Na verdade o líder da
Shadow Law havia se tele-transportado
para outra parte da sala sem aparentar o mínimo
esforço. Para piorar, estava
agora atrás de William. Antes que o militar pudesse ter
certeza do que
ocorrera, atordoado, o oponente aproximou-se deslizando pelo ar e
aplicou-lhe
um impiedoso chute nas costas. Guile caiu num gemido, julgando que
talvez
tivesse agora uma ou duas costelas partidas. Virou-se então
rapidamente,
cuspindo sangue sobre Bison... Mas antes mesmo que o líquido
rubro sujasse a
farda do maníaco, ele já havia desaparecido
novamente. A única coisa que
permanecia inalterável era sua sinistra gargalhada.
–Pare
com as
brincadeiras, desgraçado! – irritou-se o soldado.
– Não é homem o bastante para
lutar comigo?
Simultaneamente, Nash bloqueava uma
série de socos e chutes
de Cammy, a loira aparentando uma leveza ágil e ao mesmo
tempo força
persistente em seus ataques. Combatia com os olhos bem abertos,
inexpressivos,
sem piscá-los. Estava mesmo imersa num transe profundo
causado por Bison do
qual tinha de ser libertada o quanto antes.
–Agente
White, consegue me ouvir? – o amigo de Guile tentou
comunicar-se com a moça.
Foi em vão,
porém, pois ela continuou procurando atingi-lo
de todas as formas com os braços e as pernas. O rapaz ainda
conseguia
evitá-los, mas não sabia por quanto tempo...
William continuava a tentar ferir
Bison, porém ele era como
um fantasma, algo intangível, desaparecendo e reaparecendo
seguidamente em
locais aleatórios, logrando assim sempre escapar dos golpes
do adversário.
Urrando, este tentou num dado momento atingi-lo com um chute
giratório, porém o
terrorista escapou mais uma vez no instante crítico,
reaparecendo bem perto de
Guile, logo às suas costas. Agarrou-lhe então o
braço direito e cochichou junto
a um de seus ouvidos:
–Desista
enquanto ainda não sofre tanta dor!
E logo depois torceu o membro com
incrível violência, o
militar berrando enquanto tinha os ossos tirados do lugar. Caiu quase
incapacitado de prosseguir lutando, gemendo num misto de sofrimento e
raiva
extremos. Ele precisava fazer Bison pagar, estava realmente disposto a
fazê-lo
comer grama pela raiz... Só tinha de se recuperar um
pouco... E tentar ao
máximo esquecer os latejantes ferimentos.
–M-maldito...
– balbuciou, começando a levantar-se com
dificuldade do piso.
–O
que há,
senhor Guile? – zombava o guerreiro do Psycho Power emanando
sua aura negativa.
– Não é mais capaz de me derrotar?
Terá sido algum dia?
–V-vá...
Se
ferrar!
Bison então pisou nas
costas doloridas de William,
pressionando seu corpo contra o chão respingado de sangue
com esforço e
crueldade indescritíveis. Cerrando os dentes e contraindo os
músculos, Guile
estava determinado a resistir até o último
suspiro, fazendo de tudo para não
sucumbir antes de pelo menos dar uma boa lição ao
inimigo.
Ainda engajado com Cammy, Nash notou
o infortúnio do
parceiro e desejou auxiliá-lo, porém ao mesmo
tempo não poderia descuidar de
White: a ferocidade dela nos ataques crescia a cada segundo.
Subitamente
recuou, mas o combatente sabia que a razão certamente seria
apenas preparar um
novo golpe. Dito e feito: ela logo retornou correndo e, estendendo uma
das
pernas, executou uma investida que por pouco não tirou o
oponente do solo.
–Thrust
Kick!
O poderoso chute destinava-se ao seu
tórax, o qual Nash
conseguiu proteger a tempo com os braços. Mesmo assim o
impacto do ataque fez
com que seu corpo retrocedesse alguns passos. Bufando, logo se
posicionou
novamente para lutar. Tinha de dar cabo de Cammy o mais
rápido possível ou ao
menos se aproveitar de alguma brecha para partir em socorro do amigo
que, se
não fosse logo ajudado, acabaria morrendo pelas
mãos vis de Bison.
O vilão continuava a ferir
e humilhar Guile, impedindo todas
as suas tentativas de erguer-se do chão e revidar. O militar
tinha de encontrar
alguma maneira... Seu orgulho e sua própria vida dependiam
disso.
–Pensando
em
desistir? – provocou Bison.
–Nunca!
Esforçando-se mais do que
podia, William, num veloz
movimento, repeliu uma das pernas do inimigo socando-lhe o joelho. O
criminoso
ficou atordoado por poucos segundos, porém foi tempo o
bastante para que Guile
conseguisse finalmente se levantar e colocar-se em
posição defensiva, mesmo mal
podendo permanecer em pé. Endireitou o pescoço,
estalou as mãos, olhar fixo no
repugnante adversário. Era hora de moê-lo.
Mordendo os lábios, tentou
mover os dois braços para frente
com força... Mas logo sentiu uma intensa fisgada no direito,
retraindo-o.
Esquecera-se de que fora quebrado, e qualquer
ação que o envolvesse ficava
assim impossibilitada. Não poderia efetuar o
“Sonic Boom” e, gemendo, constatou
que aquela sua idéia frustrada apenas dera tempo a Bison de
recompor-se.
De fato, o chefe da Shadow Law
já revidava:
–Psycho
Crusher!
Em seguida saltou, seu corpo sendo
tomado por uma camada de
energia azul enquanto rodopiava no ar horizontalmente, um dos
braços esticados
na direção de Guile. A velocidade que assumiu
fora incrível e William acabou
não tendo tempo de desviar, ainda mais devido à
dor em seu braço: foi atingido
no peito pelo punho do oponente e praticamente atropelado por seu
corpo, sendo
atirado cerca de cinco metros até uma das paredes da sala,
com a qual colidiu
de costas. Fora completamente tomado por chamas também
azuis, crepitantes, as
quais, além de fazerem sua pele arder como nunca, pareciam
afetar sua mente já
cansada e confusa. Danificou mais algumas costelas com o impacto,
caindo
sentado no chão com o amparo do concreto frio
atrás de si. Gritou, sangrando. O
fogo anil desapareceu de si como por mágica, de
súbito, mas o sofrimento
permaneceu. E lá estava Bison novamente, flutuando,
braços cruzados enquanto
contemplava sua desgraça gargalhando.
–William!
–
bradou Nash ao testemunhar o que acontecia.
Com a face repleta de hematomas,
exausto, trêmulo, chegando
até a babar, Guile executou um novo esforço para
se erguer do piso com as
pernas bambas, o que acabou por calar a risada do inimigo. Este
não esperava
que ele fosse continuar lutando após ter levado tantos
golpes e ferimentos,
porém recusava-se a ser derrotado. Pois bem. Muito mais
sério do que antes,
Bison se dispôs a garantir que isso acontecesse de forma
rápida e incrivelmente
dolorosa, dando um fim à sua diversão. Aquele
maldito já se mostrara petulante
demais.
Ergueu o braço direito na
direção do soldado, e o punho foi
logo envolto por uma esfera de energia violeta. Precisava apenas
concentrar um
pouco mais dela e logo tudo estaria acabado...
Isto é, se a
vidraça que separava a sala da sacada não
houvesse sido quebrada com violência, milhares de cacos de
vidro voando sobre o
chão.
–Mas
o que é
isso? – Bison voltou a cabeça.
Até Cammy parou de lutar,
afetada pela súbita reviravolta
nos eventos que tinha início ali, e permaneceu de
pé, imóvel, olhos focados
numa parede enquanto aguardava novas ordens feito um robô. A
atenção dos três
demais lutadores já havia se transferido para a figura
bestial que acabara de
adentrar o recinto.
Verde e laranja, pêlos
espessos, garras afiadíssimas, uma
digna fera com algo de humano. Carlos Blanka. E, exibindo os dentes
brancos e
pontudos, deixava claro a que viera até ali. Mesmo
assustados e sem
compreenderem a situação, só a pose da
criatura serviu para elucidar Nash e
Guile que, aliviados, perceberam que só teriam de assistir
de camarote ao que
estava para acontecer. E seria algo nada bonito.
A tensão inativa durou
mais alguns instantes, até que,
urrando ameaçadoramente, o recém-chegado
finalmente atacou.
Pulou sobre Bison, cravando-lhe as
garras bem no peito. Por
algum motivo, fosse a tremenda selvageria daquele que investia ou a
perplexidade do terrorista, este não conseguiu reagir,
gemendo de uma maneira
seca, inexpressiva, como se apenas sentisse os golpes, mas
não dor. Em seguida
Blanka mordeu seu pescoço, sangue vertendo aos
borbotões sobre ambos e ao redor
do confronto. Depois voltou a usar as mãos, arranhando todo
o corpo do inimigo com
cortes profundos, raivosos. O criminoso era retalhado pelo ser mutante
que ele
mesmo indiretamente criara.
Por fim o brasileiro se desvencilhou
do adversário numa
cambalhota para trás, fitando-lhe ofegante devido a todo o
vigor que gastara.
Bison caiu de joelhos, sangue minando em praticamente todas as partes
de seu
corpo, boca aberta de modo atônito enquanto seus olhos
inumanos encaravam a
escuridão de sua própria aura. E, grunhindo,
Blanka, logo depois de olhar para
cada um dos presentes, desatou a correr na
direção da porta dupla da sala,
cruzou-a quase a derrubando e desapareceu pelas escadas rumo ao
térreo. Ninguém
o perseguiria. Seu objetivo, sua vingança, estavam cumpridos.
Agora a
situação ficava por conta dos dois amigos
inseparáveis da Força Aérea. E eles
sabiam muito bem o que fazer.
Guile conseguira, num
esforço quase sobre-humano, manter-se
de pé durante todo o ataque de Blanka a Bison e,
concentrando-se, julgou que
poderia continuar assim por no mínimo mais um minuto.
Trôpego, porém firme,
William examinou seu braço direito quebrado, que latejava
imensamente, e depois
seu braço esquerdo quase intacto. Girou-o num breve
exercício e lembrou-se das
palavras de Vulcan Raven na Amazônia e das da misteriosa
cigana pouco tempo
antes. Era sim um grande guerreiro, e tinha de honrar isso. Sentindo-se
pronto,
moveu somente o membro não-ferido para frente com
incrível velocidade e, mesmo
sem acreditar-se plenamente maduro para aquilo, resolveu confiar um
pouco em
seu espírito.
–Sonic
Boom!
Para sua surpresa, conseguiu criar a
onda de energia apenas
com um braço da mesma forma que Nash. O ataque luminoso
cruzou o ar rapidamente
rumo a Bison, ainda com a guarda baixa na mesma
posição e, atingido e englobado
pela súbita descarga de poder, foi arrastado por ela, ao
mesmo tempo em que
soltava um longo grito, rumo à mesma sacada pela qual Blanka
surgira. Sem
conseguir se agarrar a algo ou ao menos tentar frear o processo, o
líder da
Shadow Law despencou do alto do prédio rumo à
noite, seu berro frustrado logo
se tornando o mero eco de um demônio que perdera uma batalha
que imaginara
jamais capaz de perder.
Agora plenamente exaurido, William
caiu sentado, respirando
com dificuldade. Precisaria passar uns bons dias no hospital
até poder encarar
uma briga de novo, ainda mais uma como aquela. Riu para Nash, que se
aproximava
também com um sorriso na face. Haviam vencido.
–Cadê
a
loirinha? – Guile indagou olhando em volta.
Cammy desaparecera tão
rápido quanto surgira, provavelmente
aproveitando o momento de distração dos demais
para escapar sem ser notada. Era
quase certo que ainda se encontrava sob a influência de
Bison, mas os dois
lutadores ainda a trariam de volta para seu lado. De certa forma sabiam
que
ainda a veriam novamente.
–Será
que é o
fim do Bison? – inquiriu Nash, mãos na cintura.
–Tratando-se
dele... Acho bem difícil... Mas pelo menos agora ele
pensará muito bem antes de
se meter com a gente!
William suspeitava que, apesar do triunfo que haviam acabado de obter, aquela história ainda não chegara ao fim. E, refletindo acerca disso, foi auxiliado pelo parceiro a se levantar e, apoiado a ele, iniciou o trajeto para fora do local.