Resident Evil: Experimento X

Capítulo 16 - Golden Nugget.


– Eu desistiria se fosse você...

O tom no qual o homem do outro lado da mesa falava desencorajaria qualquer jogador dos cassinos de Las Vegas. Mas não ele. Não seriam algumas palavras desanimadoras o suficiente para que desistisse. Erguendo os olhos, fitou novamente seu desafiante, o homem de tapa-olho, que ainda tinha à sua direita o importuno russo de bigode. Respirou fundo. Apanhou os dados.

– Dick Valentine não desiste tão facilmente, caolho! - exclamou por fim. - Seja quem for, não conseguirá fazer coom que eu abra mão de um desafio!

– É sem dúvida um sujeito corajoso... - murmurou o indivíduo cego de um olho, num sorriso quase imperceptível. - Isso é algo digno de minha admiração. No campo de batalha, é a coragem que nos impulsiona a lutar bravamente por um ideal. É ela que nos faz matar pessoas que nem ao menos conhecemos... Que seria dos criminosos se não tivessem coragem de violar a lei?

– Você fala demais! No ramo em que trabalho, caras como você sempre se dão mal! Todos nós possuímos dois ouvidos e uma boca justamente para ouvirmos mais do que falamos!

– E talvez assim receber ordens sem questioná-las? Bem, esse é um princípio crucial numa guerra. Às vezes a coragem nos abandona, e a única coisa que nos impede de abandonar o campo de batalha é o dever de cumprir as ordens que nos foram dadas. Todavia, vejo que você, assim como eu, cansou-se disso. Agora recebe ordens apenas de si mesmo...

– Você não tem nada a ver com a minha vida! Aposto que perdeu um olho cumprindo suas malditas ordens!

– Meras conseqüências, senhor Valentine. Ossos do ofício. Por ser um mercenário, já me acostumei com isso. Em meio a um confronto, não podemos hesitar. E infelizmente vejo que o senhor o faz neste exato instante. Há uma falha em sua coragem, posso perceber. Apesar de não aparentar, você se preocupa demais com uma pessoa e tem medo de perder seu dinheiro por causa dela!

– Minha esposa está morta, filho da mãe! - replicou Dick, apertando os olhos. - Afinal de contas, o que você sabe sobre mim? É capaz de ler pensamentos ou algo parecido?

– Não, senhor Valentine. Seria algo muito útil, mas não possuo tal dom, o qual, entretanto, pertence a um de meus colegas de trabalho. Voltando ao nosso jogo, vai lançar os dados ou não?

Dick estremeceu. Olhou para os dois dados vermelhos em sua mão direita, tão traiçoeiros e tentadores. Depois fitou as pessoas ao redor da mesa, as quais, por sua vez, observavam-no com grande expectativa. Fechou os olhos, ouvindo os sons do cassino. Não podia desistir. Era algo totalmente contra seus princípios. De repente, sentiu algo puxar sua jaqueta.

Voltando a enxergar, Valentine viu que uma garotinha de aproximadamente onze anos de idade, cabelos castanhos e expressão cansada, agarrava-lhe as vestes com insistência. Tratava-se de sua filha. Presenciando a cena, um amplo sorriso brotou no rosto do homem de tapa-olho...

– Papai, eu estou com sono! - reclamou a menina, esfregando um dos olhos. - Nós não podemos subir até o nosso quarto para dormir?

– Daqui a pouco, “Jillzinha”... - respondeu Dick em tom suave. - Agora o papai está cuidando de alguns assuntos importantes! Assim que eu terminar, nós subiremos até o quarto, está bem?

– OK... - suspirou a garota, distanciando-se sonolenta.

Em seguida, Valentine lançou os dados sobre a mesa, dentes cerrados. Enquanto os cubos giravam, o sujeito caolho murmurou, logo depois que o russo de bigode cochichou algo em seu ouvido:

– Todos nós temos um ponto fraco, senhor Valentine, por mais que tentemos escondê-lo!

Dick realmente não sabia no que estava se envolvendo...

 

Um ambiente escuro. A única luz no local iluminava um grupo de jovens trajando roupas militares, enfileirados lado a lado como um rígido pelotão. Totalmente imóveis, com as mãos cruzadas atrás da cintura e olhar fixo numa mesma direção, não ousavam nem piscar. Súbito, passos foram ouvidos. Surgiu das sombras um homem usando uniforme bege, botas marrons e boina vermelha. Uma cicatriz lhe cortava o rosto. Tinha numa das mãos um comprido bastão de metal e algumas granadas presas a um par de cintos em seu tórax.

Seu nome era Rolento, um ex-especialista militar que, obcecado pelo poder das armas, deixou as Forças Armadas para criar seu próprio exército mercenário, o qual logo se uniu à gangue Mad Gear. O grupo criminoso queria dominar o submundo de Las Vegas, e o sádico homem da boina vermelha fora incumbido de tal tarefa.

Naquele momento ele passava em revista de suas tropas. Cada um dos rapazes conhecia muito bem a personalidade do comandante, e sabiam do que Rolento era capaz se desobedecido. O ex-militar lhes impunha uma disciplina doentia, na qual a mínima falha significava uma severa punição. Por esse motivo, aqueles jovens não cumpriam as ordens do comandante por respeito. Eles o faziam por temor.

Passando por seus soldados, Rolento examinava cada um com enorme atenção, sorrindo de forma cruel e amedrontadora. Enquanto fazia a inspeção, o membro da Mad Gear falava aos combatentes:

– Soldados, recebi de meus superiores uma missão que deve ser cumprida sem qualquer tipo de erro, por menor que seja. Las Vegas é uma cidade muito importante para a gangue, e o domínio do crime organizado deve ser feito à força! Somos uma tropa honrada e respeitada por onde passamos, e por isso precisamos sempre manter nosso código de disciplina livre de quaisquer máculas! Fui claro?

– Sim senhor! - responderam todos em coro.

– Ótimo... Soldado, por que sua bota está desamarrada?

Trêmulo, o rapaz em questão olhou para baixo, comprovando o fato observado por Rolento. Com o coração pulsando fortemente, o combatente disse, apavorado:

– Foi distração minha, senhor! Perdoe-me! Prometo que essa gafe não se repetirá!

– Não se preocupe, jovem! - replicou o comandante em tom compreensivo, dando um tapinha num dos ombros do soldado. - A perfeição não é para todos!

Abaixando a cabeça, o rapaz respirou aliviado, ao mesmo tempo em que Rolento parecia se afastar. Entretanto, antes que o pobre combatente pudesse erguer os olhos, o ex-militar lhe desferiu um violento golpe com o bastão metálico, que partiu seu crânio em duas partes. Sangue jorrou sobre os uniformes dos soldados próximos, que mesmo assim não se moveram, temendo terem o mesmo destino do colega agora morto. Enquanto o cadáver deste vinha ao chão, uma risada diabólica ecoava pelo lugar, endurecendo ainda mais os corações dos jovens que compunham o pelotão...

 

Na frente do Silver Star, um dos maiores hotéis-cassino de Las Vegas, havia uma bela e ampla fonte de mármore, composta por diversos chafarizes iluminados por lâmpadas das mais variadas cores. Diante de tal obra de arte, dois homens encapuzados e altamente suspeitos conversavam discretamente:

– E então, como vai o plano? - perguntou um deles.

– Às mil maravilhas, parceiro! - respondeu o outro num sorriso perverso. - Assim que aquela bomba explodir, metade de Las Vegas queimará como palha! Finalmente teremos nossa vingança!

– Eu os impedirei, terroristas covardes! - gritou alguém.

Os dois criminosos se viraram na direção da voz. Ela pertencia a um indivíduo sem camisa, músculos bem definidos à mostra. Aparentava ser de origem oriental, cabelos castanhos. Usava uma calça preta e discretos calçados apropriados ao seu estilo de luta, o kung-fu.

– Oh, não! - exclamou um dos meliantes. - É aquele chinês de novo!

– Meu nome é Fei Long! - replicou o lutador, correndo na direção dos adversários.

Numa espetacular voadora, o oriental derrubou o terrorista que se alarmara com sua aparição. O segundo tentou reagir, sacando uma pistola 9mm, mas Fei Long arrancou-lhe a arma da mão com um ágil chute. Desesperado, o criminoso não teve tempo de correr: recebendo um forte golpe no estômago, caiu inconsciente sobre o concreto.

– Corta!

O chinês suspirou, limpando o suor em sua testa. Num sorriso, ajudou o homem que aparentemente nocauteara a se levantar. Olhou então para todas as câmeras e pessoas que os cercavam. Um indivíduo de cabelos grisalhos e óculos escuros se levantou de uma cadeira onde havia a inscrição “Diretor”, caminhando até Fei Long.

– Perfeito! - disse ele ao se aproximar do lutador de kung-fu. - Simplesmente perfeito! Você é o melhor, Fei Long!

– Não, diretor... - murmurou o chinês, apanhando uma garrafa de água mineral trazida pelo contra-regra. - Nunca chegarei aos pés do grande mestre Bruce Lee... Ele sim foi o melhor!

– Modesto, como sempre... - afirmou o diretor numa breve risada. - Você já é o melhor lutador de Hong Kong, e em breve será o maior do mundo!

– Eu apenas gosto do que faço, você sabe muito bem disso... Lutar é uma arte, diretor. Para dominar o kung-fu é preciso muito treino, além de enorme dedicação. Assim como um pintor precisa fazer vários quadros para dominar sua técnica, eu também tenho que lutar o máximo possível com o intuito de reduzir minha vulnerabilidade!

– Bem, então você é o Michelangelo das artes marciais, Fei Long! Esse novo filme será um enorme sucesso de bilheteria, posso garantir!

Entusiasmado, o diretor se afastou, enquanto o ator saciava sua sede.

 

Rolando como um porco-espinho, Blanka chocou-se contra as portas traseiras do furgão fortemente, fazendo com que se abrissem. Pousando sobre o asfalto da rua junto com algumas frutas, a cobaia da Umbrella olhou para todas as luzes ao seu redor. Em seguida fitou o veículo no qual chegara até ali e, no momento em que este contornava uma esquina, Carlos pôde ler numa das laterais o nome da empresa à qual pertencia: “United Fruit - Las Vegas”.

– Las Vegas? - indagou o monstro verde em tom confuso, coçando sua cabeleira laranja.

Maravilhado, o brasileiro admirou os belos e ostentosos cassinos, em particular um cujo letreiro lhe chamou a atenção: “Golden Nugget - Nin-Nin Hall”. Até então ele só vira um lugar como aquele nos filmes de Hollywood...

Nisso, as pessoas que se encontravam na rua já haviam notado a presença de Blanka, fugindo assustadas devido à aterrorizante aparência daquela criatura esverdeada. Entretanto, o ex-soldado ignorou-os. Totalmente hipnotizado pelo charme da “Cidade do Jogo”, Carlos adentrou o Golden Nugget, afugentando um grupo de turistas asiáticos e os seguranças que vigiavam a entrada...


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