Samurai X-Men

Capítulo 17: Medidas Extremas, parte 2


Manhã do dia 1º de outubro do ano 11 da Era Meiji(1878)

Na verdade o duelo já tinha começado. Tanto Kenshin como Creed estavam empenhados em um embate de vontades. Jogando toda sua energia combativa contra o adversário, cada um procurava uma brecha, uma abertura para atacar.

O barulho causado por Logan foi percebido por ambos, e foi igualmente ignorado. Mas agora com tudo em silêncio, a tensão foi crescendo gradualmente, como se fosse um dique prestes a estourar.

Creed não estava gostando nem um pouco daquela situação. A sua habitual autoconfiança estava abalada. Com um esforço considerável de concentração, o mutante tentava se convencer de que estava diante de um simples humano, ao mesmo tempo em que tentava adivinhar o que Kenshin estava planejando.

Apesar de toda a concentração, Kenshin procurou relaxar. Precisava do controle absoluto sobre seu corpo para executar o Amakakeru Ryu no Hirameki.

O golpe supremo do Hiten Mitsurugi Ryu. Aquela era a sua cartada final, mas ele não sabia se iria funcionar. A esperança de Kenshin, era de que com o efeito cumulativo de todos os danos já recebidos, Creed estivesse mais vulnerável.

O silêncio agora era quase absoluto. Não havia pessoas nas casas vizinhas porque a polícia havia evacuado toda aquela área no dia anterior. A tensão chegou num ponto limite. Sem saber ao certo quanto tempo tinha se passado, todos mal ousavam respirar.

As mãos de Megumi estavam trêmulas e suadas. Ela nem notou quando o pequeno frasco que tinha nas mãos escorregou e caiu.

Ao cair no piso de cascalho branco e miúdo, o objeto provocou um som claro e leve. Mas que soou como se fosse um tiro de partida.

Dentes-de-Sabre saltou para cima de Kenshin, engolindo o espaço que havia entre eles num piscar de olhos. Suas garras visaram o pescoço do adversário.

Num movimento mais rápido ainda, Kenshin levou a mão à espada e deu um passo a frente. Em direção às garras de Creed.

Apenas um instante antes das garras atingirem sua jugular, Kenshin sacou a espada.

Num primeiro momento, Creed sentiu como se tivesse batido contra uma barreira invisível. O impacto que se seguiu teve o efeito de uma explosão. As últimas sensações que Creed teve antes de desmaiar foram ouvir um som muito forte e sentir o ar passando velozmente em torno dele.

Por isso ele não sentiu nada quando atravessou a parede externa da casa, bateu com força no chão assoalhado, rolou várias vezes, levando consigo tudo o que encontrou pelo caminho até parar deslizando dentro de um cômodo.

De todos ali somente Sanosuke já tinha visto Kenshin usar aquela técnica. Mesmo assim ele se convenceu novamente que não importava quantas vezes a visse, sempre ficaria impressionado.

Sob esse ponto de vista é até fácil compreender a reação de absoluto assombro por parte dos outros. Principalmente de Logan que nunca nem sequer ouviu falar daquilo.

Ele tinha saltado para cima de Megumi e Yahiko para protegê-los, quando Creed passou voando a poucos metros deles.

- Ei! - protestou Yahiko - Sai de cima de mim!

Logan se ergueu e olhou para Kenshin a tempo de vê-lo repor a Sakabatou na bainha. Em seguida ele deu alguns passos e espiou pelo grande vão recém aberto na parede da casa. Parecia que um caminhão desgovernado tinha passado por ali. Ainda tinham coisas caindo e se acomodando em meio ao caos. Apurando um pouco a vista Logan pode ver Creed caído de borco em meio de uma pilha de escombros.

O X-Man tinha sido novamente testemunha de algo fantástico. O golpe de Kenshin de alguma maneira atingiu Creed com um impacto duplo. Ao choque da espada se seguiu o impacto do ar. De alguma forma, o movimento de Kenshin causou um vácuo momentâneo. Isso explicava o estrondo que deixou Logan meio surdo.

- Jesus! - a palavra saiu da boca de Logan sem que ele percebesse. Ele não era um sujeito dos mais religiosos, muito pelo contrário. Portanto, o fato de ter proferido o nome do Nazareno era um sinal claro de sua estupefação.

A primeira a voltar a realidade foi Kaoru ao ver Kenshin cambalear e cair de joelhos.

- Kenshin! - sem perder tempo ela correu para onde ele estava e o abraçou

Logo em seguida, Megumi, Sano e Yahiko seguiram seu exemplo e num instante, todos eles estavam em volta de Kenshin.

- Ken-san. - Megumi já estava tirando remédio e bandagens da caixa - Deixe-me cuidar dessas feridas.

- Fantástico! - exultou Yahiko - Então esse é golpe supremo do Hitem Mitsurugi?!

- Boa Kenshin! - Sanosuke também estava radiante - Você conseguiu!

Por um momento, Kenshin se deixou envolver pelo clima a sua volta e relaxou. O Amakakeru Ryu no Hirameki exigia demais de suas forças, tanto físicas quanto espirituais. Era muito bom desfrutar da presença dos amigos, e melhor ainda do calor do corpo de Kaoru junto a si.

Mas esse momento durou pouco. Fazendo um esforço consciente, Kenshin afastou Kaoru. Talvez fosse cedo ainda para comemorar.

- Kaoru-dono... Por favor.

- Ah! - repentinamente, Kaoru pareceu constrangida - Desculpe.

- Por favor. - pediu Kenshin - Ajudem este servo a se levantar.

Com a ajuda dos amigos Kenshin se ergueu e olhou na direção do grande rombo na parede. Logan continuava no mesmo lugar. Sanosuke também olhava na mesma direção.

- E quanto a esse cara? - perguntou ele - Afinal qual é o papel dele nisso tudo?

- O Logan está do nosso lado Sano. - disse Kaoru com convicção.

- O que?! Como você pode ter tanta certeza?

Kenshin em seguida deu um passo a frente.

- Senhor Logan. - chamou ele.

O X-Man se voltou. A incredulidade ainda evidentemente estampada no seu rosto.

- O que o senhor acha? - perguntou Kenshin - Conseguimos derrubá-lo?

- Tu pegou ele de jeito. - disse Logan - O canalha ta com certeza... fora de combate.

Ao mesmo tempo, todos suspiraram aliviados. Menos Kenshin, ele continuava sério.

- Muito bem... - Kenshin se virou para Megumi - Temos que ver como está o Saitou.

Megumi se empertigou. Tinha se esquecido totalmente de Saitou. Ela olhou por um momento para as feridas de Kenshin como que em dúvida

- Não se preocupe com este servo. - Kenshin se apressou em tranqüilizá-la - Não é nada de grave. A prioridade agorra é o Saitou.

Sem perder mais tempo ela acenou positivamente com a cabeça e em seguida se dirigiu a Sanosuke.

- Vou precisar de ajuda. - disse ela.

- Certo... Mas que houve com o Saitou?

- Não tenho tempo pra explicar, apenas venha comigo.

- Tsc! O pau mandado do Saitou é o Chou. Cadê ele numa hora destas?

- Ai! Pau mandado é vovozinha crista de galo!

Todos se voltaram a tempo de ver o ex-membro da Juponngatana se erguendo. Ele tinha num lado do rosto um grande hematoma arroxeado.

- Falando no diabo... - troçou Sanosuke - Você é vaso ruim mesmo hein? Aquela porrada podia ter te arrancado a cabeça.

- Muito engraçado palhaço! - disse Chou enquanto se aproximava do grupo, caminhando com certa dificuldade. - Pois fique sabendo que não é um tapinha desses que vai me derrubar. O que aconteceu com aquele monstro?

Sanosuke fez um gesto displicente com o polegar, indicando o rombo na parede da casa.

Chou abriu um grande sorriso.

- Bem feito! O canalha teve sorte, eu não ia ter piedade dele dessa vez.

- E o que tu ia fazer? - Sanosuke não podia perder de jeito nenhum aquela oportunidade - Amassar a mão dele com a tua cara de novo?

- O que?! - o tom da pele de Chou ficou quase igual ao da sua roupa - O que você disse crista de galo?

- Ficou surdo... Eu disse que AI AI AI! Me solta.

Megumi havia avançado e torcido a orelha de Sanosuke sem perdão.

- Chega dessa palhaçada! - disse ela - Nós temos mais o que fazer.

Chou pareceu achar muita graça daquilo.

- He, he, he! Quem é o fracote agorAAARRRRG!

Sem soltar Sanosuke, Megumi fez a mesma coisa com Chou.

- Cala boca você também! Os dois vêm comigo, AGORA!

Ainda sob protestos, Megumi os arrastou em direção a casa sem nenhuma cerimônia. Todos os outros observaram a cena num silêncio constrangido, com uma grande gota de suor a lhes escorrer da nuca.

Mas ao mesmo tempo, aquilo serviu para quebrar um pouco da tensão que havia no ar. Especialmente para Kaoru, que até aquele momento, ainda custava a acreditar que o pesadelo tinha acabado.

- Kenshin. - disse ela - Obrigada... Você conseguiu novamente.

O espadachim olhou para ela e sorriu do modo como sempre fazia

- Não Kaoru-dono. Nós conseguimos.

Kaoru ficou muito vermelha e sorriu de volta. Sorrindo também estava Yahiko, mas a coisa estava começando a ficar muito melosa para o gosto dele. Por isso, foi com certo alívio que ele anunciou:

- Aí vem o gaijin.

- Parabéns Himura. - disse Logan enquanto se aproximava do trio - Ainda não entendi direito o que tu fez, mas com certeza foi um ótimo trabalho. Que golpe foi aquele?

O mutante parou a menos de um passo de Kenshin e lhe estendeu a grande mão peluda, havia agora um enorme sorriso no seu rosto também.

- No ocidente a gente se cumprimenta assim. Toca aqui xará!

O sorriso de Kenshin, porém havia se apagado do seu rosto. Ele olhou por um momento para a mão estendida em sua direção e em seguida lançou um olhar pelo restante do corpo do mutante. Havia sobrado muita pouca coisa inteira do uniforme ninja que Logan usava. Mas o que realmente chamou a atenção e impressionou Kenshin, foi a ausência total ferimentos e contusões que ele mesmo tinha visto quando chegou ali, a menos de dez minutos atrás.

- Vejo que o senhor se restabeleceu totalmente senhor Logan.

A animação de Logan sumiu como se lhe houvessem jogado um balde de água fria. Ele também parou de sorrir enquanto abaixava a mão. O tom de desconfiança de Kenshin lhe lembrou repentinamente que era um estranho ali. Era praticamente um alienígena naquele mundo e o único motivo de estar naquela época e lugar era para cumprir uma missão. Apesar de dever muito àquelas pessoas, devia se envolver o mínimo possível com elas.

O clima voltou a ficar pesado. Visivelmente constrangida, e perplexa com a atitude de Kenshin, Kaoru se apressou a tentar consertar a situação.

- Não fale desse jeito Kenshin.

- Kaoru-dono. Na opinião deste servo, o senhor Logan tem muito a explicar.

- Talvez mas...

- Primeiro, - interrompeu Kenshin - ele desaparece no meio da noite sem mais nem menos.

Kenshin fez uma pequena pausa para dar a Logan a oportunidade de se explicar. O mutante permaneceu calado, encarando Kenshin nos olhos sem pestanejar.

- Em seguida. - continuou o espadachim - Bem no meio de uma batalha contra o Tentáculo, este servo avista o senhor Logan acima de um telhado, observando a luta... Vestindo roupas de ninja.

Kaoru e Yahiko olham para Logan esperando alguma confirmação. Era óbvio que eles não tinham conhecimento daquele fato. Novamente o mutante permanece mudo.

- E finalmente, - Kenhin estava determinado a desmascarar Logan - Este servo chega a este local e descobre que o senhor Logan já estava aqui, lutando contra aquele monstro. Ele estava muito ferido e mesmo assim insiste em continuar lutando, desembainhado estranhas garras de dentro do próprio corpo. E como se não fosse o bastante, ele aparece agora completamente recuperado, como se nada lhe houvesse acontecido. E então? O que tem a dizer sobre isso senhor Logan?

Depois que Kenshin acabou de falar, se seguiu um silêncio desconfortável. Kaoru olhava para os próprios pés. Ela podia compreender a desconfiança de Kenshin, era lógico que não poderiam confiar em uma pessoa tão misteriosa. Ela mesma poderia acrescentar a aquela relação, o estranho aparelho em forma de caneta que Logan lhe passou e que acabou servindo para lhe salvar a vida.

Mesmo assim, para Kaoru Kamyia, a gratidão vinha em primeiro lugar.

- Kenshin... - começou ela - Acho que você se lembra que uma vez eu te disse que não me importava com o seu passado.

Um pouco surpreso, Kenshin olhou para ela.

- Apesar de tudo, - continuou Kaoru, erguendo o rosto e encarando Kenshin - o fato básico permanece o mesmo. Este homem salvou a minha vida, bem como a de Megumi e a do Yahiko. No fim, isso é tudo o que importa. Na minha opinião, o senhor Logan não nos deve nada... Muito pelo contrário.

- Ela ta certa. - disse Yahiko com um semblante sério e cruzando os braços - Se não fosse por esse cara nós não esttaríamos aqui.

Desta vez foi Kenshin que não encontrou argumentos. Mesmo assim, ele não queria dar o braço a torcer.

Em seguida Kaoru olhou para Logan e sorriu.

- Eu agradeço por tudo o que fez pela gente. - ela se curvou polidamente - Peço desculpas pela rudeza de Kenshin.

Muito sério, Logan retribuiu o cumprimento.

- Não precisa agradecer Kaoru. Não precisa pedir desculpas também... Na verdade, quem precisa se desculpar sou eu.

Kaoru parecia confusa.

- Logan. O que...

- Escutem. - interrompeu Logan erguendo uma mão - A culpa por vocês terem se envolvido nessa... bagunça, é em grande parte minha. O Himura tem razão, eu devo muito a vocês... - neste ponto Logan soltou um suspiro - Mas infelizmente não posso esclarecer certos fatos. Sei que isso é injusto, mas gostaria que vocês me perdoassem.

Logan se curvou mais uma vez, profundamente. Ele havia falado num tom sincero e humilde. Mas uma parte dele não deixou de se perguntar se não estava fazendo aquilo apenas para aliviar sua consciência.

Quando ele ergueu o busto, olhou para Kaoru. Ela tinha voltado a sorrir. Realmente não esperava nada em troca. "Droga" pensou o mutante "Isso é não é coisa que se faça".

Logan girou sobre os calcanhares e começou a andar.

- Deixem tudo por minha conta agora. - disse ele sem se voltar - Garanto que aquele cara não vai mais incomodar vocês. Assim que pegarem o Saitou, vão embora rápido. E se possível... eu gostaria que vocês esquecessem tudo o que viram por aqui.

- Espere.

Logan estacou e se virou para encarar Kenshin.

- Este servo acha que o senhor está pedindo demais.

- Kenshin! - Kaoru olhou para ele zangada - Não comece de novo.

- Não, Kaoru-dono. Este servo compreende as suas palavras e compartilha também de sua gratidão. Mas não é tão simples assim.

Kenshin deu um passo a frente. Sua expressão era resoluta.

- O senhor não pode esperar que nós simplesmente voltemos a nossa rotina e esqueçamos tudo isso. Além do mais, mesmo tendo derrotado ele, - Kenshin fez um gesto em direção ao local onde estava Creed - o Tentáculo vai continuar a nos perseguir. Não senhor Logan, já é tarde demais... Estamos atolados nisso até o pescoço.

- E o que tu quer que eu faça?

- Se o senhor mesmo admite ter parte nisso tudo... então tem o dever de nos contar. O senhor nos deve sim muitas explicações senhor Logan.

O X-Man suspirou novamente, aquilo ia ser mais difícil do que ele pensava.

A discussão recomeçou, mais acalorada desta vez. Logan estava distraído demais para perceber que Dente-de-Sabre havia recuperado os sentidos.

O mutante acordou com o som das vozes na rua. Rangeu os dentes e tentou se mover. Imediatamente uma onda de dor o atingiu fazendo com que ele quase perdesse os sentidos novamente. Foi só à custa de muita força de vontade, que Creed conseguiu permanecer acordado.

Desistindo por enquanto de se mexer, Dentes-de-Sabre, procurou avaliar a sua situação. Demorou um pouco para sua visão entrar em foco. Ele tinha ido parar num dos cômodos dos fundos da casa, a claridade vinha principalmente do vão que ele mesmo abriu através de vários cômodos até a parede externa. Sua audição estava péssima, havia um silvo agudo em seus ouvidos.

Aos poucos, ele foi se dando conta do que tinha acontecido. Conforme isso acontecia seu ódio também aumentava.

Logo, aquela raiva foi suficiente para ele poder ignorar a dor. Pouco a pouco, e a custo de muito esforço, o mutante conseguiu içar o corpo para cima e sentar, apoiando as costas numa parede. A cada respiração ele sentia uma dor que parecia rasgá-lo no meio.

Creed olhou para baixo e viu uma grande marca em diagonal no seu tórax. A marca, de um vermelho arroxeado intenso, ia do quadril direito até quase o ombro esquerdo, era praticamente uma vala com quase dois centímetros de profundidade. O fato daquilo não ter começado ainda a cicatrizar indicava que os danos haviam sido realmente muito extensos. A sobrecarga no fator de cura mutante era com certeza fruto não só daquele último golpe, mas de todos os que recebera antes, especialmente o devastador Futae no Kiwami de Sanosuke. Se não fosse pelo seu esqueleto de adamantium, Creed estaria mais morto do que vivo.

Com um sentimento crescente de incredulidade, Creed se perguntou como aquele homenzinho conseguiu aquela proeza. Ele imaginava que nada nem ninguém no mundo todo poderia atingi-lo naquela época. Essa ilusão tinha acabado ir para o ralo, sua vida tranqüila no século XIX tinha acabado.

E como se isso não bastasse, ainda tinha o Logan. Creed cerrou os punhos com força quando se lembrou que o X-Man viajou no tempo só para infernizar sua vida.

O som de conversas chamou novamente sua atenção. Pelo buraco na parede ele pode ver Kenshin e Logan, eles pareciam estar discutindo. Creed não podia ouvir direito o que estavam conversando, mas com certeza devia ser algo sobre ele.

"Desgraçados!" - o ódio de Creed aumentava cada vez mais. - "Isso não vai ficar assim!" - Apesar disso, naquela altura Creed já havia se dado conta de que na condição em que estava, não seria páreo para Kenshin, e muito menos para um Wolverine aparentemente recuperado. A frustração só servia para aumentar sua raiva.

Mordendo os lábios, Dentes-de-Sabre chegou a conclusão que a sua única alternativa era fugir antes que viessem buscá-lo.

Com mais um esforço, o mutante se pôs de pé. Ele teria que sair sorrateiramente pelos fundos e pular o muro. Antes de se virar para fazer isso, ele lançou mais um olhar para o buraco. Kenshin e Logan ainda estavam ocupados com sua discussão. Kaoru entrou em cena e se colocou entre os dois, tentando aparentemente acalmar os ânimos.

A visão da jovem provocou outro estremecimento de pura raiva e desgosto em Creed. Além do fato de ter sido vencido, ainda teria de engolir o fracasso de sua missão. Já até podia imaginar o que o líder do Tentáculo, Sato Harada, diria quando o visse voltar de mãos abanando. Não que Dentes-de-Sabre se importasse realmente com os objetivos do Tentáculo, o que ele não suportava era ser taxado como incompetente.

Foi então que Creed se deu conta de onde estava.

Foi exatamente naquele cômodo, há poucas horas atrás, que ele teve a vida de Kaoru Kamiya em suas mãos. Podia ter terminado tudo ali, mas então ele pressentiu a chegada de Logan, e resolveu se divertir mais um pouco mais. Creed quase soltou uma risada amarga. Era irônico que tudo acabasse exatamente ali, naquele mesmo lugar. Podia ainda se lembrar da cena dele mesmo arrombando a porta e encontrando Kaoru acuada num canto, uma expressão feroz em seu rosto e uma arma em suas mãos.

A idéia surgiu na mente de Creed num estalo. Ele lançou um olhar para o canto do quarto e viu as armas, ainda espalhadas em desordem pelo chão. Era incrível como ele não as havia notado ainda. Um lento e perverso sorriso brotou no rosto do mutante. Realmente aquilo era muito irônico.

Enquanto isso, Logan e Kenshin não tinham chegado ainda a um acordo.

- Escuta! - Logan já estava perdendo a paciência - Pela última vez! Vocês vão sair daqui tão logo o resto do pessoal volte com o Saitou.

- Este servo não vai a lugar nenhum enquanto não tiver algumas respostas, senhor Logan... se é que é esse mesmo o seu nome.

Kaoru, que havia se colocado entre os dois, se virou bruscamente para Kenshin.

- Kenshin! Isso já é demais!

Yahiko parecia ter entregado os pontos. Aquela discussão obviamente não ia chegar a lugar nenhum. Finalmente vencido pelo cansaço, o menino havia se sentado na escada para varanda e assistia ao bate boca reprimindo de minuto em minuto um bocejo.

Ele foi abruptamene tirado da madorna pela voz de Sanosuke.

- Ei! Sai da frente moleque!

O garoto se pôs de pé num salto e se virou.

- Hein! Moleque é a... Nossa!

Com uma expressão de espanto no rosto, Yahiko se pôs de lado e deu passagem. Usando uma porta como maca, Sanosuke e Chou passaram carregando Saitou. Para sua sorte, ele havia sido colocado no outro lado da casa e não foi atingido pela "entrada" espetacular de Creed.

Desnudo da cintura para cima, o policial tinha várias voltas de bandagens lhe envolvendo o tórax. Sua aparência não tinha melhorado em nada, muito pelo contrário.

- Cuidado nessa escada. - pediu Megumi que vinha logo atrás de Chou - Não balancem demais.

Também em silêncio, Logan, Kenshin e Kaoru observaram o pequeno cortejo se aproximar. Momentaneamente esquecidos da discussão, os três se limitaram a olhar para Saitou. Kaoru foi primeira a verbalizar a pergunta que todos estavam se fazendo.

- Megumi... Como ele está?

- Nada bem. - respondeu a médica de forma vaga - Vocês dois, baixem ele aqui por favor.

- Uff. Já tava na hora. - resmungou Chou - Esse cara é pesado.

- Pára de reclamar. - retrucou Sanosuke fazendo uma careta de dor - Pelo menos você não tem que carregar esse peso todo com os dois braços machucados.

A maca foi baixada até o chão. Megumi começou a monitorar os sinais vitais de Saitou. Todos, inclusive Yahiko, tinham se aproximado e observavam em silêncio.

Chou se abaixou e pegou a espada de Saitou, que estava a seu lado na maca. Tirou ela da bainha, a lâmina estava partida mais ou menos no meio e ainda havia sangue seco nela.

- Olha só pra isso. É muita sorte ele ter sobrevivido até agora.

- Realmente. - disse Megumi enquanto continuava a examiná-lo - Ele não teve nenhum órgão ou artéria atingida, mas a perda de sangue foi muito grande.

Logan se abaixou e verificou o pulso e respiração do policial. Estavam realmente muito fracos.

- Você não pode fazer uma transfusão de sangue? - perguntou o mutante.

- Não com o que eu tenho aqui. - respondeu Megumi indicando a sua caixa de remédios. - Temos que levá-lo para um hospital o mais rápido possível.

- Podemos esperar pela volta da patrulha que saiu em perseguição ao Tentáculo? - perguntou Kaoru. - Eles com certeza terão meios de transportá-lo mais rápido.

- É arriscado. - Megumi balançava a cabeça - Não temos idéia de quando eles vão voltar. O Saitou pode não resistir até lá.

Wolverine trocou um olhar com Kenshin, ambos já tinham visto homens morrer em quantidade suficiente para compreender que a situação era realmente crítica. Uma atitude precisava ser tomada com urgência.

- Acho que isso resolve a nossa questão, Himura. - disse Logan - Se vocês não levarem esse homem pra um hospital... ele morre.

Kenshin estreitou os olhos. Era óbvio que Logan pretendia usar aquela desculpa para se safar sem esclarecer nada. De alguma forma, Kenshin sabia que se perdesse ele de vista agora, nunca mais iria vê-lo novamente. Por um momento, o espadachim se debateu em dúvidas. Com um esforço de concentração Kenshin tentava encontrar uma alternativa para aquele impasse.

Mas Sanosuke deu fim a aquele impasse.

- Muito bem! E o que a gente ta esperando? - disse ele com energia - Não quero ter a morte desse palhaço na minha consciência. Além do mais tenho contas a acertar com esse cara. - nesse ponto Sanosuke olhou para Saitou e sorriu - Se ele pensa que vai fugir de mim desse jeito ta muito enganado.

Kenshin notou que todos olhavam para ele. Em seguida o espadachim olhou mais uma vez para Saitou e se resignou. A verdade é que não haviam alternativas.

- Chou, Sano. - Kenshin ainda olhava para Saitou. - Ergam ele. Vamos embora daqu...

Kenshin não terminou a frase. Uma sensação de perigo muito forte o assaltou. Ao mesmo tempo, a audição hipersensível de Logan captou o ruído característico de uma arma sendo engatilhada.

- PRO CHÃO!!! - gritou ele ao mesmo tempo em que saltava sobre Kaoru, procurando protegê-la com seu próprio corpo. Enquanto fazia isso teve a impressão de sentir algo passar zunindo por ele

Um estampido forte encheu o ar da manhã. Todos se atiraram para o chão.

Logan foi o primeiro a erguer a cabeça, bem a tempo de ver a fumaça do tiro e o vulto de Dentes-de-Sabre correndo para os fundos da casa.

Num movimento ágil, Wolverine saltou de pé e disparou a correr naquela direção. Enquanto corria, ele sacou as garras.

Quase sem sentir, ele atravessou a casa e se viu no pátio dos fundos.

Creed estava perto do muro e se virava para ele. Apontando uma arma.

O X-Man brecou e esperou pelo tiro.

- Covarde! - rosnou Logan - Se quer atirar em mim faz isso de frente!

Um sorriso maldoso surgiu no rosto de Creed.

- E quem disse que eu atirei em ti?

A compreensão daquelas palavras atingiu Logan um instante antes dele ouvir o grito angustiado de Kenshin.

- KAORUUU!!!

- Isso mesmo! - confirmou Creed - Assim como tu eu não gosto muito de armas de fogo... Mas considera isso o troco por aquele brinquedinho que tu emprestou pra guria.

Chocado, Logan se sentia incapaz de articular qualquer palavra. Creed ainda apontava a arma para ele

- Mas agora a pergunta é... O que tu vai fazer?

O som confuso de várias vozes chegou aos ouvidos de Logan e ele virou a cabeça naquela direção.

Quando tornou a olhar para Dentes-de-Sabre, a única coisa que viu foi a carabina Winchester que ele segurava caída no chão. O assassino tinha aproveitado a breve distração de Logan para pular o alto muro com a agilidade de um gato.

Logan chegou a dar alguns passos naquela direção, mas parou. Ele sabia muito bem que Creed havia falado aquilo justamente para tentar impedi-lo de ir atrás dele. Mesmo assim o X-Man hesitou.

Para Creed ter tomado uma atitude daquelas, isso só podia significar que ele estava realmente muito ferido e tinha se dado conta de que agora estava em desvantagem. Se Logan fosse atrás dele, poderia dominá-lo facilmente. Mas se voltasse agora para verificar a situação de Kaoru, as chances de encontrá-lo depois se reduziriam muito.

A voz de Kenshin chegou mais uma vez a seus ouvidos.

- Kaoru! Por favor, resista!

A angústia na voz dele fez com que Logan fechasse os punhos com força suficiente para enterrar as unhas na carne.

Sem mais nem menos, ele recolheu a garras, se virou e começou a correr de volta. A raiva cega que ele estava sentindo até a pouco foi finalmente tragada por uma onda de frustração e culpa.

Quando Logan entrou na casa, viu num canto um monte de armas espalhadas. Sem se deter o mutante blasfemou contra ele mesmo. Aquele com certeza era o ápice de uma série de erros que ele cometera desde o dia anterior. Agora só poderia rezar para que esse erro não resultasse na morte de mais um inocente.

Ao chegar ao buraco aberto por Dentes-de-Sabre, Logan estacou. A luz do sol o ofuscou por um momento o obrigando a erguer a mão para se proteger. A primeira impressão que teve quando sua visão entrou em foco não foi nada animadora.

Kaoru estava estendida no chão com a cabeça escorada nos joelhos de Kenshin. Ao seu lado, Megumi e Sanosuke trabalhavam freneticamente enquanto o Yahiko e Chou estavam mais afastados, assistindo a tudo num silêncio cheio de expectativa.

Logan engoliu em seco e começou a se aproximar. A chegada dele chamou a atenção de todos menos de Kenshin e Megumi. Sanosuke olhou para trás e encarou o mutante.

- O que houve? - perguntou Sanosuke com voz tremula - Cadê aquele desgraçado?

Ignorando a pergunta, Logan chegou mais perto e se dirigiu a Megumi, ao mesmo tempo em que tentava ver por sobre o ombro dela.

- Como ela está? - perguntou ele.

- Eu fiz uma pergunta gaijin. - insistiu Sanosuke - O que aconteceu?

Sem coragem para encarar Sanosuke, Logan cerrou os punhos e continuou a olhar para as costas de Megumi.

- Ele... Escapou.

- O QUE!!!

- SANOSUKE! - gritou Megumi - Não se atreva! Fique onde está, preciso que continue a fazer pressão aqui.

Com uma expressão de fúria no rosto, Sanosuke continuou olhando para Logan como se pudesse perfurá-lo com os olhos. Logan olhou para ele e viu uma lágrima abrir caminho pelo seu rosto.

- Sinto muito. - disse o X-Man.

Sanosuke engasgou. Sentindo a os ombros tremendo e a eminência de novas lágrimas ele desviou o rosto e fechou os olhos com força.

- Droga!

Logan olhou para Kenshin. Ele parecia nem ter notado a sua presença. Sua atenção estava totalmente focada em Kaoru

- K-Kenshin... - balbuciou ela - Eu...

Um espasmo de dor não a deixou terminar a frase. Kenshin se sobressaltou.

- Kaoru!

- Não deixe ela se mexer! - ordenou Megumi, com uma tensão evidente na voz.

Kaoru estendeu uma mão para Kenshin. Ele a segurou com força e tentou sorrir.

- Vai ficar tudo bem. - disse ele, tentando transmitir uma segurança que estava longe de sentir. - Por favor, não se esforce Kaoru-dono.

Kaoru tentou falar novamente, mas sua boca articulou sem emitir nenhum som. Ela parecia querer desesperadamente dizer alguma coisa, e por um longo momento lutou para reunir forças. Lágrimas corriam livres pelo seu rosto. Kenshin chegou mais perto, se inclinando até quase seus rostos se tocarem.

- Me... desculpe. - disse ela com um fio de voz.

Kenshin sentiu sua alma cair vertiginosamente num vácuo gelado. Sua reação imediata foi apertar a mão dela com mais força e acariciar seu rosto com a mão livre.

- Não fale assim Kaoru! - a voz de Kenshin também era muito fraca - Resista!

- F-frio.... está tão... frio.

Ela estava tremendo, e um suor frio e pegajoso começou a rorejar sua fronte. A médica franziu a testa, ela também suava, mas era de puro nervosismo.

- Ela está entrando em estado de choque. Preciso que vocês a ergam um pouco.

Kenshin e Sanosuke fizeram como ela pediu.

- Pode extrair a bala? - perguntou Logan.

Megumi não respondeu. Em vez disso começou a enrolar mais voltas de bandagens em torno de Kaoru. Logan foi para o outro lado e se abaixou, Megumi ergueu os olhos e olhou para ele por um instante. Havia também lágrimas em seus olhos.

Dolorosamente, Logan se deu conta de que ela não poderia fazer mais nada para ajudar Kaoru. O X-Man baixou os olhos e viu que o ferimento mal deixava um pouco de sangue no curativo. A bala havia penetrado do lado direito, logo abaixo das costelas.

Logan tinha conhecimento suficiente em anatomia para saber que a região do fígado era um ponto vital. Todos os sintomas indicavam que a bala rompeu algo importante, provocando hemorragia interna. Megumi não tinha o equipamento necessário para realizar a operação, e principalmente não tinha mais tempo.

Kaoru estava morrendo.

Megumi terminou de fixar as ataduras e sinalizou para que Kenhin e Sanosuke a baixassem novamente, com todo o cuidado possível.

- Temos que tirá-la daqui! - disse Yahiko se erguendo - Kenshin!

Kenshin não respondeu. Ele havia novamente apoiado a cabeça de Kaoru em seu colo e gentilmente limpava o suor e a sujeira do seu rosto com um lenço.

- Kenshin! O que há com você!?

O garoto deu um passo a frente, mas foi detido por Chou.

- Fica quieto aí moleque.

- Me larga!

Yahiko olhou para trás e viu que Chou tinha uma expressão sombria e muito séria no rosto. Ele olhou nos olhos de Yahiko e sacudiu negativamente a cabeça. A mensagem que aquele olhar passou foi muito clara.

- NÃO!!!

Com um safanão, Yahiko se livrou de Chou e correu para perto de Kaoru. Caiu de joelhos ao lado dela. Olhou em volta e viu que todos estavam cabisbaixos.

- Kaoru! - chamou ele - Kaoru!

Kaoru virou a cabeça e olhou para Yahiko, seus movimentos eram lentos, pareceu levar alguns segundos para ela reconhecer quem estava ali. Quando finalmente seus olhos entraram em foco, ela sorriu.

- Kaoru! - repetiu Yahiko - Que história é essa? Vai desistir?

Em silêncio, ela se limitou a continuar sorrindo. Inconformado, Yahiko sacudia a cabeça.

- Não! Eu sei que você é forte. REAJA! V-você não pode morrer por causa de uma bobagem dessas.

Kaoru ergueu a mão e acariciou o rosto de Yahiko. Ele a segurou contra o seu rosto. Estava fria e úmida.

Yahiko sentiu como se algo tivesse quebrado dentro dele. Seus olhos se encheram de lágrimas, e ele não fez nenhum esforço para contê-las.

- É m-muita sacanagem feiosa. - disse ele entre soluços - Abandonar seu único aluno.

Sanosuke se ergueu. Queria falar alguma coisa, extravasar a dor que ameaçava romper-lhe o peito. Mas não podia, havia um nó na sua garganta. Megumi então, sem mais nem menos se levantou e o abraçou. Congelado de surpresa, Sanosuke ficou inerte enquanto sentia as lágrimas de Megumi molhando a sua roupa. Sem nem pensar no que estava fazendo, Sanosuke a abraçou de volta, apertado com força o corpo trêmulo da médica. Logo, suas lágrimas já estavam se juntando as dela.

Chou fungou e desviou o olhar da cena. Mais do que nunca, ele detestou ter se envolvido em tudo aquilo.

Kenshin permanecia de olhos secos. Mas parecia ter perdido sua alma. Kaoru havia voltado a olhar para ele e ergueu a mão, tocando em sua face esquerda, sobre a cicatriz em forma de cruz. Sem mais nem menos, ela havia começado a sangrar, como se houvesse sido aberta recentemente. Uma gota de sangue caiu sobre o rosto de Kaoru, se misturando imediatamente com suas lágrimas. Apesar disso, ela sorria, acima de tudo, parecia haver gratidão em seus olhos.

Logan socou o chão e cerrou os dentes. Mais do que nunca ele se convenceu que a culpa de tudo aquilo era dele. Culpa da sua incompetência... Acima de tudo, culpa da sua arrogância.

Amargurado, ele viu que a respiração de Kaoru estava cada vez mais fraca, seus olhos começavam a perder o brilho. Ela tinha poucos minutos de vida pela frente. Nem Megumi nem médico nenhum poderia salvá-la, a tecnologia que poderia fazer isso ainda estava muitas décadas à frente.

Naquele momento, uma idéia súbita se cristalizou na mente do mutante.

Sem mais nem menos ele se ergueu e começou a apalpar o faixa abdominal de suas roupas de ninja. Sentiu algo duro e redondo e em seguida puxou o relógio de bolso, de aparência simples.

Havia se esquecido totalmente dele. O relógio era na verdade um dispositivo de comunicação que a LL&L havia lhe fornecido. Era um milagre ele ainda estar ali depois de tudo o que Logan passara.

Restava saber se ainda funcionava.

Se atrapalhando um pouco por causa do nervosismo, ele abriu a tampa do relógio e apertou duas vezes um pequeno botão na lateral. Um som de estática surgiu. Cruzando os dedos, Logan apertou novamente o botão e aproximou o aparelho da boca.

- Chang! Sou eu Logan! - Disse ele em inglês - Pode me ouvir?

O X-Man soltou o botão e aguardou alguns segundos, ouvindo apenas a estática. Ia chamar novamente, quando a voz de Chang soou alto e clara.

- Logan! Onde diabos você está? O que aconteceu?

O X-Man sorriu, nunca imaginou que um dia ficaria tão contente só por ouvir a voz do velho Chang. Precisava se apressar agora.

- Chang! - disse ele - Cala boca e escuta. To solicitando remoção de emergência, código Delta. Pode localizar o meu sinal?

- Sim. Você já está na nossa tela... Mas o que houve afinal? Conseguiu completar a missão?

- Não é hora pra falar disso Chang. - a urgência na voz de Logan era evidente - Preciso que tu prepare a equipe médica de emergência.

- Como assim?! Pra Você?!

- Negativo. Tenho dois feridos graves aqui. Um deles foi baleado e ta em estado crítico, possível rompimento de fígado e hemorragia interna. Você me copiou?

Logan soltou o botão e esperou a resposta, desta vez ela demorou um pouco mais.

- Logan... você sabe muito bem que eu não posso fazer isso.

Logan sentiu o sangue ferver.

- UMA OVA QUE NÃO!!!

Depois da explosão Logan olhou para trás. A aquela altura todos os presentes ali olhavam para ele com uma expressão de puro espanto no rosto. A exceção era Kenshin, que ainda olhava para Kaoru e continuava alienado de tudo. O X-Man respirou fundo e tentou se acalmar. Precisava convencer Chang com argumentos, não pedradas.

- Escuta aqui Chang. Tem duas pessoas morrendo aqui e tu vai ajudá-las.

Desta vez a resposta veio de imediato.

- Sinto muito Logan. Você conhece nossos regulamentos. É expressamente proibido permitir a entrada de elementos estranhos em nossas instalações. Isso é uma transgressão gravíssima dos protocolos de segurança da companhia.

- É mesmo? - Logan tinha que fazer força para não gritar novamente - Espero que tu se lembre que se dependesse desses regulamentos, tu estaria mortinho da silva.

- Logan eu...

- Te lembra de daquele buraco fedorento em que te jogaram na Coréia em 53?

- ....

- Não? Então deixa eu te refrescar a memória. Tu foi pego pelos comunas e eles iam te fuzilar no dia seguinte. Os chefões me disseram pra te abandonar. Mas em vez disso o tio Logan invadiu aquela maldita fortaleza e salvou o teu rabo, desobedecendo todas as ordens.

- Eu lembro disso, no entanto...

- E teve aquela outra vez em que a nossa filial no planeta Kasar foi invadida por um bando de alienígenas raivosos. Tu ficou pra trás novamente e eu tive que convencer o Rossovich a abrir um portal sem permissão nenhuma pra poder te resgatar.

Logan soltou o botão e esperou pela reação do velho amigo. Ele ficou quieto, parecia que aquilo estava funcionando.

- Chang. - continuou Logan - Eu podia ficar o dia todo relembrando contigo os velhos tempos. Você sabe mais do que ninguém que eu não dou a mínima pra regras quando se trata de salvar um amigo. É esse o caso agora.

- Eu sei disso Logan. - parecia haver pesar na voz dele - Nem em mil vidas eu poderia lhe retribuir por tudo o que fez por mim. Mas entenda... Se levarmos essas pessoas para cá estaremos violando a primeira diretriz.

Logan franziu o cenho. Chang estava se referindo a regra número um da Landau, Luckman & Lake. "Evitar a todo custo se expor durante o contado com nativos de outros planetas ou dimensões". Apelar para o sentimentalismo não estava dando certo. Era hora de usar o ás na manga.

- Acontece que nós já a violamos Chang.

- Como? O quer dizer com isso?

- Eu já sei quem mandou o Dentes-de-Sabre matar o Teleporter.

- Ainda não estou entendendo.

- Vocês me disseram que o Creed topou com o Teleporter por mero acaso... Cascata!

Chang permaneceu calado, Logan se perguntou se o amigo realmente sabia de alguma coisa sobre isso. Não seria a primeira vez que ele ocultava informações de Logan. As insinuações de Creed podiam muito bem ser falsas também, mas o X-Man estava disposto a jogar suas fichas naquele rumo de raciocínio.

- Foi a própria LL&L que contratou o Creed pra acabar com o Teleporter não foi?

Novamente silêncio. Logan respirou fundo, e continuou.

- Vocês mesmos precipitaram essa confusão toda, e depois me chamaram pra varrer tudo pra baixo do tapete. Bem típico de vocês.

- Logan... isso é...

- Escuta Chang. Essas duas pessoas foram feridas pelo Creed. Só Deus sabe quantos ele já matou desde que chegou aqui, mas estes dois ainda podem ser salvos. A responsabilidade por mandar o canalha pra cá é de vocês, a menos que tu ajude essas pessoas, não vou mexer mais uma palha pra resolver isso. Pode enfiar a primeira diretriz onde tu quiser.

O mutante afastou o comunicador da boca e esperou, mais uma vez cruzando os dedos. Durante um tempo que pareceu uma eternidade, Logan ouviu apenas cliques e estática, até que voz cansada de Chang se vez ouvir novamente.

- Muito bem Logan, será como você quiser.

Logan fechou os olhos e suspirou aliviado.

- Deus o abençoe Chang. O que eu faço agora?

- Procure um ponto de entrada, você deve se lembrar das especificações.

Logan olhou em volta e logo encontrou o que procurava. A um canto do pátio havia um pequeno barracão de madeira, provavelmente o depósito de lenha. Sem perder tempo Logan se dirigiu para lá. Yahiko o acompanhou com os olhos.

- O que ele está fazendo? - perguntou o menino - Com quem ele estava falando?

- Deve ter enlouquecido. - disse Sanosuke

O X-Man se aproximou da porta do depósito e a examinou. Era uma porta de abrir simples, feita de madeira e sem nada de especial.

- Achei. - disse Logan ao comunicador - E agora?

- Acerte os ponteiros do relógio para meio dia e aperte o botão lateral três vezes.

Logan fez como solicitado. Assim que apertou o botão pela terceira vez, pequenos pinos de fixação saltaram das laterais e uma voz eletrônica se vez ouvir.

"dispositivo transespacial pronto"

- Fixe o aparelho no ponto de entrada, - disse a voz de Chang a seguir - nós iremos fornecer as coordenadas de chegada.

- Pronto! - usando os pinos de fixação, Logan prendeu o relógio na porta. - E agora?

- Agora escute com atenção. Assim que você apertar o botão de cima do relógio, terá exatamente um minuto para fazer a travessia com seu pessoal. Assim que esse tempo acabar, o portal vai se fechar, e o aparelho vai se auto destruir. Entendeu?

- Entendido. Nos vemos daqui a pouco Chang. Prepare a equipe médica.

Respirando fundo mais uma vez Logan apertou o botão e deu um passo atrás.

Por um breve instante nada aconteceu, e Logan temeu que o aparelho tivesse sido danificado. Mas então um som estranho começou a brotar do relógio. Parecia ser o som de algum dispositivo poderoso acelerando.

O som cresceu rapidamente, acompanhado de estalos parecidos com um circuito elétrico se fechando. Sem mais nem menos fagulhas de pura energia começaram a sair do relógio e se espalharam pela porta inteira.

A barulheira e o show de luzes cresceu cada vez mais, obrigando Logan a se afastar e tampar os ouvidos. Todos, inclusive Kenshin, observavam aquilo sem acreditar no que seus olhos estavam vendo.

E então, um som mais forte se fez ouvir, parecia alguma coisa se rasgando. Uma luz muito forte contornou a porta, e a seguir tudo se acalmou.

Logan baixou a mão que protegia seus olhos. Havia fiapos de uma luz estranha escapando das frestas da porta, como se alguém tivesse acendido um holofote muito potente dentro do depósito. O mutante se aproximou e sentiu um familiar arrepio na base da nuca. Todos os seus pelos se eriçaram e havia um cheiro muito forte de ozônio no ar. Era sempre assim quando ele estava diante de uma câmara de teleporte da LL&L.

No relógio ainda fumegante surgiu um mostrador digital e a voz eletrônica se vez ouvir mais uma vez.

"Portal aberto, T - 60 segundos"

O mostrador começou a correr numa contagem regressiva. Logan torceu a maçaneta da porta e a abriu.

Luz branca e suave. Era tudo o que havia do outro lado. Sem perder tempo, Logan girou sobre os calcanhares e correu para o local onde os outros estavam.

Nenhum deles parecia capaz de emitir nenhum som. Boquiabertos, se limitavam a admirar a estranha luz que vinha do depósito. Logan chegou perto e sem mais nem menos pegou Kaoru e a ergueu nos braços. Ela havia perdido os sentidos e sua respiração mal era audível agora.

Pegos de surpresa, todos demoraram para reagir. Kenshin foi o primeiro, saltou de pé e foi atrás de Logan, que já se afastava com Kaoru nos braços.

- Espere! - gritou Kenshin - O que está fazendo?

Logan parou e se virou para ele.

- Salvando a vida dela. - disse ele olhando nos olhos de Kenshin, em seguida ele olhou para os outros, que pareciam ainda chumbados no chão. - Todos vocês. Peguem o Saitou e me sigam. Temos menos de um minuto!

Sem esperar resposta, o X-Man se virou e se dirigiu a passos largos para o portal. Sabia que a única maneira de convencê-los era esta. Não havia tempo para explicações.

Kenshin correu e segurou o ombro de Logan o obrigando a parar novamente.

- LARGUE ELA!!!

- Se eu fizer isso ela vai morrer! É isso que tu quer?

-....

- Confia em mim... Esse é o único jeito.

Se debatendo em dúvidas, Kenshin se perguntou se aquilo tudo não era um pesadelo ou se estava ficando completamente louco. Seu cérebro parecia prestes a se desligar por completo. A visão daquela porta iluminada lhe causava arrepios.

Ele olhou para Kaoru. Ela parecia dormir tranquilamente, e desse sono nunca acordaria. Kenshin já havia aceitado isso e agora aquele estranho dizia que ainda havia uma esperança. Os dois olharam fundo nos olhos um do outro.

- Confia em mim. - repetiu Logan

Kenshin afrouxou a pressão no ombro de Logan. Ele segurou Kaoru com mais firmeza e quase correu na direção da porta.

Boquiabertos, todos observaram ele simplesmente desaparecer no meio daquela luz. Kenshin cerrou os punhos e se voltou para eles.

- Venham todos.

Em seguida ele respirou fundo e entrou, sendo engolido pela luz da mesma forma que Logan e Kaoru.

Yahiko foi o primeiro a reagir. Se ergueu num pulo e correu na direção da porta.

- Esperem por mim!

O garoto fechou os olhos e entrou correndo. Megumi se apressou em juntar as suas coisas.

- O que você está fazendo? - perguntou Sanosuke.

- O que você acha? O Logan disse que a gente tinha menos de um minuto. Rápido, peguem o Saitou e entrem.

- Entrar aonde?! - Chou parecia prestes a enlouquecer - Aquilo é um depósito de lenha!

- Eu sei! - disse Megumi enquanto pegava a sua caixa e se dirigia para a porta - Estou tentando não pensar nisso.

A médica parou junto à porta, havia um zumbido baixo. De perto, ela notou que a luz parecia formar uma espécie de barreira sólida. Erguendo a mão, Megumi a tocou e sentiu um formigamento em todo o corpo. Ela tirou a mão imediatamente. Fosse aquilo o que fosse não seria uma experiência agradável. Mesmo assim ela respirou fundo, fechou os olhos e entrou.

Sanosuke cerrou os dentes. Só restavam agora ele, Chou e Saitou.

Vamos nessa! - disse ele - Me ajuda com o Saitou.

- Ta brincando. - Chou não acreditava no que tinha acabado de ouvir. - Nem morto eu entro lá.

- Tudo bem. - disse Sanosuke enquanto erguia com alguma dificuldade o corpo de Saitou do chão. - Eu, uff, carrego esse traste sozinho.

- Isso tudo é loucura!

Sanosuke olhou para ele e sorriu.

- E só agora você se deu conta disso cabeça de vassoura.

Sano se dirigiu para a porta e antes de entrar se virou mais uma vez para Chou.

- Pode ficar aí mesmo, ninguém vai te culpar por estar com medo.

De boca aberta, Chou observou Sanosuke e Saitou desaparecerem em meio à luz. Aquilo já era demais para sua cabeça.

- Pois eu quero mais é vocês vão pro inferno!

Em seguida pegou a espada de Saitou que havia ficado no chão e começou a andar na direção do portão da propriedade, disposto a deixar pra trás toda aquela loucura.

Mas ele mal havia dado alguns passos quando parou. As últimas palavras de Sanosuke estava martelando em sua cabeça, "ninguém vai te culpar por estar com medo".

O pulha estava sorrindo.

Chou se virou, havia uma veia pulsando em sua têmpora. Sem mais nem menos começou a correr a toda na direção do portal.

- EU VOU TE MOSTRAR CRISTA DE GALOOOO!

O grito sumiu no instante em que Chou mergulhava na luz branca. Logo depois, a porta do depósito se fechou sozinha com uma forte pancada. O mostrador do relógio marcava zero.

"tempo esgotado, conexão interrompida"

A luz por trás da porta pareceu piscar por alguns instantes e então se apagou por completo.

Tudo ficou em silêncio. E permaneceu assim até que uma solitária figura vestida de preto desceu da árvore em que estava empoleirada e se esgueirou para dentro do pátio.

Shiro caminhou com cautela e se aproximou do depósito de lenha. Ele tinha uma expressão assombrada nos olhos e virava a cabeça de um lado para o outro, como se esperasse que a qualquer momento alguém fosse atacá-lo.

O ninja havia presenciado tudo o que havia se passado ali desde o momento que Kenshin havia chegado até agora. Teria que relatar tudo ao líder do Tentáculo mais tarde, mas duvidava sinceramente se teria forças para contar o que tinha acabado de presenciar.

Pé ante pé, Shiro se aproximou do depósito. A porta estava fumegando e o estranho relógio continuava espetado nela. Sem mais nem menos uma voz saiu de dentro dele, fazendo Shiro pular para trás e levar a mão à espada em suas costas.

" Iniciar auto destruição em 5, 4, 3..."

A mensagem em inglês não foi compreendida por Shiro, que foi pego totalmente desprevenido pela explosão que se seguiu.

O ninja foi atirado longe, caindo estatelado no chão. Ele protegeu a cabeça e esperou a chuva de lascas de madeira que caía ao lado dele passar.

Lentamente, ele ergue a cabeça. A explosão não tinha sido muito forte, além do relógio havia levado embora a porta e parte das paredes do depósito.

Com cuidado, Shiro se ergueu e para seu alívio verificou que não havia sido ferido. Novamente se aproximou da entrada do depósito, se esforçando para ver através da fumaça e da escuridão.

Ele ainda tinha a esperança de ver alguma coisa que fizesse sentido. Um túnel ou algo parecido. Tinha a esperança de ver algo que provasse que tudo o que ele tinha visto não passava de um show pirotécnico muito elaborado.

Mas tudo o viu foram pilhas de lenha e lascas de madeira. Nenhum sinal de túnel, nenhuma coisa estranha. Nada.

Quase tropeçando ao sair do depósito, Shiro se pôs a olhar em volta, tampouco havia sobrado qualquer vestígio do relógio.

Depois de revirar novamente o depósito, procurar por alguma coisa qualquer que lhe desse alguma pista o ninja se sentou no chão e suspirou. Estava pensando no que diria a Sato Harada.

Ele passeou o olhar ao redor. A casa com dois rombos na parede, as manchas de sangue pelo chão, o muro semi-destruído, tudo isto tinha explicação, mas o que aconteceu no depósito não.

Com um sentimento de puro desgosto, o ninja se ergueu balançando a cabeça e bateu o pó das roupas. Iria contar o que viu. Mesmo não tendo ele mesmo acreditado no que tinha visto.

Suspirando mais uma vez o ninja se pôs a caminho. Tinha uma longa jornada pela frente.


Última revisão 09/06/2006

Comentários

Pronto, eis aí o resultado de meses de trabalho, dúvidas e muito sofrimento. Estes capítulos 16 e 17 foram de longe os que me deram mais trabalho até agora. Perdi a conta de quantas vezes apaguei praticamente quase tudo o que tinha escrito para começar de novo.

Apesar de ter a muito tempo a idéia básica formada na minha mente, foi muito difícil transcrevê-la. A todo o momento surgiam problemas e inevitáveis bloqueios, que por vezes duravam semanas.

Estes dois capítulos (que na verdade deveriam ter sido um) são o clímax da primeira fase do fanfic, e deveriam mostrar a conclusão de muitos eventos e situações mostradas nos capítulos anteriores, ao mesmo tempo, que lançava as bases para a continuação da história. Por isso eles ficaram tão grandes. Por isso demoraram tanto para sair. A forte carga emocional, especialmente no final do cap. 17 também foi algo bastante difícil de retratar.

Mas finalmente essa barreira foi superada (aos trancos e barrancos) e agora o fanfic entra numa nova fase. Muitas novidades vão acontecer agora que a história entra em sua reta final, posso citar a entrada em cena de quatro novos personagens, todos criados por mim, e a chegada dois elementos chave para a trama, vindos diretamente de Kyoto. Essa dupla (na verdade um casal) é bem conhecida dos fãs de RK, e vai com certeza dar outra dinâmica a história.

Não vou fazer promessas quanto a datas, só espero que o próximo capítulo não demore tanto pra sair quanto demoraram estes dois últimos.

Arigatou mina-san. Até a próxima.

A propósito, se quiserem me xingar, o endereço para contado permanece o mesmo: [email protected]

Capítulo 18

Capítulo 16

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