“França! Sinto-me feliz por ter nascido em teu solo. E também porque a Providência me reconduziu a ti antes que fosse tarde demais” – escreverá Thomas, mais tarde; mas não era o que pensava, quando criança, ao chegar a Calais, num dia chuvoso de setembro de 1925.

        Em Orleans, o pai falou-lhe sobre Joana d’Arc; ele pensou nela com admiração: não seria isto uma prece inconsciente?

        Saint-Antonin-em-Aveyron, antigo vilarejo romano fortificado, e cidade medieval: dela Thomas guardará uma lembrança delicada. Ao centro erguia-se a igreja.

        “Ali, onde quer que fosse, pela disposição de cada coisa eu sentia pelo menos consciência virtual da igreja. Ela se colocava na paisagem de tal forma que se transformou na chave de sua inteligibilidade; este é o sentido de todas as coisas criadas: proclamar a glória de Deus...

        ...viver em um lugar construído de tal maneira que, mesmo contra a vontade, nele nos tornemos contemplativos, onde nossos olhos, constantemente, se voltem para a casa que encerra o Santíssimo Sacramento...

        ...eu não tinha a menor idéia do que é o Cristo... de que Ele é Deus... que existisse alguma coisa semelhante ao Santíssimo Sacramento. Hoje, asseguro-vos que há uma força que emana desse sacramento, uma força de luz e de verdade, a penetrar mesmo no coração daqueles que jamais ouviram falar nele, e parecem incapazes de crer.”

        O sensível garoto de dez anos começou a viajar com o pai, que procurava modelos de quadros e visitava assim antigas capelas, velhas igrejas e mosteiros. Aprendeu o francês e, fascinado, leu Terra de França; gostava ingenuamente de catedrais e abadias. Infelizmente, outros contatos perturbaram o desabrochar dessa alma nova, quando se abria à beleza das coisas de Deus: mandaram-no, com onze anos de idade, para o liceu de Montauban, o que foi uma pena, pois não viu seus companheiros viverem o catolicismo. Quanto a ele, recebeu de um ministro protestante os rudimentos da doutrina religiosa.

        Outra influência à qual Merton se refere com profundo reconhecimento foi a dos Privat, casal de “católicos autênticos”, em cuja residência de Cantal, na Auvergne, o ginasiano de doze anos passava as férias.

       “Eram santos, levando uma vida cotidiana completamente sobrenatural, pela união constante de suas almas com Deus, em profunda fé e caridade”.

        “Só Deus sabe o que devo a essas pessoas admiráveis. Conhecendo-lhes a caridade, estou moralmente certo de que suas orações me proporcionaram muitas graças e talvez mesmo a graça última de minha conversão, e até de minha vocação religiosa...”

        Certamente, foi uma tristeza deixar Saint-Antonin e a pequena casa que Owen tinha mandado construir sobre a costa. O seu destino de artista itinerante conduzia-o à Inglaterra.

        Estamos em 1928. Enquanto o pai viaja, Thomas fica em Ealing, na casa da tia Maud, bela dama de educação vitoriana.

        Sua instrução continua em Ripley Court primeiro, depois em Oakham (Rutland); o anglicanismo se torna sua religião. Estuda latim, grego e filosofia espiritualista; apaixona-se por Blake, Spinoza, Hopkins, T. S. Eliot.

        Mas, se a cultura se amplia, sua alma adolescente permanece fechada às coisas divinas.

        Dois anos mais tarde, Owen Merton morre de tumor no cérebro (1930). Thomas amava profundamente o pai. Era seu melhor amigo, admirava-o e respeitava-o; sofreu muito com sua morte.

        Aos dezesseis anos, Tom estava só e completamente independente. Seu avô “Pop” chamou-o para a América.

        Durante a travessia de dez dias, uma crise muito especial atingiu o jovem órfão, sequioso de afeto: apaixonou-se perdidamente por uma jovem passageira. “Preferiria passar dois anos doente no hospital a recomeçar esse tormento! Esse amor devorante, emocional, apaixonado, que consome o adolescente dia e noite! Amor que não se sente duas vezes na vida...”

        Depois dessa experiência penosa, e ainda nesse verão, pensa que se tornou comunista... sem saber bem a que isso o conduzia.

        Voltando a Oakham, tinha um ar superior de grande revoltado. Nas estantes de seu quarto, amontoavam-se livros inflamados, condenáveis até mesmo pela lei natural... Entre eles, o manifesto comunista de Marx, “que serve para enfeitar”.

        Como seu pai, Thomas gosta de viajar: volta à Inglaterra. Em 1931, passa am alguns exames em Cambridge, e, um mês mais tarde, põe-se a caminho da Itália. É lá que Deus o espera.

 

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