Editor: Wolfram
da Cunha Ramos
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INFRAÇÃO DE MENOR
POTENCIAL OFENSIVO (LEI Nº 9.099/95) - TRANSAÇÃO PENAL
- DESCUMPRIMENTO INJUSTIFICADO DA PENA ACEITA PELO AUTOR DO FATO - EXECUÇÃO
DA PENA VIA CONVERSÃO EM PRIVATIVA DE LIBERDADE.
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I - INTRODUÇÃO:
O legislador pátrio instituiu a transação
penal, tido como verdadeiro mitigador do princípio da obrigatoriedade
da ação penal, visando permitir a realização
de política criminal mais eficaz e imediata. Permitiu-se não
a plena disponibilidade da ação penal pelo Parquet,
mas sim o abrandamento de tal princípio, partindo-se da premissa
de uma discricionariedade com limites fixados na existência ou não
dos requisitos legais autorizadores do oferecimento da proposta em comento.
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II - PROPOSTA DE PENA ANTECIPADA - DIREITO/DEVER:
Vislumbra-se, pela Lei nº 9.099/95, que uma vez preenchidos os
requisitos elencados seu artigo 76, ao membro do Parquet cabe o
direito-dever de ofertar a proposta de pena antecipada, na modalidade de
pena restritiva de direitos ou multa, podendo haver a não oferta
de proposta, desde que devidamente justificada na legislação
vigente. O autor do fato, devidamente assistido por profissional habilitado,
anuindo para com a proposta ofertada pelo Ministério Público,
supra mencionada, permite à autoridade judiciária analisá-la
sob o prisma de seu fundamento legal. Não cabe, concessa venia,
ao magistrado avaliar a conveniência ou se tal proposta traz
vantagens a quem quer que seja, visto que se tal avaliação
porventura ocorrer, haverá evidente interferência da autoridade
judiciária na conciliação entre as partes, ferindo
o texto legal supra citado.
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III - DESCUMPRIMENTO INJUSTIFICADO - CONSIDERAÇÕES
INICIAIS: Entretanto, nas lides forenses, tendo em vista que o texto
legal em comento entrou em vigor há menos de dois anos, algumas
questões vêm merecendo enfrentamento pela doutrina e pela
jurisprudência pátrias, como a dúvida acerca de qual
seria a consequência direta pelo descumprimento, injustificado, pelo
autor do fato, da pena antecipadamente proposta, aceita e homologada pela
autoridade judiciária. Inobstante a polêmica jurídica,
em torno do tema, tem-se que o que mais coaduna-se com o espírito
do diploma legal em referência é a conversão da pena
restritiva de direitos em privativa de liberdade. Exemplifica-se, pois,
quando aplicada a pena restritiva de direitos, p.ex. prestação
de serviços à comunidade, pode-se concluir pela aplicação
pura do preconizado no artigo 45, inciso II, do diploma penal pátrio,
caso o autor do fato, sem justificativa plausível, descumprisse
a restrição imposta. Tal raciocínio, em uma primeira
análise irrefletida, não era o entendimento deste missivista,
mas, após travar discussão jurídica com colega, este
ponderou que era necessário analisar-se os fins da Lei nº 9.099/95,
em análise teleológica da norma, levando-me à melhor
reflexão do tema e aos termos do presente artigo. Concessa maxima
venia, apesar de Doutas opiniões em contrário, vislumbra-se
que tal entendimento não atinge princípios esculpidos na
Carta Cidadã de 1988, bem como na legislação infraconstitucional.
Inicialmente vislumbra-se que as penas restritivas de direitos, consoante
legislação penal em vigor, apesar de terem natureza autônoma,
vêm substituir as penas privativas de liberdade, ex vi do
artigo 44 e incisos, do diploma penal. Assim sendo, permite-se à
autoridade judiciária, em sentença terminativa de mérito,
uma vez aplicada a pena privativa de liberdade e preenchendo o réu
os requisitos legais, perpetrar a substituição desta pela
restritiva de direitos.
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IV - CONVERSÃO - POSSIBILIDADE - CONSTITUCIONALIDADE:
No caso da transação penal, nos moldes preconizados na
Lei nº 9.099/95, não existe condenação em pena
privativa de liberdade, visto que não há por parte do autor
do fato reconhecimento de dolo. Entretanto, o legislador infraconstitucional
veio erigir nova natureza para a pena restritiva de direitos, mantendo
sua autonomia, mas tendo-a como original e não substitutiva. A culta
professora Ada Pellegrinni Grinover leciona, sobre tal questão,
que essa "...conversão é admissível porque foi
a própria Constituição Federal que, no art. 98, I,
em norma especial e por isso preponderante sobre a de caráter geral,
admitiu expressamente a transação..." (1). Tem-se, inicialmente,
que o princípio constitucional do due process of law, preconizado
no artigo 5º, inciso LIV, da CF/88, o qual reza que ninguém
será privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal não é atingido pela conversão em comento, visto
que a legislação infraconstitucional (Lei nº 9.099/95)
previu garantias e rito apropriado para que o autor do fato, devidamente
assistido por profissional habilitado, manifestasse expressamente sua anuência
para implementar a transação. Garantido restou, pois, o devido
processo legal, recordando a observação da professora Ada
Pellegrinni Grinover quando afirma que a "...conversão à
pena privativa de liberdade só ocorrerá se, no procedimento
incidental da execução, forem observadas todas as garantias
do devido processo legal, dando-se àquele que cumpria a pena restritiva
possibilidade de defesa pessoal e defesa técnica, com ampla oportunidade
de realizar prova que evite a conversão..." (2). Da mesma sorte,
verifica-se que não há infringência ao princípio
constitucional da presunção da inocência, esculpido
no artigo 5º, inciso LVII, da CF/88, o qual impõe que ninguém
será considerado culpado até o trânsito em julgado
da sentença penal condenatória. Fundamenta-se, tal entendimento,
no fato de que o autor do fato, aceitando a transação penal
proposta pelo Parquet, na modalidade de pena restritiva de direitos,
antecipadamente formulada, não admite nenhuma imputação
contra sua pessoa, nem gerará registro de antecedentes criminais
contra aquele, mesmo no caso do descumprimento, injustificado, da pena
antecipadamente proposta e aceita. Permanecerá, o autor do fato,
primário tecnicamente, salvo casos em que o mesmo já ter
sido condenado, irrecorrivelmente, em processo penal diverso. Trata-se,
neste ponto, de questão interligada com a execução
da pena, aplicada mediante a transação penal preconizada
no art. 76 e parágrafos, da Lei nº 9.099/95, nada tendo a ver
com assunção ou imputação de culpa ao autor
do fato. Finalizando-se a questão constitucional, tem-se que o princípio
da legalidade, esculpido no art. 5º, inciso XXXIX, da Carta Magna,
consubstanciado no enunciado nullum crimem, nulla poena sine praevia
legem, também não restou atingido, em virtude do fato
de que, apesar de não haver previsão na Lei nº 9.099/95,
a previsão existe na Lei de Execuções Penais, aplicada
àquele diploma legal por imposição do artigo 86, in
fine do mesmo diploma legal.
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V - NÃO CONVERSÃO - INVIABILIZAÇÃO
DO INSTITUTO LEGAL: Inadmitir-se, pois, a execução da
pena restritiva de direitos, antecipadamente proposta, mesmo com a anuência
do autor do fato e de seu defensor, seria inviabilizar totalmente a aplicação
do instituto transacional (art. 76, LJECC), pois norma sem sanção
e, consequentemente, sem instrumentos de execução, é
inoperante e inútil. Qualquer outra saída, para fins de execução
da pena restritiva de direitos, esbarrará na inviabilidade por atingir
o princípio constitucional da reserva legal por inexistir outra
previsão legal. Em conversa pessoal deste missivista com o culto
professor Júlio Fabbrini Mirabete, no Congresso Nacional de Direito
Processual e Juizados Especiais, realizado recentemente na cidade de Florianópolis-SC,
este revelou que não vislumbra nenhuma inconstitucionalidade ou
ilegalidade na conversão da pena restritiva de direitos em privativa
de liberdade, sendo a mesma consentânea com os princípios
da Lei nº 9.099/95. A tese esposada por vários doutos, acerca
da possibilidade legal de no caso de descumprimento injustificado da restrição
imposta pela proposta de pena antecipada formulada pelo Parquet,
estaria sem efeito a transação penal em tela, permitindo-se
ao Ministério Público que tome uma das medidas legais permissíveis
na legislação vigente, qual seja da requisição
de inquérito policial (art. 5º, CPP) ou do oferecimento da
denúncia (art. 41, CPP), é, concessa maxima venia,
inviável, pois estaria vedada pela existência de sentença
judicial homologatória, a qual já teria transitado em julgado
quando da oportunidade em que o autor do fato deveria dar início
ao cumprimento de sua pena. Transitada em julgado, a sentença homologatória,
indaga-se de como seria possível transpô-la e ofertar denúncia
ou requisitar-se inquérito policial? Neste ponto, cabe-nos discorrer
sobre a natureza homologatória da sentença que aceita os
termos da transação penal efetuada pelo Ministério
Público e o autor do fato. Alguns doutos autores, como o ilustre
e culto prof. Júlio Fabbrini Mirabete, apontam que tal sentença
é condenatória e não meramente homologatória,
porque "...cria uma situação jurídica ainda não
existente e impõe uma sanção penal ao autor do fato..."
(3). Ocorre que, data maxima venia, a sentença que
trata o artigo 76, §4º, da Lei nº 9.099/95, tem caráter
meramente homologatório, tendo em vista que dá força
judicial à transação penal efetuada entre o Parquet
e o autor do fato, motivo único da aplicação de pena
restritiva de direitos ou multa, visto que sem a existência da transação,
constitucionalmente aceita pelo art. 98, inciso I, da Carta Magna pátria,
inexistiria homologação ou sentença semelhante.
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VI - CONVERSÃO - PROCEDIMENTO A SER ADOTADO
- CONCLUSÃO: Em termos de vida forense, vislumbra-se que uma
vez descumprida, pelo autor do fato, a pena aplicada a este, devidamente
homologada pela autoridade judiciária, mister se faz que o mesmo
seja instado, em prazo conveniente, a se justificar, intimando-se também
seu defensor. Uma vez inexistindo justificação ou com a apresentação
de justificativa inócua, o membro do Ministério Público
poderá requerer a conversão da pena restritiva de direitos,
não cumprida, em privativa de liberdade. Neste ponto, comunga-se
com a preocupação da ilustre professora Ada Pellegrinni Grinover,
in ob. cit., p. 190, quando afirma que haverá problema no
estabelecimento do quantum da pena privativa de liberdade, tendo
em vista a natureza plenamente autônoma de tal pena, não se
podendo "...estabelecer uma equivalência entre a quantidade de
pena restritiva e a quantidade de pena detentiva...". Nesta questão,
por analogia pura, como humilde sugestão, entende-se que o Parquet
ao propor a pena restritiva de direitos e quantificá-la, dosando-a
de acordo com os limites legais estipulados ao delito e com os ditames
do art. 59, do diploma penal, também deverá constar na proposta
de pena antecipada, isto com a concordância do autor do fato e de
seu defensor, que em caso de descumprimento da pena, sem justificativa
plausível, esta será convertida pela pena privativa de liberdade,
em quantidade expressamente indicada no termo respectivo, dentro dos limites
legais e ditames do art. 59, do CP., obtendo-se a anuência do autor
do fato e do defensor. Tal sugestão, data venia, não
é vedada pela legislação em vigor, pois o legislador
já permite que o autor do fato transacione parcela de sua liberdade,
aceitando uma pena restritiva de direitos, nos termos do art. 98, I, da
CF/88, podendo, em consequência, concordar com o quantum fixado
a título de pena privativa de liberdade para fins de execução
em caso de inadimplemento injustificado. Diz-se, pois, que a execução
da pena transacionada é questão de ordem pública,
a qual poderá ficar totalmente prejudicada pela inviabilidade de
sua aplicação e posterior execução de tal transação
penal, incentivando a impunidade e o incremento da prática da infração
de menor potencial ofensivo, pelo que não podemos autorizar, absurdamente,
a impunidade daqueles que desprezam as instituições desta
Pátria, principalmente a Justiça!
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VII - BIBLIOGRAFIA: (1/2) Ada Pellegrinni
Grinover, in Juizados Especiais Criminais, 2ª ed., RT,
p. 190; (3)Júlio Fabbrini Mirabete, in Juizados Especiais
Criminais, Atlas, 1997, p. 90.
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DIVINO
MARCOS DE MELO AMORIM
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Promotor de
Justiça da Comarca de Silvânia-GO (Segunda Entrância).
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