A PROPOSTA DE IMPLEMENTAÇÃO DA QUALIDADE NA
EDUCAÇÃO: ONDE (COMO) FICA O PROFESSOR?
Neoliberalismo e educação
No mundo atual nos deparamos com a implementação
do projeto neoliberal em vários países, incluíndo os da América
Latina, como modelo hegemônico de uma ideologia mundial. Segundo
alguns autores que investigam esta temática, este projeto foi
consolidado nos países capitalistas desenvolvidos, por volta da
década de 70, baseado na implementação de propostas da economia
clássica como caminho para a superação da crise dessas sociedades.
É característica do neoliberalismo que o Estado tenha uma mínima
intervenção na economia e no controle das atividades econômicas
privadas, possibilitando assim a livre ação dos mecanismos do
mercado internacional. Neste sentido para compreendermos como este
projeto tem percebido a questão educacional, é importante numa
época de globalização, entendê-lo como um processo inserido num
contexto dinâmico maior. (Bianchetti, 1997)
Este projeto possui como característica a
criação de categorias próprias de percepção da sociedade e de
mundo, e prioriza um duplo investimento. Por um lado implementando
estratégias políticas, econômicas e jurídicas para enfrentar a
crise capitalista; e por outro veiculando uma ideologia onde só
existe uma determinada realidade divulgada em um novo senso comum,
dificultando a elaboração de uma outra quando se quer buscar uma
economia equilibrada. Dessa forma todos devem adaptar-se às suas
regras, mesmo que para isso haja um comprometimento na área social
através do aumento da exclusão. Anderson (1995), faz uma análise
deste fenômeno hegemônico e conclui , mesmo provisoriamente, que:
" Economicamente, o neoliberalismo
fracassou, não conseguindo nenhuma revitalização básica do
capitalismo avançado. Socialmente, ao contrário, o
neoliberalismo conseguiu, muitos dos seus objetivos, criando
sociedade marcadamente mais desiguais, embora não tão
desestatizadas como queria. Política e ideologicamente, todavia,
o neoliberalismo alcançou êxito num grau com o qual seus
fundadores jamais sonharam, disseminando a simples idéia de que
não há alternativas para seus princípios, que todos, seja
confessando ou negando, têm de adaptar-se a suas
normas."(p.23)
Embora o referido autor destaque o fracasso
econômico das políticas neoliberais, percebe-se na prática uma
supervalorização desta área sobre as demais, sendo este aspecto
norteador na análise das relações sociais, políticas,
educacionais, etc... que de uma forma ou de outra colaboram na
produção de uma sociedade mais desintegrada e desigual. Tal fato tem
contribuído para uma desestruturação da representação coletiva
dos interesses populares, um desestímulo aos movimentos organizados e
suas manifestações de luta. Estes fatos são decorrentes da
inculcação dos elementos centrais deste projeto global que tem sido
caracterizado através da :
" construção da política como
manipulação do afeto e do sentimento; a transformação do
espaço de discussão política em estratégias de convencimento
publicitário; a celebração da suposta eficiência e
produtividade da iniciativa privada em oposição à ineficiência
e ao desperdício dos serviços públicos, a redefinicão da
cidadania pela qual o agente político se transforma em agente
econômico e o cidadão em consumidor." (Silva, 1994, p15) .
A área da educação, nesta perspectiva tem
evidenciado que os problemas do sistema educacional são decorrentes
de um gerenciamento deficitário que não garante a participação
numa competitividade globalizada. O gerenciamento, então é visto
como o principal aspecto a ser considerado na reforma administrativa
do sistema escolar, como forma de promover estratégias de controle
que possibilitem a qualidade do ensino. A principal discussão em
torno da educação é de que esta somente será de qualidade a partir
do controle e da avaliação dos serviços educacionais e da
articulação da formação escolar com os objetivos do mercado de
trabalho. Aí fica posto um desafio para a educação que deverá
além de instrumentalizar o indivíduo para a produtividade,
desenvolver uma formação política para o alcance da cidadania.
Neste sentido agora a meta é de que através da educação possa se
preparar mão de obra qualificada, não tão especializada como
anteriormente, mas com uma formação geral e flexível de qualidade
para atender a competitividade do mercado. A partir dessas mudanças
é de se esperar que ocorra também uma modificação no sistema
escolar, de forma a atender a essa nova demanda de formação de mão
de obra para o mercado.
É nesse contexto que o termo qualidade, mesmo
tendo sido muitas vezes anteriormente referendado, passa a ter grande
destaque, sendo utilizado com diferentes conceituações e
definições vindo ocupar lugar sobre outras problemáticas do ensino.
Educação e qualidade
Dentro da perspectiva neoliberal, a busca pela
qualidade tem sido um objetivo prioritário e desafiador. Na tentativa
de compreender essa questão, recorremos à Enguita (1996) que nos
apresenta momentos distintos da utilização desse conceito na
educação. Num primeiro momento na área educacional era suposto que
quanto mais recursos materiais e humanos fossem investidos no sistema
escolar numa relação de custo por usuário, maior seria a qualidade.
Posteriormente num segundo momento, o investimento em recursos se
deslocou em função da eficácia do processo, que consistia em
conseguir o máximo resultado com o mínimo custo, seguindo assim a
lógica empresarial. Já num terceiro momento (que representa o
atual), a qualidade da educação segue a lógica da competitividade
de mercado, e será verificada através dos resultados escolares e de
diferentes formas de avaliação.
Dessa forma o rendimento do aluno será medido
considerando o seu desempenho cognitivo e habilidades adquiridas. Este
atrelamento de qualidade do ensino e rendimento escolar, reflete uma
visão tradicional de educação, que tem como principal objetivo a
transmissão de conteúdos pelo professor e a assimilação destes
pelo aluno.
Isto posto, uma das preocupações entre os
educadores é de que essa busca "repentina" de qualidade no
ensino no atual contexto, possa levar a um retrocesso no conceito mais
amplo de educação. O que tememos é que como a função da escola
passou a ser vinculada ao setor produtivo numa lógica do mercado a
serviço do cliente, possa retornar uma prática fundamentada num
tecnicismo educacional, que se limite a transmitir habilidades e
competências para formação do indivíduo que irá atuar
competitivamente no mercado de trabalho. Isto porque as propostas
educacionais tem caminhado, na perspectiva neoliberal, baseadas em um
conceito de que a qualidade na educação é:
"decorrente das práticas empresariais e
transferida, sem mediações para o campo educacional. As
instituições escolares devem ser pensadas e avaliadas (isto é,
devem ser julgados seus resultados), como se fossem empresas
produtivas. Produz- se nelas um tipo específico de mercadoria (o
conhecimento, o aluno escolarizado, o currículo) e,
consequentemente, suas práticas devem ser submetidas aos mesmos
critérios de avaliação que se aplicam em toda empresa
dinâmica, eficiente e flexível".(Gentili, 1996, p.25)
É neste sentido que o modelo neoliberal tem
repercutido na educação, através da discussão de programas de
controle de qualidade total (CQT) elaborados em empresas e aplicados
em sistemas escolares em busca de sua eficiência. Tais propostas que
tem como objetivo a produtividade procuram reorganizar a educação de
acordo com os esquemas de organização do processo de trabalho das
empresas.
Na área educacional, a gestão de qualidade total
(GQTE) tem sido implementada considerando a escola como um elo da
cadeia produtiva, onde a ineficiência da instituição é vista como
um problema gerencial e de falta de entendimento. Neste caso surge a
necessidade de ajustar o tipo e a qualidade do produto (perfil do
aluno) ao que o cliente (o mercado) espera. As mudanças seriam mais
de caráter gerencial, (organização do trabalho escolar e
pedagógico), não se verificando mudanças na tecnologia empregada na
escola. Afim de que as idéias presentes neste conceito não sejam
referidas aos modelos educacionais considerados como tecnicismo
educacional, o GQTE propõe um modelo de gestão que pressupõe a
descentralização das decisões, o autocontrole dos trabalhadores e a
conseqüente desalienação. À própria sociedade tem sido alvo dos
meios de comunicação quanto à questão de produtividade sendo
defendida a forma de trabalho de "gestão participativa".
(Fidalgo & Machado,1994)
O que percebemos é que tal programa tem uma
percepção simplista de educação, pois considera que os problemas
educacionais podem ser resolvidos simplesmente através de soluções
técnicas. Um dos aspectos que nos preocupa é o fato de que apesar de
tais programas promoverem uma maior participação, autonomia e
descentralização das escolas, possa se perder dos princípios de
universalização dos sistemas escolares. Um outro refere- se ao
processo de avaliação que é feito de forma prescritiva e
despolitizada desvinculada da escola e de seus determinantes sociais,
com o simples objetivo de se ter um controle do desempenho escolar.
De certa forma a opção de implantação de um
programa de qualidade total em um sistema educativo traz consigo uma
concepção de educação que impede concebê-la de outra forma.
Segundo Silva (1994), é importante que se compreenda que:
"quando um discurso desse tipo se torna
hegemônico ele não apenas coloca "novas" questões,
introduz novos conceitos e categorias; ele, sobretudo, desloca e
reprime outras categorias que moveram nossas lutas no passado
redefinidas agora como anacrônicas e ultrapassadas. Assim, o
discurso da qualidade total, da privatização em educação, da
escolha e soberania por parte do "consumidor", da
política como participação no consumo, não se apresenta apenas
como uma outra possibilidade ao lado e no mesmo nível das outras.
Ele tende a suprimir as categorias com as quais tendíamos a
pensar a vida social e a educação, ajudando-nos a formar um
futuro e uma possibilidade que transcedessem a presente e
indesejável situação social."(p.21)
Embora ela tenha sempre sido almejada, percebe- se
que muitas das interrogações para educação hoje passam pela
qualidade que tem significados diferentes para pessoas diferentes a
que ela se refere. Mesmo considerando sua amplitude e complexidade é
preciso que analisemos que qualidade é esta? Para que qualidade?;
Para quem?; A serviço de quem ?. Para a discussão dessas questões
temos que considerar a realidade social concreta em que está situada,
já que ela não é algo neutro ou abstrato.
Dessa forma pensar então em educação e qualidade
requer analisar a questão comprometida com projetos políticos
educacionais. Como medidas fundamentais concretas que são proclamadas
em busca da qualidade, temos acompanhado uma politica educacional, que
além de difundir programas de qualidade total, procura descentralizar
as formas de finaciamento e gestão, elaborar parâmetros curriculares
nacionais a serem implementados, (PCNs), estimular um processo de
avaliação da escola, dos professores e alunos, etc. Tais medidas,
apesar de serem baseadas sob vários indicadores tais como: recursos
financeiros, processo ensino-aprendizagem (quantidade de tarefas e
diferentes programas de disciplinas) e produtos finais (provas,
resultados, etc.) tem tentado estratégicamente responsabilizar o
docente pelo fracasso escolar numa visão que desconsidera a sua
prática profissional e as suas condições de trabalho.
O que pleiteamos é a busca de uma educação de
qualidade que promova a elaboração de uma pedagogia crítica que
possibilite ao aluno a apropriação de um saber que lhe permita
desenvolver um senso crítico da realidade a qual está inserido,
enquanto sujeito histórico para o alcance da cidadania.
Qualidade na educação e o professor
Diante desse desafio em busca da qualidade do
ensino, devemos pensar que embora exista uma grande preocupação quer
seja em termos teóricos ou em termos práticos, o papel do professor
enquanto um "agente" de qualidade tem ficado de fora. O
problema da falta de qualidade fica centrado no professor e é
justificado como decorrente da desvalorização e repercussão
negativa da profissão docente. Embora as políticas educacionais
reconheçam o papel fundamental que ele tem no processo educativo,
não levam em consideração a importância de lidar com a questão
docente de um modo mais amplo, priorizando apenas o investimento na
formação, deixando de lado as condições de vida, de trabalho, da
história da profissão.
Assim ao relacionar o problema da qualidade do
ensino ao professor, as propostas educacionais tem optado em se
"preocupar" exclusivamente com a formação deste. Em seu
projeto reconhece que sem o professor não é possivel falar em
qualidade, e como estratégia de investimento procurar treinar o
professor e controlar seu desempenho através de avaliação. Assim
para atender essa questão da formação docente, tem procurado
investir na capacitação em serviço, através do oferecimento de
treinamentos em diferentes modalidades ( presencial e/ou à
distância) com o intuito de repassar conteúdos, que possam
auxilia-los na prática pedagógica. No entanto na análise de
Gentilli (1996) tais cursos tem sido caracterizados como
excessivamente centralizados tanto em seu planejamento quanto em sua
aplicação assim :
"... vão se configurando como pacotes
fechados de treinamento (definidos sempre por equipe de técnicos,
experts e até consultores de empresas!) planejados de forma
centralizada, sem participação dos grupos de professores
envolvidos no processo de formação, e apresentando uma alta
transferibilidade (ou seja, com grande potencial para serem
aplicados em diferentes contextos geográficos e com diferentes
populações)." (p.34)
O que temos percebido é que esses cursos de
formação tem sido fundamentados num modelo da racionalidade
técnica, pois percebem a atividade educacional como uma resolução
instrumental de problemas, a serem resolvidos pela aplicação de
teorias e técnicas científicas. Esta abordagem contemplada nos
cursos acabam reforçando o distanciamento entre aquilo que se planeja
e o que se executa através de uma padronização do conhecimento
escolar. A prática profissional a ser desenvolvida pelos professores,
é exemplificada como uma mera aplicação de técnicas para a
solução de problemas, desconsiderando fenômenos incertos e
conflitantes que aparecem no cotidiano escolar.
A literatura na área, muito já vem nos mostrando
a ineficácia desses pacotes de treinamentos padronizados, enquanto
recurso de mudança efetiva na prática pedagógica. Isto porque eles
geralmente são impostos por agentes que estão fora da escola, não
considerando os anseios de capacitação solicitados pelos
professores. Como alternativa de formação em serviço tem sido
proposta uma prática de capacitação coletiva contínua entre os
professores de uma mesma escola. Assim, juntamente com um mediador, os
professores poderiam a partir de dúvidas e questões apresentadas por
eles próprios, analisar as experiências vivenciadas desenvolvendo
uma forma de atualização mais concreta e coerente com o contexto em
que atuam.
Ainda assim, embora as políticas educacionais
reconheçam a importância do professor em relação à qualidade e
para isto façam investimento em sua formação, ele ainda não tem
tido o seu papel devidamente reconhecido, ficando de forma oculta em
alguns aspectos da questão.
Essa desconsideração do papel do professor tem se
manifestado na ausência da participação docente nas discussões e
decisões de políticas educacionais. A elaboração dessas propostas
fica sob a responsabilidade de vários profissionais (economistas,
políticos, etc.) ficando a execução das mesmas por conta dos
professores, relegando a estes últimos um papel secundário e
passivo.
Neste sentido Torres (1996) em uma análise das
medidas implementadas, na área educacional, pelo Banco Mundial,
conclui que estas apesar de recentes, estão de certa forma
reproduzindo um modelo educativo convencional. E ressalta que em
relação ao professor tais políticas ainda mostram :
"...uma grande incompreensão e
negligência ao lidar com a questão docente, com as condições
de vida e de trabalho dos docentes, o seu perfil profissional e a
sua formação contínua, desconhecendo o fato de que os
professores são atores essenciais na qualidade e na mudança em
educação. Relega o docente a um papel secundário e passivo,
não contendo a participação e a consulta do magistério como
condição fundamental no desenho, execução e eficácia das
políticas e em particular da reforma educativa; tem uma visão
estreita e de curto prazo da formação docente, e concebe a
capacitação como um problema de adequação dos docentes a fins
e objetivos pré- estabelecidos; privilegia no docente o seu
conhecimento e a sua atualização em conteúdos, diminuíndo a
importância de sua formação pedagógica." (p.178)
Giroux (1997) também identifica este problema da
ausência de participação de professores nas decisões políticas, o
que talvez possibilitaria uma análise crítica da natureza e do
processo das reformas educativas. Alerta que tais mudanças
educacionais acabam sendo percebidas pelo professor como uma ameaça
decorrente da falta de confiança na capacidade deles próprios. O
autor ressalta que:
"....muitas das recomendações que
surgiram no atual debate, ignoram o papel que os professores
desempenham na preparação de aprendizes para serem cidadãos
ativos e críticos, ou então sugerem reformas que ignoram a
inteligência, julgamento e experiência que os professores
poderiam oferecer em tal debate. Quando os professores de fato
entram no debate é para serem objetos de reformas educacionais
que os reduzem ao status de técnicos de alto nível cumprindo
ditames e objetivos decididos por especialistas um tanto afastados
da realidade cotidiana da vida da sala de aula."(p.157)
Ao mesmo tempo, como uma outra forma do discurso
dos problemas educacionais, se tem culpado o professor como
responsável pela falta de qualidade da escola, por estarem mal
formados, saberem pouco e trabalharem mal, reduzindo assim a uma
visão de sistema educativo centrado no professor. Embora concordemos
que há uma grande influência das práticas docentes sobre a
qualidade da escola, não podemos fazer tal análise desvinculados da
situação em que o professor se encontra hoje. Este tipo de discurso
é analisado por Apple (1996), e identificando a existência de uma
tendência conservadora na políticas educacionais dos últimos anos
nos mostra que :
"Embora essas políticas tenham história
e impulsos complexos e algumas vezes até mesmo contraditório, em
geral está se tornando cada vez mais claro que - embora expresso
numa retórica democrática- o efeito continuado dessas
"reformas" será o de exarcebar desiguldades existentes
e perpetuar a velha prática de culpar os/as educadores/as e
particularmente os/as professores/as - por desiguldades sociais e
econômicas generalizadas’. (p.102)
Num estudo que vai além de simplesmente
responsabilizar o professor pela falta de qualidade na escola, Esteve
(1995) analisa como fica a situação destes diante dos problemas do
cotidiano escolar resultantes das mudanças implementadas. O autor
ressalta que mediante os problemas que vão aparecendo na escola, o
professor tenta encontrar saídas afim de solucioná-los. Neste
sentido ele nos diz
"O problema reside em que,
independentemente de quem provocou a mudança, são os actores que
dão a cara. São eles, portanto, quem terá de encontrar uma
saída airosa, ainda que não sejam os responsáveis. As
reacções perante esta situação seriam muito variadas; mas em
qualquer caso, a palavra mal-estar, poderia resumir os sentimentos
deste grupo de actores perante uma série de circunstâncias
imprevistas que os obrigam a fazer um papel ridículo. Tal como
actores acima mecionados (epígrafe), os professores enfrentam
circunstâncias de mudança que os obrigam a fazer mal o seu
trabalho, tendo de suportar a crítica generalizada, que sem
analisar essas circunstâncias, os considera como responsáveis
imediatos pelas falhas do sistema de ensino."(p.97)
Neste sentido, é importante também considerar as
"saídas" que são encontradas pelos professores diante das
situações que lhe são colocadas, ao invés .de somente
responsabilizá-lo pelos problemas educacionais. O reconhecimento
desta questão possibilitaria um repensar do papel dos professores e a
proposição de alternativas a fim de atender as mudanças exigidas no
contexto educacional atual.
Assim embora concordemos que a qualidade da escola
está também diretamente ligada com o professor e com a sua
atuação, entendemos que não basta implementar propostas que atuem
somente sobre um aspecto isoladamente (no caso da nossa atual
política seria o da formação). Devemos pensar em uma nova lógica
para uma atuação de qualidade do professor considerando as
transformações do mundo moderno, e em conseqüência as
modificações dos sistemas educacionais. Neste sentido, Nóvoa (1995)
analisa a profissão docente e destaca a necessidade de encontrar
novos valores e modelos de organização da profissão docente, para
enfrentar as mudanças atuais e futuras, propondo a produção de uma
cultura profissional. Neste sentido ele diz:
"Os professores têm de reencontrar novos
valores, que não reneguem as reminiscências mais positivas (e
utópicas) do idealismo escolar, mas que permitam atribuir um
sentido à acção presente. Por outro lado, precisam de edificar
normas de funcionamento regulações profissionais que substituam
os enquadramentos administrativos do Estado.
A produção de uma cultura profissional dos
professores é um trabalho longo, realizado no interior e no
exterior da profissão, que obriga a intensas interacções e
partilhas. O novo profissionalismo docente tem de basear-se em
regras éticas, nomeadamente no que diz respeito à relação com
os restantes actores educativos, e na prestação de serviços de
qualidade. ...É fundamental que a nova cultura profissional se
paute por critérios de grande exigência em relação à carreira
docente.(condições de acesso, progressão, avaliação, etc.).
Se os próprios professores não investirem neste projeto é
evidente que outras instâncias (Estado, Universidades, etc.)
ocuparão o território deixado livre, reivindicando uma qualquer
legitimidade de pilotagem da profissão docente."(p.29)
Assim segundo o autor não é mais possível
menosprezar as capacidades dos professores, sendo este o momento de
refazer as identidades, numa perspectiva de autonomia profissional,
afim de recriar a profissão e iniciar uma nova etapa na história das
escolas e de seus atores.
Concordando com Nóvoa , reforçamos assim a
necessidade de revitalizar a profissão do professor, que anda
desestimulado tanto pelas difíceis condições de trabalho no
cotidiano da(s) escola(s)
como pela forma que esta(s) o tem solicitado como
mero executor de propostas (projetos), numa prática onde se separa a
concepção da execução. Para a elaboração de uma proposta de
retomada de valorização da profissão se faz importante considerar o
histórico da formação docente, aspecto este que não tem sido
considerado nas políticas atuais de valorização do professor. Isto
requer o reconhecimento de vários aspectos da prática pedagógica
desde uma definição clara dos objetivos do papel do professor; do
reconhecimento de seus valores como pessoa; da consideração das
condições de trabalho de onde ele atua e do resgate da cultura
escolar presente no cotidiano.
Em síntese o professor precisa realmente ser
inserido e reconhecido como ator no processo de "gestão
escolar"
. Ele precisa ser considerado como sujeito que tem
um fazer e um saber, ter respeitado a sua experiência para ser
reconhecido como ator fundamental para a revitalização da escola
pública de qualidade. Assim ele poderá participar enquanto professor
comprometido, considerando as transformações do mundo e da escola,
recriando categorias próprias para elaborar um projeto educacional de
qualidade, que rejeite o dogmatismo da retórica neoliberal, de modo a
garantir uma escola pública de qualidade para todos, em busca de uma
sociedade mais justa e solidária.
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A PROPOSTA DE IMPLEMENTAÇÃO DA QUALIDADE NA
EDUCAÇÃO: ONDE (COMO) FICA O PROFESSOR?
Celia Maria Fernandes Nunes – UFOP/ PUC-Rio
As transformações ocorridas nos últimos anos na
sociedade, têm gerado profundas mudanças e caminhado em direção a
uma reorganização econômica em busca da globalização, acarretando
modificações de âmbito social, político, educacional etc... Neste
contexto, identificamos a grande importância que se tem dado a área
educacional, passando esta a ser considerada o principal aspecto para
o desenvolvimento, sendo divulgada como prioritária nas propostas
governamentais. Este grande "destaque" à área nos leva ,
enquanto educadores, a algumas indagações do tipo: O que tem
fundamentado as propostas (programas) implementados na área
educacional?; Que qualidade na educação tem sido buscada nas
reformas educacionais baseadas no modelo neoliberal?; O professor tem
sido considerado nesse projeto?; De que forma?; Como fica o seu papel
na preparação do aluno como cidadão crítico?; Que tipo de
contribuição poderia ele fornecer na elaboração de tais propostas
educacionais? .
Nesta comunicação procuro analisar tais
questionamentos organizado-os da seguinte forma. Inicialmente
procurando situar o projeto neoliberal como modelo hegemônico e a sua
relação com a educação de qualidade. Em seguida identificando como
o conceito de qualidade tem se efetivado na área educacional, para
então analisar a forma de participação dos professores neste
contexto de mudanças.
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