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CHICO ANYSIO
Copa, sim, mas... e a cozinha?
RIO DE JANEIRO (RJ) -
… E então, depois de 64 anos, teremos uma Copa do Mundo no
Brasil.
O povo ficou feliz, os atletas ficaram contentíssimos, o presidente ficou
deslumbrado, porque as contas não serão pagas por ele, mas pelo seu sucessor, os
dirigentes caindo de alegria e parece que só eu fiquei cabreiro.
Esperem. Esperem. Não me entreguem ainda ao Capitão Nascimento; primeiro deixa
eu me explicar, porque a minha cabreirice – pelo menos na minha opinião, tem
tudo a ver.
Todos usam como prova de que a Copa dará certo, o fato de o Pan Americano ter
dado, mas uma coisa é uma coisa e outra coisa "is another thing".
O Pan foi disputado pelo Brasil, Cuba, Canadá e coadjuvantes. Temos que nos
lembrar de algo importantíssimo: em todos os eventos, havia, no final, a
participação do Brasil. Deu público em todos eles e a coisa funcionou
admiravelmente. O Brasil ganhou tanta medalha que os atletas chegaram a
perguntar se depois do evento poderiam continuar falando português ou teriam que
passar a falar inglês.
Duzentas e tantas medalhas é um feito porreta demais para o nosso Brasilzinho
que, por exemplo, na Olimpíada ganha um pequeno dígito em ouro, outro mais ou
menos em prata e, com muita sorte, dois em bronze.
A Copa do Mundo é o segundo maior evento mundial do futebol. (O primeiro é a
Copa da Europa que, para ser perfeito, teria que ter a participação de Argentina
e Brasil e aí, sim, ali estariam os melhores mesmo).
O que me deixa cabreiro – para voltar ao assunto, é haver num mesmo dia e no
mesmo horário: Brasil x Portugal em Belo Horizonte e na TV para o resto do país:
Alemanha x Iran em Curitiba; Inglaterra x Costa Rica em Recife; França x
Trinidad e Tobago em Porto Alegre, Polônia x Turquia Campo Grande e Escócia X
Estados Unidos na Fonte Nova. Imaginem se, no mesmo horário, eles (os baianos,
aborrecidos porque o beque no Vitória não foi convocado) coloquem – só para
sacanear, como já fizeram quando um dia um atacante do Bahia não foi chamado –
Bahia x Vitória no Barradão. Onde terá mais público? E as platéias dos jogos
acima citados, sem o Brasil e com o Brasil na TV? Há quem argumente que o país
se encherá de turistas e eles irão formar as platéias dos jogos. Se isto
acontecer de fato, teremos que mandar construir, além dos 16 estádios, 16.000
novos hotéis, porque vai ser turista pra ninguém botar defeito. Uma coisa tipo
55 mil iranianos em Curitiba, 48 mil costariquenhos em Recife, 97 mil franceses
em Porto Alegre e assim por diante, fazendo um total de uns dois milhões de
turistas freqüentadores de estádio, porque muitos virão só para passear a
assistir pela TV, nos seus hotéis, aos jogos dos seus paises.
Como é que ficamos? Ainda desejam me atirar aos cuidados da Tropa de Elite ou
preferem pedir um cafezinho e fazer umas contas, pensar um pouco na realidade?
A Copa da Europa dá público em todos os jogos, porque a Europa inteira é menor
do que o Brasil e todos por lá têm euros suficientes para ir da Istambul a
Londres ver o jogo da sua seleção e, na mesma noite, voltar para casa. Os jogos
são lá dentro da Europa, onde, além da facilidade de vôos, as estradas são
maravilhosas e os trens são fantásticos.
A Copa de 2014 ser na Brasil só tem, no meu modo de ver, um problema grande: no
Brasil ninguém se interessa pelo jogo de ninguém, a não ser o da seleção
canarinho. Mas os outros 31 países virão e jogarão principalmente entre eles.
Sei, não. Tomara que eu esteja enganado e todos os estádios lotem, como lotaram
os da Alemanha, mas eu acho que platéia para os jogos é um grilo maior do que
aquele falante, do Pinóquio.
Artigo publicado originalmente no
Blog do Chico Anysio
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Francisco Anysio Oliveira Paula Filho,
o Chico Anysio, é ator, humorista e
diretor teatral
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SEXTA-FEIRA
16/11/2007
Francisco Anysio
Oliveira Paula
Filho, o Chico
Anysio, é ator,
humorista e
diretor teatral
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