No ano de 1516, D. Jorge, Mestre da
ordem Militar de Santiago, deu de sesmaria a Pêro Botelho uma entrada de
água salgada nas Roseiras para aí construir um moinho.
Trata-se pois do conhecido moinho da
Enxarroqueira.
A referida entrada de água salgada
confrontava por todos os lados com marinhas e seus viveiros, pertencentes
a importantes personalidades da história local e nacional, a saber; pelo
sul viveiro da marinha de Lopo de Albuquerque e outro de Tomé Afonso (onde
se chama Regos de Sapos) pelo Leste marinha que foi de Pêro Gomes,
Cavaleiro da Casa d’ el Rei e caminho do concelho e pelo Oeste, viveiros e
marinhas de Pêro Vicente e Valentim Fernandes.
Ficava Pêro Botelho obrigado a construir
o moinho no prazo de seis anos, pagando de foro todos os anos pelo Natal,
trinta alqueires de trigo do Alentejo, bom e limpo (e não de trigo que
chega pelo mar), logo que o moinho começasse a funcionar. Não construindo
o referido moinho no dito prazo ficava obrigado a pagar 1.000 reis para as
obras do convento de Palmela e a entrada de água devoluta para a Ordem dar
a quem quisesse.
Os proprietários das marinhas colocaram
alguns obstáculos a esta doação, porque assim ficavam sem acesso ao mar,
logo impossibilitados de tomar água e de escoar o sal. Nesse sentido o
contratante obrigava-se a abrir um esteiro por onde os viveiros pudessem
receber águas do mar e as barcas carregar o sal, não podendo impedir que o
transporte do sal se fizesse através dos muros da caldeira do moinho.
Todavia o início da construção foi
provavelmente anterior, pois a mesma doação havia sido feita a Pêro Gomes,
proprietário de uma das marinhas confrontantes ao moinho, que por ter
falecido entretanto não chegou a concretizar.
Refira-se por último que nas entrelinhas
do documento, concretamente na questão da acessibilidade ao mar, se
vislumbra uma polémica bem mais complexa, que durou séculos e opôs o
Convento de Santos e a Ordem de Santiago. O assunto coloca-se da seguinte
forma: a Ordem detém os direitos senhoriais sobre todos os bens e terras,
tanto em Alhos Vedros como em quase todo o sul do país, ou seja, detinha
em exclusivo o direito de fazer doações mediante o pagamento de um foro,
não só da terra mas do que nela houvesse, se construísse ou se produzisse,
excepto sobre o sal que na área do concelho de Alhos Vedros era privilégio
do convento de Santos.
Por isso a Ordem nunca deu terrenos para
construir marinhas ( na única vez que o tentou o Convento exigiu os seus
direitos) e procurasse atrair outras actividades, como os moinhos, que lhe
dariam alguns proventos. Por outro lado o Convento não tinha autoridade
para poder fazer doações onde estas se construíssem.
Assim se entende que a construção de
salinas estagnasse desde o século XIV nunca atingindo dimensões
gigantescas como em Alcochete ou Setúbal, por exemplo. O argumento de que
seriam dificuldades técnicas, como a infiltração de água doce como
impeditivo para o desenvolvimento da exploração do sal, não é de
considerar como mostram as zonas referidas.
Esteiro. Junho de 1997