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Por Que Alegações Extraordinárias
Exigem Provas Extraordinárias 

Ed J. Gracely, Ph.D.
© 1998, PhACT

Os céticos tipicamente são relutantes em aceitar alegações paranormais -- tais como alegações de poderes psíquicos, campos energéticos humanos envolvendo energias desconhecidas pela ciência, métodos de detecção envolvendo forças desconhecidas (como a rabdomância), e previsões do futuro com cartas ou sonhos -- a menos que a evidência para sustentar estas alegações seja de altíssima qualidade. "Alegações extraordinárias exigem provas extraordinárias," nós dizemos. Os proponentes do paranormal podem questionar a legitimidade desta lógica. Eles observam que os céticos aceitam algumas alegações, como aquelas feitas pela pesquisa médica ortodoxa, na base de evidências comuns, razoavelmente boas, ao passo que exigem pesquisas impecáveis, quase perfeitas antes que as alegações paranormais pudessem ser aceitas. Intuitivamente, tem-se a impressão de que se uma evidência é "boa o suficiente" para uma alegação deveria ser aceitável para outras alegações. Este artigo discute o assunto e oferece uma base estatística para a linha favorita dos céticos, ao passo que também aponta suas limitações. 

Lógica Básica

Em primeiro lugar, é importante compreender que a força de uma conclusão é uma função tanto da qualidade da evidência proporcionada em seu apoio e a probabilidade a priori da alegação que está sendo sustentada. Deste modo nunca pode existir um padrão único de "evidência aceitável" que será suficiente para dispensar cada alegação igualmente plausível. Suponha, por exemplo, que uma fonte razoavelmente confiável me conte (1) que o Presidente Clinton vetou a legislação que colocava restrições ao comércio com a China e (2) que Newt Gingrich mudou para o partido Democrata. A maioria das pessoas confiariam muito mais na veracidade do primeiro relato do que do segundo, mesmo que a fonte fosse idêntica. A diferença encontra-se na plausibilidade a priori das alegações. 

Uma formulação mais precisa exige que disponhamos a probabilidade a priori de uma alegação em uma forma de "chances" a seu favor. Uma proposição com 90% de probabilidade de ser verdadeira têm 90 possibilidades de ser verdadeira para cada 10 de ser falsa. Deste modo a vantagem é de 90 para 10, ou simplificando de 9 para 1. Uma proposição com 20% de probabilidade de ser verdadeira tem 20 possibilidades de ser verdadeira contra 80 de ser falsa. A chance (a seu favor) é de 20 para 80 ou 0,25 para 1. É mais natural traduzir o último caso em chance de 4 para 1 contra a proposição, mas os cálculos exigem que trabalhemos com as chances "a favor de" uma proposição, mesmo que elas sejam fracionárias. 

Peças de evidência alteram as chances a favor de uma proposição por um fator multiplicativo proporcional a qualidade da evidência. Um boa fonte de evidência pode multiplicar as chances por 200. Uma capciosa, talvez, por 10. Um resultado negativo pode reduzir as chances em 10 vezes. Então, vamos dizer que minha fonte segura é boa o suficiente de modo que seu apoio a uma proposição aumenta sua chance em 100 vezes. Isto aumentaria a chance de que o veto se realizou de, digamos, 50-50 (chance de 1-1) para 100-1 à favor. 

Por outro lado, a probabilidade de que Newt pudesse mudar de partido é muito pequena, talvez 1 em 10.000 (Coisas estranhas acontecem!) Isto é chance de cerca de 0,0001 por 1 à favor. Após minha fonte fazer esta alegação, as chances aumentam para 0,01 por 1 à favor. Isto ainda é cerca de 100 por 1 contra sua veracidade. 

Assim a evidência proporcionada por meu vizinho tinha tido o mesmo efeito em cada um dos casos, mas a conclusão é diferente por causa das diferentes probabilidades a priori

Considerações Práticas

O princípio é claro, a dificuldade reside na aplicação. Qual a probabilidade, por exemplo, de que a homeopatia ou o toque terapêutico realmente funcionem? Os proponentes argumentam que precisamos abrir nossas mentes para novas possibilidades e conceder a estes sistemas uma probabilidade a priori maior e mais justa  (digamos, chance de 50-50). Então, mesmo evidências de qualidades modestas tornariam as alegações muito provavelmente verdadeiras. Os céticos argumentam que estes sistemas violam leis conhecidas da física e sua validade deveria por este motivo ser considerada como praticamente improvável. 

Uma alternativa que tenho ouvido sugere que seja abolido o argumento da prova extraordinária e no lugar aceitar as alegações paranormais e da medicina alternativa estritamente às exigências comuns de replicabilidade e boa pesquisa. Esta abordagem soa sensível mas tem uma falha grave. Os céticos não estão inclinados a aceitar a plausibilidade da maioria das alegações paranormais a menos que a evidência seja extremamente forte. Se corremos o risco de sermos compreendidos (corretamente) como dissimulados ao exigir pesquisas de qualidade sólida, então a reversão ao argumento das alegações extraordinárias deveria na verdade surgir. 

Em algumas áreas da investigação paranormal, como a percepção extrassensorial (ESP), a pesquisa já é freqüentemente melhor realizada do que muitas pesquisas científicas ortodoxas, com controles e dupla-verificação que muitos cientistas poderiam considerar como excessivo. Os céticos na maioria das vezes ainda consideram que a implausibilidade intrínseca é tão grande que nada desprovido de pesquisas bem repetidas e incontestáveis seria suficiente para sustentar a ESP. Poucas ou nenhuma das pesquisas existentes chegaram a este nível, assim permanecemos céticos. (Alguns trabalhos recentes tem sido de alta qualidade, veja o artigo de Ray Hyman, "The Evidence for Psychic Functioning: Claims vs. Reality", na edição de março/abril de 1996 da Skeptical Inquirer, pág 24-26.) Os céticos tinham dito a uns 40 anos atrás que tudo o que queríamos eram pesquisas replicáveis de qualidade aceitável, podemos agora ter que engolir nossas próprias palavras. 

A lógica do argumento das alegações extraordinárias é independente da possibilidade de trapaça pelos proponentes do paranormal. Muitas alegações paranormais tem uma probabilidade a priori muito pequena. Isto significa que vieses potenciais e falhas de pesquisa são mais plausíveis como explicações para os resultados pró-paranormal do que a veracidade das alegações. O argumento ainda seria válido mesmo que a trapaça, uma possível explicação, fosse completamente excluída. Em situações onde a fraude é especialmente freqüente, como um indivíduo se auto-promovendo como médium, não precisamos do argumento das alegações extraordinárias para exigir controles firmes contra a trapaça. Cuidados usuais e senso comum bastam para produzir advertências acuradas e esmeradas.  

Conclusão

A linha cética, "Alegações extraordinárias exigem provas extraordinárias," é justificável no terreno das probabilidades, mas a dificuldade de determinar probabilidades a priori é um inconveniente sério. Isto pode impedir a comunicação com os não-céticos a menos que eles estejam dispostos a adotar nossos padrões estritos de modo a conseguirem aceitação geral. Um padrão estrito mas não "extraordinário" de boa ciência e replicabilidade comuns é arriscado porque a maioria dos céticos na verdade não acreditariam nas alegações paranormais típicas se a evidência fosse proporcionada neste nível. 

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Este artigo apareceu pela primeira vez na edição de dezembro de 1998 da Phactum, o boletim da Philadelphia Association for Critical Thinking (PhACT). O Dr.Gracely é Professor Associado de Medicina Preventiva e Comunitária na MCP*Hahnemann School of Medicine na Filadélfia.

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