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edição 100 / 2001
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O
terreno fértil da genealogia
Cresce o interesse popular pelo resgate das raízes
históricas da própria família
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Por Suzel Tunes /
Wagner de Oliveira
E-mail: [email protected]
A
cada dia, mais e mais pessoas descobrem que têm, dentro de sua própria
carteira, uma pequena, mas importante partícula da história
humana: sua cédula de identidade. Naquele quadradinho plastificado,
elas conseguem vislumbrar séculos
de vida; seja nos traços étnicos
revelados no rosto sério em 3x4,
seja no nome resultante do
encontro de famílias ao longo de gerações.
E, partindo desses pequenos sinais, mergulham numa surpreendente
viagem rumo ao passado pelos caminhos da genealogia,
o estudo das relações familiares.
Ferramenta auxiliar
da história, a genealogia é uma ciência milenar, mas nunca esteve tão
na moda. Na Internet, por exemplo,
figura como um dos quatro assuntos de maior interesse, junto com esportes, finanças e sexo.
Quando a igreja dos mórmons inaugurou seu site de pesquisa genealógica (leia
quadro abaixo), o servidor ficou saturado
com 500 visitantes por segundo.
Para Fernando Korndörfer,
presidente do Instituto de Genealogia do Paraná, Igepar, e autor do
primeiro curso brasileiro sobre o assunto via Internet, existe uma explicação para esse crescente
interesse: busca-se na elaboração de uma árvore genealógica
- que é uma das formas gráficas mais comuns de apresentação da ascendência
- o resgate das próprias raízes, perdidas nessa época de mudanças vertiginosas e desagregação familiar.
"As pessoas começam a sentir-se como 'folhinhas perdidas ao léu' e buscam âncoras para as velhas perguntas básicas do ser humano: Quem sou; de onde venho; para onde vou?
A história familiar é uma parte da resposta, com suas tradições, seus mistérios, as lutas dos antepassados.
A folhinha faz parte de um ramo, que está no galho, que está no tronco da história. E isso é muito forte", filosofa Korndörfer.
Desvendar a própria história tem sido, de fato, a motivação de
muitos jovens que se embrenham por cartórios de registros civis, igrejas e arquivos históricos empoeirados
em busca de parentes.
Fernando Korndörfer, ao lado do brasão de família:
"folha presa no tronco da história"
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O cantor lírico
Richard Bauer, de São Paulo, tinha apenas 18 anos quando começou a
pesquisar sua família. "Comecei em 1990, quando
faleceu uma tia-avó. No enterro,
vi um monte de gente que eu nem conhecia. Descobri que minha
família era gigantesca e resolvi
conhecê-la melhor.
Consegui chegar até um hexavô
da parte de minha mãe e a
um trisavô, da parte de meu pai.
E vou seguir até onde puder. Não existe colecionador de selo, moeda? Eu
coleciono gente."
Alguns pesquisadores
não se contentam em listar os nomes dos familiares.
Buscam entrar em contato com
todos os quais têm algum grau de parentesco.
A família Arantes promoveu uma
festa com 200 pessoas no Clube Paulistano, em São Paulo, para
marcar o lançamento do livro da família, uma publicação
com 1.026 páginas e mais de 30 mil Arantes, de todas
as gerações conhecidas até agora.
Os Foltran, com 1.200 membros - conhecidos - espalhados
pelo mundo, cerca de 550 só no Brasil, costumam
promover grandes encontros familiares que reúnem quase
400 pessoas, como a VII Reunião da Família Foltran,
ocorrida no município paulista de Tietê, em fevereiro
deste ano. Os megaeventos são organizados pela
Associação Grande Família Foltran, fundada em 1995.
O vício da
pesquisa
Outra motivação para a pesquisa genealógica é a busca
da cidadania estrangeira. Quem é filho, neto ou bisneto
de imigrantes italianos, por exemplo, pode requerer a
dupla cidadania. Nesse caso, a árvore genealógica pode
ir apenas até a prova documental do parentesco e origem
familiar. Mas quando se começa, dizem os genealogistas,
é difícil parar. "A pesquisa vira um vício, cada história
que se encontra é um grande barato", diz o genealogista
Fernando Korndörfer, consultor de negócios internacionais
e professor de inglês para executivos nas horas vagas.
Sobra-lhe ainda tempo para escarafunchar a
família de origem alemã.
Assim como Korndörfer,
a maioria dos genealogistas
é amadora, mas já há quem tenha descoberto, nesse ramo de pesquisa, um
lucrativo filão de mercado. Afinal, uma árvore
genealógica com várias gerações custa, em média, 2 mil reais,
mas, dependendo do tempo gasto e do grau de dificuldade da pesquisa, a
conta pode ficar ainda mais salgada.
Uma tradicional família paulista já chegou a pagar
50 mil reais por um estudo que levou oito anos para
ficar pronto. No entanto, mesmo os genealogistas ditos
profissionais não costumam ter formação acadêmica em
pesquisa histórica. Na verdade, são raros os historiadores
que se dedicam à confecção e venda de árvores
genealógicas. A maioria deles não costuma encarar
essa atividade com muita simpatia. "A pesquisa histórica
deve ser contextualizada. Para a história, não interessam
apenas os ramos nobres das famílias, mas também
os ilegítimos e o modo como viviam e se relacionavam",
alfineta a historiadora Eni de Mesquita Samara,
pesquisadora do Cedhal, Centro de Estudos de
Demografia Histórica da América Latina, da
Universidade de São Paulo. Ela reconhece a genealogia
como uma útil ferramenta de pesquisa, mas admite
um preconceito pessoal, nascido, certamente,
da tradição nobiliárquica dessa ciência auxiliar da história.
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Quem constrói uma árvore genealógica não pode deixar de fazer
uma visita a um Centro de História da Família (CHF) da Igreja de
Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, mais conhecida como Mórmon,
nome de um profeta que, segundo a Igreja, teria vivido na América
no ano de 400 d.C.
Nos 178 CHFs espalhados pelo país (com mais 34 novos previstos
para o final do ano), os mórmons permitem o acesso gratuito a cerca
de 12 milhões de registros (sobretudo certidões de nascimento,
casamento e óbito) microfilmados em cartórios, igrejas e arquivos
históricos do mundo todo. Uma cópia de cada registro vai para a
sede mundial da Igreja, em Salt Lake City, no Estado americano de
Utah, e fica guardado, como um verdadeiro tesouro, em um abrigo de
chumbo encravado no sopé das Montanhas Rochosas, totalmente a salvo
de umidade, incêndios e até explosões atômicas.
Esse arquivo central, fundado em 1894, é considerado hoje o
maior acervo genealógico do mundo. Para pesquisar neste acervo,
basta ter o nome completo do antepassado e a data exata ou
aproximada do documento que se quer encontrar. Por meio de
microfichas disponíveis em cada CHF, consulta-se um índice que vai
localizar o microfilme com o documento pedido. As consultas são
gratuitas. Esse microfilme pode ser visto em máquinas apropriadas
no próprio CHF ou ser ampliado, a pedido do pesquisador.
Tamanha paixão pela genealogia tem uma explicação doutrinária.
Os mórmons acreditam que as famílias se reencontrarão após a
morte, no mundo espiritual. Por isso o empenho dos mórmons em
montar suas árvores genealógicas.
Álvaro Santin, responsável pelo Centro de Serviços de História
da Família, começou suas pesquisas há cerca de dez anos e já tem
4.772 nomes em sua árvore. Para chegar a todos esses parentes, a
grande maioria italiana, Santin não precisou sair do país. Acessou
os arquivos da igreja na Itália. E já está colocando à disposição
os dados que conseguiu na Internet, o próximo alvo dos mórmons. Em
maio desse ano, foi inaugurado o site www.familysearch.com,
que permite o acesso a bancos de dados montados por membros da
igreja. Por enquanto, estão disponíveis apenas os nomes de
americanos, ingleses e finlandeses, num total de 400 milhões de
pessoas. Até o final do ano, porém, os mórmons pretendem incluir
bancos de dados do mundo todo, inclusive do Brasil. (*)
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(*) - Nota da
Editora do Site: Brasil e América do Sul já ficguram no site
da Igreja dos SUD
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Neide
Bibiano e o Almanaque de Gotha, um catálogo da nobreza européia:
preciosidade conservada à custa de veneno |
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Afinal, durante
anos, a genealogia atendeu aos interesses de uma nobreza preocupada em
checar o pedigree dos pretendentes às noivas de fina estirpe e, mesmo
hoje, ainda existe gente que investiga sua ascendência com o claro
objetivo de encontrar nobres ou figuras históricas famosas em suas raízes.
"Já vi gente que teve um verdadeiro ataque porque encontrou um
coveiro entre seus antepassados", diverte-se Neide Bibiano, diretora
do Instituto Genealógico Brasileiro, que possui uma das principais
bibliotecas do país especializadas no assunto.
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A professora Eni de
Mesquita alerta também que não basta enumerar os nomes de uma família.
"É importante saber quem eram essas pessoas, como viviam, o que
pensavam", explica ela, autora de um estudo sobre as famílias
paulistas do século 19, que resultou no livro A Mulher, o Poder e a
Família, editado pela Marco Zero.
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Planos
de vôo
Os
primeiros passos de uma viagem sem data para acabar
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- 1 - Reunir
toda a documentação disponível sobre seus familiares: certidões
de nascimento, casamento e óbito, carteiras de identidade, de
trabalho, passaportes, documentos de naturalização, títulos de
eleitor, certificados escolares etc.
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2 - Compor
um banco de dados onde constem: nome completo, apelido, datas e
locais de nascimento, casamento, morte e sepultamento. Para esse
trabalho, podem-se usar softwares de genealogia. Eles são
programas utilitários para organizar os bancos de dados e podem
ser adquiridos pela Internet.
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Algumas opções:
Brother's/Keeper 5.2 F: http://ourworld.compuserve.com/homepages/Brothers_Keeper/
- É um "shareware" , ou seja, uma versão gratuita,
ideal para iniciantes.
Personal Ancestral File (PAF):
http://www.genealogy.org/~paf/
- Também gratuito.
Family Tree Maker:
www.familytreemaker.com
- É o mais conhecido e mais usado no mercado. A versão mais
barata custa US$ 40,00.
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3 - Fazer
um levantamento dos dados que faltam em relação a cada indivíduo
e, se for o caso, estimar as datas dos principais eventos,
indicando hipóteses dos respectivos lugares onde possivelmente
ocorreram.
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4 - Entrevistar
parentes e amigos, principalmente os mais idosos, buscando informações
transmitidas oralmente, a fim de preencher as lacunas mencionadas
no item 3.
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5 - Pesquisar
em cartórios de registros civis e arquivos paroquiais, levando-se
em conta as localidades e épocas reais ou hipotéticas.
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Outros
locais de pesquisa: bibliotecas públicas, igrejas, museus,
arquivos públicos, institutos históricos, academias de letras
etc. (leia alguns endereços no Anote). Não se esqueça de
uma visita ao cemitério. Os livros de sepultamento e as lápides
por vezes trazem informações valiosíssimas.
Consultar os livros de autores que tratam da história e
genealogia locais (Estado ou município), como o Genealogia
Paulistana, em São Paulo, ou o Velhos Troncos Mineiros, de Cônego
Trindade.
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6 - Consultar
os Centros de História da Família da Igreja de Jesus Cristo dos
Santos dos Últimos Dias (Mórmons). Eles possuem grande acervo de
livros, microfichas e microfilmes abertos ao público, mesmo para
quem não professe a religião.
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7 - Buscar
informações na Internet, nos sites de genealogia (veja Anote)
ou mesmo nos sites de procura, como o Altavista ou Cadê. Há várias
famílias que deixam à disposição suas árvores na Web.
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(extraído
do Pequeno Guia para Iniciantes em Genealogia, de Rubens R. Câmara
e Fernando J. Korndörfer, no site http://www.genealogia.com.br/gn_guia.html)
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Esqueleto com
carne
Essa é uma orientação que Korndörfer já segue em suas buscas
pessoais. "Se os dados sobre nascimento, casamento e morte de cada
antepassado equivalessem a um esqueleto, a história que essa pessoa viveu
são a carne, músculos e coração, os quais dão vida e movimento ao
esqueleto", apregoa ele.
Mas como é possível
extrair vida de documentos aparentemente frios, como certidões,
recenseamentos, inventários e testamentos? A professora Eni explica:
"Os recenseamentos, por exemplo, revelam as diferenças de idade
entre os casais e mostram que as famílias não eram tão grandes como faz
crer o número de nascimentos. Acontece que as crianças morriam cedo. Já
nos testamentos, encontra-se o reconhecimento e, muitas vezes, a referência
carinhosa a um filho bastardo ou a escravos domésticos que acompa
nhavam a família. E, nos inventários, observa-se a preocupação em
prover as filhas com dotes para o casamento".
Para chegar a esses
documentos, os pesquisadores de história da família - profissionais ou
amadores - têm que percorrer sinuosos caminhos. "Se você souber
muito pouco sobre sua família, é melhor 'entrar de ré', isto é,
procurar primeiro os dados sobre a morte da pessoa, depois os do casamento
e finalmente os de nascimento", aconselha Korndörfer. "A certidão
de óbito geralmente lhe informará a idade, data de nascimento ou nomes
dos pais, dos quais você possivelmente não teria conhecimento para começar
com o registro de nascimento", explica ele.
Casos ao
pé da árvore
Quem faz pesquisa genealógica muitas vezes se depara com histórias
que beiram a lendas, misturam-se a elas, ou as suplantam, em graça
e singularidade.
O vampiro
e a princesa
A imprensa britânica não dá mesmo trégua à Família Real e,
especialmente, ao pobre príncipe Charles. Para o jornal inglês
The Sun, até a genealogia de Charles depõe contra ele: o príncipe
seria descendente de um vampiro. O conde romeno Vlad Tepes,
conhecido como Drácula, seria antepassado da princesa Maria de
Teck, que se casou em 1893 com Jorge V. E Jorge V é avô da
rainha Elizabeth, portanto, bisavô de Charles. Por outro lado, a
falecida princesa Diana seria uma descendente do grande escritor
William Shakespeare (1564-1616). Ele teria tido uma filha ilegítima
chamada Penélope, que teria se casado com o barão Spencer - é
reconhecido como um dos ancestrais diretos de Diana.
A
armadilha dos sobrenomes
Rubens Câmara, advogado e genealogista de Minas Gerais com oito
anos de experiência em pesquisa, vive recebendo e-mails de amigos
que perguntam qual a história desse ou daquele sobrenome. A todos
ele alerta: "Não dá para falar a história da família
apenas se baseando no sobrenome". Segundo ele, antigamente, não
se usavam sobrenomes. As pessoas começaram a ser diferenciadas
por nomes que diziam respeito à aparência, profissão, filiação
ou local de origem. Ou que surgiram de pura invenção: "O
nome de Sarney, por exemplo, foi criado por um avô do
ex-presidente, que era empregado de um tal Sir Neill. E aqui em
Minas há uma família que tem o nome bem 'britânico' de Goodgod,
criado por um antepassado deles".
Chico
Buarque e as noivas portuguesas
Para compor a música Paratodos, em que fala de seus antepassados
(O meu pai era paulista/Meu avô, pernambucano/O meu bisavô,
mineiro/Meu tataravô, baiano), Chico Buarque contou,
basicamente, com a memória dos parentes. Mais tarde sua árvore
genealógica acabaria atestando o parentesco com senhores de
engenho do Nordeste. E o professor Francisco Antônio Dória, um
matemático de formação que acabou se apaixonando pela pesquisa
histórica, foi ainda mais fundo: descobriu que um dos troncos da
ascendência materna de Chico chegou ao Brasil para atender aos
apelos do padre Manoel da Nóbrega. Como bom súdito, o padre
pediu ao rei de Portugal mulheres brancas, a fim de que os
fidalgos portugueses não se amasiassem com as índias. Assim, em
1553 desembarcou Clemenza D'Oria para se casar com Fernão Vaz da
Costa, primo do governador do Brasil, Dom Duarte da Costa, e
iniciar a família desses talentosos Franciscos.
A invasão
dos Silva
Segundo o genealogista Francisco Antônio Dória, sobrenomes
comuns brasileiros, como Menezes, Silva, Souza, Cunha, Vasconcelos
ou Pereira, são nomes da alta nobreza portuguesa do período
medieval. "Em Portugal, por volta do século 15, o sobrenome
não se transmitia obrigatoriamente de pai para filho. Podia-se,
por exemplo, adotar o nome de um bisavô, de qualquer lado.
Naturalmente, escolhia-se os mais importantes, como Silva ou
Souza, que acabaram se alastrando pelo país."
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Tesouro
na lápide
Os cartórios de registros civis e as igrejas (onde eram
registrados os nascimentos e casamentos até 1938) são endereços obrigatórios.
Mas informações valiosas podem ser encontradas em arquivos históricos,
museus, escolas e até cemitérios. As lápides, por exemplo, podem
revelar, além de nomes e datas de falecimento, também as datas e locais
de nascimento. Os arquivos históricos guardam jornais antigos com notícias
de casamentos, obituários e chegada de navios de imigrantes. E até
listas telefônicas pod
em ser consultadas em busca de parentes fortuitos - listas de outros países,
inclusive, que se encontram disponíveis na Internet. Um detalhe
importante: quem descende de imigrantes estrangeiros, precisa ter ao menos
uma noção do idioma de origem dos antepassados, para enveredar pelos
arquivos da terra natal. Assim, um descendente de japoneses precisará ler
documentos em ideogramas.
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Além de tempo,
paciência e perseverança, o pesquisador precisa ter uma saúde de ferro
para suportar o ar cheirando a mofo dos velhos arquivos e bibliotecas. No
Instituto Genealógico Brasileiro, Neide Bibiano trava uma ferrenha
batalha com os insetos - com risco de vida para ambos. É que, para
proteger os livros, ela aplica um perigoso veneno nas bordas, que manuseia
sem luvas. Aos visitantes que recebe em sua biblioteca, ela adverte que
nunca cometam o hábito de molhar os dedos na língua para virar as páginas
dos livros, sob risco de terem o mesmo destino dos personagens de O
Nome da Rosa, romance de Umberto Eco. Vale a pena o risco. Quem se
aventura pelas estantes apinhadas de livros, encontra volumes raríssimos,
como manuscritos da época do Império
e testamentos do século 15, e pode ler informações das mais curiosas,
como os inventários que relacionam o número de cuecas, camisolas usadas
e bules sem tampa que uma família possuía.
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"Como
a colônia não produzia nada, ou seja, tudo era importado da metrópole,
esses bens eram valiosos para as famílias da época", explica
Bibiano. Outra das raridades é o famoso Almanaque de Gotha, o guia das
linhagens aristocráticas internacionais. "Era a revista Caras da época",
compara a pesquisadora, com um toque de ironia. Editado na forma de livro
de bolso, com capa dura, o almanaque tirou este nome do Ducado de Gotha,
na Alemanha, onde foi publicado pela primeira vez em 1763. Não demorou a
se tornar o padrão de referência para príncipes e princesas que queriam
saber qual a dinastia mais apropriada para um casamento, e só deixou de
ser publicado em 1944, quando Gotha caiu nas mãos dos comunistas. Mas, no
último dia 15 de agosto, foi relançado na Inglaterra, com um grande
festa de nobres no Hotel Claridge, em Londres.
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Clássico na Internet
O Instituto Genealógico Brasileiro também possui um dos poucos
exemplares que ainda existem da Genealogia Paulistana, obra em nove
volumes de Luiz Gonçalves da Silva Leme (1852-1919), que é considerado
um clássico no assunto. Editado no início do século, contém informações
que remontam à época do descobrimento do Brasil. Por ter sido uma obra
com tiragem limitada e não reeditada, há poucos volumes disponíveis.
Mas toda essa obra já está sendo digitada por voluntários de todo o país,
que pretendem colocá-la na Internet, de modo a torná-la mais acessível
e proporcionar sua virtual perenidade. O livro também está sendo
reeditado em CD-ROM pela genealogista paulista Marta Amato.
Outro
futuro lançamento que vai facilitar a vida dos pesquisadores é o Dicionário
das Famílias Brasileiras, um trabalho do genealogista carioca Carlos
Eduardo Barata e do deputado federal Antônio Cunha Bueno, que deverá
chegar em novembro. A publicação, um calhamaço em dois volumes que
totalizam mais de 2 mil páginas, trará 17 mil verbetes sobre a origem e
a história dos sobrenomes que compõem a população brasileira. "É
a primeira vez que os brasileiros terão acesso a informações sobre famílias
indígenas e negras. Antigamente, só se estudava a elite",
orgulha-se Barata, que estuda a origem dos nomes das pessoas há 28 anos.
Também são relacionados os nomes referentes a cristãos-novos (judeus
fugidos da Inquisição), a linha ilegítima de alguns sobrenomes,
herdados após casos extraconjugais dos patriarcas, e até descendentes de
padres. Quem não encontrar seus antepassados no livro, pelo menos poderá
usufruir de histórias saborosas, como o Adão de Pernambuco.
Chamava-se
Jerônimo de Albuquerque e era genro de Duarte Coelho, donatário da
capitania de Pernambucano. Um dos primeiros colonos portugueses a
desembarcar no Brasil, em 1535, em Pernambuco, Jerônimo teve nada menos
que 42 filhos e 130 netos, que ajudaram a povoar a imensidão vazia do
Brasil no século 16 e a iniciar a trajetória de um dos sobrenomes com
que mais brasileiros assinam hoje: Albuquerque. Por conta de tamanho
empenho, a sociedade brasileira é uma grande família, segundo Barata.
"Esqueça o bairrismo no nosso país. O sangue brasileiro está
disseminado por todo o território. Todos por aqui têm algum grau de
parentesco", sustenta o pesquisador. "É como se fosse uma família
só", afirma.
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H
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eráldica:
nobreza estampada
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Os nobres da Idade Média tinham um sinal exterior de
nobreza tão invejado quanto uma Ferrari último tipo ou uma mansão
em Côte d'Azur: seu brasão de armas. Pintado em cores fortes e
utilizando ícones significativos como a Torre, símbolo de poder,
ou o Leão, que representava grandeza e coragem, o brasão era a
marca registrada da elite.
Objeto de estudo da heráldica, a utilização de determinados
símbolos e cores para identificar indivíduos, famílias, tribos
ou clãs é um costume que se perde no tempo. Alguns historiadores
relacionam o uso de emblemas com as
Cruzadas, outros acreditam que a origem é ainda mais
antiga. Seja como for, o uso regulamentado dos símbolos heráldicos
se estabelece na Idade Média, para diferenciar
os cavaleiros em suas intermináveis guerras e torneios.
Nessa época, para evitar duplicações e confusões, os emblemas
e cores do escudo são rigidamente codificados.
Num primeiro momento, as armas de um cavaleiro são individuais:
representam-no e, em certos casos, às terras
que possuem e a sua vassalagem. Mas não são armas
de família,
ou seja, não se transmitem de pai para filho.
Com o tempo,
esses brasões passam a ser concedidos diretamente pelo rei,
como recompensa pelos serviços ou atos de bravura de seus cavaleiros, acompanhando geralmente a doação de
terras.
A partir do século 12, esta forma de identificação pessoal
torna-se hereditária e, por ser uma deferência real,
um sinônimo
de nobreza da família. Assim surgiram
os brasões dos Almeida, dos Silva, dos Menezes.
Por isso, quem encontra hoje um brasão com seu nome
precisa descobrir, primeiro, se ele é de caráter hereditário.
Depois, se tem o direito de usá-lo. Não é porque um
Menezes teve um brasão que todo Menezes poderá
herdá-lo.
"Só quem pertence ao tronco original da família tem
direito
ao uso do brasão", alerta Neide Bibiano, diretora do
Instituto Genealógico Brasileiro. Além do mais, como
os negros
libertos da escravidão costumavam adotar os sobrenomes de seus
senhores, é comum que descendentes
de ex-escravos tenham sobrenomes de antigos nobres.
É claro que qualquer um pode comprar um brasão com seu
sobrenome, desses que se vendem em quiosque de
shopping center. Mas ele não passará de um enfeite
na parede, sem qualquer valor legal.
Outra confusão comum, diz Neide Bibiano, é a adoção de
emblemas não oficiais, ou seja, criados sem os auspícios
reais. "Com a disseminação do uso de emblemas,
os
mercadores passaram a usar figuras para identificar os produtos
que vendiam nas feiras. Ou seja, alguns
brasões são, na verdade,
rótulos de mercadorias." |
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Anote
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Na Internet
· www.genealogia.com.br
- home page da Lista de Discussão Brasileira de Genealogia,
dedicada à troca de informações entre pesquisadores
· www.bsi.com.br/~igepar/
home page do Instituto de Genealogia do Paraná, com diversos
links, incluindo o curso de genealogia básica, de Fernando J.
Korndörfer
Alguns endereços
· Instituto
Genealógico Brasileiro - rua 7 de Abril, 230, 10º andar, São
Paulo, SP, Tel. (0**11) 257-4840
· Memorial
do Imigrante - rua Visconde de Parnaíba, 1316 (metrô Bresser), São
Paulo, SP, Tel. (0**11) 6692-7804
· Centro
de Serviços de História da Família (mórmons) - avenida Prof.
Francisco Morato, 2430, São Paulo, SP, Tel. (0**11) 3723-3410 ou
3723-3407
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