Juliane
Zaché, Lena Castellón e Mônica Tarantino
Foto:
André Dusek |
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Há
cerca de duas semanas, o frentista Cícero Bezerra de
Lima, 26 anos, de Brasília, já estava na sala de
cirurgia pronto para ser operado de uma hérnia
umbilical quando foi informado de que teria de voltar
para casa. O hospital exigiu um cheque-caução do plano
de saúde, que não quis ceder. Cícero abriu um
processo no Procon daquela cidade e pensa em entrar com
uma ação na Justiça por danos morais. Ele ainda sente
fortes dores, mas o hospital e o Saúde Bradesco
continuam sem se entender. A empresa afirma que liberou
a cirurgia, mas o hospital diz que Cícero só esteve lá
para fazer uma consulta |
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Como se vê,
é como se o consumidor fosse penalizado quando fica doente e precisa usar
um serviço que paga todo mês. E na opinião do psiquiatra Márcio
Pinheiro, residente nos Estados Unidos, o pior é que o Brasil está
reproduzindo um modelo de assistência que já se mostrou falido. “Vejo
com muito maus olhos essa cópia que o Brasil está fazendo dos Estados
Unidos. Poucos países, todos do terceiro mundo, estão adotando esse
sistema, que, a meu ver, é muito perverso”, critica. Nem a abertura do
mercado a empresas estrangeiras, permitida a partir da nova legislação,
parece aliviar o calvário do consumidor. A Associação Paulista de
Medicina, por exemplo, está cautelosa em relação à entrada do capital
estrangeiro no setor.
E tem razões para isso. A entidade recebeu um documento que mostra como
uma empresa americana de gestão hospitalar trata a classe médica. Dois
dizeres chamaram a atenção da APM: “Dirigir médicos é como dirigir
gatos” e “A parte mais cara do tratamento ao paciente é a caneta do médico.”
O material fez parte de uma apresentação feita por Paul Mouristezen,
vice-presidente internacional da New England Medical Center, de Boston,
durante uma palestra sobre gestão hospitalar em Salvador. Parceira da
empresa no Brasil, a New England Serviços e Participações (Nesp) se
defende. “A primeira frase não foi acintosa. Foi uma brincadeira”,
afirma George Schahin, presidente da Nesp. A idéia era dizer que gatos
detestam ter chefes. Apesar disso, gostariam de ocupar esses postos.
Quanto à caneta do médico, Schahin argumenta que os custos hospitalares
estão subindo assustadoramente. E que a tecnologia avança, encarecendo
esses valores. “Quem pede exames? Não são os hospitais, e sim os médicos”,
diz.
Foto:
Ricardo Stuckert |
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Em
1997, Milena (nome fictício), 33 anos, adquiriu plano
da Amil. No ano seguinte, foi internada. “Recebi o
diagnóstico de HIV.” Ela ficou seis dias na instituição.
Uma semana depois, o hospital cobrou-lhe cerca de R$ 2,5
mil. A Amil só cobrira os dias em que não se sabia
qual era o problema. “Paguei a metade da quantia.”
Ela quer recuperar o dinheiro. Milena continua com a
Amil. Mas critica. “Plano foi feito para não ser
usado. Se a gente usa, pega o dinheiro que seria
embolsado pelas empresas.” A Amil não pagou os três
últimos dias porque a obrigação de cobrir doenças
infecto-contagiosas como a Aids passou a valer a partir
de dezembro de 1999 |
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Com tanta
confusão, será que há alternativas de cobertura digna para tratamento
de saúde? Para as empresas privadas e estatais, sindicatos, associações
e fundações, a resposta é sim. Trata-se do modelo de auto-gestão –
empresas integradas por médicos prestadoras de serviços. O Sindicato dos
Jornalistas do Estado de São Paulo, por exemplo, optou por essa
alternativa depois de não concordar com os reajustes de renovação de
contrato da Unimed Paulistana. “Sai mais barato porque a empresa paga
apenas quando o funcionário usa o serviço”, explica Walter Lyrio do
Valle, gerente médico da Associação Beneficente dos Empregados em
Telecomunicações, contratada pelo sindicato. Mas, ao que parece, o
consumidor que paga o plano do próprio bolso ainda terá muita briga pela
frente.
Colaboraram:
Francisco Alves Filho (RJ) e Ricardo Miranda (DF)
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