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Poesia Romântica No período de quase meio século em que predominou entre nós a estética romântica, se destacam três gerações bastante distintas de poetas.
1. Primeira geração: os indianistas. À oposição declarada aos antigos colonizadores e ao autoritarismo do imperador durante o Primeiro Reinado seguiram-se rebeliões de forte coloração popular no período regencial. O povo brasileiro, embora constituído por diferentes etnias, está em busca de uma identidade como nação. Na Europa, entre outros, o inglês Walter Scott em Ivanhoe e o português Alexandre Herculano com Eurico, o Presbítero buscam na idade feudo-clerical a trama de seus romances históricos. Em nosso país, no tempo que corresponde à Idade Média, fizeram história as culturas indígenas. Assim, era de se esperar que os cavaleiros e os castelos europeus fossem substituídos, em nossa literatura, por aborígenes e matas tropicais. A visão romântica do índio como herói da nação brasileira em formação estava longe de corresponder à marginalização da qual viviam as nações indígenas. A nossa primeira geração de românticos, com destaque para Gonçalves Dias, idealizou o índio, ficando conhecida por isso como indianista.
2. Segunda geração: os ultra-românticos. A influência dos autores ingleses e franceses, especialmente de Byron e de Musset se divulgou entre os estudantes de direito da época, sobressaindo os do Largo São Francisco em São Paulo. No rastro de Byron, os autores dessa fase deixaram-se impregnar pelo chamado mal do século: eram boêmios, egocêntricos e pessimistas, cheios de desilusões e dúvidas. Viviam intensamente. Sonhavam muito. Às vezes se viam até rezando. Geralmente ironizavam a vida. Morriam cedo. A esta segunda geração costumamos chamar ultra-romântica. Sobressaíram nela: Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Fagundes Varela, Junqueira Freire e Laurindo Rabelo.
3. Terceira geração: os condoreiros. Sob a influência de Victor Hugo, romancista social e humanitário da França, quando começa a decadência do Segundo Reinado e do regime monárquico, aparecem escritores com preocupações sociais e políticas. O sentimento patriótico, os temas sociais, em especial a abolição, marcam a poesia do século XIX. Ao negativismo da segunda geração de românticos brasileiros segue-se uma produção literária cheia de luz e otimismo, cujos autores escolheram o condor como símbolo libertário. Altos vôos eram seu ideal. Essa terceira geração de poetas românticos tem em Castro Alves, Tobias Barreto e Sousândrade seu maiores representantes...
1. Indianistas O romantismo brasileiro começou pela poesia. Os caracteres românticos europeus transplantados para o Brasil fizeram surgir um enorme orgulho pela variante brasileira da língua portuguesa. Com a poética romântica nasceu, pois, o desejo de nacionalizar as artes, a literatura em especial, pretendendo que à independência política se seguisse a independência cultural. Na apresentação dos poetas, seguiremos a ordem em que as gerações românticas surgiram, conforme foi descrito no capítulo anterior. Aqui trataremos apenas dos poetas indianistas: Domingos José Gonçalves de Magalhães (1811-1882) teve o grande mérito de ser o lançador do movimento no Brasil. Foi ele o autor do manifesto romântico. Suspiros Poéticos e Saudades e A Confederação dos Tamoios são suas principais composições. Não conseguiu, entretanto, se desfazer das influências neoclássicas que ele mesmo havia atacado com tanta convicção. Eis como Magalhães se expressa no ideário do Romantismo com que faz a apresentação de sua obra: "Seja qual for o lugar em que se ache o poeta, ou apunhalado pelas dores, ou ao lado de sua bela, embalado pelos prazeres; no cárcere, como no palácio; na paz, como sobre o campo da batalha; se ele é verdadeiro poeta, jamais deve esquecer-se de sua missão, e acha sempre o segredo de encantar os sentidos, vibrar as cordas do coração, e levar o pensamento nas asas da harmonia até às idéias arquétipas". (Gonçalves de Magalhães) Antônio Gonçalves Dias nos deixou, através do indianismo, sua contribuição mais autêntica. Seus assuntos são o índio, a natureza e o amor. Mestiço, buscou o convívio com os indígenas, com a intenção de conhecer melhor os povos que lhe serviam de tema e dos quais descendia. Mesmo assim, é o índio-ficção, recriado, quem aparece em sua poética. Descreveu nossa natureza, interferindo e modificando, provocando em nós o espanto diante da imensidão e exuberância da selva brasileira. Um amor carregado de sentimentalismo e de sofrimento, torturado pela falta de correspondência e de esperança, é o que vemos em sua lírica amorosa. Não conseguiu terminar seu poema épico Os Timbiras. Entre suas peças de teatro, sobressai Leonor de Mendonça. Mas é na lírica que ele se impõe com toda a pujança. Ao apresentar Primeiros Cantos, confessa, feliz: "Dei o nome de Primeiros Cantos às poesias que agora publico, porque espero que não serão as últimas... Escrevi-as para mim, e não para os outros; contentar-me-ei, se agradarem; e se não... é sempre certo que tive o prazer de as ter escrito". E como agradaram! Na segunda edição podemos ler a integra de um artigo Futuro literário de Portugal e do Brasil, escrito pelo famoso Alexandre Herculano! Nela figuram conhecidos poemas seus, como Canção do exílio, O canto do guerreiro, O canto do piaga, A leviana, Seus olhos... e mais 50 outros poemas aos quais Herculano se referiu como "inspirações de um grande poeta". E Gonçalves Dias tinha apenas 23 anos de idade! Novos Cantos (Segundos Cantos, na edição Saraiva de 1957) e Últimos Cantos são a coroação de um início grandioso. Neles estão suas linhas mais inspiradas: Ainda uma vez - Adeus!, Se morre de amor!, I-Juca-Pirama, Canção do Tamoio. Há poemas autobiográficos em meio a peças de arte pura: Quadras de minha vida é a principal delas. Leia alguns fragmentos apenas:
O refrão "Houve tempo..." é retomado quatro vezes, mostrando toda a esperança de amar e ser amado que palpitava em seu jovem coração. A cada um deles seguem versos melancólicos e sem esperança, culminando no desejo da morte:
O que conta em sua obra é mais a valorização do nativo e da natureza tropical, cujo exotismo era por demais evidente para quem, como ele, conhecia a fundo a Europa. Sua poética focaliza a formação da nação brasileira. É, em tudo o que escreveu, o poeta perfeito. O poema I-Juca-Pirama conta a história de um índio tupi, cuja tribo havia sido dizimada, sobrando apenas ele e o pai cego a quem servia de guia. Saindo para caçar, cai prisioneiro dos Timbiras e vai ser sacrificado. No seu canto de morte, pede que seja solto, pois é o único arrimo de seu velho pai. Promete voltar e se entregar aos que o aprisionaram. O cacique manda soltá-lo. Após algum tempo, o valente tupi volta, junto com seu pai. O velho tupi oferece o jovem guerreiro aos Timbiras, para o sacrifício final. O cacique timbira rejeita a oferta, por considerá-lo alguém que chorou em presença da morte. No final do poema, o guerreiro tupi consegue provar sua coragem enfrentando os guerreiros timbiras sozinho e provando que era digno de morrer em sacrifício. Leia estes versos de Gonçalves Dias, que constituem a parte IV do seu poema I-Juca-Pirama (forma verbal tupi: o que há de ser morto). A este trecho, podemos chamar:
Regressando de Portugal em 1845, Gonçalves Dias conhece Ana Amélia Ferreira do Vale, por quem se apaixona. Os pais dela impedem o casamento, por ser ele filho de uma mestiça. Esse amor contrariado trouxe uma nota de extrema sensibilidade e emoção à sua lírica amorosa, como se pode ver neste poema que ela lhe inspirou de que seguem as dez primeiras estrofes:
Byronianos O segundo momento romântico se modela em Byron e Musset. Lord Byron (1788-1824), nobre e aventureiro ao mesmo tempo - coisa incomum na Inglaterra vitoriana - se identificou com suas personagens: boêmio, idealista, extravagante e rebelde, não se limitou a escrever; participou efetivamente de lutas nacionalistas na Itália e na Grécia, onde morreu em conseqüência da guerra. Deixou-nos obras cheias de conflitos, impetuosas, violentas como seu temperamento e sua própria vida. Seu espírito satírico e incomparável. Alfred de Musset (1810-1858) é o gênio romântico que, ao falar de sua vida amorosa, caracteriza a quantos sofrem de amor. Seu passado imediato - a França arrasada pela Revolução e pelas lutas que ela ocasionou - fazia antever um futuro incerto. O ceticismo e o deboche plasmaram a sua alma sensível de artista da palavra. Amar e sofrer foi sua vida. E também sua obra, repassada de paixão, sensualidade e ironia. Em A Confissão de um Filho do Século, pinta o mal de que sua geração sofreu. Inspirados pela realidade histórica, conflitante também no Brasil, e pelos seus ídolos europeus, muitos jovens intelectuais brasileiros resolveram encerar a vida como algo passageiro. Tempo breve que devia ser intensamente vivido. De um modo bem individualista, para dele se tirar o máximo. Dessa geração nasceram peças literárias que também correspondiam ao estilo de fida ultra-romântico que seus autores abraçaram. Seus temas são o amor e a morte, a dúvida e o tédio, a tristeza e a angústia diante da vida que levavam, comparada à que desejavam ter. Esse conjunto todo ficou conhecido como mal do século. Sua conseqüência era a excessiva boêmia, evasão que provocava geralmente um suicídio lento pela bebida e pela tuberculose. Álvares de Azevedo é o maior nesse grupo de poetas. Lira dos Vinte Anos nos revela um jovem triste que sonha com um amor que tarda em se realizar. Além disso, nem tem esperança que chegue a acontecer, pois o poeta pressente que morrerá cedo. Esse sentimento está gritante em Lembrança dos quinze anos e no soneto Perdoa-me, visão dos meus amores. Um lado menos pessimista e não menos lírico de sua obra são os versos que revelam seu profundo apego à família. Está bem claro em A minha mãe e no soneto Oh! Páginas da vida que eu amava. Poema do frade, precedido de longo tratado sobre o belo e a poesia, é sua segunda coletânea de pequenas e grandes obras-primas. Fez ainda Macário para o teatro, e em prosa escreveu o livro de contos Noites na Taverna.
Fagundes Varela, além de acadêmico nos dois centros propulsores do byronismo de então - São Paulo e Recife - refugiava-se no interior para melhor viver sua evasão. Após o golpe da morte do filho, entregou-se ainda mais ao alcoolismo. Sua produção é vasta: Noturnas, O Estandarte Auriverde, Pensão, Livro das Sombras, Cantos Meridionais, Anchieta ou O Evangelho nas Selvas, Cantos do Ermo e da Cidade, Cantos Religiosos, Diário de Lázaro... Ressaltamos Cântico do calvário, no Livro das Sombras, que ele dedica ao filho. Sua religiosidade, aqui, é notória, bem como em grande parte de sua produção. O tema de escravidão igualmente está presente em vários de seus poemas, o que também ocorre com a natureza, escolhida para se evadir. O cântico do calvário, dedicado ao filho morto pouco depois do nascimento, é uma de suas poesias mais apreciadas pela intensidade do sentimento de dor que manifesta.
Casimiro de Abreu, desaparecido aos vinte um anos de idade, não chegou a se libertar das figuras da mãe e da irmã. Seu amor é todo idealizado. A criança e o adolescente, nele ainda presentes, são os autores de sua obra. Obra simples, fluente, de um lirismo saudosista de tudo o que representa a primavera da vida que ele não quer perder. Tudo parece ser feito para recitar: é direto, sem abstrações e segundas intenções. Quem não leu ainda Meus oito anos ou sua Canção do exílio? Seu livro mais marcante - Primaveras - reúne toda a sua lírica. Ele o apresenta assim: "As lágrimas correram e fiz os primeiros versos da minha primeira musa... Mais tarde, tive saudades de meu ninho de florestas e cantei... Rico ou pobre, contraditório ou não, este livro fez-se por si, naturalmente, sem esforço, e os cantos saíram conforme as circunstâncias e os lugares iam despertando".
A esta geração pertenceram também Junqueira Freire (1832-1855), outro grande poeta obcecado pela morte, Laurindo Rabelo (1826-1864) e José Bonifácio, o Moço (1827-1886). De Junqueira Freire, conservamos reflexões poéticas de grande originalidade sobre sua vida e sua formação religiosa de monge beneditino. Estão todas em Inspirações do Claustro. O desejo de morrer é uma constante nos seus versos.
Condoreiros O romântico é sempre um individualista. A sociedade, porém, mudara. Os problemas de grande parcela do povo brasileiro começaram a comover toda a sociedade, chegando a sensibilizar também os escritores. Começavam, entrelaçados, o movimento abolicionista e o republicano. A estas tendências se amolda a estética romântica. Nasce a poesia romântica social, caracterizada por uma linguagem ardente e bombástica, cheia de grandes metáforas e audazes comparações. Chamou-se condoreira a essa poesia que, numa linguagem elevada, voa alto, como o condor.
Victor Hugo, o poeta francês que cantou a humanidade, que nos ensinou a ficar do lado de quem sofre, autor de Os Miseráveis, foi o ídolo dessa geração. Foram poucos os poetas brasileiros desse período que deixaram seu nome na História. O filósofo que também fez poesia foi Tobias Barreto (1839-1889). O que todos conhecemos é Castro Alves, o extraordinário Castro Alves. Um não menor, mas tardiamente divulgado, é Sousândrade. Castro Alves, enquanto romântico, se compara apenas a Gonçalves Dias. Grande lírico, não foi menor como cantor da grande questão social na época: o abolicionismo. Seu lirismo já não sofre de todo o individualismo que caracterizou o surgimento do Romantismo e dos ultra-românticos. Mostra-se preocupado com o mundo exterior, com o povo, com sua terra. E, ao falar desses temas, não deixa de ser extremamente lírico. Seu amor, porém, já não é idealizado como o dos poetas anteriores. Tem forte carga sensual, antecipando a estética realista. Para um poeta que morreu com 24 anos, deixou-nos uma produção volumosa, esteticamente madura, com um estilo rico em figuras que empolgam o leitor. Vozes d'África e O navio negreiro são seus mais divulgados poemas abolicionistas, ambos em sua obra Os Escravos, dentro da qual alguns críticos colocam 33 poemas publicados depois da morte do poeta. Neles é patente a veia romântica de endeusamento da natureza. É nesta poesia que ele se mostra realmente condoreiro. Espumas Flutuantes e Hinos do Equador são coletâneas nascidas de amores vividos e não apenas sonhados: Idalina e Eugênia Câmara. Engajado nas lutas do momento, incluindo o fim do Império, muitas vezes declamou seus próprios poemas em teatros e praças públicas, empolgando platéias de Recife, Salvador, São Paulo e Rio. Aí conheceu Alencar e Machado, a quem apresentou sua peça Gonzaga ou A Revolução de Minas. A ela se referiu Machado elogiosamente no Correio Mercantil. Por menos que se conheça do grande poeta pré-republicano, qualquer brasileiro já se empolgou com versos como os do poema O povo ao poder:
Leia esse trecho do poema O navio negreiro, assim datado pelo autor: "São Paulo, 18 de abril de 1868. "Ele é longo, feito para empolgar. O autor o divide em seis partes: a majestade do mar, o destino dos marinheiros, o espanto com a triste cena que ocorre no navio, a descrição detalhada da violência que lá está instalada, um longo apelo a Deus para que acabe com toda essa barbárie e um grito ao Brasil que é co-autor desse crime.
Índice: Sobre o Trabalho (Apresentação,
Conclusão e Bibliografia) |
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