Bullets In Blue Sky

Tiros No Céu Azul

Capítulo 3: Tapas, corrida e readmissão.


A situação fez do corredor mais estreito do que parecia. As luzes vermelhas piscando em intervalos rápidos eram meio imperceptíveis devido às paredes claras e o ambiente já iluminado, mas criavam magistralmente um estado de emergência. O alarme fazia o mesmo com os ouvidos, pior que uma dúzia de carros de polícia em uma perseguição. Quem tentasse falar com outra pessoa naquele momento não teria sucesso - a não ser que gritasse.

Outra razão para o corredor parecer menor eram os cinco indivíduos correndo juntos. Misato, Asuka e Shinji iam na frente, acompanhados de perto por Pliskin e Goodspeed.

Os cinco entraram na Nerv e foram direto para a sala de comando. Maya, Makoto e o cabeludo Aoba, operadores do supercomputador MAGI digitavam freneticamente em seus respectivos teclados. O comandante Gendo Ikari apenas observava de sua cadeira no andar logo acima o telão com imagens da cidade já evacuada de Tóquio-3.

- O que está acontecendo afinal? - Asuka perguntou.

- Foi detectada a presença de um campo AT entrando na órbita terrestre - Aoba respondeu. - Um minuto para chegar a cidade. Sem imagens ainda.

- Mais Anjos? - Era a ruiva novamente.

- Não sabemos ainda, mas é provável... - Fuyutsuki respondeu. O velho tinha acabado de chegar na sala e respondeu do andar de cima, ao lado do comandante.

- Preparem as linhas de defesa. Quero o piloto Ikari na Unidade 00, Langley fica como reserva. - O comandante falou com sua voz calma e determinada de sempre.

- E-eu não sei se posso fazer isso... - Shinji disse de cabeça baixa.

Misato e Gendo estavam prestes a repreender o rapaz. Afinal a situação era crítica e eles precisavam da cooperação de todos já que deviam improvisar, pois só havia um Evangelion em perfeito estado. A Unidade 02 ainda estava em reparos desde a luta com os Eva Series.

Só que Asuka foi mais rápida que a major e o comandante, mas não menos compreensiva. Apesar dessa não ser a palavra certa a ser usada para uma inimaginável compreensão paterna de Gendo ao seu filho.

Deu um tapa no rosto do garoto, que caiu sentado no chão tamanha a surpresa e a força. A sala toda parou ao ver a reação dela.

- Você é idiota ou o que? Nós já estamos em desvantagem, e você quer ferrar mais ainda a situação? - O olhar de raiva dela encarou o de surpresa e medo do garoto. - Isso é mais uma daquelas crises de covardia? Ou daquelas ninguém-se-importa-comigo? Escuta aqui seu idiota, da última vez que você se recusou a entrar naquele seu boneco idiota eu quase morri. - Ela parou quando Shinji desviou o olhar dela.

- Asuka, espere, não é ass- Misato foi cortada pela própria alemã, que aumentou o tom de voz.

- Certo, eu vou então. - Ela olhou para o comandante, que assentiu.

A garota foi em direção ao hangar e enquanto os ocupantes da sala ainda estavam estáticos com a cena. Todos ali já tinham trabalhado o bastante com ela e sabiam do temperamento explosivo da piloto do Evangelion vermelho, mas aquela era a primeira vez que ela tinha realmente "explodido" na frente de todos. O único ali que não ficou parado foi Mark Goodspeed que seguiu Asuka.

- Ei vermelha! Espere por mim!

- Por que está me seguindo?

- É meu dever!

- Não dentro da Nerv, idiota. Aqui eu estou protegida.

Protegida, claro. Ele pensou com ironia, estava a três passos atrás de Asuka e tratou logo de alcançá-la. Puxou a garota pelo braço e encarou os olhos azuis dela.

- Você não vai conseguir pilotar a Unidade 00! - Ele falou demonstrando certo controle na voz, não queria alterar-se.

- Escuta aqui seu idiota... - Ela se desvencilhou do segurança. - Você não sabe como são aqueles anjos ou do que são capazes. Se eu não fizer nada agora é o fim do mundo. Aí acabou a sua vingança! - A ruiva respondeu com a voz igual a do dia no hospital. Nem que eu tenha que entrar no Eva da garota-maravilha para fazer isso...

Mark não gostava quando ela falava assim, apesar dessa ser apenas a segunda vez que presenciava a reação. Gostou menos da última parte do que ela falou: “Aí acabou a sua vingança”, isso não era bom. Asuka já estava pulando para conclusões precipitadas, o que poderia ser um incômodo mais para frente. Goodspeed pensou que logo teria de ter aquela conversa que prometeu a garota.

- Ok, mas tome cuidado então. Você não tem utilidade para mim se morrer.

- Hmpf! Seja como for! - Ela girou e correu para o hangar.

Não funcionou... Ele suspirou. Sua última frase era pra ter afetado a garota de alguma forma, ou pelo menos ter deixado Asuka um pouco confusa em relação a ele, mas aquele era um tipo de pessoa que Mark Goodspeed ainda não tinha lidado. Mas de coração garota, eu me importo contigo...

Tratou de esquecer a situação e olhou para os lados. Ninguém no corredor. Olhou para o teto então. Fitou uma das lâmpadas do teto e deu tchau pra ela. Nem se preocupou com o fato de estar sendo filmado, isso não importava, ao contrário do som, mas a captação desse estava desativada desde que botou o pé no corredor. Portanto a conversa com a ruiva não passou de um chiado para quem tivesse tentado ouvi-los naquele momento.

Ele se sentia bem mais tranqüilo tendo um operador do MAGI ao seu lado.

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Asuka se sentia mal dentro do Evangelion azul. O sentimento talvez só fosse explicado por uma palavra. Repugnância.

Era também o seu sentimento pela ex-piloto da Unidade 00. Sentia aversão toda vez que olhava para a garota de olhos vermelhos. Ela era manipulável, fazia as coisas só se fosse ordenada por alguém, em especial o Comandante Ikari. A ruiva lembrou do momento que foi apresentada a “garota-maravilha”. Estendeu a mão, não como um gesto de amizade, mas por que achou que seria conveniente.

Ela admitia agora que aquela não foi das suas melhores atitudes, começar uma amizade falsa alegando conveniência, mas quem sabe, elas poderiam vir a ser amigas apesar da possibilidade ser pequena. Só que Rei não demonstrou a receptividade esperada por Asuka. Dispensou o aperto de mão e falou que só seria amiga dela se fosse ordenada para isso. Era alguém incapaz de tomar suas próprias decisões.

E Asuka odiava isso nas pessoas.

Ela era só uma boneca! A ruiva pensou. E Asuka também odiava bonecas, mais do que tudo.

“Era” isso é uma verdade. Só que no momento mais importante da existência de Rei Ayanami, ela não fez o que foi ordenada. Não deixou Gendo Ikari controlar o Terceiro Impacto, ela escolheu Shinji para fazer isso. Pela primeira vez na vida a piloto da Unidade 00 agiu por conta própria. Claro, Asuka não sabia de nada disso, e mesmo se soubesse, provavelmente ignoraria.

O que a sua mente confusa a forçou a acreditar era que seu ódio vinha do fato de Rei ser a primeira em tudo, a principal piloto, a preferida do comandante e da agência Marduk, até na escola Rei conseguia notas melhores que Asuka mesmo aparecendo de vez em quando.

Culpa dos malditos kanjis! Para qualquer ocidental sem muito contato com a cultura oriental seria mesmo difícil aprender rapidamente os complicados Kanjis japoneses, mas isso não era desculpa para a alemã. Com 14 anos ela já estava na faculdade, era mais inteligente que o resto. Um detalhe banal como esse não deveria ser pretexto para notas baixas.

Mas ela sabia que tudo isso não passava de devaneios de sua mente, aquela voz baixa chamada consciência dizia isso para ela, porém a ruiva ainda não dava atenção a ela.

“Asuka, tente se concentrar. Não temos muito tempo!”

A voz de Misato saiu por um dos alto-falantes de dentro do Eva. Ela tentou deixar a mente livre de pensamentos e fazer o que Misato ordenou. O lugar e a situação não ajudaram. Fechou os olhos quando um líquido laranja começou a sair das laterais e do teto e só voltou a abri-los depois de ter a sensação de estar submersa, o que fazia a repugnância voltar à ruiva. Ela sentiu um cheiro desagradável de sangue. Era o LCL.

“Ativar a Unidade 00!”

Ouviu a voz da major mais uma vez. Se ela falou alguma coisa depois daquilo Asuka não sabe, apenas sentiu como se estivesse em uma montanha russa enquanto o Evangelion subia os vários níveis do complexo.

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Um feixe de luz invadiu os olhos da piloto. A porta de uma das construções fortificadas acabara de abrir e uma esteira levou o Evangelion para fora do prédio de concreto e metal. A impressão que dava a aqueles que veriam a Unidade 00 em ação depois de tanto tempo, era a de que o gigante metálico parecia pensar enquanto imóvel, com a face voltada para o solo. Poucos instantes depois o único olho dele, uma esfera vermelha perfeita, brilhou em sinal de ativação. Levantou a cabeça e fitou um brilho no céu descendo rapidamente, como um cometa ou uma estrela cadente.

“Asuka, já avistou o inimigo?”

Era a voz de Misato novamente. Desta vez tão carregada de apreensão que a jovem alemã percebeu isso mesmo em meio a tantos barulhos e a quase surdez proporcionada pelo LCL, que ainda não tinha sido recolhido como mandavam os procedimentos. O líquido servia para encher os pulmões dos pilotos protegendo-os contra impactos ou forças externas. Também era usado para melhorar a sincronia entre o Eva e seu ocupante. A última hipótese parecia a mais provável, já que era a primeira vez que tentavam a Segunda Criança na Unidade 00.

Acham que eu não sou capaz, não é? Um misto de sarcasmo e autoconfiança no pensamento.

- Contato visual com o inimigo! - Asuka respondeu.

“Pegue uma metralhadora e aguarde segunda ordem. Vamos esperar uma das câmeras visualiza-lo e fazemos um link para o seu Eva”

Era um momento crucial para a missão. Uma atitude impensada de Asuka agora poderia botar um fim na sua carreira de piloto. De novo. Misato começou a ficar realmente apreensiva.

- Ceeerto... - Asuka respondeu, agora o sarcasmo estava evidente até em sua voz. Misato estava definitivamente apreensiva.

Na sala de controle, Goodspeed tirou seus óculos e guardou no bolso, logo em seguida cruzou os braços e se aproximou de Snake, cutucou-o com o cotovelo. O outro estava olhando para Shinji e observando o lamento silencioso do garoto. O jovem estava com a mão na bochecha vermelha, cortesia de Soryu Asuka Langley. Snake viu Mark fazer um gesto com a cabeça em direção à tela gigante. Logo entendeu a atitude do companheiro. Estava na hora de ver se investiram na pessoa certa, olhou para Mark e viu um sorriso como o de uma criança que acabara de ganhar um brinquedo desejado.

Snake voltou a olhar para o jovem piloto, percebeu que ele transpirava tanto medo quanto o resto da sala. Deu uma última olhada num ocupante da sala antes de voltar a atenção para a tela. Constatou que nem todos estavam preocupados naquela sala. Gendo Ikari estava com a feição de sempre, Snake até pensou em ter visto um sorriso como o de Mark nele.

Misato olhou para a parte da tela que mostrava o cockpit da Unidade 00, alguma coisa ali a incomodou. Era ruim o bastante para a sua preocupação chegar ao ponto máximo, o que parecia impossível.

Era um sorriso surgindo na face de Soryu Asuka Langley. Só restou a Misato suspirar, fechar os olhos e balançar a cabeça negativamente. Poderia até continuar de olhos fechados, pois sabia o que ia acontecer.

O Evangelion azul, portando um lança-mísseis maior que seu braço, começou a correr como se fugindo de uma bomba ou sem destino qualquer. Só que isso ele tinha. Foi em direção ao brilho amarelo que rasgava lentamente o céu azul.

- Ela conseguiu ignorar todas as minhas ordens... - Misato comentou baixo, repetindo a palavra todas em sua mente.

A corrida pela cidade fez a ruiva relembrar da luta contra o décimo anjo, Sahaqiel, o gigante de um olho só que tentou atacar a central da Nerv agindo como um meteoro. Só que a excitação nesse momento era maior, dessa vez não conhecia o inimigo, sequer esperou o link da imagem aparecer em uma das telas do Eva. Hora de provar mais uma vez que ela era capaz de pilotar e o melhor, numa missão solo, assim como a sua luta contra os Evangelions brancos. E desta vez, sairia vitoriosa.

A Unidade 00 ultrapassou os limites da cidade no mesmo momento que o alvo parou de brilhar e pareceu tocar o chão e mesmo assim a piloto ainda não conseguia ver o inimigo, entre este e o Evangelion azul estava uma montanha, que não serviu de obstáculo para o gigante que com um só pulo atravessou toda a extensão elevada de terra.

Finalmente fez contato com o inimigo ainda antes de tocar o solo. O que estava à frente de Asuka a fez perder toda a concentração e o Eva rolou no chão após perder o equilíbrio, sua arma caiu ao lado.

O inimigo, se assim podia ser chamado, era o Evangelion Unidade 01. A máquina desaparecida desde que o Terceiro Impacto falhou. Tentaram por várias vezes fazer varreduras pelo planeta através de satélites, mas não conseguiram encontrar o gigante em lugar algum, parecia ter simplesmente desaparecido.

E agora ele estava de volta. A imagem bem à frente de todos mostrava a Unidade 01 de pé com um objeto a sua frente: a Lança de Longuinus.

A armadura parecia estar avariada, com rachaduras por todo o corpo de metal e um grande buraco no peito, onde uma esfera vermelha saltava do corpo do gigante púrpura. A Unidade 00 estava quase se levantando quando algo de estranho começou a acontecer com o outro gigante.

Asuka assistiu com terror os olhos negros e sem vida do gigante púrpura brilharem e se transformarem num branco desconcertante e intimidador, logo em seguida deu um grito ensurdecedor mais parecendo um uivo e começou a respirar rápido, como se estivesse a tempos sem fazer aquilo. Virou o rosto para o Evangelion azul e encarou com despeito o mesmo. Caminhou com passos curtos e lentos até a lança e a segurou com as duas mãos.

A ruiva viu o gigante retirar a lança enfiada no solo e aponta-la em sua direção.

- A sincronização está caindo! - Maya gritou.

Isso fez Misato voltar a si. Até o momento sequer tinha reparado no nível de sincronização de Asuka com a Unidade 00. Olhou para um dos computadores e viu um marcador: 51 por cento. Era incrível, Rei demorou meses para ultrapassar o mínimo necessário e Asuka acabava de bater uma das melhores marcas de Rei sem nem precisar que o Evangelion protótipo fosse configurado para a alemã. Só que essa era a porcentagem do máximo que o piloto tinha conseguido com o Eva. O problema foi que alguma coisa fez a ruiva perder quase que totalmente a concentração e o marcador mostrava agora a casa dos 30 e abaixando cada vez mais.

- Desligue as conexões da piloto com o Eva!

- Não! - Todos ouviram o grito do comandante. Até mesmo Gendo Ikari tinha sido pego desprevenido, ninguém esperava por algo parecido, porém isso não o impediu de tomar o controle da situação. - Conectem-se à Unidade 01, quero saber o nível da sincronização!

- Não há tempo comandante, não podemos arriscar a vida dela!

- S-senhor, c-captamos o sinal da Unidade 01 - Makoto chegou a ajustar os óculos, já que nem ele acreditava no que estava vendo. Voltou a olhar para a tela do seu computador. - 400 por cento...

- Berserk... - A voz de Misato sumiu antes de completar a palavra. Não podia deixar a garota enfrentar a Unidade 01 em estado de Berserk, seria uma derrota mais certa do que contra os modelos de produção em massa. - Desliguem Asuka do Eva! Agora!

- Não façam nada! É uma ordem! - Gendo gritou mais alto que a major. Por mais que ele fosse a autoridade máxima ali, parecia que Misato Katsuragi se recusava a entender. Virou-se para um microfone acima de sua mesa afim de falar com a piloto. - Langley, atraia a Unidade 01 até a cidade que vamos capturá-la com os cabos de segurança.

Asuka ficou em silêncio por um momento, o mesmo acontecendo na sala de controle na Nerv. Ela sabia que sua decisão agora definiria sua carreira. Seguir a ordem do comandante Ikari seria o primeiro passo para sua readmissão oficial como piloto e se a missão, que era simples ela tinha de admitir, fosse bem sucedida já estaria com os dois pés dentro da Nerv. Era pouco tempo para refletir se seus objetivos e os de Mark Goodspeed valiam mais que arriscar sua própria vida.

Vamos lá, então... Ela falou consigo mesma já de decisão tomada.

Mesmo com a cabeça feita ela ainda tremia de medo dentro do cockpit. O robô púrpura acompanhava todos os movimentos dela ao mesmo tempo em que apontava a lança para a cabeça do inimigo. Assim que o azul finalmente conseguiu se por de pé o púrpura parou de se mexer por alguns instantes. Só que a respiração dele continuava. Algum idiota ligou o áudio do recém-chegado Evangelion ao de Asuka e ela podia ouvir o som pesado e melódico da respiração do gigante. Não era algo agradável de escutar.

O Evangelion 00 começou a dar passos curtos e lentos para trás, o outro parecia estranhar um pouco a situação, mas se mantinha estático, apenas acompanhando com os olhos a movimentação do azul.

- Ele não está atacando... - Misato falou na sala de controle.

“Não me diga!”

A voz sarcástica de Asuka ecoou pela sala. Misato novamente ignorou, olhou para Gendo Ikari e tratou de controlar o tom de voz para falar com o comandante, apesar de que no fundo quisesse gritar com ele.

- Senhor, parece que ele não vai sair do lugar - Ela disse e esperou pela resposta.

- Você é a especialista em táticas aqui, major Katsuragi. Pense em alguma coisa.

Bastardo... Ela parou para pensar por alguns instantes. Tinha de arranjar uma forma de atrair a Unidade 01 sem que Asuka se machucasse, mesmo ela achando que a garota precisasse de uma surra devido ao constante comportamento arrogante, mas não seria contra um Evangelion que ela seria punida. Pelo menos ela está voltando ao normal... Ela pensou, por mais que não gostasse do jeito "normal" da ruiva agir. Mas você não vai me escapar de uma boa bronca, Asuka. Escapar! Isso! Um ligeiro sorriso cresceu na major, ela teve uma idéia.

- Asuka, atire no Eva! - Misato falou ainda com o sorriso no rosto.

“O QUE?”

- Foi bem isso que você ouviu. Atire no Eva. Ele vai atrás de você e ai nós o capturamos.

“Ele vai acabar comigo antes que eu consiga sair daqui!”

- Asuka, faça o que quiser, a decisão é sua. Lembre-se que no momento não está sendo forçada a pilotar...

- Vamos lá, garota, é fácil! Basta apertar o gatilho e sair correndo. - Mark falou, o que chamou a atenção de alguns naquela sala e até mesmo de Asuka.

Não seria aquilo que a faria mudar de idéia, afinal ele era apenas mais um ali contando com ela, entregando a vida em suas mãos. Assim como o resto do mundo o fez nas batalhas contra os anjos. Asuka não sabia como nem o porquê, mas ouvir a voz e ver Mark torcendo por ela fez a ruiva um pouco mais confiante.

A garota não respondeu. O silêncio foi a resposta que obtiveram aqueles que estavam na sala de comando. Em seguida veio a reação da Unidade 00.

A ação foi tão rápida que mesmo se a besta púrpura estivesse mais atenta do que já estava não teria percebido totalmente a movimentação ligeira do gigante na sua frente. Seus olhos se arregalaram, e logo em seguida foi jogado para trás com o impacto da explosão vinda da arma do EVA 00. Este, por sua vez, sumiu da tela quase que instantaneamente, foi necessário um dos operadores do MAGI agir rápido e mudar para a visão de outra câmera.

O azul corria em direção à cidade o mais rápido que podia esquecendo inclusive o lançador de mísseis usado contra a Unidade 01. Saltando o mais alto que pode, o gigante pilotado por Asuka chegou ao topo da elevação de terra, mesmo que desta vez não tenha conseguido saltar por ela completamente. Enquanto sobre o cume, virou-se para olhar o púrpura e como era esperado encontrou-o levantado e partindo em sua direção.

Ai, droga... Foi a única coisa que a garota conseguiu pensar antes de voltar a correr, dessa vez o mais rápido que conseguiu. Praticamente enterrou os controles manuais usados para controlar a velocidade do Eva e fez questão de aplicar mais um pouco de força, como se de alguma forma isso adiantasse e o Eva conseguisse correr mais do que já estava. Se na luta contra o décimo anjo ela conseguiu fazer um tempo quase recorde de um minuto atravessando a cidade com o seu Evangelion vermelho, agora ela já estava na metade do caminho em questão de 20 segundos. Só que mesmo assim o púrpura estava chegando cada vez mais perto mesmo não havendo piloto algum ali para controlá-lo.

"Vamos Asuka! Só faltam mais 600 metros"

Pelo menos agora a Misato parece confiante... E a ruiva estava certa, a voz de sua guardiã parecia ter perdido o tom de preocupação de antes. Ela não podia perder a concentração, mas se forçou a olhar rapidamente a janela com o link para a sala de comando. Misato e Goodspeed estavam ambos ao lado dos 3 operadores do MAGI, Iroquois Pliskin estava mais atrás, mas até ele que era o mais sério dos dois guarda-costas parecia entretido com aquela ação toda. Até mesmo Shinji parecia esboçar em seu rosto alguma coisa diferente da cara de idiota de todo dia.

Asuka avistou duas fileiras de prédios pretos, uma em cada lado da grande avenida pela qual o Evangelion corria desesperadamente. Ela sabia o que aquilo significava. Quando chegou próximo aos dois últimos edifícios escuros o gigante azul saltou inclinando o corpo para frente, pés juntos e braços abertos. Um salto estiloso que até mesmo Gendo Ikari deveria ficar impressionado com aquela rápida demonstração de graça e estilo. Antes do gigante de um olho só chegar no chão - alias, um pouso perfeito - a Major Katsuragi gritou na sala de comando.

"AGORA!"

Em uma sincronia absurda os três operadores do MAGI digitaram comandos e apertaram a última tecla ao mesmo tempo. Vários cabos saíram de cada uma das construções de metal negras e se prenderam ao longo da cadeia de edifícios, no meio de tudo isso estava a Unidade 01 que foi atingida e amarrada por vários desses cabos. Nos momentos que se sucederam a Unidade púrpura se debateu e chegou a se desprender de alguns mas logo em seguida mais cabos surgiram, dois deles se prenderam no pescoço do gigante. Não demorou muito para a Unidade 01 cair de joelhos e seus olhos finalmente pararem de brilhar.

"Parabéns Asuka, foi perfeito!"

A voz de Misato soou mais uma vez dentro da cabine do Evangelion. Asuka não foi a única que estava feliz com a situação, lá na sala de controle dois outros pareciam felizes e satisfeitos - quase - com o que viram.

- Apesar de não ser exatamente o que eu esperava, ela é boa mesmo, Speed - Solid Snake falou baixo, de forma que só o jovem escutasse.

- Todos eles são, mas ela em especial... é incrível - Ele falou no mesmo tom de voz. É bem filha da Kyoko mesmo.

- Só não foi perfeito pela indecisão e demora dela. No campo de batalha não se encontra inimigos tão passivos como o chifrudo ali - O mais velho voltou a falar, se referindo a Unidade 01.

- Ah, dê tempo ao tempo, amigão! - Ele deu uma risada e um tapinha nas costas de Snake. Quero só ver quando mãe e filha entrarem em ação! E Mark Goodspeed voltou a sorrir como uma criança. Deu as costas para a sala toda e foi em direção ao hangar para esperar a vitoriosa Asuka Langley.

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Hangar de lançamento,

- O que está fazendo aqui?

- Vim dar as boas vindas à garota!

Misato estranhou a atitude do segurança. Todas as vezes que os agentes da Seção 2 seguiam os pilotos até a Nerv esperavam até segunda ordem numa sala especial para eles. Essa era a primeira vez que dois deles se envolviam tanto com a segurança dos pilotos acompanhando-os inclusive até a sala de comando, mesmo que as ordens de Goodspeed e Pliskin fossem de ser as "sombras" de Asuka e Shinji. Tudo bem que os dois agentes pareciam boas pessoas e definitivamente eram mais sociáveis e até mesmo engraçados do que o restante da divisão de segurança da Nerv. A major voltou a atenção ao hangar após ouvir um barulho.

O Entry Plug saiu das costas da Unidade 00 e se despressurizou automaticamente. Em seguida a escotilha se abriu e de dentro saiu uma imensa quantidade de líquido laranja, carregando uma certa garota ruiva gritando para tudo e todos que estivessem por perto ouvirem.

- QUEM FOI O ANIMAL QUE ESQUECEU DE RECOLHER ESSA PORR- Ela, já no chão, foi interrompida de completar a frase.

- ASUKA! - Misato gritou.

- O QUE?

- Acalme-se - A major falou mais baixo, já mais próxima da garota. Mark não conseguiu sair do lugar, muito menos parar de rir do estado da pequena temperamental.

O recém-empregado segurança tinha de concordar com a ruiva. Algum "animal" tinha esquecido de recolher o líquido laranja de dentro do cockpit do gigante azul, provavelmente um dos operadores do MAGI, já que pareciam ser eles que comandavam quase tudo nos Evas antes, durante e depois das batalhas. Mas ele não queria se preocupar com isso, estava muito mais divertido olhar para Soryu Asuka Langley e seu infortúnio. Como o cockpit estava lotado do chamado LCL a escotilha quando aberta fez o líquido vazar rapidamente carregando a alemã para fora. A garota caiu no chão e rolou antes de sentar-se ali mesmo e ser cumprimentada por mais uma quantidade do líquido, dessa vez caindo tudo em cima de sua cabeça e acabando definitivamente com o seu penteado. Os poucos técnicos que trabalhavam ali para receber a Unidade 00 e reparar os danos caso fosse necessário, trataram de sumir da vista dela antes de se tornarem os prováveis alvos do escândalo da alemã. Aquela cena era realmente engraçada, claro que não para a garota.

- CALADO! - Ela esbravejou fitando Mark.

Não adiantou de nada. Ele foi à direção dela ainda entre risadas apenas parando para olhar para a ruiva e voltar a rir. Ela estava prestes a levantar e agredir o jovem de preto quando ele já em frente a ela estendeu a mão e ajudou a garota a se levantar, mas isso não significava que ele sairia ileso da ira de Asuka. Ela já tinha levantado a mão para atacá-lo quando ele tirou o terno e gentilmente a cobriu, em seguida voltou a botar os óculos exóticos que até então estavam em um de seus bolsos.

- Está frio aqui - Ele disse e sorriu, a ruiva por incrível que pareça devolveu o gesto. A sensação de frio era maior ainda para a ruiva que tinha acabado de sair do LCL quente. - E sua camiseta é branca, e sabe como é, ela estando molhada, mais esse frio...

SLAP!

Ele nem se preocupou muito com a marca vermelha que o tapa de Asuka iria deixar até o resto do dia, simplesmente não poderia ter deixado aquela oportunidade passar em branco. Os únicos sons naquela sala eram as risadas de Misato e Goodspeed, além dos passos pesados de uma certa alemã enfezada.

- Pensei que ela não bateria em alguém de óculos...

- Você ainda tem muito que saber sobre Soryu Asuka Langley, garoto - Misato respondeu.

Ela sabia que chamar Goodspeed de garoto não era muito certo, já que a diferença de idade deles não devia ser maior do que 3 anos. Deve ter pegado o hábito de Iroquois Pliskin de se referir a Mark sem perceber. Sabia menos ainda que o jovem já conhecia Asuka, antes dele ser oficialmente um dos seguranças dos pilotos, e antes mesmo da própria ruiva conhece-lo no hospital. Ajudou o jovem a se levantar já que Asuka conseguiu botar até um homem do porte dele no chão, e com um só tapa. É... talvez a marca no rosto dele não vá sair até o final do dia.

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- Asuka!

O andar pesado da garota finalmente cessou quando ela parou em frente ao vestiário feminino, no mesmo momento que alguém chamava pelo seu nome. Não era com um grito, a voz na verdade parecia mais um sussurro, mas ainda assim demonstrava alguma urgência... ou importância. Asuka queria abrir a porta e entrar de uma vez no vestiário, não queria falar com ninguém no momento, mas por ironia a maçaneta não funcionou na primeira vez. Ela sentiu a pessoa se aproximar e resolveu encará-la já que a maçaneta também não funcionou na segunda vez. Mas só por causa disso.

- O que foi, Terceiro?

Shinji Ikari não gostava de ser chamado assim, e Asuka sabia muito bem disso. Mas não havia o porquê dela não fazê-lo, muito menos motivos para ela mudar de atitude, ou começar a tratá-lo com respeito, que de fato ele merecia algum, afinal todos nós precisamos disso não é? Nem que seja um pouco.

Não! Ele é a única pessoa que não merece o meu respeito!

Talvez ela estivesse apenas parcialmente mudada... talvez algumas coisas não tenham sido aprendidas no Terceiro Impacto. Mas quem sabe? Talvez elas possam ser trabalhadas agora.

- Eu só queria dizer que...

Então diga de uma vez e pare de enrolar! Ela esperou impaciente por mais alguns segundos até o garoto abrir a boca para falar novamente.

- B-bom trabalho...

Ela não respondeu. Balançou a cabeça em sinal de desaprovação, a mesma estava presente em seu olhar. Falou baixo alguma coisa em um alemão incompreensível para o garoto, girou e finalmente entrou no vestiário depois da terceira tentativa quando a porta resolveu cooperar. Shinji ficou ali, de cabeça baixa por um tempo que ele não fez questão de contar.

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- Pliskin, o que está fazendo ai?

- Só vendo a corrida dela de novo! - Snake respondeu. Deu um sorriso falso a major antes de voltar a atenção novamente a tela do computador. Olhos vidrados na tela e fones nos ouvidos. A pessoa ao seu lado digitou alguma coisa em seu teclado e logo a tela do computador dividiu-se, mostrando as visões de duas câmeras diferentes.

Interessante...

Eram duas telas mostrando localidades diferentes coincidentemente separadas pela mesma porta, mas a cena era quase igual. Em ambas havia uma pessoa jovem, mas de diferentes sexos. A diferença entre as cenas era o que os dois faziam. O garoto apenas olhava para o chão, a outra ficou encostada na porta por um tempo, até chegar em frente a um armário e soca-lo.

Interessante... Ele repetiu o pensamento. Muito... Ele disse ao ouvir o som do vestiário.

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Solid Snake parecia um pouco preocupado em falar de assuntos importantes dentro da Nerv. As pessoas vivem dizendo que as paredes têm ouvidos, e ele sabe disso como ninguém já que sua experiência durante os anos de agente secreto o ensinou da pior forma possível. Mesmo com Mark Goodspeed dando sinal de aprovação, mesmo tendo um dos técnicos do MAGI em sua equipe, aquela infinidade de paredes e aquele ar de mistério da pirâmide branca praticamente exigiam que ele pensasse o contrário.

- Ela é instável, Mark! - Snake falou depois de um longo suspiro. Olhou para os lados para ver se havia alguém por perto. Acabou avistando uma funcionária da Nerv se aproximando, não era a Misato Katsuragi nem aquela jovem que ele achou muito bonita, a tal de Maya. Na verdade não era ninguém em especial ou conhecido, mas resolveu esperar ela passar por eles e quando a jovem fez isso ele teve de devolver o sorriso simpático que ela deu aos dois seguranças.

- Os dois são - Goodspeed finalmente respondeu após o silêncio.

- O garoto parece uma melhor escolha que ela, mesmo se tivermos que trabalhar o psicológico dele para isso.

- Com Asuka sendo a nossa piloto vai ser muito mais fácil de alcançarmos nosso objetivo.

- Você deveria ter me chamado antes de escolher ela. Tenho certeza que teríamos pensado melhor.

- Escute, eu sei que ela é a melhor escolha! - Mark respondeu com uma ligeira irritação.

- Se você diz, garoto...

- Snake, você só teve a oportunidade de ver as gravações das batalhas dos anjos. Lá o Shinji realmente é melhor que ela, ainda mais depois de algum tempo. Mas você precisa vê-la lutando no ataque da JSSDF e da Seele. É impressionante. - O jovem falou esforçando ao máximo que podia uma excitação na última parte. Ele sabia o que aconteceu com Asuka no final da luta. Teve o desprazer de ele próprio fazer a gravação do vídeo. E eu sei que podemos fazer algo em relação ao emocional dela...

Os dois voltaram a caminhar. Mark pegou um pequeno guia de seu bolso com alguns mapas das instalações da Nerv neles. Misato havia dado o pequeno livro para os dois conseguirem achar o caminho dos vestiários e depois levarem Asuka e Shinji para casa. Antes de se despedir, ainda pediu que ficassem de olho neles o resto do dia, pois era provável que ela só voltaria para casa na manhã seguinte. Snake olhou para o seu relógio cinza e barato, por mais que gostasse daquele relógio ele já estava a muito tempo pensando em comprar um novo e caro, daqueles prateados e cheios de funções como cronômetros e horário de vários países, apesar dele saber de cabeça todos os fusos. Alguém com muito tempo vago, nota-se.

Bom de qualquer forma, se o James Bond tinha o seu Rolex caríssimo e cheio de funções, por que ele, o lendário Solid Snake, não teria? 5 horas da tarde... meu Deus, no que eles vão trabalhar tanto? Após finalmente olhar para o horário em específico, voltou a pensar nos últimos acontecimentos. Um dos Evangelions simplesmente apareceu do nada e mesmo sem piloto ele foi capaz de se mover sozinho. Tinha ouvido falar de uma das batalhas contra os anjos onde usaram um tipo de artifício semelhante a uma AI para fazer o robô lutar sem estar sobre o controle do piloto, mas não tinha ouvido nada disso na conversa da sala de controle, lá eles só falaram de um tal de "Berserk", que fez ele lembrar que essa era uma palavra de alguma mitologia, provavelmente a nórdica. Se a sua memória não falhava o piloto do Evangelion que lutou naquelas duas condições - a da AI e do Berserk- foi Shinji Ikari. Mark usou esse acontecimento como um dos motivos para não ter escolhido Shinji Ikari como piloto, por mais estável que ele fosse se comparado a Asuka, o emocional dele sempre acabava cedendo quando Gendo Ikari estava por perto. Era uma boa desculpa, Solid Snake tinha de concordar, mas ainda assim achava que se dando um pouco de confiança para o garoto ele se tornaria a melhor opção deles.

Ele foi interrompido de seus pensamentos a ver um grande grupo de pessoas se aproximando, a maioria eram guardas armados com o uniforme bege claro e detalhes vermelhos tradicional da Nerv, mas os trajes de uma pessoa ali se destacavam. Era uma mulher loira, provavelmente com o cabelo pintado como anunciavam suas sobrancelhas negras, num jaleco branco sobre roupas civis, o que fez Snake considerar que ela era alguém importante, já que todo o resto dos funcionários usava uniforme de mesma cor. Alguns cientistas tinham o direito concedido de trajar-se como bem queriam devido a sua alta genialidade e importância, não seria diferente na Nerv. O que Solid pensava disso? Que eram apenas uns egocêntricos que se achavam no privilégio de receberem regalias. Aquela situação, contudo, era completamente estranha levando em consideração ao fato da mulher estar sendo escoltada com algemas na mão e tudo.

- Ritsuko Akagi, uma das cabeças do Projeto-E. - Mark Goodspeed disse quando os guardas e a cientista já estavam bem longe deles.

- E para você saber disso, ela provavelmente vai trabalhar com a gente. - Snake perguntou, mas o jovem não respondeu. - Já trabalha? - E então Mark Goodspeed sorriu.

- Já te disseram que sorrir como resposta pode deixar as pessoas confusas?

- Muitas vezes...

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Uma hora antes,

Argh! Nunca mais viajo no porta-malas! Uma figura estranha pensou com raiva. Seus cabelos eram espetados e negros, alias a cor preta praticamente predominava nele e contrastava com a pele clara. A cor dos olhos já era escura por natureza e ele ainda fazia questão de usar lentes de contato pretas, achando o visual mais "cool", como o próprio diria. As roupas que trajava eram todas da mesma cor escura: sapatos, calça, luvas e a camiseta sem mangas, alias todos esses eram de materiais pouco usuais e difíceis de conseguir, por exemplo, os sapatos que durante o andar não faziam barulho algum, ou a camiseta - que mais estava para um colete - e a calça feitos por um material que conservava o calor dentro do corpo e impedia a passagem do frio via um console que poderia ser regulado manualmente na região do abdômen, caso fosse necessário. Apesar disso ser quase inútil se levar em consideração o fato dos seus braços estarem descobertos.

Ele encostou-se a uma das paredes e olhou pela esquina da mesma. Parecia um pouco preocupado ao tentar evitar as câmeras, até que finalmente lembrou que não precisava se preocupar com nada, afinal, ninguém poderia vê-lo.

Ahh... as maravilhas da tecnologia moderna! Ele pensou enquanto um quase-sorriso formava-se no seu rosto. Deixou a preocupação de lado e começou a andar pelo meio do corredor, mal se importando com o peso dos seus passos já que o material usado no seu calçado - ou bota, como ele mesmo via aquilo - abafava qualquer som possível. Olhou para cima e viu que as luzes no corredor ao seu lado estavam quase apagadas. É aqui mesmo! Entrou no corredor e tirou andou meio que as cegas por alguns metros até chegar quase ao fim do corredor, virou-se para uma porta a sua direita e olhou para os números escritos sobre ela. 216... espero que seja essa cela mesmo... Ele pensou com um pouco de receio. Por mais que tivesse prestado atenção nas instruções antes de sair para a missão ele havia esquecido do número que lhe foi dado. Por outro lado conseguiu chegar até o seu destino olhando apenas uma vez nos mapas que Ryouji Kaji trouxe para a base deles. Meu problema chama-se números... De fato, era.

"Loirinha, querida, já cheguei, só confirma aí pra mim: porta número 216, não é?" Ele perguntou para o nada, ao apoiar-se no chão com um dos joelhos e levar uma das mãos a tampar a orelha, provavelmente para escutar melhor alguma coisa.

"Por que você não abre todas, idiota!" Veio a resposta numa voz feminina.

"Ok, desculpe"

"Sim, é essa mesma... espere um pouco, vou pedir para o Otacon abri-la para você" Ela voltou a falar. O rapaz podia jurar que a ouviu falar alguma coisa como "Não faça nada ainda, deixe-o esperando"

É... eu tenho que parar de falar com ela assim... E como ele havia pensado, teve de esperar um certo tempo até a porta ser destrancada e abrir automaticamente, revelando uma pequena sala de 1,5m de largura e 4m de comprimento. Até que é confortável, comparado as americanas. Ele disse e riu da própria piada.

A cela era escura, assim como o corredor, mas no final dela havia uma lâmpada solitária no final, abaixo dela uma tentativa de banheiro, um pouco afastada disso estava uma cama com um colchão que mais parecia um lençol de tão fino. Se a pessoa ali passasse frio, sequer seria capaz de cobrir-se sem comprometer sua cama. Sobre a cama estava uma pessoa sentada que apesar da luz fraca parecia ler alguma coisa, provavelmente um livro, aliás haviam vários livros abaixo da cama. Livros grossos. Livros com muitas páginas. Coisa que ele jamais faria questão de ler. A pessoa se levantou e acabou por se revelar uma mulher. Muito bonita, ele logo teve o prazer de constatar. Era loira, apesar das sobrancelhas negras, menor do que ele e provavelmente mais velha. Deve ser... já que era colega de faculdade daquela belezinha de major. Ela usava uma camiseta azul também sem mangas. Olha querida, estamos combinando! E uma saia curta e preta. Gosta de preto também? Deixando seus pensamentos de lado, resolveu finalmente falar.

- Boa tarde, doutora Akagi! - Ele disse ao entrar na sala, esperou que a porta atrás de si fechasse para dar um pouco de privacidade, mas provavelmente a garota com que falara momentos antes deu um jeito de deixá-la aberta afim de provocar o jovem.

- Ikari precisa da minha ajuda novamente? - Ela perguntou ignorando completamente o fato do dono da voz acabar de se materializar na frente dela. Sabia da existência de tal tecnologia e se a pessoa a sua frente estava usando só poderia significar duas coisas: ou ele ia matá-la, ou ajuda-la.

- Ah, não, não. Na verdade eu estou representando um grupo super-secreto que está com vontade de ferrar a Seele, e a ajuda da filha da criadora do MAGI seria muito apreciada.

- Hmm... fale-me sobre isso! - Ritsuko Akagi sorriu por um instante, mas a escuridão da cela não permitiu que o estranho tomasse conhecimento disso.

- Bom, se eu falar e você não concordar com os nossos termos, terei que te matar, loirinha... - Ele disse com certa tristeza na voz. Realmente tinha uma queda por loiras.

- Parece que eu não tenho muitas opções, senhor...?

- Axel! Pode me chamar de Axel! E sem essa de senhor ou esse tal “san” que vocês gostam de usar!

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Algum lugar nas montanhas,

E ela ouviu um som. Os longos cabelos loiros giraram no ar acompanhando o movimento dela. Seus olhos abriram e o que ela viu foi completamente diferente da linda cidade ao por do sol de segundos atrás. O tom alaranjado do momento não sumiu por completo, o sol ainda contemplava o lugar onde estava, apesar da visão de antes ser muito mais interessante e prazerosa do que a de agora. Havia alguém ali com ela. Ou algo. Algo além dela, seu carro amarelo - agora quase avermelhado pelo sol - e a cidade de Tóquio-3.

Revelou-se uma pessoa. Um homem aparentando sessenta anos ou algo nessa casa. Vestia uma camisa amarela puxando para o branco, abotoada quase que até os últimos botões o que acabou revelando uma camiseta ou alguma outra peça de roupa de cor preta por baixo. Uma calça bege e um sobretudo marrom de couro completavam o visual dele. Não. Ele ainda usava óculos com armação prateada com um detalhe ou outro preto e com a lente ligeiramente escura. Era um modelo mais apreciado por pessoas jovens, um pouco moderno demais para ele.

Quando ela achava que já tinha terminado de analisar o velho, que havia ficado parado o tempo todo encostado sobre o seu conversível amarelo, reparou na cintura dele. Haviam duas armas ali, uma de cada lado. Eram do tipo antigas, bem antigas, daquelas famosas pelos filmes de faroeste dos anos pré - Segundo Impacto. Eram dois revólveres prateados e muito bem trabalhados, como ela pode observar ao ver os trabalhos provavelmente feitos a mão no cabo da arma e nela em si. Foi ali, olhando pra a cintura do velho que algo mais no vestuário dele chamou atenção. Usava estranhas botas marrons de couro, outra coisa que voltava a lembrar os filmes de faroeste. Tinha até aqueles discos de metal pontudos que giravam - e que ela não tinha a menor idéia de como se chamavam - atracadas na parte de trás de ambos os calçados.

- Nunca gostei de ver o pôr do sol. Achava sentimentalismo demais o que as pessoas falavam. Acabei parando para observá-lo umas duas ou três vezes na minha vida. E só agora, vendo ele no Japão, que percebi o quanto sinto falta de nossa mãe Rússia. Talvez o sentimentalismo tenha finalmente me encontrado - O velho falou num russo legítimo.

- Já eu perdi a conta de quantas vezes fiquei horas observando o sol e esperando a noite - Ela respondeu também em russo. - Não me pergunte por que faço isso. Acho triste ver o sol desaparecer, mas... continuo olhando para ele... - Parecia calma mesmo levando em consideração que a pessoa ao seu lado estava armada. Provavelmente por que já tinha presenciado cenas parecidas a vida toda

- E tem observado mais ainda nos últimos dois anos, não é?

- Sim... - Ela disse e observou o homem aproximar-se lentamente e encostar no parapeito atrás dela.

- Eu diria que é típico dos apaixonados, se não soubesse que o motivo dessa sua tristeza é a morte de seu pai e sua irmã.

A loira preferia ter sido pega de surpresa ao ouvir as palavras do velho, de alguma forma se sentiria menos vulnerável se fosse dessa forma. O compatriota desconhecido parecia conhecer mais dela do que definitivamente ela conhecia dele. E a loira odiava quando isso acontecia. Geralmente era sinal de más notícias.

- Não olhe para mim dessa forma. Somos da mesma pátria, não precisamos ser inimigos. - O outro falou, observando um semblante de raiva surgindo no rosto da mulher.

- Quem é você? - As mãos dela já iam em direção a arma escondida por baixo de sua blusa, mas o que o velho fez acabou com qualquer reação dela.

Num movimento mais rápido do que ela podia acreditar que um ser humano pudesse ser capaz de realizar, o velho sacou suas duas armas e apontou-as para a cabeça dela. Mal conseguiu piscar os olhos e já estava caída no chão devido ao chute que o velho deu nela. Não foi com força, ela até nem se machucou nem no chute nem na queda, o velho havia usado força o bastante apenas para colocá-la no chão.

O velho não havia respondido a pergunta da loira ainda. Ela até achou que morreria antes dele falar mais alguma coisa. Mas a resposta finalmente veio. Não com palavras, mas com algo que deixou a russa caída de boca aberta. O velho continuou apontando uma das armas para ela, enquanto a outra mudava de direção lentamente. A arma da mão esquerda não mais apontava na direção dela quando disparou. O tiro acertou exatamente um pequeno cavalo de metal, adereço e símbolo da marca do seu conversível amarelo. O velho não desviou de olhar em momento algum.

- Shalashaska é como prefiro ser chamado, mas sou mais conhecido como Revolver Ocelot - O velho falou em seguida.

- O-o-o homem que n-nunca erra... - Ela gaguejou. Foi a única coisa que conseguiu fazer.

- É, também se referem a mim dessa forma. Como se eu fosse uma lenda, ainda que em menor grau comparado ao assassino de seu pai.

A garota gelou ao ouvir as palavras de Revolver Ocelot. Ela sabia que Solid Snake não era o culpado da morte de sua família, demorou um pouco mas Snake conseguiu explicar para ela o que realmente aconteceu. Não que o ocorrido tenha sido pacífico, na verdade o lendário Solid Snake apanhou muito dela e quase recebeu uma facada e uns tiros da confusa russa. Foi preciso Goodspeed, Black e Axel para imobilizá-la e ainda assim com muito custo. Ainda conseguiu pegar a faca na sua mão e jogar na direção de Snake, que milagrosamente conseguiu desviar e sair ileso. Isso se desconsiderar o fato das pancadas que levou da russa.

Só depois de amarrada a uma cadeira que enfim ouviu a versão da história de Snake, ainda que sobre protestos no início. Ele entregou a loira uma carta de sua irmã, Olga, que de alguma forma previu que uma situação como aquela acontecia. Lá, ela dizia que o agente tinha boas intenções, e que contava com ele na busca de sua filha desaparecida, e que esperava a ajuda da irmã também. Natasha Gurlukovich não pode fazer nada se não chorar. Foi então que a desamarraram. Foi então também que ela descobriu que até mesmo lendas podiam ter um pouco de compaixão. Solid Snake a abraçou e consolou a russa chorosa, algo que ninguém ali naquela sala achou que ele seria capaz de fazer. Mais tarde quando ela se acalmou, finalmente ouviu a história toda.

Na versão de Snake, a versão verdadeira, o culpado pela morte de Sergei Gurlukovich era Revolver Ocelot, e de Olga, Solidus Snake. Foi preciso mais algum tempo para Snake explicar a história toda do terrorista chamado Solidus.

Mas o que importava era que o homem ali, a sua frente, Revolver Ocelot, foi quem matou seu pai. E Natasha Gurlukovich não deixaria isso passar em branco. Só havia um problema: ela não estava em condições de fazer nada.

- Eu tenho uma proposta, Natasha!

- O-o que?

- Alie-se a mim. Posso ajudar a encontrar Solid Snake. Vou dar-lhe a oportunidade de matar o assassino de seu pai.

- Foi... você... que matou meu pai... - Ela quis gritar, mas não conseguiu.

- Então Solid chegou primeiro, não é?

Natasha, mesmo se pretendesse, não conseguiria responder. Alguma coisa fez a atenção de Revolver Ocelot voltar-se para outra direção. Foram tiros. A russa não tinha idéia de onde eles vieram, mas uma vez que não sentiu nenhum deles a atingir, tomou aquela como a oportunidade perfeita para sair daquela situação.

Levantou-se e correu para longe do velho. Pulou e deslizou pelo capô do carro e se escondeu do outro lado. Estava para alcançar sua pistola mais uma vez quando ouviu mais uma rajada de tiros, seguida de 4 tiros de som diferente, mais seco e pesado. Provavelmente Ocelot estava devolvendo a hospitalidade. Foi ai que Natasha viu o autor dos tiros. Era um homem em roupas civis, a única coisa que ela conseguiu reparar.

Ela olhou por cima do carro e viu os dois homens atirando entre si. Ambos estavam parados e por nada se mexiam a não ser pelos dedos apertando os respectivos gatilhos. Se ela não visse com os próprios olhos, diria que nenhum deles tinha o objetivo de acertar o outro. Mas eles miravam para acertar, as balas é que poucos metros antes de chegar aos respectivos alvos, magicamente eram desviadas e passavam ao lados dos dois homens. Os dois pararam de atirar quando ambas as munições haviam acabado, os revólveres do velho e o rifle de assalto do outro.

Natasha viu os dois darem uma risada e falar alguma coisa em suas respectivas línguas, a única que conseguiu entender direito foi a de Ocelot por razões óbvias. Disse alguma coisa como “roubaram a nossa tecnologia...” depois disso o velho cowboy russo pulou morro abaixo em direção à cidade e simplesmente desapareceu.

- Tudo bem com você? - O recém chegado disse ao ajudar a loira a se levantar.

- Ah, droga... meu carro - Ela passou a mão na parte onde um pequeno cavalo prateado costumava estar. O outro deu uma risada e jogou o rifle dentro do carro.

- Pode me dar uma carona? - Ele perguntou já se sentando no banco do passageiro. Mesmo se quisesse Natasha não podia mais dizer não.

- Andou sumido nos últimos dois dias...

- Ah, assuntos inacabados...

- Sempre cheio de mistérios, senhor Kaji.

---

Dois homens caminhavam sozinhos pelos corredores da Nerv, o de óculos de lente vermelha ia à frente, o outro, mais velho e já de cabelos grisalhos estava poucos passos atrás.

- E agora Ikari?

- Prepare os documentos para a readmissão de Soryu Asuka Langley. Quero oficializá-la como nossa piloto até o final do dia.

- Já está sendo providenciado. Assim como a liberação provisória de Akagi.

- Mande-a para minha sala depois. Preciso conversar com ela. E mandem revista-la antes...

Na verdade eu estava me referindo a Yui, mas... Kozo observou o amigo e superior tomar o caminho dos hangares.


Notas do autor: Sei que prometi que esse não ia demorar muito, mas acabei tendo que mudar algumas coisas nele. Guardei uma parte meio dramática com a Asuka para outra hora (mas deixei uma dica de onde foi) e tive de fazer o encontro de Natasha com Ocelot para compensar. Well, sorry

Sobre o Axel? Bom, inicialmente imaginei ele como o Axel de Kingdom Hearts 2, mas mudei o visual dele de última hora.

E Asuka pilotando a Unidade 00? What the hell? Bom, explicarei mais para frente. Foi meio curta essa parte pq tive que editá-la também. To achando que as coisas estão acontecendo rápido demais... De qualquer forma, prometo mais ação no capitulo 4. Mas é só isso que prometo por enquanto xD

Escrito ao som de: Classical Gas e suas várias versões, Italian Fireflies,Pachebel's Canon In D também em várias versões, Yes - Close to the Edge e o álbum Tommy do The Who.

Disclaimer: Não possuo Evangelion ou Metal Gear Solid, seus direitos e personagens pertencem respectivamente a Gainax e Konami.

Capítulo 4

Capítulo 2

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