O Poder da Oração
Frater Vicente Velado, OSB
Perscrutar em profundidade a essência dos eventos no
universo material visivel e invisivel tem sido uma das características
das Ordens Rosacruzes, principalmente da AMORC, tal como foi reorganizada para
o presente ciclo pelo Dr. Harvey Spencer Lewis. O Movimento Rosacruz como um
todo parece ter nascido do inconformismo de alguns ante as imposições
religiosas e perante as várias interpretações da "salvação"que
vêm sendo servidas à humanidade há milênios por teólogos
comprometidos com o poder temporal, sem falar nas filtragens e nos adendos habilmente
apostos pela casta sacerdotal.
Desde que a consciência humana atingiu o ponto de evolução
em que a autopercepção se tornou possível, trazendo em
seu bojo o conhecimento da finitude, concomitantemente a tentativa de definir
um propósito para a Criação vem sendo exercida de várias
maneiras, obviamente todas elas em função do homem finito diante
do enigma de sua própria finitude. Era preciso decretar a continuidade
ad infinitum da existência
individual e várias teorias foram criadas. Em todas elas a figura central
parece ser Deus, o Criador de tudo o que existe, que existiu e está por
existir e pai bondoso dos homens, animais, plantas, micróbios, pedras,
estrelas.
A idéia de Deus sempre tem sido apresentada aos homens de forma religiosa,
com ou sem antropomorfismos, e cada religião pretende ser a dona da verdade,
o repositório da Vontade Divina, a representação material
do substrato imaterial eterno. Ao longo das eras pessoas especiais - os avatares
- têm trazido mensagens sobre a implantação de códigos
de moral e conduta destinados a elevar a consciência humana e a melhorar
a qualidade de vida como um todo, como condição preliminar para
a ascensão espiritual.
Em cima das mensagens e dos exemplos vivos desses avatares foram constituídas
religiões - tentativas de religar o homem a Deus através dos ensinamentos
deste ou daquele Mestre. O que define exatamente uma religião como tal
não é a existência de dogmas - pois estes são apenas
e tão-somente mistérios absolutamente velados para os profanos.
O que define uma religião como tal é a sua apresentação
como O Caminho (ou seja, a única escada de acesso viável para
o Plano Divino). É justamente por isso que a Ordem Rosacruz AMORC sempre
se apresentou como não sendo uma religião, apesar de contar com
templos e rituais místicos.
A estruturação de um corpo ritualístico implica não
só a repetição sistemática de atos e afirmações
para a consubstanciação de uma egrégora mas também
a apresentação de dogmas e nem mesmo a AMORC se esquivou a isto,
tanto assim que um dogma - o da reencarnação - foi enfaticamente
afirmado no Artigo 4 do Credo Rosacruz promulgado na semana de 23 a 30 de julho de 1930, na Convenção
Internacional realizada no Templo da AMORC em San Jose, California, USA. O dogma
está firmado com esta enunciação literal: "Sei que
quando Deus insufla, no corpo do Homem o alento da Vida, o Homem se torna uma
Alma Vivente, um segmento inseparável da Alma de Deus, residindo num
corpo mortal, para vários propósitos, através de sucessivas
encarnações humanas. Assim, com relação a tudo que
é real e vital, é toda a Humanidade uma Fraternidade sob a Paternidade
de Deus."
Entretanto, é preciso frisar e deixar bem claro que a existência
de uma tal afirmativa - a afirmação ritualística da reencarnação
como verdade absoluta - e não a sua apresentação como uma
teoria a ser investigada não implica concomitantemente proibição
formal para que se faça tal investigação. E o próprio
Deus é apresentado aos Rosacruzes como o Deus do coração
de cada um, quer dizer, um Deus entendido e percebido conforme a interpretação
individual. Como se vê claramente, mesmo com a idéia de haver um
Deus e a proposição de um dogma a AMORC realmente não
é uma religião.
O mesmo principal enunciador do Credo Rosacruz original - porque houve modificações
posteriores, recentes -, o Dr. Spencer Lewis, de feliz memória,
recomendava sempre que se orasse, não como um mero religioso, mas como
um possuidor da verdadeira fé. E aí fé
significa a crença inabalável em
leis cósmicas como a Lei do Triângulo, em que Vontade e Ação
originam um Efeito.
Experiências científicas recentemente realizadas nos Estados Unidos
demonstraram de forma cabal que a oração tem poder de cura sobre
doenças mortais. Grupos de pacientes pelos quais foram feitas orações
- sem que eles soubessem disso - apresentaram índice de cura 45 por cento
superior ao verificado em outros grupos, pelos quais não se orou.
Quando questionamos o fenômeno da eficácia real da reza, colocamo-nos
diante de uma questão aparentemente grotesca: seria Deus um relaxado,
um relapso? Teria Ele de ser chamado à atenção para as
aflições dos homens para que se dignasse a amenizá-las
como um bom pai, contudo meio desligado? Mas logo vemos que tal hipótese,
de tão insípida e contraditória ante a idéia que
se faz de Deus, é totalmente descabida. A conclusão a que somos
levados é a de que as Leis Cósmicas privilegiam o bem comum, e
disso nos dá certeza Jesus Cristo, quando afirma que "...Onde duas
ou mais pessoas se reunirem em meu nome, aí estarei". Eis porque
aquele que reza em causa própria dificilmente obterá algum sucesso,
enquanto aqueles que se juntam para orar em conjunto, pelo bem comum, são
atendidos. É assim que vemos curas fantásticas sendo operadas
nos templos de várias religiões nos quais as pessoas se reúnem,
fixadas em um ponto focal comum -geralmente a invocação do avatar
em torno do qual foi instituída a religião.
Pergunta-se agora, qual seria, então, o ponto focal para rosacruzes reunidos
em um templo ou em alguma atividade conjunta. Sem dúvida, o ponto focal
deve ser a Egrégora Rosacruz, visualisada da forma oficial atual, tal
como foi exposto aos membros da Ordem. Evidentemente, isso não impede
que um rosacruz no recesso de seu Sanctum privado eleja outro ponto focal.
O que se nota, quando se estuda o fenômeno da oração, é
que o Universo, tal qual o concebemos ante nossa limitada percepção,
parece ser um processo em andamento, com um propósito bem definido: a
evolução, através da depuração no Plano da
Dualidade. E dentro desse processo é que a oração, como
exercício dirigido de vontade, funcionaria sobre todos os entes, modificando
condições, alterando quadros tidos como definitivos, originando
curas "milagrosas", trazendo a paz onde existia o desespero, a prosperidade
onde estava o insucesso, o amor onde havia ódio, enfim, fazendo a luz
brilhar nas trevas. Em outras palavras - o conjunto de mentes voltadas para
um propósito ético aciona a Lei, que é fundamentada justamente
na Ética Cósmica, que se endereça à evolução,
não ao caos.
Este é o processo e dele não é dono o condutor de qualquer
oração coletiva ou prática correlata. Ela, a oração
conjunta dos seres cheios de fé sincera, sempre funcionará, como
ação da Lei do Triângulo, pouco importando que o padre,
pastor, rabino, guru ou seja lá quem for se apresente como o detentor
de uma linha direta com Deus. É por isso que pode-se definir a oração
como a Lei do Triângulo posta em ação pelo amor ao próximo
tal qual foi ensinado por Jesus Cristo. Esse processo de acionamento da Lei
do Triângulo é exercido no âmbito da AMORC, em favor de suplicantes
aflitos, pelo Conselho de Solace. Enfim, a oração é a invocação
de uma Lei, e tal invocação será sempre oração,
mesmo que não se revista do conceito convencional do rezar.
As religiões, obviamente por seu sectarismo e intolerância, têm
manipulado a apresentação da Lei do Triângulo em ação
na oração conforme suas conveniências. Para os rosacruzes,
porém, deve estar sempre bem clara a verdade. Isto é, que não
existe uma entidade, uma deidade, concedendo benesses aos suplicantes em atendimento
à súplica, mas sim uma Lei Cósmica se exercendo a si própria
em função de sua substância, à qual a vontade humana
coletiva momentaneamente se agregou por harmonização. Para tanto
não existem fórmulas mágicas e o que pode haver, isto sim,
é um consenso em torno de algo, para maior unidade, como, por exemplo,
o enunciado de determinadas frases que sejam sempre as mesmas (e disto temos
bons exemplos no Pai Nosso e na Saudação Angélica). A compreensão
desse princípio é fundamental para o domínio da vida, porque
ajuda a remover crendices, superstições e falsos conceitos advindos
da ignorância -precisamente o mal do qual deve o ser humano ser salvo.
Nota: O Frater Vicente Velado, eremita da Ordem Beneditina, integra a Hierarquia Esotérica da AMORC , da qual é membro vitalício. Este artigo representa opinião pessoal sua e não opinião oficial da AMORC