Biografia da Amargura
Yoko Hiyama
 

Capítulo 10 - Resistência

- Está tudo resolvido, Kurama-Sama. Quando ele foi preso surgiram dezenas de outras queixas.

- Tomara que apodreça na cadeia. - Kurama desejou.

- O cara era mesmo um canalha! - Kanashiro concordou.

- Bom, mas vamos encerrar esse assunto por aqui. Não quero mais ouvir sobre esse assunto nessa casa.

- Eu concordo.

- Toda essa confusão atrasou bastante o nosso trabalho.

- Sim, mas não há nada pra gente se preocupar. Vamos continuar?

- Claro. Onde paramos mesmo?

- Hum... o senhor estava falando das tentativas de Katsui para fazer você reagir.

- Isso... eu apanhei mais do que nunca nessa época. Mas, como eu lhe disse, nem isso adiantou de muita coisa . eu continuava resistente. Até que um dia, eu fui atacado.

- Atacado?

- Sim, foi na hora do banho. Um grupo de dez youkais se uniu para... você sabe...

- E o que aconteceu?

******

- Você é tão bonito! Com esse rostinho de menina... nós queremos você!

- Não! Me larguem! Socorro!

- Não adianta gritar! Não tem guardas por aqui! Somente relaxe!

- Não! Eu não quero!

Um deles lhe deu um tapa:

- Cale a boca!

Kurama foi forçado a se debruçar numa bancada de mármore e foi imobilizado e começou a gritar quando sentiu um início de penetração.

******

- Não posso te dizer mais porque eu desmaiei. Acordei na cama de Katsui, com um pano molhado na testa.

- Continue, por favor.

******

- Você está bem, Kurama?

- Acho que não... você falou o meu nome.

- Você esteve desacordado por uma semana. Delirava com uma febre altíssima.

- O que aqueles caras fizeram comigo?

- Nada. Alguém viu e correu para me avisar o que estava acontecendo. Se eu tivesse chegado um segundo atrasado, você teria sido estuprado.

- Você me salvou. Por que?

- Eu teria salvado qualquer um que estivesse nessa situação absurda.

Kurama colocou a mão nos cabelos e com uma voz mais baixa, confessou:

- Acho que pela primeira vez conheci o medo. É horrível não ter como se defender...

- Cabeça Vermelha, eu não vou ficar te defendendo pra sempre. Que tal você começar a se mexer?

- Você vai me ajudar?

- Muito a contragosto.

- É sério?

- Já disse que sim. começamos com as aulas amanhã.

- Obrigado.

- Não agradeça, ningen estúpido! E passe para a sua cama. Eu vou trocar os lençóis da minha. Esse seu cheiro de rosas me dá alergia.

- Tá... - Kurama riu e pulou pra sua cama.

- Dá pra você para de usar esse maldito perfume?

- Lamento, mas eu não uso perfume.

- Tá... você quer me enganar que cheiro é natural?

- É a mais pura verdade.

- Maldito cheiro que pega em tudo.

- Nunca ninguém reclamou! Só você.

- Cale a boca. Não me torre a paciência.

- Eu acho que vou dormir mais um pouquinho. A propósito, eu falei durante o meu delírio?

- Só uma palavrinha.

- Qual?

- Hiei.

******

- Ele ficou com dó de mim.

- Isso percebe-se claramente. E como foi o treinamento?

- Bem puxado. Ele começou a usar melhor a minha força. Aprendi muitas técnicas de luta com Katsui e em troca ensinei a ele alguns truques com plantas. Remédios, venenos e outras coisinhas. O mais interessante foi que a nossa amizade começou a se desenvolver a partir daí. Até que um dia, ele se abriu comigo pela primeira vez.

- Me conte como foi.

******

- Chute.

Kurama respirou fundo e chutou o ar. Katsui segurou seu pé e o puxou, fazendo com que ele caísse no chão.

- Ai!

- Muito lento! Chute de novo!

- Tá!

Kurama chutou e desta vez, levou uma bela rasteira.

- Ai!

- Muito alto! Cabeça Vermelha, se concentre!

- Não dá! Não dá! Minha cabeça está longe hoje.

- Então é melhor fazermos uma parada.

- Obrigado.

- E já vou avisando que se tiver de frescura de novo amanhã vou te bater até ela passar!

- Não é frescura. Eu estava pensando no meu irmão Shuichi.

- Você tem irmão? Ele está vivo?

- Não sei. Ele foi levado como escravo. Era só uma criança, não sei se sobreviveu aos trabalhos forçados. Provavelmente está morto.. de qualquer forma, quando eu conseguir sair desse lugar, a primeira coisa que farei será procurá-lo. Mesmo que a chance de encontrá-lo ao vivo seja pequena.

- Acho que o meu destino será parecido com o seu.

- Por que?

- Bem, deixa pra lá. É uma história bem longa e pouco interessante.

- Pode contar. Estou ouvindo.

- Antes dessa maldita guerra começar, eu vivia feliz. Yomi-Sama não era mais o governante mas a estrutura política deixada por ele era tão forte e estável que permaneceu depois de sua saída. Eu já estava a alguns anos casado naquela época e tinha um filho.

- Casado?

- Sim... o nome dela é Hitomi. Eu sinto uma chama queimando no peito cada vez que penso nela. Não sei explicar... eu sinto uma dor aguda quando lembro dos momentos felizes que tive com ela.

- Isso é saudade.

- Talvez seja... quando a guerra estourou e os soldados de Manabu começaram a destruir tudo para demonstrarem o poder do grande imperador, eu a deixei e ao meu filho num abrigo e fui para a luta. Ela implorou para que eu ficasse, disse que eu estava esperando outro filhote meu e que tinha medo do que acontecesse a ela e ao filho.

- Katsui...

- Deixe-me terminar. Eu escolhi proteger minha terra do que ficar com Hitomi. Eu a deixei lá e me uni à Resistência do Makai. E em pouco tempo me tornei líder do grupo. Mas, um dia, numa luta violenta, perdi todos os meus homens e fui preso. Estou nessa maldita cela até agora. Que tipo de youkai sou eu? Falhei em salvar a minha terra e minha família.

- Acalme-se, Katsui. Você não tem culpa de nada.

- Eu não tenho mais certeza disso. Eu devo ter errado em alguma coisa para estar sendo punido dessa forma tão cruel. Eu preciso sair desse lugar e procurá-la! E quando eu a encontrar... me ajoelharei aos meus pés e vou implorar que ela me perdoe. Vou jurar pela honra de Yomi-Sama que nunca a deixarei sozinha de novo! Nunca!

- Calma, amigo! Eu tenho certeza de que sua esposa está viva e esperando por você. Eu vou pedira Yomi que dê uma olhada no seu processo. Quem sabe não conseguimos sair desse lugar juntos?

- Você... faria isso?

- Claro!!! Enquanto isso, vamos nos preparar para nossa vingança. Você salvará sua terra e sua família! Confie em mim. Essa guerra ainda não acabou.

- Você tem razão, Cabeça Vermelha. E parece que agora você está mais animado pra treinar.

- Animadíssimo! Vamos recomeçar?

- Claro! Chute direito agora, baka!

- Hai, hai!

******

- Caramba! Mulher e filho? Katsui era mesmo um cara surpreendente. Como ele era fisicamente?

- Bem alto, extremamente musculoso, olhos verdes, cabelos também verdes e curtos... não me lembro de mais detalhes. Mas sei que ele não era muito bonito e nem muito feio.

- Hum... e até agora você não tinha começado aqueles estudos que me emprestou...

- Não... eu só me apliquei assim nesse trabalho quando me uni à resistência...

- Uma resistência dentro da Penitenciaria?

- Pois é... ali dentro estavam as maiores cabeças dos Três Mundos. Nós passávamos códigos e ordens para os membros que estavam do lado de fora e mandávamos ações terroristas de dentro da prisão.

- Como conseguiram fazer isso numa prisão de segurança máxima?

- Usando a cabeça, meu amigo.

- Confesso que estou louco para saber dos planos com mais detalhes, mas, primeiro, eu preciso saber qual foi o grande estímulo que te empurrou pra Resistência. Katsui conseguiu te convencer?

- Não... eu recebi uma visita de Yomi...

******

- Dessa vez, trago boas notícias, Kurama.

- Por favor, diga que Manabu morreu.

- Não, infelizmente ele está vivo e cada vez mais tirano. Acredita que o maldito mandou que fizessem três estátuas de mármores dele?

- Aquele imbecil provavelmente vai colocar uma estátua no centro de cada um dos Mundos. - Katsui opinou.

- Provavelmente ele vai fazer isso mesmo. - Yomi concordou.

- Espero que não seja essa a boa notícia.

- Não. Eu finalmente descobri em qual campo de escravidão o meu filho Shura está.

- Poxa, Yomi! Isso é ótimo! Quer dizer que ele está vivo?

- Vivo e com saúde! Logicamente, eu não pude vê-lo. Seria muito perigoso... mas ele está recebendo proteção especial, ficará seguro por enquanto.

- Eu estou feliz por você, Yomi.

- Mas isso não é tudo.

- Não?

- No mesmo campo em que meu filho está, sabe quem eu também encontrei?

- Meu irmão?

- Sim! ele está vivo, Kurama!

- Isso é ótimo! Você me deu a melhor notícia que eu poderia receber. Shuichi está vivo!!!

- Não quero estragar a felicidade dos dois, mas... enquanto esses garotos estiverem lá, correm perigo real de vida. - Katsui interrompeu - eu soube pelas minhas fontes que a situação desses Campos de Escravidão é terrível!

- Você tem toda razão. - Yomi concordou - mas eu já estou planejando um jeito de fazê-los fugir. Shura é muito esperto e saberá se virar muito bem. Ele protegerá Shuichi.

- É... acho que esta é a única saída. - Kurama concordou.

- Estou vendo que você está bem melhor.

- Sim, Yomi. Graças a Katsui, ele me ajudou muito.

- Devo agradecê-lo por isso, Katsui.

- Yomi-Sama, eu é que agradeço pelo seu reconhecimento.

- O que posso fazer para retribuir?

- Yomi, eu gostaria que você desse uma olhada no processo de Katsui. - Kurama respondeu pelo amigo.

- Ah, eu já fiz isso...

- O quê? - Katsui e Kurama se espantaram.

- E acho que vou conseguir libertá-lo antes mesmo do que você, Kurama.

- O senhor está falando sério, Yomi-Sama?

- Claro, Katsui. Eu não mentiria uma coisa tão séria.

Katsui ajoelhou-se perante Yomi e curvou a cabeça.

- Muito corajoso, Yomi-Sama.

- Não foi nada. Afinal, estamos todos do mesmo lado. Bem, agora eu tenho que ir. Minha próxima visita deve demorar bastante, não quero que Manabu desconfie de mim antes de eu conseguir libertar Shura e Shuichi. Eu volto quando conseguir fazer com que aqueles dois fujam.

- Eu concordo, Yomi. Muito obrigado e cuide-se.

- Adeus, Yomi-Sama.

- Adeus.

Yomi se retirou e Katsui fez um comentário que obrigou Kurama a rir.

******

- Qual foi o comentário?

- "Se existe um Deus, ele se chama Yomi-Sama.

- Nossa! Impressionante!

- É. Foi a partir desse dia que a minha vontade de lutar voltou completamente e eu decidi me unir a resistência.

- Então foi assim?

- Foi... minha vida virou uma aventura perigosa. Eu não tinha tempo pra absolutamente nada. Vivia trabalhando em diversos projetos de ataques terroristas. Em um mês de trabalho, fizemos com que Manabu decretasse estado de alerta.

- Que coisa fantástica!

- Nem tanto. Apesar de tudo, nós continuávamos presos e não podíamos fazer ataques realmente importantes. No máximo colocávamos uma bomba num lugar estratégico ou envenenávamos um figurão aliado de Manabu. Nunca passava disso. E o pior era que todas essas operações eram suicidas. Fatalmente, o voluntário que concordava em seguir algum plano terminava morrendo. Com sorte, se unia a todos nós.

O som da campainha interrompeu a fala de Kurama.

- Quem será? - Hiren se perguntou enquanto se levantava pra atender.

Kanashiro foi até a janela e o que viu o espantou bastante.

- Kurama-Sama, está preparado?

- Quem está lá fora?

- O atual governante do Makai e toda a imprensa dos Três Mundos Unificados.

- Você está fazendo algum tipo de piada?

- Não, senhor. É a mais pura verdade.

- Kurama-Sama! - Hiren entrou na sala com os olhos arregalados de susto - o governante dos Três Mundos está aqui e quer falar com o senhor.

- Então é verdade mesmo. Eu vou recebê-lo. Mas, por favor, não deixe a imprensa entrar.

- Sim, Kurama-Sama.

- Devo permanecer na sala, Kurama-Sama?

- Acho que sim. você está fazendo a minha biografia, não é? Mas se ele reclamar, receio que não poderei mantê-lo aqui.

- Eu entendi.

Nesse momento, Hiren entrou na sala, seguido pelo governante dos Três Mundos que se ajoelhou perante Kurama, fazendo uma saudação respeitosa.

- Kurama-Sama, é um prazer falar pessoalmente com o senhor. Agradeço muito por ter me recebido.

- Tokumo-Sama, o senhor é o atual soberano dos Três Mundos Unificados, não precisa se ajoelhar. Por favor, sente-se e fique a vontade. Hiren, pode preparar um lanche para o nosso visitante?

- Já dei a ordem, Kurama-Sama.

- Muito bem... o que o trouxe aqui, Tokumo-Sama?

- Bem, eu vim convidá-lo para ser meu acessor direto no governo. Garanto que o senhor exercerá o mais alto posto.

- Entendo... está ficando insustentável a pressão dos Restauradores e o senhor veio para fazer uma última tentativa de manter-se no poder.

- Como? Eu... eu...

- Me desculpe, mas nesses casos eu costumo chegar diretamente no assunto. O senhor arranjou uma saída política muito inteligente para o problema. Mas eu não posso aceitar.

- Por que não?

- Porque eu não quero voltar ao poder.

- Como não? A maioria da população quer a sua volta. Ainda mais agora que vivemos a primeira crise desde que o senhor saiu do poder.

- A minha missão como imperador acabou. Os problemas a serem resolvidos são bem diferentes dos daquela época. Não se preocupe, eu prefiro passar o resto dos meus dias nessa fazenda.

- Mas.. como eu vou resolver o descontentamento do povo? Como eu posso manter o meu poder?

- Eu não tenho as respostas para as suas perguntas, Tokumo-Sama. O senhor é quem deve saber se tem ou não poder para se impor. Eu particularmente acho que o senhor deve ouvir a voz do povo. Acho que o caminho certo passa por aí.

- O senhor tem toda razão, Kurama-Sama.

- Relaxe um pouco. Tome o lanche que Hiren acabou de servir e ponha sua cabeça em descanso. Eu não pretendo ser um obstáculo para o seu governo.

- Está certo.

******

- O senhor conduziu a questão muito bem, Kurama-Sama. Kanashiro deu a sua opinião.

- Com o discurso de Tokumo-Sama, dizendo que o senhor não está interessado em tomar o poder vai cair como uma bomba na cabeça dos Restauradores. - Hiren completou.

- Espero que a situação se estabilize. Eu não agüento mais essa insistência. Não quero ser o ídolo desse povo.

- Eu ainda acho que a situação dos Três Mundos melhoraria muito com o senhor no poder.

- Que nada. Isso é uma ilusão.

- Toda essa agitação deve ter cansado o senhor, Kurama-Sama. - Hiren interrompeu.

- É verdade. Acho que vou pra cama.

- Eu te levo.

- Boa noite, Kanashiro.

- Boa noite, Kurama-Sama.



Capítulo 11
Biografia da Amargura
Yu yu Hakusho
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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