Biografia da Amargura


Yoko Hiyama
 

Capítulo 3: Uma nova versão dos fatos
 

- Podemos continuar, Kurama-sama?

- Claro.

- Kurama-sama, tem certeza que não quer continuar a depor amanhã? Esse pesadelo que o senhor teve... não gosto de vê-lo tão agitado.

- Fique tranquilo, Hiren. Eu estou bem, posso continuar.

- O senhor pintou a Batalha do Apocalipse de uma forma que me chocou bastante, Kurama-sama.

- É... mas acredito que esse não foi o pior período da minha vida.

- Bom, o que aconteceu depois daquela bomba explodir?

- Eu e Hiei procuramos por sobreviventes durante vários dias. Desnecessário dizer que não encontramos nada. Todos mortos, tudo destruído. A rendição tinha sido assinada e em horas a nossa cidade, ou o que sobrou dela, foi invadida por milhares de youkais. Nós dois fomos presos.

- E Yomi?

- Logo depois da explosão, ele voltou para o Makai para que não desconfiassem dele.

- Por que ele se arriscou tanto para te salvar?

- Porque ele me amava imensamente. Aquela não foi a primeira vez que Yomi arriscou sua pele por mim. Na verdade, ele só não lutou do meu lado na guerra porque Manabu ameaçou o filho dele de morte.

- Taí outro fato desconhecido.

- Só eu e os mais próximos de Manabu souberam daquilo.

- Bom... mas o senhor disse que tinha sido preso. Como foi isso?

- Eu e Hiei estávamos escondidos, quando a cidade foi invadida novamente pelos soldados youkais.
 

*****
 

- Hiei... as ruas estão cheias de youkais.

- Não vai demorar para nos encontrarem. Estamos cercados, Kurama. Não temos como sair daqui.

- Já percebi isso, Hiei. Mas parece que eles não vão começar a vasculhar essa noite e sim ao amanhecer.

- Kurama... essa pode ser nossa última noite juntos...

- Eu sei...

- Estou preocupado.

- Bom, não adianta nos desesperarmos.

- Kurama, por favor saia dessa janela e venha aqui.

Kurama foi ao encontro de Hiei e o abraçou.

- Se essa é a nossa última noite, então eu quero te amar como nunca.

- Hiei, eu te amo...te amo loucamente.

- Eu quero um beijo, raposa. Esqueça o sofrimento... hoje eu quero você livre, puro. Quero sentir o seu corpo gostoso junto ao meu.

- Hiei, meu doce koibito...Venha, estou pronto.
 

*****
 

- Aquela noite foi especial. Eu me entreguei completamente. Eu dei amor e recebi amor que me preparou para o que viria no dia seguinte. Ai, me desculpe... eu divaguei nas minhas lembranças...

- Foi um relato bonito.

- Sabe de uma coisa? Você não pareceu muito sincero.

- Me perdoe, Kurama-sama. É que eu não estou acostumado com esse tipo de relacionamento.

- Relacionamento gays são tão normais hoje em dia, desde que foram permitidos por lei. Por sinal, essa foi uma das primeiras leis que Manabu instituiu depois da Grande Invasão. Pelo menos, ele fez alguma coisa que prestasse no seu governo maldito.

- Mesmo que sejam normais, eu fui criado por uma família bem conservadora.

- Entendo. Mas o senhor vai ter que se acostumar. Minha preferência sexual sempre foi essa. E não tenho vergonha nenhuma disso.

- Não me entenda mal, Kurama-sama. Eu...

- Não precisa me explicar nada. Eu já sei...

- Kurama-sama... - Hiren tentou começar.

- Não precisa me repreender, Hiren. Não falei isso para brigar com o rapaz. Vamos continuar...

- Está certo.

- Eu e Hiei fomos presos na manhã seguinte. Eu estava morrendo de medo de nunca mais ver Hiei.

- Para onde o senhor foi levado?

- Ao contrário do que eu pensava, eu não fui levado para uma cadeia e sim para o castelo de Manabu, no Makai.

- O quê?

- Exatamente.

- E o que ele queria?
 

*****
 

- O que você quer de mim?

- Quero ver se você mudou de idéia quanto a me aceitar como marido. Afinal, tanta coisa já aconteceu com você. Talvez você já tenha desistido de resistir ao meu poder ao lado daquele insignificante koorime.

- Eu já lhe falei daquela vez e vou lhe falar de novo. Hiei é o meu verdadeiro marido. Eu nunca vou me casar com você.

- Vejo que você ainda não aprendeu...

- O que você vai fazer comigo e com Hiei?

- Eu não vou fazer nada. Já disse que eu não vou te forçar a se unir a mim. Você será meu por sua própria vontade. Você está livre, pode ir.

- Você vai libertar um preso político? Por que?

Manabu acariciou o rosto de Kurama com delicadeza e respondeu:

- Porque eu te amo, Kurama. Quero ser seu companheiro e vou esperar todo o tempo que for necessário.

- E Hiei?

- Também será libertado. Vocês poderão desfrutar juntos do meu novo reino. Eu lhe disse que seria rei dos três mundos. Eu tenho tudo o que quero. E vou ter você também.

- Veremos, Manabu.

Kurama se retirou daquela sala e voltou para a cidade no Ningenkai, à procura de Hiei.
 

*****
 

- Eu passei horas procurando-o, gritando seu nome e nem acreditei quando ele surgiu na minha frente. Eu experimentei a felicidade quando me abracei a ele de forma possessiva. - Kurama sorriu com as próprias lembranças.

- E a partir daí, o que vocês fizeram?

- Eu e Hiei voltamos para o esconderijo onde estavam nossos parentes e amigos, em busca do que sobrou daquela invasão.

- E vocês os encontraram?

- Sim... Porém os soldados de Manabu já tinha passado por lá. Encontramos todos desesperados, com medo de que nós tivéssemos morrido e apavorados, pois o meu irmão Shuichi havia sido levado.

- Acredito que essa tenha sido a lei de escravização humana de Manabu.

- Sim. Todos os homens sobreviventes foram escravizados. As mulheres trabalhavam ou serviam de consolo para os demônios... Minha pobre mãe estava inconsolável. E tudo só piorou quando eu contei sobre a morte de Yusuke, Genkai e do meu padrasto que estavam na cidade no momento da explosão. Keiko teve um ataque histérico na hora... a ponto de termos que amarrá-la para que ela não fizesse nenhuma besteira. Minha mãe teve que tomar uma postura forte para ajudar a todos, mas ela também estava desolada... Acho que todos nós estávamos muito feridos por dentro... A essa altura, dos nossos amigos, só restaram Yukina, Keiko e minha mãe. Botan e Koenma haviam morrido na Guerra do Reikai, e os demais, morreram na Batalha do Apocalipse.

- E o que vocês fizeram depois daquilo?

- Decidimos nos refugiar no antigo templo da Genkai que ficava numa região afastada e protegida dos monstros. Levamos Keiko, Yukina e minha mãe para lá e tentamos nos recuperar por alguns dias... Até que a morte tornou a visitar nossa casa.

- O que aconteceu?

- Nós encontramos o corpo de Keiko boiando na água do rio. Ela não agüentara o sofrimento e acabou se matando. Pobre garota, a única esperança de felicidade dela estava em Yusuke e quando ele se foi... Já não existia razão para viver. Naquela época eu não entendi isso muito bem. Porém mais tarde a vida me fez compreender o que é perder todos que amamos aos poucos.

- Kurama-sama... eu lhe peço que faça uma pausa. Não quero vê-lo esgotado. - Hiren interrompeu o diálogo.

- Você tem razão. Acho melhor pararmos. Eu estava mesmo querendo tomar um banho bem relaxante.

- Vamos então, Kurama-sama.

- Meu rapaz, amanhã continuaremos. Tente descansar um pouco. Você não está com uma cara muito boa...

- Hã? Sim.. eu vou tentar.
 

*****

Mas Hitsuke não conseguiu dormir naquela noite, e passou-a escrevendo suas anotações. Aquela era uma versão completamente nova da vida de Kurama e logo ele, que sempre pensara entender tudo sobre Kurama-sama, de trás para frente, agora tinha a cabeça cheia de perguntas.

E o que mais incomodava era o tom de voz tranqüilo e até frio com que Kurama contava as tragédias de sua vida.

Desde que chegara àquela casa não conseguia associar aquele velhinho tão calmo e até simpático com a figura do Grande Imperador dos Três Mundos, que governou por trinta anos com mão de ferro. Aquele ser que era quase uma divindade, uma lenda lá fora e vivia completamente alheio a tudo aquilo.

- Amanhã mesmo, faço uma pergunta a ele sobre isso. - Hitsuke prometeu a si mesmo. - Não saio dessa casa intrigado com coisa nenhuma.


Capítulo 4
Biografia da Amargura
 

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