Gostaram
do pequeno retrospecto histórico
da matéria anterior? Foram
apenas algumas pinceladas de um
assunto quase inesgotável. Pois
dessa vez, teremos o resumo da
biografia de alguns daqueles
grandes cantores citados
anteriormente. O que realmente é
lastimável é não podermos
ouvir a maioria deles, uma vez em
que o gramofone só foi criado no
início do séc. XX; um fato
gerador de grande controvérsia
para os historiadores da música,
afinal, não há como se ter
certeza de como eram executadas e
interpretadas certas
composições da antigüidade.
Mas, enfim, vamos descobrir mais
a respeito desses ilustres
personagens da cena lírica do
passado.
Os Grandes
Cantores
parte II
"Alfarrábios biográficos"
Os castrati:
A ópera italiana à maneira de
Alessandro Scarlatti foi o principal
gênero musical do século XVIII e seus
cantores foram, na época,
entusiasticamente exaltados. Mas quando
esse gênero caiu, depois da reforma de
Gluck, em descrédito, aqueles mesmos
cantores, e sobretudo as cantoras, foram
denunciados como responsáveis pela
degeneração da arte: os compositores
teriam sacrificado tudo ao brilho das
vozes e à vaidade dos virtuoses da voz.
Não é possível, hoje, nem concordar
nem discordar, pois da arte daqueles
cantores não ficou sequer uma
reminiscência verbal. Só sabemos, com
certeza, que foram injustiçados os
"castrados": pois justamente
entre eles houve homens de requintada
cultura musical e alto nível artístico
como os que veremos agora.
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- Farinelli -
pseudômino de Carlo
Broschi, cantor de ópera
italiano. O mais célebre
dos castrati,
nasceu em Andria a 24 de
janeiro (ou junho) de
1705 e morreu em Bolonha
a 15 de julho de 1782.
Recebeu de seu pai as
primeiras lições de
canto. Em 1725
protagonizava em Veneza a
ópera "Didone
abandonada" (Dido
abandonada, de Albinoni).
Triunfando depois em
todos os palcos
italianos, em Viena,
Londres e Paris, passou a
ser aclamado como o maior
soprano de todos os
tempos (sim, eram
'sopranos' mesmo). Indo
para a Espanha (1737),
exerceu no país uma
verdadeira ditadura
musical de 25 anos, sob a
proteção de Filipe V,
que viveu toda essa
época sob o fascínio de
sua voz. Homem de ampla
cultura musical,
Farinelli foi o maior
cantor de ópera do séc.
XVIII.
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Girolamo
Crescentini -
professor de canto e cantor
italiano. Nasceu em Urbania a 2
de fevereiro de 1762 e morreu em
Nápoles a 24 de abril de 1846.
Destacou-se entre os castrati, em
várias óperas do séc. XVIII.
Admirado por Napoleão, cantou na
cerimônia de sua coroação como
imperador.
O bel
canto romântico:
Por volta de 1800 ou 1810, a época do
bel canto parecia definitivamente
terminada: em Veneza e em Paris
lamentava-se o desaparecimento total das
'belas vozes' . Mas com a ópera
romântica de Rossini, Bellini e
Donizetti surgiu uma nova geração de
grandes intérpretes operísticos. A
Europa inteira aplaudiu freneticamente
cantoras como Catalani, Pasta, Malibran,
e Grisi, e cantores como Lablache,
Rubini, Tamburini e Nourrit. Brilharam
internacionalmente, também, nas salas de
concerto, a alemã Henriette Sontag e a
sueca Jenny Lind.
Giuditta
Negri Pasta -cantora
italiana, nasceu em Saronno a 28
de outubro de 1797 e morreu em
Como a 1º de abril de 1865.
Apresentou-se com sucesso em
cidades italianas, Londres,
Paris, São Petersburgo,
alcançando consagração em
Milão (1831), quando Bellini lhe
dedicou "La Sonnanbula"
e "Norma".
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Luigi
Lablache -
cantor italiano. Nasceu
em Nápoles a 16 de
dezembro de 1794 e morreu
na mesma cidade a 23 de
janeiro de 1858.
Considerado um dos
maiores baixos de sua
época, salientou-se nas
grandes capitais
européias como
intérprete de Rossini,
Donizetti e no papel de
Leporello, do "Don
Giovanni" de Mozart,
que causou forte
impressão a Wagner em
Paris (1839). Escreveu um
método de canto e uma
série de exercícios
para a voz de baixo.
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Maria de
la Felicidad Garcia Malibran - cantora
francesa de origem espanhola.
Nasceu em Paris a 24 de março de
1808 e morreu em Manchester a 23
de setembro de 1836. Dotada de
uma voz de amplo registro, que ia
de soprano a contralto, obteve
grande sucesso na Europa e nos
EUA (New York), consagrando-se
como intérpretes em óperas de
Rossini e de Mozart. Sua morte
prematura inspirou a Musset as
"Stances à Malibran"
(Estâncias à Malibran).
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- Henriette
Sontag -
internacionalizou-se como
Sontag. Cantora alemã,
nasceu em Koblenz a 13 de
maio de 1805 e morreu na
Cidade do México a 9 de
julho de 1854.
Destacou-se tanto na
Europa como na América,
interpretando Rossini,
Mozart, Bethoven, em
árias de coloratura e
'Lieder'. Foi rival da
Malibran e por volta de
1826 inspirou um poema a
Goethe.
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Jenny Lind - cantora
sueca. Nasceu em Estocolmo a 6 de
outubro de 1820 e morreu em
Malvern a 2 de novembro de 1887.
Salientou-se em óperas de
Bellini (Norma, Sonnanbula) e
Meyerbeer, deixando o palco
(1849) para só se apresentar em
salas de concerto, onde além de
árias operísticas, interpretou
com sucesso canções e baladas
populares.
A época
de Verdi e Wagner:
Ainda em vida dos artistas mencionados,
surgiu uma nova geração de
intérpretes, capazes de corresponder às
exigências de Verdi: nomes como Pauline
Viardot, Pauline Lucca, Adelina Patti e o
cantor Tamberlik. Foi mais difícil
encontrar cantores competentes para o
drama musical de Wagner: os melhores
cantores alemães da época foram Albert
Niemann e Lili Lehmann, ao mesmo tempo em
que Julius Stockhausen cultivava o canto
camerístico, a arte do 'Lied' de
Schubert, Schumann e Brahms.
Pauline
Lucca - cantora
austríaca, nasceu em Viena a 25
de abril de 1841, morrendo nessa
mesma cidade a 28 de fevereiro de
1908. Em 1860 teve enorme sucesso
em Praga, na Norma
de Bellini. destacou-se depois
como intérprete de Africana,
Mefistofole
(1882) e Gioconda
(1885), impressionando
principalmente pela delicadeza e
intimidade de sua voz.
Eurico
Tamberlik - cantor
italiano. Nasceu em Roma a 16 de
março de 1820 e morreu em Paris
a 13 de março de 1889.
Considerado modelo como voz de
tenor, dedicando-se
principalmente a Rossini e Verdi,
foi o primeiro a sustentar o dó
sustenido "de peito"
(no Otello,
de Rossini). De idéias liberais,
em Madri (1868), por ocasião da
revolta contra Isabel II, guiou
seus espectadores pelas ruas,
cantando a
"Marseillaise" (hino
francês).
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- Lili
Lehmann -
cantora alemã. Nasceu em
Würzburg
a 24 de novembro de 1848
e morreu em Berlim a 17
de maio de 1929. Soprano,
estreou em 1865, cantando
Mozart, em Die
Zauberflöte (A
Flauta Mágica). A
convite do próprio
Wagner participou da
primeira encenação de
sua tetralogia em
Bayrieuth (1876). Seus
maiores sucessos, nas
capitais européias e em
New York, estiveram
ligados a suas
interpretações de Tristan
und Isolde e Tannhäuser,
ainda que também
triunfasse em óperas de
Bellini, Verdi e outros
compositores.
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Albert
Niemann - cantor
alemão. Nasceu em Erzleben a 15
de janeiro de 1831 e morreu em
Berlim a 13 de janeiro de 1917.
Tenor eminentemente wagneriano,
teve seu nome, em 1854, ligado à
interpretação de Tannhäuser
(As casas
do bosque). O grande sucesso
confirmou-se em Die
Meistersinger von Nürberg (Os
Mestres Cantores de Nuremberg), Tristan
und Isolde, Die Walküre (As
Valquírias), embora também se
apresentasse em óperas
italianas. Consagrou-se, em sua
época, como um dos cantores de
mais notável talento dramático.
Crepúsculo
da Ópera:
com o desaparecimento de Bizet, Verdi e
Puccini, termina a época da ópera
italiana (e da franco-italiana), que só
sobrevive como arte musical para um
público mundano (?). Milão, Paris e
depois New York são, no séc. XX, os
centros desse virtuosismo crepuscular,
que encontrou pela última vez vozes do
maior encanto e brilho: Marcela Sembrich,
Nellie Melba, Louise Homer, Luiza
Tetrazzini, Lucrezia Bori, Maria Callas;
Battistini, o famosíssimo Caruso, Ruffo,
o norte-americano John MacCormack,
Schipa, e Gigli.
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- Enrico
Caruso -
cantor italiano. Nasceu
em Nápoles a 27 de
fevereiro de 1873 e
morreu na mesma cidade a
2 de agosto de 1921. De
origem humilde, foi
lançado por um
empresário (1894) no
Teatro Nuovo de sua
cidade natal, tornando-se
em pouco tempo o mais
célebre cantor
operístico da história
da música. Consagrado
como o maior tenor do
início do séc. XX,
Caruso arrebatou
auditórios do mundo
inteiro pela riqueza de
timbre e vigor vocálico,
que atingia as
colorações de barítono
nas notas graves. Muitos
atribuem o sucesso de
Caruso às gravações
que ele fez. Caruso foi o
primeiro tenor a gravar
comercialmente em grande
quantidade. Por outro
ponto de vista, muitos
atribuem o sucesso do
gramofone ao fato de
Caruso ter gravado sua
voz e oferecê-la ao
público. Dotado
de extraordinário poder
de respiração, que lhe
permitia tenutas
de duração quase
inacreditável, chegou a
ter um repertório de
aproximadamente
cinqüenta óperas,
ressaltando-se entre seus
desempenhos principais La
Bohéme, Aida, Madame
Butterfly
(de que fez a estréia
mundial, em 1904).
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Tito
Schipa - cantor
italiano. Nasceu em Lecce a 2 de
janeiro de 1888 e morreu em New
York em 1965. Depois de se
apresentar em várias óperas de
Verdi e Bellini, alcançou grande
sucesso como intérprete em Tosca
(Milão, 1912-1913). Abarcando
desde então grande repertório
da ópera franco-italiana, em
1932 passou a integrar o elenco
do Metropolitan Opera House of
New York. Voltando à Europa
várias vezes, e visitando a URSS
em 1957, consagrando-se como
tenor em cuja voz se admiraram a
leveza e flexibilidade de
recursos. Foi considerado o
'príncipe dos tenores'.
|
- Beniamino
Gigli -
cantor italiano. Nasceu
em Recanati a 20 de
março de 1890 e morreu
em Roma a 30 de novembro
de 1957. De origem
humilde, cantando desde
criança, só em 1918, ao
interpretar Mefistofele
no Scala de Milão,
passou a ser reconhecido,
particularmente pelo
regente Toscanini. Dentro
de pouco tempo, se
apossava do melhor
repertório da ópera
italiana do séc.XIX,
apresentando-se como o
mais provável sucessor
de Caruso. Consagrou-se
como um dos maiores
tenores do século no
Metropolitan Opera House
of New York e nos
melhores teatros do
mundo. Tenor de extrema
homogeneidade e limpidez,
com um registro ao mesmo
tempo delicado e intenso,
mereceu, ainda, por suas
maneiras simples e
cordiais, o apelido de
"o cantor do
povo". Morreu
retirado num convento.
|
- Feodor
Chaliapin - cantor
russo. Nasceu em Ometov, perto de
Kazan, a 14 de fevereiro de 1873
e morreu em Paris a 12 de abril
de 1938. De família muito pobre,
encontrou grandes dificuldades
para firmar-se como artista. Seus
primeiros sucessos foram
conquistados em 1896 e 1899, em
óperas de Mussorgski. No teatro
Mariinskij de Moscou, ganhou fama
(1904) em Boris
Godunov.
Três anos depois, arrebentava no
Metropolitan Opera House of New
York em Mefistofele,
Barbieri di Siviglia e
Don Giovanni.
Em 1908 recebeu consagração
solene em Paris, apresentando-se
no Boris
Godunov e
outras óperas russas. A
celebridade desde então o
acompanhou pelo o mundo inteiro.
Extraordinária voz de
baixo-barítono, com uma incomum
riqueza de extensão e
sonoridade, acrescentava ainda,
como ator, grande talento
dramático, dos maiores já
encontrados no canto operístico.
|
- Maria
Callas -
nome artístico de Maria
Kalas Meneghini, cantora
norte-americana de origem
grega. Nasceu em New York
em 1923 e morreu em Paris
a 16 de setembro de 1977,
sua morte permanece sem
esclarecimento. É uma
das mais famosas
intérpretes modernas da
ópera franco-italiana do
séc. XIX. Entre seus
papéis de maior destaque
sobressai o de Norma,
na ópera homônima de
Bellini, mas pode-se
citar também o de Lucia,
na Lucia
de Lammermoor,
de Donizetti.
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Referências:
- Barbier, P. -
"História dos
castratti" - Editora
Nova Fronteira S.A. 1989. São
Paulo, SP.
- Enciclopédia
Mirador Internacional - Vol
5. - Ed. Encyclopaedia Britannica
do Brasil Publicações Ltda.
São Paulo, SP.
- Galway, J.
- "A Música no Tempo"
- Livraria Martins Fontes Editora
Ltda. 1987. São Paulo, SP.
- - Assisti o filme
"Farinelli,
il castrato" (indicado
Oscar/96). É excelente por
apresentar a época e o drama
desses personagens, tendo como
tema a vida de Farinelli. Usaram
a mixagem das vozes de um contra-tenor e
uma soprano
na tentativa de ilustrar como
seria a voz desse cantor mítico.
As músicas foram escolhidas a
dedo e o resultado de edição
são interpretações de se tirar
o fôlego.-
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