado um funcionário para garantir
o funcionamento da iluminação, sendo em 1864 António Simões, que pede um
aumento de ordenado em virtude de servir à muitos anos, e a quem a câmara
comprou umas escadas para exercer o seu trabalho, que era manter os
candeeiros diariamente limpos e acesos. Todavia em 1870 a câmara resolve
garantir a iluminação por arrematação pública, medida que visava torná-la
menos onerosa e também assegurá-la, pois a principal dificuldade era
manter os candeeiros acesos.
Pelo auto de vereação de 10/8/1870, o arrematante
ficava obrigado a fornecer o petróleo à sua custa, devendo ser de primeira
qualidade, bem como todos os tubos e vidros que se partissem; a conservar
bem limpos todos os candelabros; a fazer diariamente a iluminação do farol
do cais de forma que ficasse acesso desde as Ave Marias até de madrugada;
os outros candelabros seriam acesos todas as noites escuras das Ave Marias
às duas horas da manhã, no Verão, e até às cinco horas desde o último de
Outubro ao fim de Fevereiro, até Junho seria alterado conforme as
circunstâncias, nas noites de luar deveriam ficar acesos apenas uma hora
depois das Ave Marias, podendo depois apagá-los; era ainda obrigado a
fornecer à sua custa todos os utensílios necessários à limpeza. Faltando a
estas condições seria multado em 6 000 reis, descontados no vencimento do
mês respectivo.
A medida não foi suficiente nem resolveu a dificuldade
de garantir os candeeiros acesos, pois a câmara constata ainda nesse ano,
que devido ao pouco zelo do arrematante, ao mau estado dos aparelhos
iluminatórios e outras razões, que não especifica, os candeeiros apagam-se
pouco depois de acesos.
Em gravuras de princípio desse século são visíveis
alguns destes candeeiros.
Notícias da Moita. 15 de Julho de 1996.