No
final dos anos 60, duas publica��es disputavam os leitores
interessados em not�cias - e fofocas - sobre televis�o:
"Intervalo", da Editora Abril, e "S�o Paulo na TV",
da Editora Propaganda. As duas publicavam em suas p�ginas um guia
semanal de programa��o com os hor�rios de todos os programas. Na
�poca, as pessoas referiam-se �s emissoras por meio de sua posi��o
no seletor. A Tupi era o "canal 4", a TV Paulista (Globo) era
o "canal 5", a Record era o "canal 7" e assim por
diante. O p�blico paulistano, em 1967, tinha seis canais �
disposi��o: 2, 4, 5, 7, 9 e 13 - respectivamente, Cultura, Tupi,
Paulista, Record, Excelsior e Bandeirantes.
Em
janeiro de 1968, a programa��o do Canal 2 n�o estava mais
dispon�vel. Na revista "S�o Paulo na TV", o espa�o a ela
destinado passou a trazer as palavras "Futura TV Educativa". A
observa��o passou a constar do roteiro da publica��o a partir do
momento em que foram encerradas as transmiss�es da antiga TV Cultura,
considerada a "irm� ca�ula" da TV Tupi no conglomerado de
empresas de comunica��o dos Di�rios Associados. E l� ficaram, at�
1969, as palavras que indicavam ao telespectador de S�o Paulo que
futuramente ele teria mais uma alternativa em seu seletor de canais. A
novidade: seria uma emissora p�blica - e muito mais do que a "TV
Educativa" anunciada.
O
surgimento de canais voltados � educa��o e � cultura tinha o
respaldo do Governo Federal, que em 1967 havia criado a Funda��o
Centro Brasileiro de TV Educativa, com o objetivo de estimular e dar
apoio �s emissoras culturais estaduais. Desde o in�cio, a entidade
reservava um papel importante ao futuro canal educativo paulista:
superior em recursos - 12,5 milh�es de cruzeiros novos para o ano de 69
-, deveria fornecer programas em videotape para os outros Estados. O
potencial de emissoras dessa natureza j� havia sido demonstrado pela
pioneira TV-U, Canal 11, de Recife. Criada em novembro de 1966 e mantida
pela Universidade de Pernambuco, em poucos meses apresentava expressivos
�ndices de audi�ncia com seus programas educativos e de teatro.
A
Funda��o Padre Anchieta
Para
viabilizar e manter a nova TV2 Cultura, o Governo de S�o Paulo criou,
em setembro de 1967, a Funda��o Padre Anchieta - Centro Paulista de
R�dio e Televis�o Educativas, com dota��o do Estado e autonomia
administrativa. Institu�da e mantida pelo poder p�blico, nascia com o
estatuto de entidade de direito privado, para ter seu rumo desvinculado
das vontades pol�ticas dos sucessivos governos estaduais. Esse
fundamento fazia parte da concep��o de TV p�blica idealizada pelo
ent�o governador Roberto de Abreu Sodr�.
A
constitui��o da Funda��o Padre Anchieta seguiu as diretrizes da Lei
Estadual n� 9849, de 26 de setembro de 1967, que autorizou o Poder
Executivo a formar uma entidade destinada a promover atividades
educativas e culturais por meio do r�dio e da televis�o. Foi
autorizada tamb�m a abertura de um cr�dito de 1 milh�o de cruzeiros
novos para o empreendimento. Al�m da dota��o inicial, estavam
previstos outros recursos, como receitas originadas de aplica��es dos
bens patrimoniais. Entre esses bens figurava o Solar F�bio Prado, na
avenida brigadeiro Faria Lima, doado pela sra. Renata Crespi e que hoje
abriga o Museu da Casa Brasileira.
Logo
ap�s a cria��o da Funda��o, seu primeiro presidente, o banqueiro
Jos� Bonif�cio Coutinho Nogueira, tratou de buscar profissionais para
dar in�cio a execu��o do projeto da nova TV Cultura. Por meio de
consultas e indica��es de amigos do mundo art�stico, como o ent�o
diretor do Teatro Cultura Art�stica, Alberto Soares de Almeida - que
sugeriu os nomes de Cl�udio Petraglia e Carlos Vergueiro -,
Bonif�cio chegou aos nomes que viriam a participar das reuni�es de
planejamento e fariam parte da primeira diretoria da emissora: o
brigadeiro S�rgio Sobral de Oliveira, assessor administrativo; Carlos
Sarmento, assessor de planejamento; Carlos Vergueiro, assessor
art�stico; Cl�udio Petraglia, assessor cultural; Antonio Soares Amora,
assessor de ensino; e Miguel Cipolla , assessor t�cnico. O radialista
Fernando Vieira de Mello se juntaria ao grupo, ainda que por pouco
tempo, como assessor de produ��o. V�rios desses profissionais traziam
experi�ncia de outros ve�culos - Petraglia tinha no curr�culo v�rios
cursos e est�gios no exterior e uma passagem significativa pela TV
Paulista; Cipolla havia trabalhado na TV Excelsior; Vergueiro era
diretor da R�dio Eldorado; e Vieira de Mello atuava na R�dio Pan
Americana, a Jovem Pan.
Carlos
Vergueiro
|
Cl�udio
Petraglia
|
Antonio
Soares Amora
|
Nos
primeiros meses, a Funda��o Padre Anchieta tinha dois endere�os. As
reuni�es de planejamento aconteciam nos escrit�rios da avenida
Ipiranga, regi�o central de S�o Paulo, enquanto alguns setores
administrativos j� operavam no local que abrigaria a sede definitiva da
TV Cultura, � rua Carlos Spera, 179, no bairro da �gua Branca, zona
oeste da capital. Neste �ltimo endere�o existiam dois est�dios, um
pequeno pr�dio utilizado pela administra��o, uma lanchonete, outro
pr�dio t�rreo onde funcionavam a R�dio Cultura AM e o almoxarifado
geral, al�m de uma pequena casinha ao fundo, onde morava o zelador
N�lson Niciolli. Era este o patrim�nio inicial da nova TV Cultura.
Funcion�rios mais antigos ainda lembram do per�odo em que essa
estrutura servia aos Di�rios Associados.
"Aqui tinha uma grande lona, como num
circo, onde o S�lvio Santos vinha fazer seu programa aos domingos. A
gente atendia telefonemas e sa�a para dar os recados, porque n�o havia
esse sistema de comunica��o eficiente como o de hoje. Ali�s, as ruas
de acesso n�o eram asfaltadas e n�o havia condu��o. Era tudo barro,
ent�o n�s t�nhamos que vir com mais um par de sapatos e troc�-lo
aqui."
Marly Therezinha Ribeiro, recepcionista e telefonista em 1966. Em
1999, supervisora administrativa da Ger�ncia Operacional da TV Cultura.
A
constru��o
As
primeiras obras de amplia��o da emissora foram realizadas em 1968, com
a constru��o de um pr�dio de dois andares para abrigar a diretoria, o
Conselho de Curadores e a produ��o, de uma nova sede para a R�dio
Cultura e um anexo para abrigar o setor de opera��es. Paralelamente, a
equipe inicial reunida pelo presidente da Funda��o elaborava um
cronograma de trabalho para colocar o canal no ar no ano seguinte.
No
destaque, a constru��o da
sede invadindo regi�o alagada
|
Em
1971, obra conclu�da e
contornos j� aterrados
|
No
segundo semestre de 68, come�aram a ser contratados os profissionais de
TV que dariam o 'start' da programa��o. Ao mesmo tempo, cuidava-se da
aquisi��o de equipamentos - os mais modernos do mercado - e a
concep��o visual da emissora. O logotipo do canal surgiu nas
pranchetas do escrit�rio dos designers Jo�o Carlos Cauduro e Ludovico
Martino. Chamado internamente de "bonequinho", foi concebido
para ter varia��es conforme a utiliza��o. A primeira vinheta
musical, que j� utilizava o bonequinho, foi composta por Camargo
Guarnieri e gravada no est�dio da RGE-Scatena.
Na �poca - e j�
avan�ando em 69 -, aconteceram os testes t�cnicos e de produ��o nos
est�dios da Escola de Comunica��es e Artes da USP, no Antigo Pr�dio
da Reitoria. Curiosamente, a fase de testes era acompanhada por alunos
de R�dio e TV da ECA que, formados nos anos seguintes, viriam a se
juntar aos pioneiros da nova emissora, j� como profissionais.
"No
per�odo de implanta��o, chegamos � id�ia b�sica de TV p�blica e
n�o TV instrutiva. Elaborei um dec�logo contendo os itens fundamentais
de uma 'public TV'. N�s t�nhamos de ter audi�ncia ao mesmo tempo em
que precis�vamos abrir espa�o para programas experimentais. Em seu
conjunto, os programas teriam de atender a todos os segmentos. Se n�o
tivesse existido esse conceito de televis�o p�blica, acho que a TV
Cultura teria fracassado, n�o teria feito a carreira que vem fazendo
at� agora. Hoje, ela � uma televis�o cultural."
Cl�udio Petraglia, assessor cultural da TV Cultura at� 1971. Em
1999, diretor regional da Rede Bandeirantes de Televis�o no Rio de
Janeiro.
O
projeto t�cnico
Se o
perfil de programa��o do novo canal estava tra�ado, era necess�rio
viabiliz�-lo tecnicamente. Durante todo o ano de 68, o assessor
t�cnico Miguel Cipolla, em conjunto com o assessor de planejamento,
Carlos Sarmento, elaborou um projeto t�cnico que possibilitava a
capta��o do sinal da emissora num raio de 150 quil�metros em torno de
S�o Paulo. A primeira provid�ncia foi a mudan�a da antena do alto do
pr�dio do Banco do Estado de S�o Paulo, no centro da cidade, para o
pico do Jaragu�, na zona oeste.
O
passo seguinte foi a reinstala��o dos est�dios, com a aquisi��o de
novos equipamentos. A empresa vencedora da concorr�ncia foi a RCA, que
forneceu todas as m�quinas, com exce��o das c�meras - a emissora
optou pelas modernas Mark V, da Marconi, s� encontradas nos est�dios
da BBC de Londres.
Durante
o processo de compra e implanta��o, a equipe ganhou o refor�o do
engenheiro Ren� Xavier dos Santos, que havia participado da
instala��o da TV Globo no Rio de Janeiro. A exemplo de Cipolla, Xavier
era formado no Instituto de Tecnologia da Aeron�utica, de S�o Jos�
dos Campos.
|