Samurai X-Men

Capítulo 5 - Jogo de Gato e Rato


Madrugada do dia 31 de Setembro do ano 11 da Era Meiji.

Em meio às ruas desertas de um distrito afastado uma cena de perseguição se desenrolava. Dois ninjas do Tentáculo tentavam alcançar uma única pessoa, uma mulher vestindo roupas masculinas. Apesar da aparência franzina, ela não estava disposta a ser um alvo fácil.

Mas Kaoru Kamia estava chegando ao seu limite. O ferimento no braço não era problema, mas a exaustão por estar correndo e lutando a mais de duas horas já ameaçavam a se tornar insuportáveis.

Assim, Kaoru escolheu um vão entre duas casas com pouco mais que três metros de largura para se entrincheirar e enfrentar de uma vez por todas os seus perseguidores, antes que alguma arma de arremesso ou o cansaço dessem cabo dela. Logo em seguida Yamada e Debushi cercaram a entrada do pequeno beco empunhando suas espadas. Durante algum tempo tudo o que se ouve é o som de três respirações tentando buscar mais ar. Os adversários apenas se encaravam.

Os dois ninjas sabiam que o prêmio por qualquer atitude precipitada seria um destino igual ao do seu companheiro, Hiko. Já Kaoru aproveitava cada segundo do pequeno intervalo para recobrar o fôlego sem, no entanto, relaxar a guarda um instante sequer. Se os inimigos percebessem qualquer sombra de medo ou dúvida seria o seu fim, por isso empunhou a espada capturada com mais firmeza.

Sem querer, Kaoru começou a rememorar os fatos que a levaram até aquela situação.

 

Tudo havia começado naquela mesma manhã quando Sanosuke apareceu no dojô para filar a refeição matinal com a sua usual cara-dura. Por mais que gostasse do amigo, Kaoru não conseguia se acostumar com a displicência de Sanosuke. Ela não podia entender como alguém com tantas qualidades podia se contentar em vagabundear o dia todo, apenas procurando por diversão, que na concepção dele se resumia a jogos de azar e uma boa briga de vez em quando.

Naquela manhã Sanosuke estava especialmente animado e bem humorado, tanto que se prontificou a ajudar Kenshin a lavar louça enquanto Kaoru e Yahiko se dirigiram para o salão de treinos. É claro que esta atitude provocou suspeitas mais do que justificadas por parte de Kaoru, afinal, segundo ela, Sanosuke era o tipo de sanguessuga incapaz de levantar um dedo sequer para ajudar em casa. Deste modo, após ter instruído seu jovem pupilo quanto aos seus exercícios, ela saiu do salão com a desculpa de “ir ao banheiro”.

Com todo o cuidado ela contornou o prédio residencial para chegar ao poço que fica nos fundos, onde usualmente Kenshin exerce parte de suas funções de “empregada doméstica” como o Yahiko costumava dizer.

Quando ouviu a voz dos dois Kaoru parou colando as costas à parede da casa e tentou apurar a audição, como ela suspeitava boa coisa não era, pois ambos confabulavam em voz baixa. Sanosuke parecia estar tentando convencer Kenshin a ir a algum lugar, mas Kaoru só conseguia ouvir pedaços como “vamos nos divertir” ou “desta vez você tem que ir”. Justamente quando Sanosuke ia dar alguma pista sobre o lugar em questão Kaoru ouve a voz de Yahiko atrás de si.

- O banheiro não é do outro lado?

A aparição repentina de Yahiko, além de causar um grande susto, foi suficiente para tirar o equilíbrio da jovem espadachim fazendo-a cair de cara no chão. O tombo não passou despercebido a Sanosuke e Kenshin, este último não perdeu tempo em ir ajudá-la a se erguer. Yahiko até podia ter ajudado também se não estivesse quase sufocando de tanto rir.

- Tudo bem Kaoru? - perguntou Kenshin enquanto a ajudava - O que estava fazendo aí?

- Ah tudo bem, não foi nada. Eu estava só... Indo ao poço pegar um pouco d’água.

A resposta causou um novo e mais forte acesso de gargalhadas em Yahiko, que o fez rolar pelo chão com lágrimas nos olhos. Sanosuke se aproximou do trio com as mãos nos bolsos e mascando uma espinha de peixe, e é claro, não perdeu a oportunidade para alfinetar.

- Sabia que é muito feio bisbilhotar a conversa alheia?

- Eu não estava bisbilhotando! - explodiu Kaoru - Já disse que estava só indo pegar água.

- A é? - falou Yahiko quando conseguiu retomar um pouco de controle - Então o que você estava fazendo escondidinha de orelha em p...

POW

Yahiko não pôde terminar a frase. Kaoru resolveu acabar com o discurso com um poderoso golpe de shinai que pôs o garoto a nocaute.

- Isso é pra você deixar de ser metido. E quanto a vocês...

- Oro!?

- Eu sabia. Você estava espionando mesmo.

- ISSO NÃO VEM AO CASO! Podem ir confessando o que os dois estavam tramando.

Sanosuke sorriu. Já tinha se acostumado ao jeito agressivo e às vezes infantil com que a amiga lidava com os próprios sentimentos. Especialmente no que se referia a Kenshin. Como estava de bom humor resolveu provocar mais um pouco.

- Nada que te interesse. É coisa de homem.

- Co-como assim? - Kaoru ficou mais vermelha do que já estava - O que você quer dizer com isso?

- Calma Kaoru - Kenshin se colocou entre os dois com um sorriso apaziguador no rosto - O Sanosuke só estava me convidando para uma confraternização com os amigos dele hoje à noite.

- “Confraternização”?

- Só uma festinha entre amigos. - confirmou Sanosuke - O que achou que fosse?

- Algum problema Kaoru? - perguntou Kenshin com um sorriso inocente no rosto.

Um pequeno intervalo silencioso se passou enquanto Kaoru se dava conta do ridículo a que estava se expondo, e da vergonha que a fazia ter vontade de se atirar dentro do poço. Ela teve que fazer um esforço para se controlar e tentar salvar a situação.

- Há, há, há. Claro que não, deixa de ser bobo. Eu só estava brincando. Vocês são adultos, o que fazem ou deixam de fazer não é da minha conta.

Kaoru começou a rir de puro nervosismo enquanto Kenshin fazia uma cara de quem não entendia nada, ora olhando para Kaoru, ora olhando o pobre Yahiko, que ainda estava desmaiado com um enorme galo na cabeça. Kenshin na certa estava achando as brincadeiras dela um tanto quanto violentas. Sanosuke por sua vez deu outro dos seus sorrisos cínicos antes de falar.

- Agora que está tudo esclarecido eu vou andando. - dá as costas e começa a andar - Eu passo aqui às seis, Kenshin.

- Está bem Sano. Bem, vamos ver como está o Yahiko.

Dizendo isso, Kenshin se abaixa perto do garoto e começa a reanimá-lo. Kaoru se prontifica a ir buscar o material de primeiros socorros, mas, ao invés de se dirigir ao dojô, corre em direção à saída a tempo de alcançar Sanosuke, que recém tinha passado pelo portão da frente.

- Sanosuke, espera.

- O que foi Kaoru?

- Na verdade onde você vai levar o Kenshin? Essa história de festa foi só pra convencer ele não é mesmo?

Kaoru tentou parecer despreocupada, casual. Mas o nervosismo era evidente por trás do sorriso. Ela tinha que ter certeza. Por mais que odiasse admitir.

Por um instante Sanosuke pensou em tranqüilizar a jovem. Mas logo em seguida teve outra idéia.

- Nada disso. Ele sabe muito bem aonde eu vou levá-lo... Só não é bem onde ele disse.

A resposta surtiu o efeito esperado, por um momento Kaoru empalideceu e perdeu a fala antes de retomar o ar dissimulado.

- Eu já desconfiava. Só não entendo porque o Kenshin inventou aquela história. Afinal aonde vocês vão? N-não há porque me esconder.

- É, também acho. Nós vamos à zona, sabe como é, apesar de não parecer, o Kenshin é homem também, não é saudável ficar tanto tempo sem sexo.

Sanosuke quase se arrependeu da brincadeira quando viu Kaoru ficar mais pálida ainda. Na verdade, ele esperava que ela explodisse como sempre fazia, mas ao invés disso ficou como que em transe, como se a alma tivesse fugido do corpo.

- Kaoru... Tudo bem?

- Claro. - respondeu Kaoru voltando a si - Claro que sim. Isso é natural não é? O Kenshin é muito bobo por querer esconder isso de mim.

Apesar da resposta, Sanosuke podia sentir que alguma coisa estava errada. Pro seu próprio bem era melhor sair dali rapidinho.

- Er... então eu vou indo.

- Tchau, divirta-se você também.

Assim que Sanosuke sumiu de vista Kaoru voltou ao dojô para encontrar Yahiko (já restabelecido) em pé de guerra com ela, e Kenshin como sempre tentando esfriar os ânimos. Ela resolveu tentar esquecer daquela história e passou o resto do dia tentando se convencer de que o caso tinha pouca importância, que era perfeitamente natural um homem ir àqueles lugares. Algumas vezes até tentou esclarecer tudo com Kenshin, mas sempre que entrava no assunto da “festinha” de logo mais ele continuava insistindo com a cara mais lavada do mundo que tudo não passava de uma reuniãozinha inocente, o que provocava a ira de Kaoru e custava a Kenshin uma boa dose de pauladas que ele em vão tentava entender.

Quando chegou a hora, Sanosuke apareceu e arrastou Kenshin sem muita cerimônia, ele não queria estar por perto se Kaoru tivesse um ataque. Mas para surpresa (e alívio) dos dois ela se trancou no quarto e não apareceu. Kenshin atribuiu o estranho comportamento da amiga ao seu gênio problemático, mas mesmo preocupado acompanhou Sanosuke recomendando a Yahiko que cuidasse dela.

Nem bem a dupla saiu e Kaoru apareceu vestida como se fosse treinar, a não ser pela sobrecasaca e os tabis de cor escura quase da mesma tonalidade do hakama. Ante um intrigado Yahiko ela disse que ia “fazer uma visita a Megumi” que teve um “tô sabendo” como resposta. Kaoru saiu em seguida, tanto para não perder aqueles dois de vista como para fugir do risinho sarcástico do garoto.

Para evitar ser descoberta pelo sexto-sentido de Kenshin, Kaoru resolveu tomar um caminho diferente. Desde os tempos de Yeasu Tokugawa, quando Tókio se chamava Edo, a zona do meretrício ou zona alegre foi estabelecida em um distrito afastado, distante alguns quilômetros do distrito de onde ficava o dojô Kamia.

O que mais incomodava Kaoru nem era o fato de Kenshin ir a um lugar como aquele, mas a insistência dele em desmentir. Ela achava que depois de tudo o que tinham passado juntos ela merecia um pouco mais de confiança. Desse modo ela optou por tomar um riquixá, chegar antes deles, esperá-los na única entrada do distrito e surpreender os dois, ela queria ver a cara de Kenshin e ouvir as desculpas que ele iria dar.

Quando Kaoru chegou à ponte que dava acesso ao distrito já era noite fechada. Ela não pode deixar de admirar a beleza da iluminação das casas de chá e das ruas no outro lado do rio onde mulheres pesadamente maquiadas tentavam atrair a freguesia. Kaoru escolheu um pequeno restaurante perto da ponte e pediu um chá enquanto esperava, sempre atenta aos transeuntes que iam e vinham.

Depois da quinta xícara de chá Kaoru começou a se impacientar. Pelos seus cálculos eles já deveriam ter chegado a tempo. Mesmo assim ela continuou no mesmo lugar.

Já passavam das 10 horas da noite quando ela começou a desconfiar que toda aquela história não passava de mais uma brincadeira do Sanosuke, a partir de então a raiva foi dando lugar a um crescente sentimento de vergonha.

Ela se lembrou que Kenshin sempre foi sincero com ela desde que se conheceram, quando logo de cara ele revelou ser ninguém menos que o lendário Battousai. Desde então ele nunca deu motivos para desconfianças, pelo contrário, mostrou uma amizade e dedicação a toda prova. Por fim, tomando uma resolução ela se levantou e pediu a conta ao taberneiro.

Pela segunda vez naquele dia ela bancou a boba. A melhor coisa que ela podia fazer era voltar para casa antes de Kenshin e tentar no futuro, ter um pouco mais de confiança nele. Afinal toda a confusão podia ter sido evitada se ela tivesse realmente insistido em esclarecer tudo.

Kaoru mal tinha começado a andar quando ouviu o primeiro tiro, que logo foi seguido por outros estampidos.

Assim como ela todos os transeuntes pararam por um momento para escutar o tiroteio cada vez mais forte e que parecia não estar muito longe. A seguir, como que obedecendo a um único comando todos começaram a correr e tentar se abrigar.

Kaoru em vão tentou pegar outro riquixá para casa, com uma rapidez fenomenal todos os condutores sumiram de vista. Pra piorar a confusão vinha exatamente da direção que tinha que tomar para ir para casa. Ela então começou a correr de um lado para outro tentado entrar em algum estabelecimento.

Passava por mulheres gritando desesperadamente e homens com expressões de puro pavor no rosto. Ela achou ter ouvido algumas vezes em meio à balbúrdia as palavras “ninjas” e “Yoshioka”. Quando se deu conta estava sozinha esmurrando a porta de uma hospedaria. A rua estava deserta e os únicos sons presentes eram tiros e tinir de espadas.

Vendo que era inútil Kaoru Kamia parou de bater na porta e gritar. Ela tinha se deixado levar pelo medo e desespero a sua volta, mas lentamente retomou o controle e o sangue frio. Afastou-se alguns metros e se agachou atrás de um muro para evitar balas perdidas e considerar suas opções. Pelo barulho uma verdadeira guerra estava acontecendo a poucas quadras dali. Se por um lado era arriscado sair agora, a perspectiva de ficar onde estava pelo resto da noite também não agradava.

Ela então resolveu esperar a intensidade do conflito diminuir um pouco para só então tentar voltar para casa.

Um quarto de hora tinha se passado quando ela decidiu sair. O tiroteio agora era esparso, no entanto os sons de luta se espalharam indicando que a refrega ainda iria longe.

Mas o que realmente a motivou foi a cena que se desenrolou a poucos metros e que ela pode vislumbrar por uma brecha no muro. Cinco homens corriam como se o próprio diabo os perseguisse. Quando passaram por Kaoru três deles foram abruptamente abatidos por armas de arremesso. Os outros dois também foram atingidos, mas mesmo feridos tentaram correr novamente. Mal haviam dado alguns passos quando quatro figuras vestidas de negro da cabeça aos pés os alcançaram e rapidamente os eliminaram usando espadas e foices com correntes.

Kaoru mal ousou respirar e agradeceu aos céus quando os quatro ninjas sumiram quase tão rápido quanto haviam surgido. Provavelmente logo outros apareceriam por perto, se fosse descoberta Kaoru poderia ter a certeza de uma morte rápida e brutal. Por isso ela verificou com cuidado as duas extremidades da rua antes de sair em disparada.

Sua intenção era contornar o local do conflito para depois seguir em direção do dojô. Sempre que via ou ouvia algum sinal de luta, procurava se desviar ou se esconder até ser seguro voltar a andar, sempre sob a cobertura das sombras. Mais de uma hora já se havia passado até ela alcançar uma distância segura. E foi com um suspiro de alívio que deixou os últimos sons de batalha para trás. Começou a andar com um pouco mais de confiança pelas ruas desertas.

Ela estava passando perto de um pequeno bosque fronteiriço à zona urbana quando algo fez os cabelos da sua nuca se eriçarem. O som de passos, vindo de uma rua transversal. Sem perder tempo Kaoru se escondeu entre alguns arbustos próximos, torcendo para que ninguém estivesse no seu rastro.

Para o seu desespero não demorou muito para um grupo de ninjas aparecer. Ao todo eles eram cinco, sendo que um deles era de longe o homem mais alto que Kaoru já vira (se não contar o gigante Fuji da Juppongatana). A um sinal dele todos pararam, o coração de Kaoru falhou uma batida. Mas ficou nisso, ao que tudo indicava o grupo estava esperando alguém ou alguma coisa.

E realmente, logo em seguida surgiu outro grupo de ninjas, escoltando um homem de meia idade usando roupas ocidentais. Este homem e o gigante se saudaram e se afastaram dos demais. Pararam a menos de 10 metros do local onde Kaoru estava.

Ela podia vê-los perfeitamente. O homem de casaca, colete e calças pretas era japonês. Apesar do chapéu Kaoru pode notar que seu rosto era profundamente marcado por rugas e o homem usava uma barba-bigode grisalha ao estilo Abraham Lincoln. Do outro Kaoru não pode ver muito, pois usava uma máscara que deixava só os olhos de fora.

- Como foi Creed-san? - perguntou o homem de chapéu - Nenhum problema, espero.

- Foi tudo conforme o planejado, Yamagushi-sama. - respondeu o gigante num japonês com forte sotaque estrangeiro. - Não tivemos dificuldades.

- Excelente. Como foi a morte de Matsuo?

- Eu devia ter dado ouvidos a você. Aquele velho deu um bocado de dor de cabeça, veja.

E então o homem chamado Creed tirou a máscara para mostrar ao outro um rasgo na parte de cima enquanto fazia um breve relato do assalto à mansão e a luta contra Matsuo Yoshioka. Nessa hora Kaoru pode ver com clareza o seu rosto, o cabelo loiro e a pele clara eram evidentemente ocidentais.

- Incrível. - disse Yamagushi enquanto examinava a máscara - Você nunca deixa de me surpreender CCreed-san. Gostaria muito de ter visto a cara do velho Yoshioka. Pena que fosse tão teimoso. Mas agora, com ele fora do caminho podemos seguir com o nosso plano.

- Eu mal posso esperar. Apagar um peixinho como o Matsuo não é nada comparado a matar o Imperador. Isso sim é trabalho pra mim.

Yamagushi devolveu a máscara a Creed.

- Sabe muito bem que não deve falar sobre isso Creed-san, todo o cuidado é pouco. Agora é melhor partir, estão esperando por você.

- Claro, desculpe. Vá amanhã ao monte Ueno, nós temos que comemorar.

Kaoru simplesmente não podia acreditar no que acabara de ouvir. Um atentado contra a vida do Imperador. Com o coração quase saltando pela boca ela observou os dois grupos indo por caminhos opostos. Quando achou que já tinham se afastado o suficiente, saltou para fora do esconderijo com a intenção de ir imediatamente bater na porta do delegado Uramura.

Mas um fato que para ela passou despercebido mudou sua sorte para pior, o vento mudou de direção. Sem mais nem menos o grupo liderado pelo gigante parou quando estava já a mais de cem metros. Kaoru ainda podia vê-los e o que viu fez o seu sangue gelar. O estrangeiro se virou e estava olhando direto para ela. No momento seguinte gritou alguma coisa e quatro ninjas dispararam na sua direção.

Com o coração quase saindo pela boca, Kaoru tratou de fugir logo. Ela não tinha a menor vontade de enfrentar quatro assassinos desarmada. Por isso começou a correr o mais rápido possível pelas ruas, na esperança de viver o suficiente para topar com alguma patrulha da polícia.

Mas logo se tornou óbvio que ela não ia conseguir escapar por muito tempo, mesmo assim procurou colocar a maior distância possível entre ela e o gigante que sozinho inspirava mais medo que todos aqueles ninjas juntos.

Várias vezes tentou despistá-los sem sucesso, a um dado momento olhou para trás e viu três ao invés de quatro perseguidores.

Ela imaginou que eles ainda não tinham usado shurikens e dardos envenenados na certeza de que logo a alcançariam e poderiam se divertir matando-a a golpes de espada. Tendo isso em mente Kaoru parou e se voltou para encará-los. Tinha de tentar alguma coisa antes que se esgotasse totalmente.

Quando viu a mulher parar e se voltar com os braços caídos ao longo do corpo, Hiko pensou: “até que enfim desistiu”.

Por ser mais rápido corria a uns 50 metros à frente dos companheiros e ia ganhar a aposta que fizera com eles sobre quem iria decapitá-la. Enquanto sacava a sua ninja-to da bainha pressa a suas costas não chegou a imaginar o porque da mulher se mostrar tão calma ante a morte iminente. Apenas pensou que assim precisaria de apenas um golpe.

Kaoru limpou todos os pensamentos da mente e se concentrou apenas na figura que corria na sua direção com uma espada desembainhada. Limpou tudo o que poderia atrapalhá-la: o medo; a raiva; a esperança. Por um instante fechou os olhos e sentiu que nada daquilo era importante, e portanto, o que tinha de fazer era simples.

Quando abriu os olhos ele estava a menos de cinco metros e ela sabia exatamente o que tinha que fazer.

Sem esforço nenhum ela aparou o golpe horizontal enquanto girava nos calcanhares. No momento seguinte ela estava de posse da espada. O ninja perdeu o equilíbrio e quase caiu. Mesmo assim tentou reaver a arma. Mas Kaoru num movimento ágil conseguiu evitá-lo e o golpeou no flanco.

O que aconteceu a seguir a despertou do quase transe a que tinha se imposto. O ninja ferido caiu sobre os joelhos e começou a fumegar como se estivesse pegando fogo. Com um grito hediondo ele começou a se contorcer enquanto o corpo parecia se dissolver em meio daquela fumaça nojenta. Em poucos segundos tudo o que restou foram as roupas, ainda fumegando.

Kaoru por pouco não conseguiu reprimir um grito de puro terror enquanto se afastava. Os dois outros chegaram ainda a tempo de assistir à agonia do companheiro.

Yamada e Debushi pararam por alguns instantes como que hipnotizados pela cena, até que mais uma vez encaram a mulher com os olhos chispando de ódio.

- Maldita!

- Desgraçada!

A partir daí começou o jogo de gato e rato que terminou por colocar Kaoru encurralada no pequeno beco cercada pelos dois ninjas.

 

Os três já estavam parados a um bom tempo sem ninguém ter a coragem de tomar a iniciativa. Até que Debushi falou.

- Não tem mais pra onde fugir. Desista.

- Não. Muito obrigada.

Debushi sabia que seria muito arriscado entrar naquele beco. A mulher tinha sido muito esperta ao se entrincheirar naquele lugar, só poderiam atacar um de cada vez, e os embates anteriores foram mais do que suficientes para mostrar que não estavam lidando com uma espadachim comum, o máximo que tinham conseguido foi feri-la de leve, no braço. Em vão gastaram todos os seus shurikens sem lograr nenhum acerto. O único jeito era um deles atacar, se não para matá-la, pelo menos para abrir caminho para o outro.

De repente o silêncio da madrugada é interrompido pelo som de apitos. O som soa como música para os ouvidos de Kaoru. Eram os apitos da polícia.

Sem perder mais tempo Debushi resolveu tomar a iniciativa. Suas ordens eram para matar aquela mulher, se o preço para isso fosse sua vida, tudo bem. Com um grito de kiai ele avançou tentando golpear Kaoru de cima para baixo. Mas esta se esquivou lateralmente e ao mesmo descarregou um golpe que amputou a mão direita do ninja.

Yamada atacou em seguida. Usando o companheiro que tinha se agachado como trampolim saltou e aplicou um poderoso golpe para partir Kaoru em dois.

No entanto, mesmo sendo pega de surpresa pela rapidez e impetuosidade do golpe ela teve reflexo suficiente para erguer a própria espada e bloquear o ataque. O choque foi tão grande que terminou por quebrar ambas as lâminas. Yamada estalou a língua antes de aplicar um forte pontapé em Kaoru, que literalmente voou antes de se chocar contra a parede nos fundos do beco. Nesse meio tempo Debushi tinha se arrastado para fora para dar mais espaço ao colega e poder cuidar da hemorragia no braço.

Kaoru havia batido a cabeça no choque e estava no limiar da consciência. Quando tentou se mover uma dor fortíssima a fez constatar que tinha pelo menos uma costela quebrada. Era o fim. Sem esboçar nenhuma reação ela viu Yamada recuar e pegar um pedaço de espada do chão.

- Isto vai servir. Em homenagem a sua bravura eu vou matá-la rap...

Antes de terminar a frase uma espada atravessou seu pescoço de lado a lado. Kaoru não pode ver o autor do golpe, pois este estava oculto pelo canto da parede. Assim que o corpo do ninja se dissolveu em fumaça uma figura alta e esguia aparece empunhando uma katana. Apesar da pouca claridade, Kaoru prontamente o reconheceu:

- S-Saitou, é você mesmo?

Hajime Saitou embainhou a espada e se aproximou, após um rápido exame tomou a garota nos braços e a ergueu facilmente do chão.

-Você é a última pessoa que eu esperava encontrar por aqui... Garota doninha.

Kaoru queria dizer mais alguma coisa, mas não teve forças. Acabou desmaiando nos braços do policial.


Comentários:

Antes de mais nada é hora de esclarecer algumas coisas sobre o Tentáculo. Vocês devem ter achado muito estranho aquele lance do ninja se dissolvendo, bom o fato é que eu não inventei aquilo. O Tentáculo surgiu pela primeira vez nas histórias do Demolidor sendo por muito tempo os seus principais antagonistas. A sua principal característica era o caráter obscuro e “místico” do grupo. Cada ninja além de passar por um árduo treinamento tinha de ser “iniciado” para ser aceito na seita. Através de um ritual que envolvia magia negra e sacrifício o candidato empenhava sua alma a uma entidade demoníaca e jurava lealdade eterna ao grupo. Dito isso vamos voltar ao fanfic em si.

Tenho que confessar que não ficou nenhuma maravilha, mas até que ele não é tão ruim, o que atrapalha é o monstruoso flashback no meio dele. Minha intenção inicialmente era narrar os fatos de forma seqüencial, mas depois tive a idéia de colocar a Kaoru logo de cara frente a frente com os ninjas para chamar a atenção do leitor e em seguida enxertar o flashback para contar como ela tinha chegado aquela situação. O que eu não contava era que o “intervalo” ficasse tão grande. Desse jeito o ritmo da história ficou meio quebrado, talvez eu tenha acertado no remédio, mas exagerado da dose. De resto acho que ele cumpre razoavelmente bem a função de amarrar alguns nós da narrativa e elucidar alguns fatos.

Nossa! Dava pra escrever outro fic só com esses comentários. Eu sempre me pergunto se alguém vai ter paciência para chegar até aqui depois de dez páginas tão mal escritas. Mesmo assim, se alguém estiver lendo isso e queira falar comigo o e-mail é [email protected] ou [email protected]. No próximo capítulo, as peripécias de um certo mutante canadense na era meiji. Até lá.

Capítulo 6

Capítulo 4

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