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A Enganosa Reportagem da Newsweek
sobre "Medicina Alternativa"
William M. London, EdD, MPH
Em sua edição de 2 de dezembro de 2002, a revista Newsweek publicou uma
reportagem mal concebida sobre "A Ciência da Medicina Alternativa."
Em sua coluna "Editor's Desk", Mark Whitaker escreveu:
"Temos orgulho de estar trabalhando com a Harvard Health Publications
e seu editor-chefe, Dr. Anthony Komaroff, para trazer a você a melhor visão
que nossa equipe de veteranos jornalistas da área da saúde e especialistas da
Harvard têm a oferecer." Infelizmente, a melhor visão que oferecem é empacotada
com propaganda promovendo noções falsas sobre medicina complementar e
alternativa (MAC). Eis alguns dos problemas da reportagem da Newsweek.
- A noção de "a ciência da medicina alternativa" sugere
falsamente que existe uma categoria expressiva de saúde chamada "medicina
alternativa" e que é fundamentada cientificamente. Mas no uso comum, o
termo "medicina alternativa" é um eufemismo usado por entusiastas
e exploradores para dar a aparência de legitimidade a métodos promovidos com
alegações cientificamente improváveis, invalidadas ou não validadas.
- Uma introdução a reportagem inclui a generalização falsa de que as
"terapias 'complementar' e 'alternativa' não foram sujeitas a testes
científicos rigorosos até agora." Entretanto, muitos dos métodos que
estão sendo promovidos como "complementares" e
"alternativos" foram testados rigorosamente e não foi demonstrado
que tragam algum benefício aos resultados de saúde quando combinados com
métodos comprovados ou como
substitutos para métodos comprovados. Por exemplo, em testes rigorosos,
megadoses de vitamina C e laetrile fracassaram como tratamentos do câncer.
- Geoffrey Cowley, um dos repórteres do Newsweek, refere-se a
acupuntura como digna de crédito. Mas revisões de estudos clínicos sobre acupuntura não
apóiam alegações de que a acupuntura seja eficaz para uma grande variedade
de problemas. Efeitos benéficos foram relatados para alguns tipos
de acupuntura no tratamento de sintomas tais como dor e náusea. Entretanto,
estes efeitos podem resultar de distração, expectativa, sugestão,
condicionamento e características do relacionamento cliente-profissional ao
invés de qualquer aspecto especial da acupuntura. A acupuntura não foi comprovada
como determinante na mudança de curso de qualquer doença.
- Cowley refere-se a quiropráxia como digna de crédito. Mas a
quiropráxia apresenta dogmas centrais absurdos sobre como o sistema nervoso afeta saúde, e tem
facções conflitantes oferecendo vários sistemas técnicos duvidosos.
Desde 1895, quando a quiropráxia foi concebida pelo auto-descrito
comerciante e "curandeiro magnético" D.D. Palmer, os
quiropráticos não fizeram nenhuma contribuição científica significativa
no campo da saúde e muitos tentaram minar a confiança dos consumidores em
tratamentos racionais e medidas preventivas de saúde pública
confiáveis.
- Cowley aponta: "Então após rejeitar as terapias MAC como charlatanice
por boa parte de um século, o establishment médico encontra-se
agora com pressa em avaliá-los." O termo "establishment médico"
é uma abstração. O uso do termo neste contexto faz uma super
generalização quanto ao interesse em avaliar terapias MAC. Muitos médicos e cientistas
de fato reconhecem que a promoção de tratamentos MAC não validados ou
invalidados com o propósito de ganho financeiro é charlatanice. Prefeririam
que o dinheiro para pesquisas fosse distribuído de acordo com a promessa científica
ao invés de agendas políticas. Embora muitos hospitais e instituições de pesquisa
estejam conduzido pesquisas com tratamentos MAC, muito dessas pesquisas tem
a haver com o rastro do dinheiro. Grandes quantias de financiamento tornaram-se
disponíveis quando a legislação encabeçada pela panacéia entusiasta do
Senador Tom Harkin (D-Iowa)
forçou o National Instututes of Health a criar um Escritório de Medicina não
convencional, que evoluiu para o Centro Nacional de Medicina Complementar e
Alternativa (NCCAM, na sigla em inglês). Entretanto, após gastar mais de
110 milhões de dólares em pesquisas, o NCCAM não publicou nenhuma
recomendação a favor ou contra o uso de qualquer tratamento MAC.
- Cowley cita os dados da pesquisa publicada por Eisenberg e colegas em
1993 mostrando que 34% dos adultos nos EUA tinham recebido pelo menos uma
terapia "não convencional" em 1990. Mas críticos apontam que a
porcentagem foi bastante inflacionada porque a pesquisa incluiu o uso de
grupos de auto-ajuda, exercícios, orações, e outras atividades que não
deveriam ser consideradas como "MAC". [1]
A publicidade em torno do estudo levantou o interesse dos consumidores em produtos herbáceos duvidosos
e outros produtos MAC (como refletido numa pesquisa de seguimento em 1997),
o que por sua vez foi usada para justificar a proteção dada ao inútil
NCCAM.
- Cowley cita o chefe do NCCAM Dr. Stephen Straus: "Nós queremos
testar terapias que tenham uma base plausível e que se destinem a alguma
necessidade não satisfeita." Cowley falha ao não indicar que muitos
dos estudos
financiados até agora não têm uma base plausível. O maior destes é uma
verba de $30 milhões do NCCAM/NHLBI para apoiar um teste com terapia
de quelação para doenças cardíacas. A subseqüente avidez da quelação e o
estudo são mencionados num canto da Newsweek porém sem mencionar a
implausibilidade da quelação [2] para esse propósito.
- Cowley sugere que seguradores da nação são preconceituosos contra
tratamentos "holísticos". Mas o "viés" real dos seguradores da nação
é contra perder dinheiro. Infelizmente, alguns seguros oferecem tratamentos duvidosos
na esperança de atrair mais segurados. Muitos planos
cobram uma taxa extra ou simplesmente possibilitam que os segurados obtenham descontos de
profissionais designados. E Cowley falha ao não reconhecer que bons médicos
sempre consideraram os pacientes como um todo e que o termo
"holístico" é uma bandeira perigosa sob a qual praticantes de
métodos não científicos se agrupam.
- Outra repórter, Anne Underwood, escreveu sobre a praticante de medicina
tradicional chinesa (MTC) Nan Lu que examinou sua língua e
"pulsos"-- um para cada órgão do seu corpo -- para diagnosticar
"perda de energia" do seu coração e então recomendar
acupuntura, qigong (descrito erroneamente como ioga chinesa), meditação,
modificações dietéticas e remédios a base de ervas contendo casca verde-alaranjado,
sementes azedas e raiz de alcaçuz e outras dezenas de ingredientes exóticos.
A repórter descreveu que as atividades de Lu não soam científicas a "mente
ocidental." Mas ela falhou ao não reconhecer que as atividades de Lu também
não soam científicas para cientistas reais na Ásia. A língua e o exame
do pulso na MTC carecem de uma validade e uma base racional para fazer diagnósticos
e recomendar tratamentos. O diagnóstico de "perda de energia" na
MTC é subjetivo e não tem nenhuma base científica. A física moderna
reconhece a energia como uma entidade material, como expressa pela famosa equação
de Einstein E=mc2, e explicada pela teoria quântica.
A energia não é um espírito imaterial como sugerido pelos divulgadores da
MTC e muitas outras práticas de MAC.
- Underwood sugere que a acupuntura alivia a dor por reforçar a ação dos próprios
opiáceos do organismo chamados endofirnas. Mas alguns estudos mostraram que
bloquear receptores de endorfinas usando um antagonista opiáceos não
reverte o alívio da dor que ocorre após a acupuntura. Além do mais, não é necessário
aplicar agulhas em pontos específicos, como na acupuntura, para liberar
endorfinas. A liberação pode ser estimulada sem agulhas.
- Underwood cita um estudo apresentado numa conferência na China sugerindo
que a acupuntura com estimulação elétrica de baixo-nível pode reduzir o
desejo ("cravings") por drogas e o índice de recaída entre os
dependentes por heroína. Mas ela não
menciona que revisões de estudos de tratamento de acupuntura para
dependentes químicos não apóiam as alegações de que a acupuntura melhora
os resultados dos tratamentos com dependentes. E corrente elétrica
contínua através de tecidos não é
"acupuntura".
- Underwood alega que "os medicamentos chineses tendem a ter menos
efeitos colaterais que remédios ocidentais" e que "a medicina
ocidental é mais perigosa." Ela oferece um argumento infundado para
esta generalização. Escreveu que uma pesquisa de 1996 nos estados mais
populosos da Austrália encontrou um evento adverso tanto de ervas como de acupuntura
para cada oito a nove meses de uma prática de tempo integral do
profissional, ou um problema por 633 consultas. Ela compara este dados da pesquisa com os
resultados de um estudo publicado no JAMA em 1998 que usou uma
metodologia totalmente diferente: uma meta-análise de estudos prospectivos. Os autores do
trabalho de 1998 estimaram (não "encontraram" Underwood escreveu) que
ocorreram mais de 100.000 reações a medicamentos entre pacientes nos
hospitais dos EUA em único ano. Não é razoável
tirar conclusões sobre os riscos relativos de todos os tratamentos com
medicamentos prescritos versus todos os tratamentos com ervas comparando dados
de eventos adversos de pacientes hospitalizados (que estão freqüentemente em
condições incertas e enfraquecidos) com dados de pacientes ambulatoriais.
Os autores da meta-análise advertem que seus "resultados devem ser
vistos com prudência por causa da heterogeneidade entre os estudos [em suas
análises] e pequenos vieses nas amostras." A comparação de Underwood
também é falha porque só considera eventos adversos ocorridos após os tratamentos e não
os benefícios oferecidos pelos tratamentos. Ela não
considera o que a grande adulteração de tratamentos herbáceos chineses com
a inclusão de drogas
sintéticas indica sobre o pensamento dos fabricantes destes produtos em
relação a que suas
ervas têm a oferecer em termos de benefícios. (Outras adulterações e
contaminantes em potencial dos produtos herbáceos incluem plantas diversas,
microrganismos, toxinas microbianas, pesticidas, agentes de fumigação e
metais tóxicos.) E, como informado no periódico Science, "De
acordo com uma pesquisa de 1999 feito pelo governo de Hong Kong, apenas 22%
das consultas médicas ambulatoriais feitas na cidade foram realizadas por
praticantes da medicina chinesa. Funcionários do governo acham que a porcentagem é
ainda menor, e acreditam que preocupações quanto a segurança estão
afastando as pessoas da MTC." [3] Produtos de ervas medicinais tendem a
apresentar má rotulagem por causa das dificuldades em identificar corretamente
as espécies vegetais, variações químicas dentro das espécies vegetais, falta de padronização, adições de
substâncias químicas, e substituição
intencional de uma planta por outra. Foi descoberto que algumas ervas chinesas tradicionais
contêm ácido aristolóquico que foi conectado a lesão renal e cânceres
do trato urinário. Em junho de 2002, o Ministério da Saúde do Canadá
advertiu consumidores a não usarem sete produtos comercializados como
remédios chinesas tradicionais porque foi descoberto que continham remédios
que necessitam prescrição adicionados a ervas e não declarados. Em janeiro de 2003, o
Diretor-Geral da Saúde da Nova Zelândia
advertiu os consumidores que interrompessem o uso de onze remédios chineses tradicionais
vendidos como remédios de ervas após investigações e testes terem
revelado que eles continham remédios que necessitam prescrição e substâncias tóxicas.
- Underwood discute a crescente demanda de ocidentais por serviços de
medicina chinesa sem mencionar a crescente demanda de pessoas na China
pela medicina moderna [3]. Underwood oferece um testemunho de uma
pesquisadora científica que disse ter tido "graves crises de vertigens"
após contrair o vírus do Nilo Ocidental. A cientista disse que o tratamento
com "especialistas ocidentais" não fizeram sua crise desaparecer, mas
a vertigem, alergias, e problema crônico do ombro "sumiram" depois que um
acupunturista diagnosticou "qi estagnado no fígado" e administrou
acupuntura e remédios a base de ervas. Underwood
cita a cientista dizendo: "Isso não faz sentido, mas existe algo aí".
Underwood conclui: "Se a medicina chinesa pode ajudar nas complicações
do
vírus do Nilo Ocidental, pode funcionar para a insônia? O júri ainda
está por decidir,
mas estou otimista." A conclusão injustificada de Underwood sobre a medicina chinesa e seu fracasso
em explicar aos leitores o por quê de testemunhos não serem confiáveis
como evidência da eficácia de um tratamento é jornalismo da pior
categoria.
- Em seu breve artigo sobre tratamentos baseados na Ginkgo biloba,
Mary Carmichael sugere corretamente que ainda não há um veredicto no que
se refere a eficácia em manter capacidades de memória em idosos. Ela
também indica que "exercícios mentais ainda são a melhor maneira de
permanecer afiado". No entanto recomenda: "Então experimente um suplemento,
mas lembre: memorizar os nomes de todas aquelas substâncias químicas
[misturadas
com Ginkgo biloba em fórmulas comerciais] pode fortalecer seu cérebro
mais do as substâncias químicas em si". É imprudente para consumidores gastar
dinheiro em produtos de benefício desconhecido, mas Carmichael encoraja-os
a apostar no ginkgo mesmo assim. Seu conselho desafia o princípio ético da
não maleficência, i.e., primeiro, não causar dano. Ela falha ao não
mencionar que o ginkgo tomado oralmente ocasionalmente causa dores de cabeça,
náuseas, sintomas gástricos, diarréia, ou reações alérgicas
de pele e pode estar associado com convulsões, hemorragias cerebrais, e
outras reações adversas [4]. Seu artigo não incluiu nenhum menção aos
achados do ConsumerLab.com de que aproximadamente um quarto entre trinta marcas de
produtos com extratos de Ginkgo biloba testados não pareciam conter o que
os rótulos prometiam.
- O artigo de David Noonan sobre vários métodos promovidos como
"medicina alternativa e complementar" ou "MAC" para
crianças menciona um estudo de três anos financiado pelo NIH sobre tratamento de
acupuntura na paralisia cerebral no qual alguns pacientes mostraram melhoras
em algumas áreas de funcionamento e outros não. Embora Noonan não
forneça nenhuma descrição do design do estudo, incluindo se o estudo
tinha um grupo controle, ele descreve o investigador, Burris Duncan,
como "um membro de um pequeno mas crescente grupo de pesquisadores que
estão sujeitando terapias de CAM em pediatria aos rigores dos ensaios
clínicos controlados, aleatórios, tradicionais." Estudos rigorosos
devem dar respostas claras, mas Noonan cita Duncan dizendo:
"[Os sujeitos] mudam de diferentes maneiras de modo que é muito difícil
saber que o que fazer disso." Noonan levanta questionamentos adicionais sobre o rigor
do trabalho de Duncan ao escrever: "Determinado a não levantar falsas esperanças, Duncan diz
que a única coisa que sabe por certo é a necessidade de mais pesquisas, e planeja
continuar seu
trabalho." Noonan também menciona que Duncan conduziu o estudo
porque ficou impressionado com o que observou na China sobre acupuntura e
outros tratamentos da paralisia cerebral. Embora o artigo do Noonan inclua
impressões subjetivas de Duncan, não traz nada sobre a base supersticiosa
do
tratamento com acupuntura, a implausibilidade da acupuntura em trazer benefícios
especiais para crianças com paralisia cerebral, e a importância de
concentrar recursos científicos no teste de tratamentos plausíveis ao
invés de implausíveis.
- Noonan está equivocado quando descreve estudos em andamento para determinar a
eficácia de tratamentos como manipulação osteopática na prevenção de infecções
de ouvido como "ciência séria." É improvável que a manipulação
osteopática previna infecções de ouvido. O financiamento do NIH de
tratamentos improváveis reflete política séria, não ciência séria.
- A colocação da palavra "Mas" por Noonan na seguinte passagem
engana os leitores por fazer um testemunho parecer mais informativo que a evidência
de estudos bem conduzidos: "Embora alguma pesquisa sugira uma associação
entre laticínios e sibilos respiratórios em crianças, mais estudos são
necessários. Mas o regime funcionou para Grant Janz, que está agora há
mais de dois meses sem apresentar sibilos respiratórios." Naturalmente, se
Grant parou de sibilar por dois meses, não significa que
seu regime [de não usar laticínios] "funcionou".
- Um quadro do artigo de Noonan recomenda o livro Healthy Child, Whole
Child [Criança Saudável,
Criança Interal] de Stuart Ditchek, MD, Russell Greenfield, MD, e Lynn
Murray Willeford. Os autores são todos discípulos da
"medicina integrativa" do guru Andrew Weil, MD, que
escreveu o prefácio do livro. Conforme Weil já tinha feito previamente, os
autores equivocadamente caracterizam a medicina regular como "convencional" ou
"alopática" e então sugerem que (a) o "não fique aí só parado, faça
alguma coisa" torna-a excelente para emergências clínicas e cirúrgicas;
(b) pode ser menos útil para distúrbios crônicos e (c) pode ser
desnecessariamente agressiva em situações onde tempo ou uma abordagem mais
branda pode ser igualmente eficazes. [p. 5] Não parece que os
autores realmente acreditam nesta caracterização da medicina; de outro
modo, por quê prudentemente recomendariam vacinações na infância? E, aparentemente, os
próprios autores têm esse "não fique aí só parado, faça alguma
coisa", especialmente ao tratar problemas auto-limitados. Eles
escreveram: "Na maioria dos casos, as terapias que recomendamos têm ao menos
algum apoio de evidência de pesquisas e
sempre tem evidência testemunhal de eficácia". Mas é fácil surgir
com testemunhos felizes para virtualmente qualquer preparado. E é fácil encontrar o padrão brando de "ao menos
algum apoio de evidência de pesquisas" citando estudos principalmente irrelevantes,
mal projetados ou anômalos proporcionando evidência muito menor que a
evidência extraordinária necessária para hipóteses extraordinárias. Um
montículo de evidência de apoio satisfaria o padrão dos autores mesmo que
esteja disponível uma montanha de
evidência e conhecimento científicos contrários.
Baseados em testemunhos e (ou) achados preliminares, os autores são rápidos
em concluir que os tratamentos funcionam: "Se uma terapia potencialmente
eficaz é segura e relativamente barata, não achamos que haja uma
necessidade de esperar por mais pesquisas para explicar como funciona --
para nós basta saber que funciona". [p. 167]. Desse modo, recomendam vários
tratamentos duvidosos incluindo: (a) osteopatia cranial para infecções
de ouvido, dores de cabeça, sinusite, problemas respiratórios, desordens
de aprendizado, e desordem do déficit de atenção; (b) produtos homeopáticos
para tratar dor de garganta, resfriados e outros problemas auto-limitados; e
(c) acupuntura para sinusite aguda. O título de seu capítulo sobre medicina
tradicional chinesa é um exemplo da falácia "todo mundo disse isso"
[Argumentum Ad Populum]: "Um
Bilhão de Pessoas Não Podem Estar Erradas". Se um
bilhão de pessoas confiam em testemunhos para concluir que um tratamento tem valor
terapêutico, então simplesmente podem estar tão erradas quanto Ditchek,
Greenfield e Willeford. Na parte dedicada aos assim chamados métodos de "medicina
energética", escrevem: "Temos visto promissoras evidências
testemunhais ou de pesquisas para alguns deles e outros são simplesmente
estranhos demais para considerarmos". [p. 250] Entre os métodos de "medicina
energética" que não são estranhos demais para
considerarem estão o "toque terapêutico" e "qi gong externo". Os autores
falham ao não mencionar críticas publicadas
destes métodos. O mais perto que os autores conseguem chegar de uma
crítica a irracionalidade da "medicina energética" é: "Estamos em
uma espécie de areia movediça científica quando falamos sobre medicina
energética porque falamos sobre energias sutis que não podem ser medidas por instrumentos
científicos atualmente disponíveis". [p. 248-249] Mas mesmo este
alerta é enganador. As palavras "uma espécie de" e "atualmente
disponíveis" não se encaixam na sentença. E é simplesmente errado
descrever energias imaginárias como "sutis".
- O quadro inclui a recomendação de Ditchek e Greenfield de dar equinácea
junto com vitamina C à crianças com resfriados. É verdade que foi
demonstrado que extratos de Echinacea purpurea têm ações significativas
no sistema imune. Entretanto, não está claro que tomar tais extratos proporciona alívio
para as pessoas com resfriados [5]. E o comércio de produtos a base de
Echinacea é freqüentemente anunciado de maneira equivoca [6]. Foi
demonstrado que a suplementação de vitamina C
reduz a severidade e duração de resfriados minimamente, na melhor das hipóteses. O gasto
com tais remédios reflete o "não fique aí só parado, faça alguma
coisa" que
Ditchek e Greenfield criticam.
- Outro livro que o quadro recomenda é The Holistic Pediatrician [O
Pediatra Holístico] de Kathi J. Kemper, MD, MPH. O livro de Kemper é,
em sua maior parte, um recurso útil
para os pais. A grande maioria dos métodos de saúde recomendados no livro são
racionais e encaixam-se no mainstream da medicina. O livro também
traz avisos prudentes aos consumidores sobre produtos herbáceos disponíveis
nos Estados Unidos. E Kemper não conta com testemunhos como
evidência. O problema principal com o livro é que Kemper adota estudos
achando que tratamentos de "MAC" são eficazes sem considerar
se os resultados fazem sentido, se são clinicamente significativos, ou se são
atribuíveis a problemas de metodologia de pesquisa. Por exemplo, ela cita um
trabalho de Jennifer Jacobs e colegas em apoio a sua sugestão de considerar
uma consulta com um profissional homeopático para prescrever remédios homeopáticos
(os quais
provavelmente não contem nenhum dos ingredientes supostamente ativos) para
diarréia em crianças. Mas, como indicado numa crítica publicada, o estudo
não mostrou nenhum benefício clinicamente significativo do tratamento homeopático,
não foi demonstrado nenhum benefício para maioria das variáveis de
resultado medidas, diferentes produtos homeopáticos foram usados em
sujeitos diferentes, e os sujeitos não tinham diarréia suficientemente severa para
que se fosse indicado tratamento, ao invés de apenas observar. Baseada em evidências
similarmente fracas,
Kemper sugere tentar: (a) "toque terapêutico" para queimaduras
ou febre; (b) consultar um praticante de MTC que pode recomendar um chá
herbáceo para o tratamento de eczema; (c) remédios homeopáticos contendo
"pulsatilla" para tratar infecções de ouvido (seguido da
recomendação de consultar um médico, se as infecções
não acabarem em 24 horas); e (d) tratamento de
acupuntura para alergias, asma, enurese, prevenção da dor de cabeça e
náuseas/vômitos. De acordo com uma descrição de Kemper na segunda edição
do livro, ela foi recrutada em 1998 pela Harvard Medical School para tornar-se
a primeira diretora do Centro de Educação e Pesquisa Pediátrica
Holística. No prefácio à segunda edição do livro de Kemper, seu colega Herbert
Benson, MD, Presidente do Instituto Médico Mente-Corpo escreveu:
"Por outro lado, trapaças e charlatanices estão vivos e bem.
Vigaristas manipulam milhões via mídia de massas e Internet; e
tomam um médico experimentado tanto em medicina tradicional como em alternativa
para manter a perspectiva perante táticas de vendas que apelam a natureza, mistérios
esquecidos e frutas proibidas." [p. xi] Benson está equivocado.
"Medicina alternativa" é um mero slogan de marketing promovido
como se fosse uma especialidade médica. Os consumidores precisam das
perspectivas de especialistas em ceticismo saudável.
- Em um artigo em sua maior parte equilibrado e razoável, que acompanha a
reportagem, sobre o efeito placebo, membros da Harvard Medical School Ted Kaptchuk,
David Eisenberg e Anthony Komaroff parecem falsamente implicar que céticos
têm pouca razão para duvidar de alegações terapêuticas feitas para métodos
promovidos como MAC. Após descrever o efeito placebo como "a cura
que ocorre não por causa de uma droga ou tratamento em particular mas por
causa das expectativas, crenças ou esperanças embutidas no encontro entre um
paciente e um clínico," afirmam que: "Céticos freqüentemente
descartam respostas a terapias complementares e alternativas como 'mero'
efeito placebo. E, até recentemente, especialistas têm considerando o efeito
placebo apenas com relutância, alguns insistindo que as pessoas que o
experimenta devem simplesmente ter percebido equivocadamente sua doença ou
sua recuperação". Entretanto, céticos cuidadosos não apelam
rapidamente ao efeito placebo como uma explicação para mudanças positivas aparentes
após o uso de supostos tratamentos de medicina alternativa e complementar
(MAC). E não saltam para conclusões de que tais mudanças
são "respostas" a MAC. Além disso, diferente de Kaptchuk e colegas,
os céticos reconhecem que é razoável não minimizar seja a plausibilidade
seja a prevalência de pacientes perceberem equivocadamente seu estado de
saúde. Pessoas que se recuperam de doenças sérias depois de usar métodos
MAC em combinação com métodos baseados na ciência freqüentemente chegam
a conclusão de que os métodos MAC aparentemente promovidos de maneira mais
exótica e apaixonada merecem a maior parte do crédito. Os pacientes e
profissionais da saúde percebem equivocadamente doenças e recuperação devido a uma variedade de outros
fatores incluindo diagnósticos equivocados, prognósticos inapropriadamente
pessimistas, falhas em reconhecer variações no curso natural das doenças, necessidades
psicológicas, e a presença de substâncias químicas indutoras de euforia
em alguns
tratamentos da MAC. Diferente de muitos praticantes de MAC, os céticos
também valorizam o quanto é fácil equivocadamente perceber tratamentos
potencialmente perigosos como seguros, particularmente quando os efeitos se desenvolvem
com o passar do tempo, ocorrem raramente, ou podem ser confundidos com complicações
da doença. Como apontado em um recente artigo de revisão: "Se uma erva
causasse uma reação adversa em 1 em cada 1000 usuários, um curandeiro
tradicional teria que tratar 4800 pacientes com aquela erva (i.e., 1 novo
paciente a cada dia de trabalho por mais de 18 anos) para ter uma chance de
95 por cento de observar a reação em mais de 1 usuário". [4]
A palavra "alternativa" pode sugerir "adequação para algum
propósito" e/ou "compulsão para escolher". [7] Porém métodos
duvidosos e irracionais não são adequados para seu propósito pretendido, e
consumidores não devem sentir-se compelidos a escolhe-los. Em vez de tentar uma
reportagem especial sobre "A Ciência da Medicina Alternativa", a Newsweek
teria prestado um serviço melhor aos seus leitores revelando "A
Pseudociência Promovida como Medicina Alternativa". Como o Drs. Marcia Angell
e Jerome Kassirer alertaram em um editorial de 1998 no The New England
Journal of Medicine: "Não pode haver dois tipos de medicina -- a
convencional e a alternativa. Existe apenas a medicina que foi adequadamente testada e
a medicina que não foi, a medicina que funciona e a medicina que pode ou não
funcionar". [8]
Referências
- Gorski T. The
Eisenberg data: Flawed and deceptive. Scientific Review of Alternative
Medicine 3(2):62-69 1999.
- Green S, Sampson W. EDTA
chelation therapy for atherosclerosis and degenerative diseases:
Implausibility and paradoxical oxidant effects. Scientific Review of
Alternative Medicine 6:17-22; 2002.
- Normile D. The new face of traditional Chinese medicine. Science
299:188-190; 2003.
- De Smet PAGM. Herbal remedies. New England Journal of Medicine
347:2046-2054, 2002.
- Barrett B. Medicinal
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2003.
- Gilroy CM. Echinacea
and truth in labeling. Archives of Internal Medicine 163:699-704, 2003.
- Garner BA. A Dictionary of Modern American Usage. New York: Oxford
University Press, 1998.
- Angell M, Kassirer J. Alternative Medicine -- The risks of untested and
unregulated remedies. New England Journal of Medicine 339:839-841, 1998.
________________
Dr. London, ex-presidente do National Council Against Health Fraud (NCAHF), é um
conselheiro do corpo docente do Programa de Mestrado de Ciência em Saúde
Pública da Walden University. Este artigo foi modificado de uma série em 2 partes
publicada no boletim do NCAHF.
Leituras
da IstoÉ: Nivelando por Baixo ||| Quackwatch em português
Este artigo foi
publicado no site original em 12 de julho de 2003.
Publicado em português em 06 de dezembro de 2003.