TEREZA
BICUDA ( História
contada por Florípia Lopes Gonçalves )
Tereza
Bicuda morava aqui, no Larguinho Santana, com a mãe.
Tereza tinha lábios grossos, aquele tipo assim bem
grosseiro, e por isso era chamada de Tereza Bicuda.
Ela era assim uma moça muito rebelde, moça sem
instrução também. E de vez em quando,
ela batia na mãe.E punha a mãe pra pedir as
coisas na rua e queria do bom e do melhor.
Um certo dia, ela deu demais na mãe. Andou a Rua das
Flores todinha montada na mãe. Pôs freio de cavalo,
bateu com o pé na mãe e andou montada nela.Nesse
dia, a mãe de Tereza excomungou ela e morreu justamente
por causa das pancadas que Tereza lhe deu.
Passado muito tempo, Tereza Bicuda ficou louca. Andava gritando
pela rua e bebia demais. Havia enlouquecido. Quando ela morreu,
enterraram ela lá no cemitério.Ela continuou
gritando, passando nas ruas de noite e gritando do mesmo jeito.Isso
aconteceu há muitos anos...
Eles desenterraram a Tereza e enterraram novamente atrás
da Igreja do Rosário. Ela continuou do mesmo jeitinho...
gritando na Rua das Flores. Quando chegava aquela hora em
que ela passou na Rua das Flores montada na mãe, todo
mundo ouvia os gritos e os lamentos da mãe. Depois
eles desenterraram ela da Igreja do Rosário e enterraram
lá na cabeceira desse córrego...que é
o Córrego Tereza Bicuda. É por isso que o Córrego
Tereza Bicuda tem esse nome. E lá tem caixa de marimbondo,
mora marimbondo lá...
Tereza Bicuda ficou amaldiçoada mesmo.
Quando demorava chover, a gente ia fazer penitência...
Eles fizeram uma cruz de cedro e puseram lá. Mas ninguém
chega perto da cruz, ninguém. Tem casa de marimbondo
lá no pé da cruz. Uma distância longe
que a gente fica, os marimbondos vêm...
Depois que levaram ela lá pra cabeceira do Córrego
Tereza Bicuda, nunca mais ela apareceu gritando na Rua das
Flores.
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O CAVALEIRO DA RUA DAS FLORES
(
História contada por Cecília Pereira de Souza.
)
Meu padrinho, de nome João, morava com minha avó,
aqui na Rua das Flores. Foi ela quem criou ele. Quando ele
ficou rapaz, quis se mudar da casa de minha avó, porque
queria ter liberdade. Os velhos eram muito enérgicos.
Não gostavam que ele ficasse até tarde na rua.
Em frente da casa de minha avó, tinha uma casa que
era assombrada.Era de um pessoal que morava na roça.
Então, ele resolveu alugar um cômodo, um quarto
dessa casa e ficou dormindo lá. O povo vivia falando
pra ele assim:
-Você vai ver... Você ainda vai ver assombração
nessa casa.
Ele falava:
-Não tem nada. Eu não acredito nessas coisas.
Respondiam:
-Tem um cavaleiro que vem e desce aí na porta. O cavalo
vem ferrado e tudo. Você ainda vai ficar assombrado.
-Não acredito nisso não. Não tem essa
bobagem não.
E continuou lá nessa casa.
Quando foi um dia, era na quaresma e ele conta que chegou
da rua, abriu a sala e entrou no seu quarto. Naquele tempo,
não tinha luz aqui. Ele acendeu uma vela e pôs
assim numa cadeira, na cabeceira da cama. Ele estava sem sono
e pegou um livro pra ler. Ele era muito ativo, muito ladino.
Era professor aqui em Jaraguá. Então ele pegou
um romance e foi ler. Ele estava distraído com a leitura,
nem tava lembrando de assombração...Nesse meio
tempo, ele viu...O cavalo veio... pá...pá...pá...
de ferradura. Entrou na calçada... Na porta da casa
tinha uma pedrona grande assim... O cavalo veio, com aquele
barulhão, bateu na calçada, fez "plá"
na calçada. Nisso, ele escutou o cavaleiro descer,
arrastando a espora. Ele tinha certeza que a porta estava
trancada. Ele tinha acabado de fechá-la. E o cavaleiro
continuava a arrastar a espora entrando pela casa adentro.
Ele pensou: 'Ele vem aqui no meu quarto". Então
ele abriu a janela e correu. Correu pra casa do meu pai que
ficava perto da casa do meu avô. Tudo na Rua das Flores.
Chegou lá só de cueca,chamando minha mãe
e meu pai.
Minha mãe acordou meu pai. Ele sabia que João
dormia sozinho lá nessa casa. Aí meu pai levantou
na carreira, abriu a porta. João tava assim com os
olhos arregalados, com medo. Entrou e disse pra minha mãe:
-O cavaleiro tá lá, tia. Entrou lá. Entrou
lá dentro da casa. Não chegou a entrar no meu
quarto, mas eu ouvi o arrastar de espora dele. Ouvi o barulho
tudo, o cavalo até soprando na porta! Ouvi o barulho
da ferradura batendo na pedra!
Contou ainda o que pensou na hora:
- Eu vou é sair daqui, porque se eu ficar ele vem cá
no meu quarto.
A casa de mamãe era pequena. Não tinha lugar
pra pôr ele, não tinha mais uma cama pra dar
a ele. Nem uma rede não tinha. Aí meu pai disse
assim:
-Vamos lá, João.
Meu pai e ele saíram, foram lá pegar o colchão
dele.Chegaram lá, a porta tava trancada e a janela
aberta. Abriram a porta, pegaram o colchão, fecharam
a janela e a porta e vieram embora. Nesse dia, ele dormiu
lá na casa do meu pai. Desse dia em diante, ele não
quis pousar lá nessa casa mais não. Voltou pra
casa do meu avô e largou de muita farra que ele fazia.
Muita gente andou vendo esse cavaleiro descendo lá
nessa casa. Dizem que era o marido da mulher que morava lá.
Falam que esta mulher não era assim muito séria.
O marido dela morava na fazenda e vinha à noite pra
ver se ela tava andando direito. Então, quando ele
morreu, ficou fazendo essa arte aí, fazendo assombração.
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A PROCISSÃO DOS MORTOS (
História contada por Cecília Pereira de Souza
)
Aqui em Jaraguá, no Largo do Rosário, morava
uma mulher. Ela ficava sempre na janela pra explorar a vida
dos outros, pra falar da vida alheia. Essa mulher só
vivia falando, olhando, murmurando. Falava de um, de outro,
de moça, de tudo. Entardecia e ela continuava na janela.
Chegava a noite, todo mundo ia dormir, ela continuava lá,
até a meia-noite explorando o tempo.
Um dia, dizem que quando ela estava na janela, passou bem
em frente uma procissão. Era uma procissão muito
grande. Ela ficou olhando um, olhando outro, mas não
reconheceu ninguém. Quando então, saiu dessa
procissão uma moça, chegou perto da janela e
disse:
- Olha, dona, a senhora toma essas velas aqui. Eu quero que
a senhora guarde elas pra mim até amanhã. Eu
quero que a senhora me entregue elas amanhã, nessa
mesma hora.
Aí ela recebeu as velas, mas ficou receosa, porque
não estava reconhecendo ninguém daquela procissão.
Depois que a procissão acabou, ela foi olhar as velas
e viu que aquilo era canela de defunto. Era osso da canela
de defunto. Ela ficou muito nervosa, por isso não conseguiu
dormir a noite inteira, pensando naquilo, imaginando que tinha
de devolver aqueles ossos.
Na noite seguinte, ficou lá na janela com as velas
na mão. Quando veio a procissão, a moça
que tinha entregado as velas aproximou-se dela e falou assim:
- Olha, escuta aqui. Isso aqui é uma procissão
dos mortos. Essas velas são ossos de quem já
morreu. Você não fique na janela mais, explorando
a vida dos outros não, porque isso é muito feio,
é muito ruim, é até pecado.
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