Foto: Sutton
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Nelson Piquet
Memórias de um Campeão
Por Ricardo Pereira
Nelson Piquet Souto Maior nasceu a 17 de Agosto de 1952 no Rio de
Janeiro, Brasil. Nelson, filho de Clotilde Piquet e de Estácio
Souto Maior, Ministro da Saúde durante o governo de João
Goulart, viveu grande parte da sua vida em Brasília depois da
fundação da cidade em 1960.
Nelson hesitou sobre o seu futuro quando era jovem. Ele pensou
seguir engenharia, ténis e automobilismo. Contudo, aos 14 anos já
participava em corridas de Kart e desejava fazer parte deste
mundo no futuro. Foi depois de uma vitória sobre o seu pai num
jogo de ténis que decidiu competir em Kart.
No início, Nelson trabalhou na Camber, uma empresa de Alex Dias
Ribeiro. Durante esse período Piquet reconstruiu um protótipo
para Ribeiro competir na Divisão 3, Classe A. Neste Volkswagen Nelson venceu 7 das 8 corridas do campeonato
brasileiro de protótipos.
Piquet foi coroado campeão brasileiro de Kart em 1971 e 1972. A
sua estreia em competição foi mantida em segredo da sua família.
Devido a isso, colocou o nome Piket no seu carro, para não ser
reconhecido.
Em 1976 sagra-se campeão brasileiro da Formula Super V. No ano
seguinte, tenta a sua sorte na Europa apadrinhado pela família
Prado. Em 1978, disputou o campeonato britânico de F3, onde se
sagrou campeão conquistando sete vitórias consecutivas na
categoria. No mesmo ano, estabelece o seu primeiro contacto ao
volante de um F1 em Silverstone, testando para a McLaren. Ele faz
a sua estreia aos comandos de um Ensign-Cosworth no GP Alemanha (Hockenheim).
Disputa ainda 3 Grandes Prémios com a McLaren antes de se ligar
contratualmente com a Brabham no Canadá.
Bernie Ecclestone, chefe da equipe Brabham, assina de imediato
Nelson por 4 motivos: a sua incrível rapidez, não cometer erros,
pelas ideias revolucionárias que introduziu na F3 e por um magro
contrato de 3 anos mesmo para aquela época. Na Brabham, Piquet
aprendeu muito com Niki Lauda, seu colega de equipa. Quando o
austríaco se retirou no final de 1979 Piquet tornou-se no
primeiro piloto da equipa.
Em 1980, perde o campeonato para Alan Jones (Williams-Ford)
depois de uma longa e árdua disputa, por vezes demasiado árdua
quando Alan decide o título a seu favor colocando o jovem Piquet
fora de prova. Foi ainda em 1980 que no GP Estados Unidos em Long
Beach vence a sua primeira corrida de F1. Em 1981, ainda com a
Brabham, conquista o seu primeiro título de Campeão do Mundo,
batendo Carlos Reuteman por um único ponto na última corrida da
temporada em Las Vegas.
Piquet gosta de relembrar um episódio envolvendo Carlos Reuteman
em 1974. Quando o jovem Nelson trabalhava para a Brabham de
"graça" ele limpou o capacete do argentino. Depois de
Nelson ter acabado o serviço, Reuteman disse: "Rapaz, tu não
serves nem para limpar um capacete!" Quando Piquet
conquistou o seu título relegando Carlos para o 2º lugar,
Nelson vira-se para Reuteman e diz: "Eu não sirvo para
limpar o teu capacete mas talvez tu possas limpar o meu que é de
Campeão do Mundo!".
A época de 1982 foi uma temporada de desenvolvimento para a
Brabham e a BMW, preparando-se para assaltar o título de 1983.
Contudo, há um episódio ocorrido em Hochenheim durante o GP
Alemanha que ninquém esquece, quando Nelson liderava a prova e
preparava-se para dobrar Eliseo Salazar numa das chicanes do
circuito, o chileno fecha a porta e põe Piquet fora de prova.
Claramente, Piquet lembrava-se do acidente sofrido por Didier
Pironi na sessão de qualificação onde o francês foi
transportado para o hospital com várias lesões. Para além
disso, ele assistiu à morte do seu amigo Gilles Villeneuve em
Zolder umas semanas antes, numa altura em que Nelson criticava
severamente a Ferrari acusando a equipa de Maranello de fazer
correr "caixões com rodas".
Depois do acidente Piquet caminhava a pé para as suas boxes
quando de repente uma carrinha aparece para o apanhar. No entanto,
quando se apercebe que Salazar é um dos passageiros, Nelson
recusa-se a entrar. De imediato, a discussão ficou de novo acesa
entre os dois, tentando Piquet tirar Eliseo para fora. Para
acalmar os ânimos o motorista sai da carrinha. Mas antes de
conseguir falar com qualquer dos dois, Nelson salta para o lugar
da frente e arranca deixando para trás tanto Salazar como o
motorista.
10 anos depois, um engenheiro da BMW revela a Piquet que o seu
motor iria partir-se duas voltas depois da colisão. A sua reacção
foi imediata: "o acidente com o Eliseo foi a melhor coisa
que podia ter acontecido à BMW porque evitou a vergonha de ver o
seu motor explodir em pleno GP da Alemanha. O brasileiro tentou
imediatamente encontrar o telefone do chileno para lhe contar a
novidade.
Quando conquistou o seu 2º título mundial em 1983, Piquet
tornou-se no primeiro piloto campeão com um motor turbo. Um
facto curioso é que tanto em 81 como em 83, Nelson teve que
recuperar a desvantagem pontual na última corrida para se sagrar
campeão do mundo. Mas nem sempre foi fácil, quando os seus
adversários o colocavam fora de prova.
Em 1984, Piquet era claramente o piloto mais rápido do Mundial
de F1 mas os problemas de fiabilidade do seu Brabham-BMW deixaram-no
sem hipóteses para conquistar o tri-campeonato, contudo a sua
rapidez foi bem patenteada nas 9 poles positions conquistadas ao
longo da época, o que lhe valeu outras tantas "scooters",
prémio para quem conquistasse o melhor tempo na sessão de
qualificação. A temporada de 85 foi ainda mais frustrante,
Piquet obteve apenas uma vitória em Paul Ricard no GP França,
muito graças à sua condução e aos pneus Pirelli que
aguentaram toda a distância da corrida.
Durante a época, Piquet assina um contrato com a Williams-Honda
para 1986. Contudo, depois do trágico acidente de Frank Williams
que o deixa paraplégico, a equipa perde o rumo e liderança.
Como consequência, o título é conquistdo por Alain Prost no
seu McLaren-Tag Porsche na última prova em Adelaide, ambos os
pilotos da Williams, Piquet e Mansell, retiram pontos preciosos
um ao outro em lutas fraticidas deixando caminho para o francês
conquistar inesperadamente o seu 2º título consecutivo.
No ano seguinte tudo corre de feição a Piquet, conquista o seu
tri-campeonato por uma grande margem sobre Nigel Mansell. O inglês
era o seu alvo preferido de partidas, uma prática que gerou
alguns conflitos entre os dois, dentro e fora das pistas. No
decorrer dos treinos de qualificação do GP do México e quando
Nigel sofria de problemas de estômago por ter comido demasiada
comida mexicana apurada na noite anterior, numa das suas
correrias à casa de banho a meio do treino, Nelson apercebe-se
do sucedido e esconde-lhe o papel higiénico, o que por certo
deixou o britânico a rugir como um leão.
Outro alvo das suas brincadeiras era o presidente da FIA, Jean-Marie
Balestre. Durante um briefing de pilotos em Paul Ricard, enquanto
Balestre fazia o seu discurso, Nelson aproxima-se com muito
cuidado do presidente e cuidadosamente entorna-lhe uma garrafa de
água mineral no bolso esquerdo do casaco, quando a água começa
a escorrer pelas pernas nem mesmo o todo poderoso presidente
evita uma gargalhada enquanto todos os outros pilotos há muito não
conseguiam conter as suas gargalhadas.
Apesar dos momentos divertidos, Piquet teve que lutar muito com
Mansell em 87, chegando mesmo a encontrar inimigos no seio da
equipa, Nelson sabia que a equipa queria um inglês campeão do
mundo. O grave acidente de Piquet nos treinos para o GP São
Marino não ajudou em nada, provocando uma grande instabilidade
no sono do piloto que apenas conseguia dormir 3 a 4 horas por dia.
Contudo, o seu talento e destreza faz superar o mau momento e
vence o campeonato em grande estilo.
Outro acontecimento curioso deu-se precisamente depois do
acidente em Imola. No Sábado, Piquet deixou por si mesmo o
hospital contra indicações médicas e foi encontrar-se com o
professor Sid Watkins nas boxes, pedindo-lhe para o deixar correr.
O teor da conversa foi no mínimo hilariante:
Prof. Sid Watkins: "Nelson, não posso deixar-te correr
porque tens um traumatismo crâneano."
Piquet: "Como sabe?"
Prof. Sid Watkins: "Nelson, só tens calçado um sapato e
esqueceste-te do outro."
Piquet: "Não esqueci não, não consigo calçar o outro
porque tenho o pé inchado."
Por esta altura muitos acusaram Sid Watkins de favorecer Mansell
ao deixar Piquet fora da corrida italiana.
Cansado das guerras internas no seio da Williams, Piquet
precipita-se e comete o maior erro na sua carreira ao assinar
pela Lotus para 88 e 89 apesar do contrato multimilionário. Foi
a primeira vez desde 1980 que não venceu uma única corrida na
época. Volta a saborear o gosto da vitória apenas em 1990 no GP
do Japão, em Suzuka, ao volante de um Benetton-Ford. Foi uma vitória
importante pois foi a primeira dobradinha da equipa com Roberto
Moreno em segundo lugar, substituindo o acidentado Alessandro
Nannini a recuperar da queda de helicópetro que sofrera uma
semana antes e que lhe havia decepado um braço. No GP seguinte,
na Austrália, volta a vencer, também esta uma vitória histórica
pois foi o vencedor do 500º GP do Mundial de F1. Em 1991, ainda
com um Benetton-Ford, completa a sua carreira na F1 com uma vitória
no GP Canadá.
Piquet teve um papel extraordinário de desenvolvimento na F1, o
maior gozo para ele era desenvolver carros vitoriosos, dedicação
que lhe valeu um brilhante palmarés em 204 GP's. Das inovações
salientam-se os famosos cobertores térmicos para os pneus para
terem uma melhor resposta nas primeiras voltas, e a regulação
das barras de travões dentro do cockpit. Fruto desse
desenvolvimento foi por três vezes Campeão do Mundo de F1 cada
uma delas com 3 motores diferentes: Ford, BMW e Honda.
Depois da F1, Piquet estabelece um novo objectivo em 1992, as 500
Milhas de Indianápolis. Mas numa sessão de treinos uma falha
mecânica traiu o campeão e colocou o seu Lola-Buick do Team
Menard no muro de betão da famosa oval. Nelson sofreu um
traumatismo crâneano, uma perfuração no tórax e graves lesões
nas pernas e pés. Parecia o fim de uma brilhante carreira, mas
um ano volvido, e depois de uma lenta e penosa recuperação,
regressa a Indianapolis para acabar o que tinha deixado a meio no
ano anterior. Porém, o motor Buick que equipava o Lola não o
deixa passar do primeiro terço da prova, partindo-se em plena
recta. Ainda em 1993 monta uma equipa de F3000 para fazer o
correr o seu afilhado, o monegasco Olivier Beretta.
Desde 1993, Nelson Piquet apenas corre para se divertir em
eventos como as 24 horas de Le Mans e Spa-Francorchamps e em
provas do campeonato brasileiro de turismos. A ligação com a
BMW está sempre presente. Ainda correu na "Temporada"
GT com um McLaren-BMW F1-GTR e em algumas provas do campeonato
SudAm de F3, correndo no seu circuito em Brasília. A sua
principal ocupação agora é ajudar a desenvolver o
automobilismo de competição no Brasil e transmitir todos os
seus conhecimentos para os jovens pilotos. Outra actividade
corrente do Piquet é gerir a Autotrac, uma empresa de
rastreamento de camiões através de satélite. Recentemente
criou a F. Espron no Brasil, com o objectivo de promover corridas
com baixos custos. Gere ainda o autódromo de Brasília com o seu
nome bem como o do Rio de Janeiro. Agora que rumo Nelson irá
seguir?
Prevê-se que Nelson Piquet poderá ser nomeado representante da
FIA no Brasil. A dinastia Piquet nas pistas não vai acabar, o
seu talentoso filho, Nelson Ângelo Piquet é já piloto de testes da Renault F1 e prevê-se quem em 2008 esteja já ao volante de um F1
em Grandes Prémios.
Considerado como um dos melhores pilotos de F1 de todos os tempos,
Nelson Piquet espalhou o seu talento, velocidade e conhecimento
nas pistas de todo o mundo durante décadas, deixando milhares de
espectadores maravilhados.
Os seus momentos mágicos jamais serão esquecidos