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ÉRIKA BENTO GONÇALVES
O que fazer com as bandeiras?
Pronto. Aconteceu o que
a maioria dos brasilieros não queria. O Brasil está fora da Copa do Mundo. Para
empurrar a nossa seleção rumo ao hexa, vestiram o verde e amarelo, penduraram
bandeiras nas janelas de suas casas, nos prédios comerciais e até nas antenas
dos carros! Tudo isso, claro, para a alegria do comércio formal e informal.
O brasiliero viu o sonho do hexa desaparecer nos pés de Zidane (que, às vésperas
de dizer adeus aos gramados, deu um show de determinação e técnica, coisa que
nenhum dos jogadores da seleção demonstrou) seguido de um toque preciso de
Thierry Henry. O um a zero calou a torcida brasileira, derramou lágrimas por
todo o país e obrigou o brasileiro a repensar o sonho do hexa.
O que eu quero saber agora é: será que este povo, que exibiu uma exacerbada
paixão pelo país, continuará com o delírio patriótico nos dias seguintes à
derrota na Alemanha? Para onde vão as toneladas de bandeiras espalhadas pelo
país?
Antes de colocá-las no fundo de uma gaveta ou, para aqueles fanáticos
decepcionados que pensam em jogá-las no lixo, apresento algumas sugestões. Que
tal usar este mesmo patriotismo para acompanhar as eleições deste ano? Que tal
usar a bandeira para lembrar-se de que se vive neste país durante todos os meses
do ano, por décadas e décadas a fio, e não apenas de quatro em quatro anos? Ou,
talvez, manter a tradição de ficar à frente da tv, mas desta vez, para
acompanhar uma votação na CâmaraFederal ou no Senado (depois do recesso)? E quem
sabe até, juntar-se aos milhares que clamam por justiça num país onde o poder
judiciário se vende por um reajuste salarial, mesmo que contrário à lei
eleitoral.
Ah, mas isso tudo é muito chato, não é? É diferente de torcer pelo país durante
uma partida de futebol. Nada disso que sugeri é divertido, reúne amigos e
parentes para um churrasco ou uma cervejada. Nada disso lhe proporciona ser
dispensado mais cedo do trabalho.
É verdade. O futebol é a alegria que a política não oferece. Pela seleção
brasileira, vale a pena qualquer coisa.
Porém, enquanto você lê este artigo e amarga comentários sobre a Copa ainda por
semanas seguidas e tenta reerguer a cabeça, muitos dos "nossos" heróis, nem
sentirão o peso deste sonho não realizado. Eles, talvez, nem passarão pela
terrinha tupiniquim, já que,
dos vinte e três convocados, somente três jogam em clubes
brasileiros.
Pois é. Enquanto milhões ainda pensam no que fazer com as bandeiras, vinte dos
"nossos" ex-futuros hexa campeões voltarão para suas vidas milionárias, em solo
etrangeiro, à espera de 2010. Quem sabe a CBF paga novamente o salário deles
para um turismo luxuoso na África do Sul, sede da próxima Copa?
Em resumo, não vejo tanta diferença assim entre política e futebol. Enquanto
milhões esperam que eles apenas façam o trabalho pelo qual são muito bem pagos,
eles, no final das contas, ficam com os lucros e nós, com as decepções.
PS: vale a pena lembrar que os "nossos" jogadores devem tirar agora alguns dias
de férias antes de voltarem aos clubes, porque lá, assim como cá, o futebol pára
até o final da Copa do Mundo.
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Érika Bento Gonçalves. Jornalista, começou a carreira em 1994, em
Poços de Caldas, sul de Minas Gerais. Passou de repórter a apresentadora e
editora-chefe da emissora de televisão regional, Tv Poços. Em dez anos de
trabalho em Minas atuou também nas áreas de marketing e jornalismo político.
Foi coordenadora dos programas de televisão em duas campanhas políticas. Há
três anos trabalha na Rede Record.
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SEGUNDA
03/07/2006
Érika Bento
Gonçalves é
jornalista da
Rede Record
de Televisão
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