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A bobine de
Ruhmkorff não foi inventada por Ruhmkorff, mas tomou o seu nome pelos êxitos
que este teve na fabricação de bobines de indução. Durante as
primeiras incursões nos domínios da eletricidade, esta não tinha qualquer
utilidade para além da diversão. Primeiro, os corpos eletrizados por frição
permitiam atrair objetos leves, o que foi utilizado na eletrização de pessoas
em demonstrações públicas, utilizando-se para o efeito as primeiras máquinas
eletrostáticas por frição. Estas máquinas permitiam armazenar eletricidade na
garrafa
de Leyden,
entretanto descoberta. Com esta garrafa tornou-se mais fácil eletrizar
pessoas e produzir-lhes choques elétricos verdadeiramente sensíveis. Houve
quem pensasse em aplicar esta inovação para tratar certas doenças através de choques elétricos.
Os choques produzidos com a garrafa de Leyden eram muito violentos, pelo que
o padre Nollet, experimentador entusiasta da eletricidade, fez experiências
com animais, acabando por provocar a morte de um pardal com um choque
elétrico. Apesar disso, a terapia dos choques elétricos continuou a ser
experimentada. Mais tarde,
em 1832, o professor universitário americano Joseph Henry fazia experiências
com um circuito elétrico constituído por várias pilhas elétricas ligadas em
série, por dois fios com vários metros de comprimento (ligados cada um a um
dos pólos da bateria de pilhas) e por um recipiente com mercúrio (metal
líquido condutor). Para fechar o circuito e fazer passar a corrente elétrica,
Henry mergulhava as duas extremidades livres dos condutores no mercúrio. Ao
retirar o fio do mercúrio, Henry observou que se formava uma faísca entre o
fio e o mercúrio (ver figura seguinte). Aparentemente, a interrupção da
corrente não era instantânea, manifestando a corrente uma espécie de inércia
pelo aparecimento de outra corrente a que chamou extra-corrente de rutura.
Henry realizou novas experiências e verificou que as faíscas eram mais intensas
aumentando o comprimento do fio, enrolando o fio em espiras (uma espira é um
fio enrolando em forma de circunferência) e introduzindo um núcleo de ferro
no interior das espiras. Este fenómeno ficou conhecido pelo nome de indução.
Pelo fato de se formar no próprio circuito onde passava a corrente, chamou-se
auto-indução. |
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Um ano antes,
o físico inglês Michael Faraday fizera uma experiência com um anel de ferro em torno do qual
enrolou fio em duas bobines separadas. Ligou uma das bobines a uma pilha
(circuito primário). Ao ligar, observou num aparelho de medida ligado à outra
bobine (circuito secundário) que a agulha do aparelho se desviava, indicando
a passagem de corrente. Ao desligar a pilha do primário, observou que a
agulha no circuito secundário se desviava em sentido contrário ao inicial. Só
houve desvio da agulha ao ligar e ao desligar. Este fenómeno de indução é da
mesma natureza do verificado por Henry. Como se verifica entre duas bobines
separadas chama-se indução mútua. A experiência realizada por Faraday
está também na base do que viria a ser o transformador, máquina usada
hoje em dia em corrente alternada. É possível
receber choques elétricos segurando as extremidades do circuito onde se
formam as faíscas e abrindo e fechando o circuito. Em 1835,
Charles Page, médico e fabricante de instrumentos científicos americano,
inventou o primeiro auto-transformador para fins medicinais (ver
figura seguinte). O aparelho era constituído por uma bobine (circuito
primário) e vários pontos desta estavam acessíveis (circuito secundário). Os
choques eram obtidos neste circuito quando o primário era aberto. |
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Foram criados
dispositivos para abrir manual ou automaticamente o circuito de forma a
produzir as faíscas. Uma forma de interrutor
manual é de uma roda com manivela. Ao rodar, uma lâmina condutora assenta
sucessivamente sobre uma parte condutora e sobre outra parte não condutora.
Estas partes encontram-se distribuídas em quantidade pela periferia da roda.
As partes condutoras estão ligadas à bobine. Uma forma de interrutor
automático foi adotada pelo professor irlandês de física Nicholas Callan que
utilizou com a sua bobine (auto-transformador) um mecanismo de relógio
para acionar um fio de metal mergulhado num recipiente com mercúrio e abrir
assim o circuito 3000 a 4000 vezes por minuto. O fio e o mercúrio
funcionavam como interrutor e o comando manual foi substituído pelo mecanismo
de relógio. Em 1837
Callan separou a bobine em duas, uma primário e outra secundário, aproximando
a bobine da sua forma final. Entretanto
Page introduzia melhoramentos nas suas bobines, um dos quais em 1837 foi um interrutor
eletromagnético funcionando como os circuitos hoje usados nas campainhas
elétricas. O circuito está fechado e um eletroíman atrai uma armadura. Quando
a armadura é atraída abre o circuito e o eletroíman desliga. Ao desligar
este, a armadura regressa à posição inicial e fecha de novo o circuito,
repetindo-se o processo. A parte correspondente ao martelo que bate na
câmpanula da campainha era constituída por uma haste que entrava ou saía de
um copo de mercúrio. Ao deixar de contatar com o mercúrio, abria-se o
circuito da bobine e saltava uma faísca. Outros construtores usaram o mesmo
princípio. Mais tarde,
os copos de mercúrio foram substituídos por contatos de platina e parafusos
de fixação (ver figura seguinte). A velocidade de funcionamento normal é
muito superior à mostrada na animação. |
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Na década de
40 as bobines eram praticamente apenas usadas para fins médicos. Um dos
fabricantes de instrumentos magnéticos em Londres era E.M. Clarke, em
cooperação com o engenheiro ótico Charles Chevalier. Um dos empregados deste
último era Heinrich Ruhmkorff, mecânico de precisão de origem alemã. Mais
tarde Ruhmkorff encontrar-se-á em Paris. De 1851 a
1856, Ruhmkorff melhora as bobines de forma a aumentar as faíscas produzidas
no secundário. Com ele a bobine entra no domínio da física. Ruhmkorff reduz a
seção dos fios do secundário, atingindo um comprimento do fio de cerca de 10
km, aumenta o isolamento do secundário com goma-laca e separa as camadas de
fio com seda envernizada. Enrola o secundário sobre um cilindro de vidro,
isolando-o do primário. Acrescenta um inversor de corrente para mudar o
sentido da corrente no primário. Por sugestão do físico Hippolyte Fizeau,
junta, em 1853, um capacitor de grande capacidade ao primário. Com o
capacitor reduz o desgaste dos contatos devido à diminuição da intensidade
das faíscas e do tempo de duração da indução e aproveita a extra-corrente de
ruptura para carregar o capacitor. Desta forma aumenta a tensão no secundário,
pois a corrente no primário passa a ser mais brusca., por diminuição do tempo
de duração da indução e aproveita a extra-corrente de rutura para carregar o
capacitor. Desta forma aumenta a tensão no secundário, pois a corrente no
primário passa a ser mais brusca.
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Ruhmkorff
ganhou diversos prémios desde a Exposição de Paris de 1855, o que contribuiu
para que a bobine tomasse o seu nome. Em 1877, a
bobine será utilizada pelo físico alemão Heinrich Hertz em experiências que o
conduzirão à descoberta das ondas
eletromagnéticas
propagando-se no espaço. Além disso,
nessa época é utilizada em laboratórios no estudo das faíscas e das descargas
nos gases, na produção de oscilações e ondas elétricas e, desde 1895, na
produção de raios X. Foram
construídas bobinas com cerca de 2 metros de comprimento capazes de produzir
faíscas com mais de 1 metro de comprimento. A bobina de
indução tem hoje larga aplicação para produzir as faíscas necessárias à
ignição dos motores a gasolina. A bobina de indução é, na
realidade, um transformador de corrente contínua de baixa tensão em corrente
alternada não sinusoidal de alta tensão. |
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Hertz (Cahiers de Science et
Vie)