Hakura Kusanagi
Capítulo 2
"E então, Yusuke? Você o encontrou?"
"Não, nada, Keyko... Há mais de três meses que estamos procurando por Kurama, e nada...NADA! Isto já está nos deixando loucos!"
"K’SO!! Onde você se enfiou, Raposa Estúpida? Por que não dá notícias?! Por que????"
"Calma, Hiei! Acalme-se!! Pare de destruir toda a casa de Shiori!"
Todos estavam reunidos na casa da mãe de Kurama; tentavam fazer com que a família dele se mantivesse calma, mas com tanta preocupação vinda deles mesmos, isso era quase impossível.
Yusuke, Hiei e Kuwabara procuravam por Kurama por todos estes meses no Ningenkai e no Makai: cada parte de cada um destes mundos fora esquadrinhada, à procura de Kurama, desde que o Youko fora lutar nas trevas... e não voltara. E nada. Absolutamente nada. Era como se o Youko tivesse simplesmente desaparecido dos três mundos.
Hiei era o que estava mais desesperado, nesta altura do campeonato: ele só perdia para Shiori, que fora obrigada a tomar remédios para se acalmar durante todo aquele período de buscas. Naquele momento, tanto Keyko quanto Shizuru estavam ali, ao lado deles, no que lhes parecia uma eterna preocupação com a vida de Shuuichi.
O Demônio de Fogo conseguira esconder de todos o que sentia desde o desaparecimento de Kurama, mas, ao que parecia, seus nervos, sempre com o controle de aço, já não agüentavam mais, e Hiei não se continha de raiva e desespero; reagia querendo quebrar tudo o que via pela frente, chutando e quebrando cada móvel da casa, e gritando como um louco. Para piorar, Yusuke sabia que ele já estava impaciente com a demora de Kuwabara, que fora dar outra procurada pelo Makai e ainda não voltara - seu medo era que o Koorime quisesse fazer o que estava fazendo com os móveis, no amigo, quando este chegasse.
Uma repentina explosão de Hiei confirmou suas suspeitas:
"BAKA!! Aquele Imbecil está demorando muito!! E porque aquele idiota do Kurama tinha que ter ido de novo para aquele Inferno?? Porra, eu avisei para ele não ir, para ele não aceitar aquele maldito desafio... E agora a sua teimosia deu nisto: desapareceu!!"
"Se acalme, Hiei!! Sente-se, e espere um pouco mais!"
"EU NÃO QUERO me sentar, Yusuke!"
"Vai se sentar, SIM!!, antes que EU te dê o MESMO REMÉDIO QUE DEMOS PARA A MÃE DO KURAMA!! Agora SENTE e espere mais um pouco!" - Yusuke finalmente perdera a paciência com o Youkai.
Finalmente Hiei se sentou no sofá da sala, prostrando o corpo exausto nele: cruzando os braços, jogou os pés para cima da mesinha e largou a cabeça para trás, fechando os olhos cor de rubi para evitar que mais alguma outra indicação de seu verdadeiro estado de espírito fosse presenciada por aqueles ningens estúpidos.
Yusuke e Keyko se despreocuparam um pouco com o pequeno Youkai, mas por pouco tempo:
De repente alguém irrompeu pela porta da casa, e atravessou a sala, aos gritos. Era um rapaz alto, forte, de clara e cabelos alaranjados; suas botas faziam um som assustador no chão de madeira da sala. Vinha trazendo, em uma das mãos, um tipo de correspondência de cor azul.
"Urameshiiiiiiiiiii!!!!!"
"Kuwabara?!"
"Urameshi! Urameshi!!"
Kuwabara gritava balançando o tal papel na mão.
Hiei levantou-se como um raio, ao vê-lo entrar pela casa adentro: seus instintos gritavam, dizendo-lhe que todo aquele escândalo só podia ser por terem conseguido, afinal, alguma notícia a respeito do paradeiro de Kurama. Levou, porém, um choque, ao ouvi-lo gritar, enquanto gesticulava um papel de um lado para outro:
"Kurama... É do Kurama!!"
"Oh, Meu Deus!" - assustou-se Keyko.
"Do que você está falando, Kuwabara? Que papel é esse?" - Yusuke perguntou.
"Não percebeu que nós não estamos entendendo nada, seu Imbecil?"
"É de Kurama... O Convite!!" - Kuwabara falou, lutando contra a falta de ar provocada pela corrida.
"CONVITE? Que convite?!?"
"Este nas minhas mãos!" - Kuwabara sacudiu novamente o papel em suas mãos, e começou as explicações, esbaforido: - "Bom, eu estava no Makai, procurando notícias sobre o Minamino, e... bem, de repente, me apareceu um Youkai bem estranho na minha frente, dizendo que tinha este troço para me entregar: ele me disse que era de quem eu procurava... e avisou que o tal ‘Mestre’ contava com a nossa presença, na tal festa... A presença de TODOS nós!"
"Não estou entendo nada! Que ‘Mestre’?? Que festa é essa?"
"Explique-se logo, Imbecil!" - Ameaçou Hiei.
"Eu... Eu... desculpem, mas é que... eu também não entendi muito, mas quando abri o convite, eu li isto: e me assustei a tal ponto, que vim correndo para cá!"
"Mas... o que diabos está escrito aí?" - gritou Hiei, com o coração parecendo parar no peito.
"Vejam vocês mesmos!"
Kuwabara entregou-lhes a carta. Ela dizia o seguinte:
"Convidamos vocês: Urameshi Yusuke, Kazuma Kuwabara e Hino Hiei, detetives do Mundo Espiritual, para a Festa em Comemoração à União de Kurama Youko e Kairui Nazago, a ser realizada em seu Castelo...
Contamos com sua presença.
Ass.:Kurama Youko
&
Kairui
Nazago."
"O QUÊ?? UNIÃO?!?! Mas... QUE MERDA É ESSA?"
A voz de Hiei tremia, de fúria, enquanto suas mãos seguravam o papel com tanta força, que quase rasgavam o convite: ele não entendia... e NÃO ACREDITAVA naquele convite de forma alguma!! Como Kurama -seu Kurama - podia sumir durante três meses inteiros quase enlouquecendo-o de preocupação, e depois simplesmente aparecer com um Youkai qualquer, e convidando a TODOS para a festa de união deles? COMO? Foi quando uma voz sussurrou em sua mente:"E ele, Hiei?" Kurama o esquecera? Se cansara dele? Aquilo era mentira... uma armadilha, qualquer coisa: menos verdade... Não podia ser: NÃO PODIA!!
Hiei não era o único a não entender: todos ali estavam estupefatos com tal fato:
"Eu também não entendi: por isto vim logo para cá! O pior de tudo é que esse convite é para daqui a dois dias!! Como é que vamos fazer?" - perguntou Kuwabara, à Urameshi.
"Eu...não faço a menor idéia, Kuwabara." - respondeu Yusuke, ainda atônito com a ‘bomba’ que se abatera sobre eles. Sua mente girava, sem parar, com uma única pergunta: "E Hiei? O que acontecerá com Hiei?" Yusuke não queria admitir, mas EXISTIA a possibilidade de Kurama... "Não! Kurama ama Hiei... Ele jamais faria uma coisa dessas com o baixinho: nunca!"
Seus pensamentos tomavam essa direção caótica, enquanto acompanhava, com o canto dos olhos, o Koorime: mergulhado no que deveria estar lhe parecendo um pesadelo, o Youkai era a própria imagem da solidão e do desespero... Yusuke não era burro, e, como amigo daqueles dois, sabia muito bem que um dos maiores impecilhos para que eles ficassem juntos fora o medo que Hiei tinha de vir a se apaixonar por Kurama... apenas para ser abandonado depois. Agora, o Youkai devia estar enfrentando o seu maior medo transformado em realidade: como ele reagiria?
"EU sei COMO: nós vamos lá... e ficaremos sabendo o que Diabos realmente está acontecendo. Preciso descobrir quem é este tal de Nazago!"
"Concordo com você, Hiei: e vamos preparados para qualquer coisa!"- disse Yusuke.
"É!!! E se esse tal de Nazago estiver mantendo Kurama como prisioneiro, ele vai ver o que faremos com ele, vai ver!!" - entusiasmou-se Kuwabara.
"Nós vamos também?" - perguntou Keyko, querendo saber.
"Não. vocês não vão: as coisas podem piorar, pois não sabemos o que está acontecendo, de verdade." - Yusuke continuou: - "Vocês duas ficam e cuidam da mãe de Kurama: ela vai precisar de ajuda para entender toda essa situação, até nós voltarmos do Makai."
"Acho que você tem razão, Yusuke: Keyko e eu ficaremos por aqui, cuidando de Shiori-San e do irmão do Shuuichi, enquanto esperamos por notícias." - Shizuka ponderou.
"OK." - disse
Yusuke.
***
O dia da noite da festa chegou.
Fim de tarde...
Yusuke, Hiei e Kuwabara provavelmente já estariam no Castelo de Nazago, quando Kurama se desse conta do que estava ocorrendo.
Ele passara os últimos três meses no mesmo ritmo de antes, sendo domesticado por seu Senhor: era o escravo doméstico e sexual de preferido de Nazago.
O Youko não tivera descanso naqueles meses: fora usado de todas as formas macabras para satisfazer os desejos sexuais de todos os amigos do Kairui, principalmente os do próprio Nazago. Era um pesadelo em vida: trabalho servil durante o dia, e açoites e estupros constantes durante a noite... passando assim dias, semanas e meses, sem direito de ter descanso para dormir... ou até mesmo, comer.
Era uma rotina horrível de sadismo completo: a Raposa nem ligava mais para os atos feitos nele; não gritava ou gemia em recusa: ele aceitava qualquer coisa que o Kairui mandasse. Kurama começava a ficar completamente sem pensamentos ou ações próprias: ele estava ficando "educado".
Agora os dois Guardas da Raposa estavam indo buscá-lo em sua cela, um buraco do qual onde nunca saía, a não ser para seus "serviços". Aquela escuridão fazia parte de sua vida; não saía daquela parte do Castelo onde ficava preso para nada: ele não conhecia a beleza dos imensos jardins que circundavam o Castelo; não conversava com ninguém, além de seu Mestre e seus Guardas... Não tinha mais a voz rouca e bonita de antes, muito menos o tom firme e agressivo de quando chegara naquele inferno; seus olhos já não tinham mais o brilho bonito das esmeraldas - seu tom de verde se tornara apagado, sem vida, e repletos de olheiras; a cabeça ficava sempre abaixada, sua postura, agora, era completamente submissa.
O humano estava lá, deitado sobre sua cama, tentando manter seu corpo descansando por alguns minutos... e quem sabe até dormir, coisa que tão raramente lhe era permitido fazer - a não ser nas vezes em que Nazago percebia que a insanidade havia passado dos limites... e o deixava dormir, enquanto usava seu You-Ki demoníaco para restaurar o corpo e a vida de seu escravo preferido.
Seus guardas chegaram, e foram entrando, sem cerimônias. Suas novas roupas agora eram rasgos de pano sujo, como tudo naquele lugar. Seu corpo encolhido entre os braços, era sempre uma bela visão para Naiuki e Aiko: os guardas desarmavam ao ver o quão belo... e selvagem se tornara aquele ningen: seus cabelos já estavam bem compridos, mas sem corte, e eram sujos como cada pedacinho de sua pele; afinal, os banhos dados pelos Youkais geralmente eram apenas para fazê-lo sofrer ainda mais com as dores causadas pelos cortes e cicatrizes abertos, do que para deixá-lo limpo.
Gritaram, então, para Kurama:
"Ei, maldito: acorde, vamos!"
"Levante-se, escravo: nosso Amo quer vê-lo...Ande logo!"
"Sim, meus senhores, eu... já estou indo."
Kurama sussurrou, levantando-se da cama. Ele andou com passos lentos e de cabeça baixa, sem encará-los, até se aproximar de ambos, e esticou os braços para que Naiuki prendesse as correntes nas algemas, enquanto Aiko jogava seus cabelos para trás para prender uma maior na coleira do pescoço. Isto feito, ambos começaram a puxá-lo da cela.
"Bom garoto..." - reconheceu Naiuki. - "Venha, vamos!"
Para sua surpresa, Naiuki e Aiko mudaram o rumo, e terminaram por levá-lo até uma ala diferente do Castelo, uma das principais, parando em frente de um quarto diferente, estranho, no qual ele, Kurama, nunca tinha vindo antes: o quarto era muito bonito, espaçoso, agradável e iluminado... uma visão do paraíso para quem vivia há meses trancado em uma cela suja, escura e fria; a cama era o que chamava mais a atenção nele, pois era bem grande, de forma arredondada, com formação de flores em sua guarda, enormes lençóis de seda caindo até o chão; à sua volta tinha uma cabeceira de madeira, com alguns objetos e enfeites, além de um armário enorme no lado direito do quarto, onde, Kurama, admirado, via duas servas guardando roupas. O quarto também tinha cortinas, longas e claras - cores tão diferentes das escuras que dominavam o restante do Castelo - cobrindo janelas, onde, das quais, se podiam ver as gigantescas árvores e flores dos jardins, serpenteando o local. Elas se enroscavam muro acima, até as bordas da grade da varanda:
Rosas.
Rosas vermelhas.
Centenas delas.
Lindas e maravilhosas rosas vermelhas, exalando seu delicioso perfume por todo o quarto.
Os olhos verdes de Kurama se arregalaram de repente, faiscando, como se adquirissem vida novamente.
Um pequeno sorriso saiu de seus lábios: um tão leve e solto, como a brisa que de repente invadiu o local, iluminado pelos últimos raios do pôr-do-sol, espalhando dezenas de pétalas que se espalharam por todo o quarto, algumas voando até os longos cabelos do Kitsune, fazendo sentir-se como que voltando a um passado... não tão distante assim, porém, do qual havia desistido, para salvar a vida dos que amava.
Kurama estava feliz como há muito não se sentia: há três meses que ele não via rosas, sentia seu cheiro, nem sua delicadeza; e ver aquilo era uma benção dos Deuses para ele, trazendo agora, lágrimas de pura saudade aos belos olhos verdes.
Os dois Guardas, indiferentes, voltaram sua atenção então para as servas, às quais trocaram palavras:
"Aqui está ele,..."- Indicou Naiuki, com um gesto de cabeça, Kurama, que estava ainda parado no meio do enorme aposento: -"... como o Amo nos ordenou. Serão vocês as encarregadas do serviço?"
"Sim, Senhor, seremos nós. Nosso Amo nos mandou aqui para cuidarmos de seu escravo, e prepará-lo para a Cerimônia." - Respondeu, em voz baixa e servil, uma das Youkais.
"Eu não sei porque tanta insistência com este animal."- Aiko despejou seu veneno: -"Ele não merece nada disto."
"Não." - respondeu a mesma moça, prudente. Pelo que sua experiência como escrava de Nazago lhe dizia, podia sentir que a vida daquele ningen estaria correndo sérios riscos, caso continuasse na "Guarda" daqueles Youkais por mais tempo. Mas terminou, servil: - "Mas é isto que nosso Amo deseja, então, é nossa obrigação fazermos tudo como ele assim o quiser."
"Certo. Então vamos." - disse Naiuki, se aproximando do escravo.
Os dois trataram então de retirarem as correntes rapidamente, e entregaram Kurama à serviçais, dizendo:
"Fique bem comportado, Raposa Maldita: daqui a pouco, nosso Amo Nazago em pessoa virá buscá-lo. Não tente nada, senão..."
"Mas... meus Senhores... o que vão fazer comigo?" - Kurama arregalou os olhos, assustado, ao ouvir que Nazago em pessoa logo estaria ali.
Seu medo era tanto, que uma das Youkais, com pena, tentou dizer-lhe:
"Não se preocupe, não sofrerá, nós..."
"Não lhe interessa! E FIQUE CALADO!!!"
"Sim, Senhores..."- Ele abaixou os olhos novamente, e seguiu, conforme uma das Youkais lhe indicava, na direção de uma porta do outro lado do quarto.
Chegando lá, viu tratar-se de um banheiro. Parado na porta, pasmo, Kurama reconheceu-o como sendo uma cópia do seu, em sua casa, no Mundo dos Homens.
As serviçais o conduziram, tranqüilas, a uma banheira cheia de água e sabão líquido, que exalava um delicioso perfume de rosas. Elas levaram suas mãos ao corpo do Kitsune, que com este simples gesto se assustou, movendo-se para mais próximo da parede.
As duas Youkais falaram com ele, de forma calma e suave:
"Não se preocupe, Shuuichi-San...Nós não vamos lhe machucar, não é, Sayara?"
"Sim, irmã. Sayka está falando a verdade, Shuiichi-Kun: nós queremos apenas cuidar de você."
Kurama as olhou, não acreditando muito bem no que elas falavam, mas os leves toques das duas em seu corpo, acariciando sua pele com ternura, fizeram-no perder o medo e esboçar as palavras.
"Porque estão me chamando por este nome? Não estou entendendo..."
"Nós ficamos sabendo de... certas coisas, pelos corredores... e uma delas foi o nome do novo escravo de nosso Amo." - parou, ao vê-lo abaixar o rosto bonito para o chão, com vergonha do que aquela palavra significava... e das coisas que tivera que fazer, por causa dela. Arrependida, Sayara apressou-se: - "Acredite, é sempre bom lembrar de seu nome verdadeiro... e das pessoas que nos são queridas."
"Por que? Elas... Elas... não podem..." - parou, ao sentir os olhos se encherem de lágrimas.
"É isto mesmo: mas um dia você vai entender... Agora, se preocupe apenas em nos deixar cuidar de você: precisamos deixá-lo bem bonito para a Cerimônia de hoje à noite."
Kurama criou coragem para perguntar:
"Que Cerimônia é esta?"
O ar desamparado nos olhos do jovem humano era o suficiente para convencê-las de que ele não sabia de nada... ainda. Sayara deu uma olhada rápida para sua irmã, e respondeu:
"Desculpe, mas nós não sabemos: sei apenas que é uma festa com todos os Youkais mais poderosos do Makai... e será hoje à noite. Todos os escravos estão trabalhando para isto; o Castelo está maravilhoso, você verá."
"Mas... deixe-nos prosseguir com você... Podemos?" - perguntou Sayka, meigamente.
"Hai...Sim, por favor."
O Youko soltou as mãos do corpo e deixou as serviçais tirarem o que restavam de suas novas roupas, deixando-o nu, às suas vistas. O corpo da Raposa estava magro, vítima do mais puro cansaço, e marcado de cicatrizes de chicotes e queimaduras... Ainda podia-se encontrar perfeitamente as últimas chagas dos açoites da noite anterior... as marcas roxas em cada local do peito, abdômen, coxas e pernas se ressaltavam em sua pele clara; as algemas de ferro sacudiam sobre seus punhos, deixando à mostra as profundas cicatrizes, causadas pelo aperto cruel do aço na carne macia; o rosto, delicado, marcado por olheiras fundas e marcas de tapas e murros; marcas longas, causadas por objetos pontudos... ou mais provavelmente, unhas, riscavam suas costas esguias de cima a baixo.
"Pelos Deuses! O que estão fazendo com ele?" - horrorizou-se Sayara. Se o que andara ouvindo pelos corredores fosse mesmo verdade... e que aquelas marcas de espancamento e torturas eram a prova mais fiel de que sim, eram tudo verdade... Era um milagre que ele ainda estivesse vivo, após todos aqueles meses!
Notou que ele se retraiu sensivelmente, ao ouvir um gemido de angústia de Sayka.
Rápida, decidiu-se a ajudá-lo.
As irmãs tocaram sua pele, conduzindo-o meigamente, como se fosse uma criança, para a banheira; as duas fizeram com que Kurama se deleita-se com a água morna em seu corpo ferido e machucado, jogando-a aos poucos em suas costas e ombros, fazendo-o suspirar profundamente. Ele parecia descansar, com aquelas suaves mãos em seus cabelos, lavando-os, assim como sentindo-as deslizarem por suas costas, em sutis espumas nas coxas e pernas...
"Feche os olhos e relaxe, Shuuichi-Kun..."
"Por favor, deixe-nos acariciar sua pele; ela está precisando de cuidados... Você deve estar muito cansado, então, deixe seu corpo aos nossos cuidados: faremos como nosso Amo mandou."
"Sim... estou... muito..." - Kurama sussurrou, antes de fechar os olhos e entregar seu corpo aos cuidados suaves de Sayara e Sayka, dormindo profundamente, enquanto elas deslizavam seus dedos por entre seus longos cabelos úmidos, repletos de espuma. Seu espírito agradeceu por aquele trato de mãos suaves acariciando-o de todas as formas.
Do mesmo modo em que se enroscavam em seus braços com movimentos tranqüilos, massageando-os por completo; erguendo um pouco suas costas, onde ambas tomaram todo o cuidado com as feridas ainda abertas. Elas esfregaram, então, delicadamente, a esponja por sua virilha e coxas, sempre atentas às infinitas manchas roxas e machucados que descobriam, principalmente naquela área tão vulnerável do corpo... e, justamente por isso, Sayara não conseguiu evitar que os olhos se enchessem de lágrimas silenciosas, ao ver ali, as marcas dos estupros a que o jovem ruivo havia sido submetido.
Quando finalmente elas terminaram com o banho, acordaram a Raposa com delicados gestos em sua face, percorrendo-a com os dedos.
"Acorde, Shuuichi-Chan... venha..."
"Sim, venha... Agora precisamos cuidar de suas roupas..."
Kurama abriu suavemente as pálpebras, e, ajudado por Sayara, levantou-se da banheira, sendo envolvido por Sayka num enorme roupão. Ele se aconchegou naquele tecido macio e deixou-se ser levado para o quarto, onde sentou-se na cadeira em frente a um espelho redondo. Kurama se olhou no espelho; sua visão foi deprimente: ele apalpou com os dedos aquelas profundas marcas de cansaço destacadas abaixo de seus olhos, a magreza em sua face era tão profunda, que poderia ver seus ossos ressaltando um pouco mais seus contornos; os lábios, rachados por falta de alimentação, e, principalmente, água; os longos cabelos ruivos, caindo pelos verdes olhos, apareciam muito mais, já que eles, antigamente tão brilhantes, estavam agora tão apagados, como se tivessem lutado por toda a vida... e perdido.
Seus dedos pararam em frente aos olhos, assustando as Youkais, quando ele se abaixou, escondendo o rosto nas mãos; suas lágrimas desceram sem controle, - amargas e sutis -, contornando sua face tão sofrida.
Até que, sem aviso, uma onda de fúria tomou conta de seu corpo, e, descontrolado, socou diversas vezes o móvel, gritando de ódio, em meio aos soluços e as lágrimas:
"Então... então foi nisso... que me tornei?? Nisso?? Num ser quebrado, vencido... HUMILHADO de todas as formas e meios?? MALDITO SEJA, Nazago!! MALDITO!!! Você NÃO VAI conseguir destruir minha vida, ouviu?? NUNCA! Não vou desistir tão fácil: não me deixarei ser DOMESTICADO por você, demônio...NÃO VOU!!"
"Calma, Shuuichi-Kun!! Calma!!! Não adianta ficar furioso neste lugar!! Nosso Amo Nazago-Sama nunca perdeu um escravo... e sempre educou os mais rebeldes...!"
"Isto mesmo Sayara... Você pode lutar, mas não dessa forma: mantenha sua mente aberta, e não se deixe abater pelas humilhações!!"- Depois, disse: -"Agora, controle-se, pois, se nosso Amo ouvir o que está dizendo, sofrerá bastante por nada... Deixe-nos continuar, por favor."
Kurama suspirou profundamente, pensando sobre o que elas haviam falado, analisando as idéias. Aquilo estava certo: pelo menos agora, ele percebera que ainda tinha um pouco de sua resistência psicológica dentro de si, e isto era bom, pois não seria tão fácil Nazago conseguir quebrar seu verdadeiro espírito.
Então, finalmente respondeu:
"Sim, vocês estão certas... Continuem com seu serviço; não quero que sofram por minha causa... E quero saber o que aquele Kairui quer comigo."
"Obrigada, Shuuichi-San!"
Elas prosseguiram, quando Kurama voltou à sua posição na cadeira, enxugando suas lágrimas. As irmãs caminharam suas mãos aos pentes e escovas e os utilizaram para cuidar dos longos fios ruivos do Youko, enroscaram-no para cima, fazendo um enorme rabo-de-cavalo, deixando os fios ruivos, agora lavados e brilhantes descendo descuidados por seus ombros e costas, contrastando vivamente com a túnica branca que uma delas acabara de por nele.
Depois alguns minutos, ele já estava arrumado, usando a túnica branca com coloração azul e detalhes dourados e gola aberta, permitindo que seu coleira humilhante aparecesse; descendo pelo ombro vinha um enorme pano preso por uma faixa de cor azul escura, contrastando maravilhosamente com o tom dos cabelos e da túnica que descia-lhe até os pés.
Ele se levantou enquanto as duas o observavam, apreciando sua beleza maravilhosa e pungente, que nunca deixara de existir, mesmo com toda a tortura que ele passara.
"Você é realmente lindo, Shuuichi-Kun!" - Sayara deixou escapar, encantada.
"Sim, você está..."
"Maravilhoso, escravo!"
Os três olharam para o dono da voz firme e profunda que soara de repente, no quarto enorme, assustando-os: Nazago, em pessoa, que viera buscar seu brinquedo predileto.
Ele estava vestido com uma bela túnica, seus longos cabelos azuis, caindo por seus ombros até o meio das costas. Ele encarou as serviçais e, com um gesto, indicou-lhes para sair do quarto, enquanto dizia:
"Vocês fizeram um bom serviço, escravas. Agora, saiam: eu não quero ninguém conversando com este escravo."
"Sim, Senhor Nazago."
"Com licença, Nazago-Sama."
As duas se retiraram, deixando, somente os dois sozinhos.
Nazago se aproximou do escravo humano, tocando-o por todo o rosto, levantando-o até encará-lo. Kurama reagiu com um ar de desgosto, facilmente percebido pelo Kairui, que arqueou uma sobrancelha.
"Então elas trouxeram um pouco de sua consciência de volta?" - perguntou, cínico. - "Não importa: este resto vai desaparecer hoje. Saiba que estou organizando uma Cerimônia no Castelo... e adivinhe quem são meus convidados especiais?"
"Convidados especiais?" - repetiu Kurama, inocente.
"Sim. Meus ilustres convidados: Kazuma Kuwabara, Urameshi Yusuke... e Hino Hiei."
Aquele nome ecoou em seus ouvidos... e explodiu como uma bomba na sua cabeça: seus olhos se iluminaram com um brilho espetacular com o simples nome, aquelas simples sílabas pronunciadas uma a uma de cada vez:
"Hiei... Hiei!!"
Ele parecia duvidar do que aquele Kairui acabara de dizer: "seu amante viria até ali aquela noite? Agora??" Seu coração disparou, parecendo explodir de felicidade: "Hiei estaria ali! Hiei viria para..."
Mas uma ponta de tristeza se alojou em seu coração, ao pensar na visão que Hiei teria, ao deparar com ele ali, daquele jeito...
... E seu coração quase parou, ao pensar no por que de seus amigos terem sido convidados para virem até ali: por Inari, o que aquele demônio estaria tramando?
"Hiei? Aqui?" - sua voz vacilou; o medo do que estava por descobrir apertando seu coração: -"Por quê, Nazago?"
"Se interessou, não?" - deu um risinho de superioridade: - "Você verá, escravo."
"Mas... você não pode fazer isso, maldito!! Trazê-los aqui... por quê? Para quê? Hiei... eles..." - a voz da Raposa tremia, agora, e sua mente girava, em pânico: -"... eles vão me ver assim... há três meses que eu não os vejo! ... olhe como eu estou, esta coleira no meu pescoço..." - a enormidade do que Nazago estava para fazer com ele estava começando a tomar forma na mente de Kurama: - "Como irei explicar minha situação??! Como vou fazê-los entender??"
Kurama teve sua resposta num único gesto: um aperto forte no seu pescoço, quase fazendo-o perder todo o ar. O Kairui levou suas mãos a seu pescoço com tal violência, que o ergueu a centímetros do chão. Nazago levou os dedos de uma das mãos ao rosto do Youko, acariciando-o cinicamente, enquanto ele se agoniava em desespero, lutando para respirar.
"Idiota!! Não volte a usar este tom de voz comigo outra vez: você é apenas um inútil escravo que está sob minhas ordens, nada mais!!" - Aqui, aproximou o rosto do de Kurama, indiferente à agonia do ruivo: - "Ouça bem: sua vida não vale nada para mim; eu só o mantenho vivo por um único motivo: gosto de foder você, Youko; seu corpo me dá prazeres inimagináveis, e eu amo fazer sexo com um ser insaciável que suporte todo o meu sadismo. Mas o seu querido Koorime me deu ódio eterno!! Tenho o mesmo por você, escravo: posso lhe matar a qualquer hora; mas não o farei: quero ver a dor estampada nos seus olhos, quando ele o vir daqui a pouco; quero ver a desistência de uma luta eterna, quero ver essa sua arrogância se esvair, seu espírito se quebrar, até se tornar meu escravo Youko sexual preferido - uma Raposinha domesticada, lambendo minhas mãos e beijando meus pés! Escute bem, seu imbecil, seu pequeno Koorime, aquela criança perdida terá seu fim, se continuar a agir desta forma!! O que me diz, vai aceitar?? A coleira é problema seu, se vire!! "
Ele soltou a força do pescoço, libertando Kurama. A Raposa respirava ofegante, lutando para trazer o ar que lhe fugira dos pulmões; ele se agarrou aos braços do Kairui, encarando-o e devolveu a resposta, mesmo que lançada fracamente no ar:
"Eu... sim, aceito, Senhor... Não faça nada com eles, por favor, eu... faço o que quiser, meu Senhor... eu... lhe imploro..." - lágrimas de vergonha lhe desceram pelo rosto abaixado.
"Ah, agora sim: fez o que era certo! Hum... Olhe só como está lindo este meu servo!! Devo admitir que aquele ignorante escolheu um ótimo amante: que corpo esplêndido!! ...e, quando bem cuidado, fica um ser maravilhosamente bonito!" - Kurama fechou os olhos, ao sentir Nazago enterrar o rosto na curva de seu pescoço, inalando o perfume de rosas de seus cabelos. - "Cabelos macios e cheirosos... sem falar nesse perfume saboroso e excitante que vem de sua pele!" - O Kairui levou sua língua até o pescoço de Shuuichi e começou a lambê-lo devagarinho, de cima a baixo; depois foi ao seu rosto, lambendo sua face; traçando, com a língua, o contorno de sua boca, loucamente, deixando Kurama estático, sem reação, até ele retirá-la, dando, então, uma mordiscada em seu lóbulo esquerdo, antes de sussurrar-lhe, ao ouvido:-" Huum... gosto delicioso... como sempre, minha Raposa é maravilhosa! Me diga: vai ser bonzinho agora, não vai mais fazer este deslize?"
"Não, Senhor, nada... de erros, Mestre Nazago-Sama."
"Isto é ótimo! Agora repita: ‘ Não farei nada de errado esta noite; serei seu servo obediente e farei tudo o que quiser, meu Amo’. Fale."
Kurama repetiu, abaixando a cabeça e levando suas mãos até o pescoço, fechando a gola da túnica para esconder sua coleira:
"Eu... não farei nada de errado esta noite. Serei seu servo obediente, e farei tudo o que ordenar, meu Amo."
Em seguida, ouviu a voz do Youkai:
"É assim
que eu gosto. Venha..."- disse ele: - "...seus amigos acabaram de chegar."
***
"Veja só isto, Kuwabara: nunca vi tantos demônios reunidos num só lugar... Cruzes!! Por que será tudo isso, hein?"
"Concordo, Urameshi: isso aqui mais parece uma festa de gala! Estes Youkais são cada um mais diferente do que o outro, não? Vão ser feios assim, só no Inferno!"
"Hn. Olha só quem fala."
"Hã?? O quê? O quê você disse, Hiei?"
"Hn! Você ouviu. Queria o quê, Idiota? Aqui é o Inferno!! Esta Cerimônia reuniu todos os Youkais mais poderosos desta parte do Makai... E nem todos são tão feios quanto esta sua cara amassada!"
Aqui, Yusuke segurou providencialmente Kuwabara de voar em cima de Hiei, enquanto este, numa demonstração rara de sentimentos, explodia :
"K’SO! Meu problema não é esse bando de Youkais Imbecis andando de um lado para o outro: meu problema é Kurama!! Onde está ele? Eu quero vê-lo: não vim aqui para olhar a cara de vocês e deste bando de demônios! MERDA!!"
"Calma, Hiei: espere!!!! Escute: nós já fomos apresentados, agora é só esperar e ver o que vai acontecer neste raio de Cerimônia, sacou?"
Era verdade.
Eles finalmente estavam na festa.
Fora uma angústia para todos até o dia, enfim, chegar: Hiei estava que destruiria qualquer coisa que viesse à sua frente, de tanto ódio. Na realidade, ele estava se sentindo quase enlouquecer: passara os últimos três meses vasculhando o Makai de um canto à outro como um desesperado; passara noites e noites em claro, pensando somente em como e onde poderia estar sua Raposa - viva... ou morta?? Ele queria de qualquer jeito Kurama de volta, sentia desesperadamente sua falta; sem ele, Hiei não conseguia mais viver em paz; sem ele, sentia-se como uma nau sem rumo, não tinha motivações para continuar vivendo; sem seu amor, era uma casca vazia... seu amante era mais importante do que qualquer coisa em sua vida. E quem lhe fizesse algum mal, se arrependeria horrivelmente de ter nascido.
Assim, depois de tanto tempo de buscas e agonia, estava prestes a encontrá-lo, a saber o que Diabos realmente acontecera, o porquê ele não voltara... e quem era Nazago. Seus nervos estavam tensos como fios de aço. Por dentro, sentia um bolo horrível no estômago... e, no fundo de seu coração, tentava esconder a sensação horrível de perda que se instalara nele... e que parecia querer engoli-lo. Seus olhos vermelhos esquadrinhavam tudo e todos à sua volta, enquanto seu jagan tentava novamente achar, sentir, o Ki de sua Raposa.
Nada.
Inútil.
Ou Kurama não estava ali - o que os levava à hipótese de que tudo não passasse de uma armadilha; ou, se estava, tinha aprendido a camuflar o próprio You-Ki muito bem.
"MALDIÇÃO!"
Agora os três estavam juntos, esperando Kurama chegar. O salão de festa era realmente grandioso, como tudo naquele Castelo: as luminárias de cristal brilhavam como a noite lá fora. Aquelas cortinas de seda que voavam junto com a brisa noturna, era tão esplendorosas quanto toda a decoração espalhada por cada canto salão. Em meio à toda aquela ostentação de riqueza, Hiei só conseguia pensar em quantas dezenas de infelizes escravos haviam sido forçados a dar o sangue para que aquele lugar ficasse como estava. Sim, por que era como as coisas funcionavam, no Makai: o dono do Castelo - fosse o tal Nazago ou não - deveria ter, no mínimo, uma centena. Ao pensar nisso, o Koorime deu um risinho de escárnio: ele odiava mercadores de escravos, ou senhores...não odiava?
O vai-e-vem dos convidados foi finalmente interrompido, de repente, por uma entrada aguardada por todos naquele local: no centro do salão, apareceram dois Youkais.
Um alto e extremamente forte, imponente, de olhos cinza assassinos - sim, aquele brilho no olhar era facilmente reconhecível por outro assassino ali presente: Hiei. - e outro mais baixo, de postura submissa, longos cabelos ruivos... e olhos verdes sem expressão.
Kurama!
E em sua forma Ningen!!
O choque paralisou Hiei.
A maioria do público os recebeu com aplausos de felicidade, por ver o imponente Youkai de cabelos azuis entrar definitivamente no salão.
Kurama Youko e Kairui Nazago - era como os demônios ali presentes os chamavam.
Nazago cumprimentou alguns lordes e conhecidos rapidamente, e logo se dirigiu aos três convidados que estavam ao fundo, perto de uma das janelas do salão. Sim, reconhecia-os a todos: Kuwabara, Yusuke, o filho meio humano, meio demônio de Raizen... e Hiei. Este, em especial, não precisava de apresentações: estava gravado a ferro e a fogo em sua mente. Aproximou-se, saboreando o fato que os três o olhavam, meio que ainda chocados com a sua chegada e a de Kurama.
Sorriu.
Apresentou-se, então:
"Prazer... Que bom contar com a presença de todos vocês! Devem ser... Yusuke, Kuwabara... e Hiei, não? Meu nome é Kairui Nazago, um grande amigo de Kurama; é excelente conhecê-los." - Nazago estirou a mão para cada um deles, testando-os. O humano e o filho de Raizen ainda aceitaram o cumprimento, mas o maldito Demônio de Fogo não: apenas ficara lá parado, olhando-o, como que querendo descobrir o que lhe passava pela mente... não com os olhos vermelhos da cor do sangue, mas sim com o Jagan.
Idiota.
Nunca conseguiria nada com o Jagan ali. Ele, Nazago, tratara de cuidar disso pessoalmente.
Foi quando ele deu um passo para o lado, deixando Kurama aparecer.
Imediatamente, a atenção dos três se voltou para o jovem humano, maravilhosamente vestido:
"Cara, eu não acredito: é você mesmo, Kurama?" - perguntou, pasmo, Yusuke.
"Sim, sou eu, Yusuke..." - respondeu Kurama, a voz rouca forçando-se a parecer alegre, enquanto o coração ameaçava explodir, por vê-los ali, tão próximos de si. Sabendo-se vigiado, com os lábios trêmulos, deu um sorriso: - " Ou será que tem outra Raposa por aqui?"
"Acho melhor deixá-los à sós: vão precisar conversar muito... Mas não demore, Raposa: eu preciso de você ao meu lado. Está certo?"
"Sim, Senhor: só preciso resolver este problema."
O Youkai era seguido pelos olhos mortais de Hiei, do qual se despediu de forma rancorosa, como se o conhecesse de há longo tempo, já:
"Adeus, Hiei. É uma pena não poder falar mais com você: temos muitos assuntos pendentes... mas haverá outras chances, não é mesmo?"
"Hn. Isto mesmo, Kairui. Quem sabe outra hora?"
Finalmente o Youkai afastou-se.
O reencontro entre os quatro foi tumultuado, seguido de fortes abraços de saudade, e perguntas ansiosas:
"Kurama, por que sumiu? Estávamos todos preocupados!! Três meses sem notícia, sem nem uma mensagem, NADA!" - explodiu Yusuke.
"Poxa, Kurama... Pelo menos poderia ter dado um sinal de vida: pensávamos que estava morto!" - Kuwabara reclamou.
"Raposa Estúpida!!! Poderia ter me avisado que tinha sobrevivido àquela luta: Eu merecia essa consideração, não acha, Kurama?"
A repreensão carregada de mágoa de Hiei caiu como uma bomba no meio dos três.
Hiei encarou Kurama com um ar fatal vindo de seus olhos vermelhos, que queimavam, de fúria... mas que ao mesmo tempo, não conseguiam esconder o alívio por ver seu amor vivo.
"Gomen nasai, amigos, eu..." - Aqui começava a tortura da noite: mentir para os amigos... e Hiei. -"...eu precisei me esconder durante esse tempo todo, por que, quando terminei de lutar, estava muito fraco e ferido... e Nazago então me socorreu. Desde então, eu devo minha vida a ele, e tenho ficado aqui, cuidando de seus exércitos enquanto me recupero." - Kurama tomou fôlego, enquanto rezava para que acreditassem no que ele dizia. Inari!! Até parecia que ele abandonaria os amigos, a família, Hiei... sem notícias, só por estar machucado, ou algo assim!! Mas fora o melhor que pudera pensar, enquanto era levado para o salão. Agora vinha a pior parte; colocou um dos seus melhores sorrisos no rosto e disse: -"Nazago-Sama é um Youkai muito bom, excelente, e ótimo governante desse pedaço do Makai, e..."
"Não confio nele, Youko: ele não presta." - Foi interrompido bruscamente por Hiei.
"Por quê, Hiei?" - perguntou Kuwabara.
"Eu já o conheci antes; e não pode ter mudado tanto assim. Não ele."
"Lamento, mas tenho que dizer não concordo com você, Hiei: o Senhor Nazago é muito bom com todos aqui; principalmente comigo."
"Senhor? E desde quando você trata outro Youkai dessa maneira? E não acredito nisso. Olhe só você, Raposa: seu rosto só demonstra cansaço; está tão abatido e magro... Aposto como foi ele!"
"Nisto eu tenho que acreditar: você está realmente fraco; não tem se alimentado direito, ou dormido, é isto? Cara, nem sequer conseguimos sentir seu Ki!! O que está acontecendo aqui, Kurama?" - perguntou na lata, Yusuke.
Kurama segurou nas mãos de Hiei e o encarou nos olhos da forma mais carinhosa tentando passar e firmeza e convicção no seu tom de voz:
"Hiei, Yusuke, não falem assim: eu só estou desta forma por que não tenho tido muito tempo para descansar; minha recuperação está sendo lenta, e tenho muito serviço, mas não se preocupem: estou ótimo!"
"Se está assim tão bem, volte para casa conosco agora: seus pais estão quase loucos, preocupados com você!" - Hiei ordenou, transtornado, agarrando-o pelos braços, como se tentando trazê-lo para a realidade: -"Sua mãe está sendo medicada, por causa de seu desaparecimento!"
Kurama sentiu o coração doer, ao imaginar o sofrimento de sua mãe. Mas ele não podia voltar atrás... Não podia!!
Ele voltou com a fala mais séria para todos, já largando das mãos de Hiei, que se assustou um pouco com o gesto, e o olhou, chocado.
"Olhem, amigos, eu... Sinto muito pelo o que vou dizer, mas... eu não vou mais voltar para o Ningenkai. Ficarei aqui no Makai, resolvendo meus assuntos com Nazago, e morando aqui no Castelo."
A reação dos três foi paralizadora, seus olhos quase saltaram das órbitas, tal o choque levado com a declaração de Kurama: nenhum deles sabia o que dizer, o que perguntar, qualquer coisa. A única coisa em que pensavam era no por quê de Kurama haver decidido ficar no Makai - justo ele, que nunca pensara em voltar para sua Terra Natal, e muito menos, abandonar os amigos e a família.
Por que ele faria isto?
"Não estou entendendo... Ou melhor: acho que nenhum de nós aqui entendeu o que você acabou de dizer..." - Yusuke começou.
"Fi.. Ficar no Makai? Mas... por que, Kurama??" - Perguntou Kazuma, ainda atordoado, terminando por perguntar o que Yusuke ia dizer.
"Por que eu quero, Kuwabara." - foi a resposta fria que recebeu.
"Mas... você nunca quis voltar comigo pra cá!! Nunca quis deixar sua mãe, sua família e amigos..."- o tom de voz de Hiei não escondia mais o desespero e confusão sentidos pelo Koorime. - "Por que isso agora??"
"Concordo, isto não está certo!! Como vamos explicar para Shiori que o filho dela - você, Kurama - não vai mais voltar?? Que não quer mais vê-la??" - revoltou-se Yusuke.
"Digam apenas que algo mais importante me prendeu aqui." - O coração de Kurama rasgava-se, por dentro, pela frieza demonstrada... "Me perdoe, Kaasan, eu te amo...": -"Apenas falem que, algum dia, talvez eu volte."
"Mas... Kurama, como... nós..." - tentou falar Kuwabara.
"Digam que a amo e a manterei no meu coração para sempre... mas não posso retornar para lá. Perdoem-me."
"Mas... Kurama... e eu?" - Hiei sentia uma parede esmagando seu peito, seu coração...
Hiei tentava encontrar palavras para dizer o que estava sentindo, quando foi interrompido pela voz possante e firme do Kairui, chamando:
"Kurama! Venha, preciso de você aqui! Tem alguns amigos meus querendo conhecê-lo!!"
"Hai, já estou indo!"- respondeu, e, rápido, voltou-se para os amigos, dizendo: -" Gomen, amigos, mas... vocês aceitam minha decisão, não?"
"Eu... nós..."- Kuwabara não sabia o que dizer.
Hiei estava em estado de choque.
"Tudo bem, Kurama: nós... tentaremos, mas não garanto nada." - Conseguiu dizer Yusuke.
"A ... Arigatou gozaimasu... por tudo, e..."
"KURAMA!" - foi interrompido, por outro chamado, dessa vez impaciente, de Nazago.
"...e... até mais: eu... preciso ir."
E ele se foi, deixando seus amigos e amante ainda estupefatos com a notícia bombástica que lhes dera... e as conseqüências que dela viriam.
Mas algo ainda maior iria acontecer, naquela noite, que os faria ficar realmente pasmos, sem conseguir acreditar em seus olhos:
Alguns minutos depois, um dos Guardas deu um sinal, informando que a tal "Cerimônia" iria começar. Aiko, que estava no centro do Salão, começou a falar:
"Senhores, por favor... Silêncio, pois agora nosso Amo deseja falar a todos vocês: ele fará um pronunciamento muito importante, iniciando a Cerimônia! Senhor Nazago..."
"Nazago!! Nazago!!"- foi o coro dos convidados ali presentes.
A altivez e arrogância de Nazago ficaram ainda mais evidentes naquele momento:
"Obrigado. Agora, deixem-me falar. Como sabem, hoje é um dia muito especial para mim... e para todos em meu Reino. Escolhi a noite de hoje para oficializar algo muito importante para mim. Como alguns de vocês conhecem, este é meu novo Sub-Chefe, Kurama Youko..."-Apontou para Kurama, que estava de pé ao seu lado; em cuja face, o suor frio brotava, enquanto esperava, em uma verdadeira agonia, pelo o que o Kairui estava tramando: -"... o qual todos vocês conhecem a fama e sua história." - virou-se novamente para a multidão, mais precisamente para onde estavam os Detetives Espirituais: -" Pois bem, ele agora será o meu Companheiro Real, comandando e dirigindo boa parte de meu Reino: Essa é a Cerimônia de nosso Casamento."
Todos aplaudiram a decisão de Nazago-Sama, gritando seu nome e o do Ningen/Youko ao lado dele.
A bomba explodiu na mente de Kurama.
O horror pelo significado de tudo aquilo o invadiu de tal maneira, que não pode evitar: seus olhos verdes, arregalados, varreram a multidão... e encontraram-se com um par de olhos vermelhos, em completo estado de choque.
"Não acredite: é mentira!"- seus olhos imploraram.
As palavras invadiram sua boca... e ali ficaram: Kurama foi repentinamente atacado por uma onda de energia poderosíssima, que o deixou paralisado, e travou sua mente.
Kurama olhava para todos estático, sem reação.
Foi quando, de repente, sentiu seus braços moverem-se... cruzarem a cintura do Kairui, e abraçá-lo fortemente, em frente a todos que estavam presentes. Nazago estava controlando-o!
Nenhum de seus amigos estavam entendendo nada, principalmente aqueles gestos... o único que estava entendendo o que se passava era Hiei: o Koorime olhava tudo aquilo com uma fúria terrível nos olhos; uma de suas mãos segurava o cabo de sua katana, a outra, abria-se e fechava-se, como se controlando para não invocar as Chamas Negras... e matar a todos ali dentro.
Nazago então prosseguiu:
"Eu, Kairui Nazago, declaro diante de todos vocês, que, a partir de hoje, Kurama Youko será meu amante eterno!! Nós... nos amamos!!! - estas últimas palavras ecoaram naquele Salão como um trovão, principalmente para dois humanos e um Koorime.
O som de uma espada caindo no chão foi ouvido quando o Kairui, logo depois de sua última frase, levou seus dedos até a face delicada da Raposa, suspendendo-a até a sua, para em seguida, juntar seus lábios num beijo longo, saboroso e devorador para ambos os lados.
Hiei não acreditava no que estava vendo e ouvindo: em sua mente só se passava a idéia de que estava ele estava tendo um pesadelo horrível; mas não: seu Jagan, aberto, provava mais do que tudo, que aquela cena, digna de seus maiores pesadelos, era real; uma realidade pura, nua e crua.
Yusuke e Kuwabara se entreolharam, chocados; o silêncio era tanto, que os três puderam ouvir os comentários de um grupo de convidados:
"Não acredito: Nazago-Sama realmente consegue o quer: ele é um verdadeiro Dominador!"
"Ele levou o melhor, com certeza! Kurama consegue fazer coisas inimagináveis na cama!"
"Sim, aquele Ningen/Youko é maravilhoso...Uma foda esplêndida!"
"Concordo! Estou para encontrar algum amante que suporte tantas perversões na cama como ele!"
"Realmente, nosso Amo pegou o melhor de todos, sem dúvida!"
Aquilo deixou os amigos com nojo; porém, a situação ficou bem pior, quando Kurama separou os lábios dos de Nazago, e começou a passá-los por seu pescoço, acariciando-o, lambendo-o, deliciado, enquanto trazia seus braços mais próximos do peito do Kairui, as palmas das mãos percorrendo seu colete, atravessando-o para cima e para baixo, em carícias no seu tórax; sua cabeça com os longos fios ruivos se recostando em seu ombro e beijando-o carinhosamente.
Kuwabara não suportou aquilo, e voltou-se para Yusuke:
"Meu Deus! O que está acontecendo com Kurama? Parece..."
"Não faço idéia, Kuwabara: ele está agindo como se...gostasse daquele Youkai! Este não é o Kurama que eu conheço: de jeito nenhum! Hiei, o que Diabos está acontecendo aqui? Por que o Kurama está agindo ass...Hiei?!?"- Yusuke assustou-se, quando não viu o Youkai atrás deles.
"Acho.. acho que o baixinho não agüentou aquela cena, Urameshi." - murmurou Kazuma.
"Coitado... Ele deve estar se sentindo humilhado... e trocado por outro, pelo Kurama. Pelos Deuses! Isso está me dando nojo!"
Eles faziam caras feias a cada gesto feito por Kurama em Nazago: eram beijos e lambidas em seu pescoço, toques em seu corpo, carícias correspondidas pelo Kairui: este, com os olhos fechados, afagava cada parte de seu belo rosto, trazendo-o para mais próximo de seu peito, deslizando os dedos por entre os fios vermelhos no longo rabo-de-cavalo, esquecido quase que por completo do mundo, até que, finalmente, deu a seção por encerrada.
Olhou então, diretamente dentro das belas esmeraldas de seu escravo, querendo ter o prazer de ver sua expressão, ao ver-se finalmente livre de seu comando mental: queria ver a confusão no rosto de seu servo, assim que ele se desse conta do que havia acabado de fazer!!!
Não se decepcionou: os olhos de Kurama, agora livre de seu domínio, estreitaram-se com um ódio assassino que o divertiu.
Finalmente livre, o belo ruivo sussurrou:
"Eu lhe odeio."
Nazago riu, dando a entender aos demais que seu "esposo" lhe dissera palavras meigas.
Acariciando-o no rosto, disse:
"Se eu não soubesse, você enganaria até a mim, Youko.
Voltando sua atenção à multidão de aliados e guerreiros:
"Então? O que acharam de minha decisão?"
"Parabéns!!"
"Sábia decisão!!"
"Bravo!" - Todos respondiam em coro, fazendo um brinde àquela nova união.
Kurama olhou na direção de seus amigos e se voltou em seguida para Nazago.
"Senhor, posso ver meus amigos agora?"
"Sim. Você já foi bem útil, escravo."
Ele se moveu na direção deles, procurando, com os olhos, Hiei, o qual, àquela altura, estava muito longe do Salão. Kurama se preocupava extremamente com seu amante; como seria sua reação à tudo aquilo que feito por ele na sua frente: Hiei precisava entender que era tudo mentira, que tudo fora uma grande armadilha armada por Nazago, que fora obrigado a fazer aquilo para salvar tanto sua vida quanto às de Yusuke e Kuwabara; mas não deixara de amá-lo de maneira alguma: sua voz assustada, mostrava o medo de chegar tarde demais.
"Kuwabara... Yusuke... Onde está Hiei?"
"Kurama? O que está acontecendo aqui?" - Kuwabara perguntou, sem responder sua pergunta.
"Não tenho tempo para explicações!"
"Mas Shuuichi, você nos deve isto, que cena foi aquela?"
"Kurama... Você não foi embora daqui por que gosta daquele Youkai, é isto?" - Yusuke se exaltou.- "Onde você está com o juízo, cara? Duvido que você tenha esquecido de Hiei: aquele Koorime sempre foi sua vida, e agora, o abandona em apenas três meses?? Aquela cena lá na frente foi deprimente!!" -
"Não devo explicações a vocês: essa foi a minha decisão, já disse! Agora, só me interessa saber para onde Hiei foi... Digam-me, por favor!"
"Para quê, Kurama? Para humilhá-lo? Fazê-lo sofrer ainda mais?? Pelos Deuses, Kurama: você já o humilhou o suficiente... Deixe Hiei em paz, agora!"
"Por favor!"- Kurama implorou.
"Tá bom, eu... acho que ele foi para o jardim." - Concedeu Yusuke, com pena de Kurama, arrasado: nunca imaginara que tal coisa fosse acontecer, um dia. Aqueles dois... separados? Esperava que o Kitsune, do jeito que fosse, conseguisse se entender com Hiei. De uma maneira... ou de outra.
"A ... Arigatou, Yusuke."
Kurama saiu do recinto mais do depressa, praticamente correndo para os jardins, com o coração batendo feito louco no peito...
"Hiei... Ah, Hiei..." - só de imaginar como o Koorime deveria estar se sentindo com tudo aquilo, seus olhos enchiam-se de lágrimas, enquanto o Kitsune descia a escada, na tentativa de chegar ao nível dos jardins. - "Você não merecia isso... Nós não merecíamos isso..."
Minutos depois, chegava aos jardins que rodeavam o Castelo.
Kurama se via justamente no mais belo dos jardins, cercado de flores de todas as formas e espécies, enormes árvores enfeitavam o local, abençoando-o com as mais belas paisagens, para qualquer lado que olhasse. Os raios da Lua davam uma beleza ainda maior às sombras da noite.
Angustiado, o Youko começou a procurar pelo Youkai por todos os lugares, até encontrá-lo próximo de um chafariz: sentado em cima de um dos galhos mais altos de uma árvore, sua feições estavam sombrias, e seus olhos vermelhos se ressaltavam na escuridão, extremamente raivosos... porém incapazes de esconder o desespero que lhe ia na alma.
Kurama se aproximou da árvore, e o chamou para descer.
"Hiei? Hiei, desça, onegai shimasu... Eu preciso falar com você."
"Conversar? Mas eu não tenho nada para falar com você." - A voz de Hiei era fria, seca, sem sentimento nenhum. Aquela pequena criança Koorime estava magoada; sua posição tensa de ataque, com os braços cruzados e o Jagan aberto esboçava crueldade e insatisfação com aquele Youkai/Humano.
Kurama se assustou, mas tornou a tentar:
"Por favor, Itoshii... Desça, preciso falar com você. Conversar. Por favor!"
"Itoshii, o cacete! Não sou mais nada seu, Baka! E não precisa me dizer nada: eu vi tudo!"
"Hiei, você não entendeu..."
Shuuichi levantou seus olhos para ele, ergueu seus braços, chamando-o novamente. Seu olhar triste e meigo foi quebrado pelo salto do Koorime na sua frente, encarando-o de forma agressiva, louco de ódio:
"Como não entendi?! Eu não sou nenhum idiota, e muito menos cego! Vi perfeitamente você agarrando-se àquele maldito Youkai, Kurama!!"
"Espere, Hiei..."- Kurama tentou colocar as mãos nos ombros do Koorime, mas ele recuou um passo para trás, furioso, deixando suas mãos caírem no vácuo, numa postura visivelmente magoada e furiosa.: - "Eu... Eu não sou isso que você está pensando, eu..."
"CALE A BOCA!!"
Kurama empalideceu, ao ouvir o grito.
"Quem vai falar aqui sou EU, Raposa: eu sei muito bem o que estou pensando... Você mentiu para mim!! Me TRAIU com o Youkai que eu mais odeio neste Inferno!"
"Nani?? Do que... Do que está falando?"
Um tapa violento atingiu-o na face, deixando-o sem ar... e quase atirando-o ao chão.
"Já não disse para manter essa porra de boca fechada!?" - Kurama olhou-o com os olhos verdes arregalados pelo choque. Mas a fúria de Hiei tinha alcançado o limite, e o jovem Humano nada podia fazer, a não ser balançar a cabeça, como se negando para si mesmo o que estava acontecendo: -"Vou lhe dizer tudo o que está entalado aqui, seu filho da puta!!" - De repente, toda aquela fúria sumiu, deixando em seu lugar, todo o desespero, mágoa e confusão que o invadiam o Youkai: -"Como pôde fazer isso comigo, Kurama? Como? Eu te amo, esperei estes três meses por uma notícia sua, procurei feito um louco por você; achei que estava preso... ou até morto!! Mas aí tenho esta visão de vê-lo vivo... e bem, ao lado de Nazago - muito bem, por sinal; levo a bomba na cara de que não vai mais voltar para o Ningenkai, - coisa que você nunca nem pensou em fazer por mim, por que decidiu ficar aqui com aquele desgraçado!! Nunca desistiu de nada por mim, mas, por ele, esqueceu de seus amigos e de sua família! Como acha que eles reagirão à essa maravilhosa notícia? Diga, como??? E sua mãe... vai ter coragem de largá-la, também?"
"Eu..." - Kurama não conseguia falar nada: as lágrimas desciam-lhe pelo rosto, e os soluços impediam que dissesse qualquer coisa, tamanho o choque frente ao ataque verbal feito pelo Koorime.
"Não me responda!! Isto não interessa nem um pouco! Estou cansado de ouvir suas mentiras... que se vire com os outros!!" - Aqui, os olhos vermelhos ficam repentinamente rasos d’água: -"O problema aqui, sou eu, não é isto? EU sobrei nesta história! Você mentiu descaradamente para mim; brincou comigo, me usou, e, quando cansou, não pensou nem um instante: sumiu, desapareceu, como se nosso relacionamento fosse algo simples, fácil, um simples namorico do Grande Youko Kurama! Afinal, quem haveria de acreditar que justo você iria se apaixonar por um reles Youkai, um mestiço Koorime renegado até pelo seu próprio povo? Me diga, quem??" - Hiei gritava, descontrolado.
"Você, meu amor..." - Aquela constatação ressoou na mente do Kitsune: soluços desesperados impediam Kurama de falar, de dizer qualquer coisa: ver o desespero e a confusão de Hiei estavam matando-o por dentro... Saber que ele achava que tinha sido traído...usado como um mero brinquedo por ele... Inari! aquele sempre tinha sido o pior medo de Hiei: o de se entregar a ele, apenas para ser trocado por outro, depois... Pelos Céus, seu Itoshii não merecia sofrer daquela maneira; não merecia achar que todo o amor que lhe dedicara fora mentira... Não podia!
"Maldito!! Eu joguei meu coração no nosso amor!! Pensei que ele fosse verdadeiro, acreditei que você me amava... Mas me enganei terrivelmente: você nunca me amou da mesma forma que eu o amei... NUNCA!! Foram mais de quatro anos desperdiçados... MERDA!"
"Não, Hiei: deixe-me... deixe-me explicar!"
"Explicar?! Explicar o quê?? Dizer que ficou no Makai por causa do seu relacionamento com aquele Youkai? É isto? Ou será que vai tentar me convencer que aquela ceninha de amor explícito na frente de todo mundo naquele maldito salão não era verdade?! Pelos Deuses, Kurama: aquilo foi a coisa mais nojenta que já vi!! Você parecia um prostituto... A que nível você chegou? É isso que você é: um Youko... Um maldito Youko promíscuo, se agarrando e se beijando com aquele desgraçado do seu amante... Se quer saber, você é um prostituto! Um Youko filho da puta prostituto!!!"
"O quê, Hiei?" - Aquela palavra chocou Kurama de tal forma que seus olhos se arregalaram e suas mãos gelaram, diante do olhar fatal do Koorime: o Youko/Humano não podia resistir ao sentir seu coração se partindo, se despedaçando, ao ouvir aquelas palavras maldosas, raivosas, vindas da boca de seu amor. Suas mãos se agarraram à túnica, e seus olhos verdes se apagavam aos poucos ; sua voz parecia ter sumido, tão baixa fora feita a pergunta.
"É isto mesmo! Um Youko prostituto, um vagabundo... Que deita com qualquer um!!"
"Hiei!! PÁRE!!" - sua voz elevou-se, num grito: não conseguia mais ouvir aquilo; não conseguia!!
"CALE A BOCA, sua Raposa Desgraçada!! Vou repetir: Você é uma farsa: não passa de um Youko filho da puta, vagabundo, prostituto de uma figa!! Eu tenho nojo de você, Kurama: muito nojo!! Acha que não ouvi os sussurros de cada um daqueles Youkais?? Acha?? Maldito, você deu para todos naquele lugar: mulheres, homens... aposto que até para os escravos e Guardas!!"
"PÁRE!! PÁRE, POR FAVOR!!" - Kurama gritou, sem conseguir ouvir mais nada.
"Nem acredito que um dia te amei... que a minutos atrás eu estava preocupado com sua vida, que eu seria capaz de dar a minha, para tirar você daqui!!! Você é repugnante, nojento... um... VIADO que dá para todos no Makai!!"
"CHEGA!!!"- Kurama não agüentou mais e levou sua mão à cara de Hiei, dando-lhe um forte tapa em seu rosto, fazendo aparecer uma marca vermelha na face do Youkai. - "Você... Você não pode falar de mim assim: eu não lhe dei esse direito!"- ele respondeu, com voz fraca, ainda horrorizado com a reação que tivera.
"Como Não?? Baka!! Você me deu esse direito quando passou a ser um prostituto!! Vamos, Youko, me diga: foi gostoso para eles? Parece que sim, por que eles falavam muito bem de você, e de suas ‘atuações’ na cama... Deve ter feito coisas melhores do que comigo, afinal, você sempre foi o mais experiente: o Grande Youko Kurama, não é mesmo? Por acaso eles lhe pagavam?! Vamos, diga, desgraçado!! Ouvir aquele bando de Youkais renegados fofocando, falando, a respeito do que você fazia e agüentava na cama... Nunca me senti tão mal: me deu vontade de vomitar, só de pensar que meu corpo um dia tocou no seu!"
"Hiei, deixe-me explicar: você... não sabe o que está acontecendo, precisa entender, eu... eu não queria te magoar: juro!! ... a culpa não é minha... Eu amo voc..."
O Youko tentou se justificar, mas o Koorime se enfureceu ainda mais, seus olhos vermelhos se transformando em chamas, até lascar-lhe um tapa, bem mais forte que o anterior, no rosto, ao ouvir a última frase, fazendo-o quase desabar no chão. A marca desta vez foi de sangue: as unhas afiadas rasgaram sua face esquerda com muita vontade. O Youko/Humano ficou em estado de choque com o gesto de fúria do Youkai: levando suas mãos ao rosto, sentindo a dor dos ferimentos causados por ele, Kurama sentia seu coração doer mais e mais, seu corpo esfriar, suas pernas tremerem, e dos olhos começaram a descer pequenas lágrimas, que foram aumentando uma a uma, até ele perder o controle, suas pernas tombando no chão; a voz não saía mais, se transformando em soluços fortes, sem nenhum controle.
"Como pode ser tão cínico a esse ponto?"
"Hi... ei, eu..."
"Seu... Filho da Puta, CALE-SE! Eu não suporto mais ouvir sua voz, está me ouvindo? Não suporto mais! Eu te odeio, Kurama: não quero nunca mais vê-lo na minha frente, entende? NUNCA MAIS! Já passei pôr muita humilhação: estas lágrimas não vão me convencer!" - De repente, em meio àquela explosão de palavras e fúria, a voz de Hiei se quebra, com um soluço de dor, e sua voz, trêmula, diz: -"Eu o amava, Raposa... Não: na verdade, ainda o amo, mas vou esquecê-lo: não foi o que fez comigo?" - sua voz era só dor e falta de esperança.
"Não, eu não..."
"PÁRE DE MENTIR!! Quer todos aos seus pés, é isso? Pois eu não serei um deles... nunca mais! Posso lhe amar ainda, mas vou esquecê-lo: com certeza, desaparecerá de minha mente e de meu coração!! O ódio que sinto por você é bem maior que meu amor... Tudo desaparecerá... ou morrerei tentando!!"
Um último olhar congelou os olhos vermelhos como sangue nos olhos verde-esmeralda:
"Adeus."
"NÃO!! Hiei! Hiei! Espere... não vá, Hiei! ... HIEI!!!!!!" - Shuuichi implorou, aos gritos, inutilmente; pois seu amor já estava muito longe agora: desaparecera por entre as árvores dos Jardins, deixando para trás o coração de um Kitsune acabado... arrasado. Kurama não resistia mais: ajoelhando-se no chão, suas mãos esticadas na direção aonde ele sumira, as lágrimas caíam por suas faces, manchando a túnica que vestia. O som angustiado de seus soluços invadia a noite quente, enquanto seu corpo, prostrado no chão, era banhado pela gélida luz da Lua. Ele acabara de ver seu único amor... e sua esperança, se despedir naquele último som - "...é por você que estou sofrendo tudo isso... para salvar sua vida... eu... te amo, Hiei... não vá, por favor!... não vá... não me abandone aqui..."
As lágrimas e os soluços encobriam suas palavras: seu mundo desmoronara naquele instante; acabara de ver seu amor partindo, levando consigo parte de seu ser, seu coração, e sua alma...
A face rosada, ensangüentada, cabisbaixa, tocava o chão; os olhos não tinham mais brilho, apenas razão para chorar, encobertos pelos longos cabelos ruivos, livres do rabo-de-cavalo; as mãos jogadas no gramado, apertando fortemente a grama rasteira... Assim ficou, incapaz de sair sozinho daquele mar de dor e tristeza que se abatera sobre ele.
Foi quando, de repente, ele percebeu que estava próximo ao chafariz, e, mecanicamente, ergueu-se, levantando e se aproximando de sua borda...
"Viver? Para quê?" - sua mente atormentada perguntava-se, desorientada.
O brilho fantasmagórico da Lua, refletido na superfície da água o anestesiou, fazendo-o sentar-se na borda do chamariz.
Ao se olhar na água límpida, transformou seu reflexo na mesma imagem de destruição que lhe ia pela alma. Era tanta dor, que ele não estava mais conseguindo colocar para fora, reagindo como um robô... Um pequeno toque de seu dedo indicador na água criou ondas que acabaram pôr desfazer aquela imagem tão triste e sem esperanças. As pétalas trazidas pelo vento afagavam seus cabelos como carícias de um amante... "Um amante que jamais retornará..." As lágrimas prosseguiram da mesma forma, em reação ao pensamento, à sua tristeza, à dor que se abatera em seu coração e no corpo todo, deixando com tremores na pele.
De repente, acaba sentindo a presença de um Ki ao seu redor.
"Nazago?"- pergunta, sem se mover.- "Eu sei que é você. Não bastou me humilhar na frente deles... acabar com minha única de voltar a ver meus amigos, minha família? Será que tem que... tem que acabar com tudo à minha volta?" - Sua voz, carregada de dor não passa de um sussurro, enquanto continuava a olhar o reflexo da lua na fonte, como se estivesse hipnotizado -"Me deixe em paz com minha dor... quero sofrer sozinho... Me deixe em paz..." - O ímpeto de revidar, de lutar, em Kurama, já não existia mais: fora brutalmente esmagado com aquela farsa nojenta montada pelo Kairui. "Então elas trouxeram um pouco de sua consciência de volta?", "Não importa: este resto vai desaparecer hoje." As palavras ditas antes por Nazago assombravam sua mente "... quero ver a dor estampada nos seus olhos, quando ele o vir daqui a pouco; quero ver a desistência de uma luta eterna, quero ver essa sua arrogância se esvair, seu espírito se quebrar!" Ele conseguira, então: "Você conseguiu o que queria: Hiei me odeia... perdi a única pessoa que me amava... ela se foi para sempre... Não tenho mais ninguém neste mundo, nem no Ningenkai; minha mãe, ela... eu... nunca mais a verei... ela pode morrer..." - sua voz quebrou-se: parecia que seu coração parara de tanto sofrimento.
Nazago saiu das sombras, aproximando-se do Kitsune ali sentado.
Disse, então:
"Não se preocupe, Kurama: sua mãe não morrerá, eu lhe prometo. Não me interesso por mortes em vão. Mas agora, você tem que vir... Fez bem, me obedecendo, escravo: poderia ter acontecido coisas piores, aqui hoje à noite, se não me obedecesse."
"Eu... sei, mas... deixe-me sofrer aqui, esta noite, Senhor." - pediu - "Fiz o que queria, mas... eu..." - "Não estou agüentando!", pensou.
"CHEGA!!" - a voz de Nazago soou enfurecida: -"Não merece chorar pôr ele: ESQUEÇA-O!! Eu avisei antes que isso aconteceria! Não duvidou de minha palavra... ou duvidou??"
Kurama não respondeu, mas Nazago deu sua resposta, aproximando-se e sentando-se ao seu lado, levou uma de suas mãos para dentro da bela túnica que estava usando e puxou com os dedos uma rosa vermelha enorme, com suas pétalas completamente abertas, o verde de suas folhas eram esplendorosos. Ele a retirou de lá e a conduziu até os cabelos da Raposa, depositando-a em seus cabelos, por cima de sua orelha direita.
Kurama voltou seus olhos a ele, sem entender aquele gesto, enquanto vagarosamente suas mãos saíam da água. Nazago com seus dois dedos o resto da rosa, e levou sua outra mãos até as de Kurama, depositando-as lá. O susto dos olhos verdes foram enormes, ao encerarem os daquele Youkai, ao ver aqueles olhos cinzentos fitarem os seus de uma forma esquisita, sem ódio e fúria, como sempre os vira: eles estavam calmos, repletos de paz... e luz. Com um leve toque de seus dedos no belo rosto do Kitsune, ia recolhendo suas lágrimas e logo em seguida, sorriu.
Aquele sorriso foi tão espontâneo, com os caninos aparecendo, tão diferente daqueles com os quais Nazago o premiava com requintes de crueldade... Shuuichi nunca o vira assim, parecia estar feliz, ou algo semelhante; da mesma forma que suas palavras pronunciadas em seguida:
"Esta rosa é para você, Kurama: tão linda quanto sua beleza. Este brilho surpreendente de suas folhas, são idênticas à cor de seus olhos, e suas pétalas vermelhas, se confundem com seus cabelos ruivos. Este se delicioso perfume de rosas exalando de cada canto de sua pele parece se tornar tão sensual, ao lado destas plantas, flores, e principalmente, desta única rosa vermelha."
"Por quê? O que pretende com isto, Senhor? Quer brincar comigo?" - a voz de Kurama era um sussurro. Não agüentaria mais nada, nenhum sofrimento mais naquela noite.
"Não, não quero. Hoje, meu interesse é outro, escravo... Pare de chorar e venha comigo."
"Mas... para quê? Não compreendo, Senhor... Já teve o que queria de mim." - Kurama levantou os olhos rasos d’água para Nazago: -"Deixe-me em paz por esta noite, por favor... eu lhe imploro..."
"Chega de implorar: hoje não é noite para isso. Venha, não lhe farei mal."
"Senhor, os seus convidados... a festa..."
"Não se preocupe com isto: os convidados ficarão muito bem sozinhos... E eu o quero hoje à noite. Venha."
"Sim, Senhor Nazago."
Kurama se levantou, levado pelas mãos pôr Nazago-Sama. Suas lágrimas cessaram um pouco, mas não pararam; sua cabeça baixa, e os passos lentos combinavam com seu medo e desconfiança quanto ao que Nazago iria fazer.
Eles seguiram até uma parte do Jardim que se podia penetrar pelo Castelo, sem ter que passar pelo Salão de Festas.
Entraram, então, para surpresa de Kurama, no enorme quarto em que ele fora cuidado antes, pelas duas Youkais. O quarto agora estava mais sombrio, mas as janelas abertas traziam, além do brilho do luar, o perfume e as pétalas de rosas para dentro do ambiente; o balançar das cortinas sombreando o chão e a cama. Tudo aquilo encheu os olhos do Kitsune com novas visões de conforto... e paz. Coisas que à muito tempo não tinha; nem sentia.
Os dois penetraram naquela escuridão. Nazago encaminhou Shuuichi para a cama, trazendo-o ainda pelas mãos, visivelmente trêmulas.
Puxou os lençóis, para logo depois tirar a túnica. Pegou novamente uma das mãos de Kurama, fingindo não notar o quanto estava trêmula... e gelada, fazendo-o se sentar cuidadosamente no colchão. Disse:
"Vamos, aconchegue-se na cama."
"Não estou entendendo, Nazago... Por quê?" - atreveu-se a perguntar. Sua voz, um sussurro, apenas.
"Por que simplesmente você merece isto hoje. Fez bem seu serviço: cumpriu minhas ordens direitinho, sem resistências estúpidas... por isso, você merece um presente, escravo. Este lugar é para você, minha Raposa."
"Eu... Senhor... Não vai me maltratar?" - Os belos olhos cor de esmeralda, límpidos, espelhavam incredulidade.
Nazago envolveu o rosto lindo e delicado de Kurama nas mãos.
"Não se preocupe com isto: hoje nada lhe acontecerá de mal; não o machucarei; será meu amante, escravo. Seu corpo será acariciado de forma delicada, como você merece. Este tipo de coisa só dou uns poucos escravos, ou a quase nenhum: farei amor com você, Kurama, como nunca fizeram com você, antes; te darei amor no lugar de seu antigo amante... Farei você esquecê-lo para sempre, Kitsune."
Aproximou o rosto forte do de Kurama até poder sentir-lhe a respiração tocar em seu rosto.
"Deixe-me seduzi-lo e tê-lo por inteiro."
"Você... está mentindo."
"Vou provar que não. Olhe bem: Solte!"
Kurama apenas ouviu um barulho abafado, vindo de um lugar próximo, e depois mais nada.
"O que você fez, Senhor?"
"Você verá."
Nazago abaixou-se e levou suas mãos para a túnica que o Youko/Humano usava, desabotoando botão por botão. A primeira coisa que fez depois disso, então, foi levar seus dedos até o pescoço dele, puxando sutilmente sua coleira, até retirá-la completamente.
Kurama se assustou, e o olhou, interrogativo.
"Você a retirou... Por quê, Nazago?"
"Eu lhe disse que provaria que não estava querendo o seu mal."
"Não acredito... Senhor, você vai me soltar? Vai me deixar... livre?"
"Sim, você hoje merece isto. Hum... Que lindo... Está sorrindo?"
Kurama esboçava um pequeno sorriso nos lábios. Suas mãos tocavam seu pescoço timidamente, como se há muito tempo não sentissem o contato com a pele. Agradecendo por aquele símbolo humilhante ter sido tirado dele, seus olhos cor de esmeralda brilhavam com uma leve felicidade, apesar de seus dedos notarem os arranhões e cortes causados pela coleira em seu pescoço. Nazago levou os dele até suas mãos, pegando-as, trazendo-as e depositando-as de volta em cima da cama.
"Deixe-me continuar."
"Hai... Sim, Senhor."
Nazago puxou o nó da túnica levemente, desamarrando-o, para em seguida enfiar suas mãos enormes por dentro da túnica, retirando manga por manga de seus braços, até deixar seu tórax esguio nu. Um toque mais carinhoso em seus punhos delicados, desativou as algemas, lançando-as ao chão ao lado da coleira. A palma de suas mãos acariciavam sutilmente seu tórax, descendo com seus dedos pelo abdômen, apertando e tocando cada centímetro de sua pele. A reação de Kurama era de descanso; um alívio, por seus braços não carregarem mais aquele peso em seus punhos... Fora isso, não podia sentir prazer com alguém que não amava, justamente pelo causador de toda sua desgraça; em sua mente só se ouvia um nome: "Hiei."
Sua pele estava agradecida por aquelas carícias, seus músculos se relaxavam entre suspiros e gemidos; aquela sensação estranha de suas pernas tremendo...
Nazago então começou a acariciar suas coxas com as unhas em garras, subindo por suas nádegas, fazendo, com um leve empurrão, seu corpo deitar-se na cama.
Sua calça foi retirada, do mesmo modo que suas tornozeleiras; as roupas de ambos se juntaram no chão, e o Kairui foi subindo com o corpo enorme, sólido e forte, sobre o de Kurama, muito mais esguio, acariciando seu rosto com pequenas lambidas. Os punhos do Kitsune foram sendo carregados para cima de sua cabeça, em direção à grade da cama, pelas mãos do Kairui, conforme sua língua percorria cada centímetro dele; as pernas musculosas se juntaram às coxas do Humano, roçando umas nas outras, procurando caminho, forçando-as cuidadosamente a se abrirem, subindo e descendo, encaixando-se, até que seu membro intumescido entrou por completo no interior do Humano.
Kurama gemeu ao sentir mais uma vez aquele órgão pulsante dentro de si, e se retesou, tentando livrar-se, imaginando que a tortura começaria ali, igual às outras vezes; mas o Kairui o forçou com mais delicadeza, e de um jeito que a dor não fosse tão forte.
A Raposa não compreendia o por que daquilo, porém seu corpo estava apreciando a maciez do colchão, a sensibilidade do cetim frio encostando-se em sua pele, dando-lhe pequenos arrepios; apreciando de tal forma, que o prazer começou a crescer, mesmo não sendo isso o que seu coração queria. Ele quase não se mexia, perdido em meio às sensações que o envolviam: há tantos meses que não sabia mais o que eram carícias; o carinho de alguém; o conforto de uma cama, a beleza de um recinto calmo, perfumado e delicado... a liberdade retirada meses atrás... Oh, Inari... tudo era tão bom, que talvez fosse até um sonho, após todo aquele pesadelo...
Mas não era: Nazago estava lhe dando aquilo que Hiei sempre lhe oferecia... e que, agora, não teria mais.
Sua mente então se encheu de recordações e lembranças, se desligando totalmente do presente.
Aquilo durou pouco tempo, pois ao abrir os olhos, o que viu foi seu Senhor penetrando freneticamente dentro de si, entrando e saindo diversas vezes. A língua e a boca de Nazago trabalhavam em seus mamilos e por sua pele, conforme os dedos causavam ondas de prazer, envolvendo firmemente seu membro, flexionando os dedos diversas vezes em seu pênis, tornando a agonia de seu corpo quase doentia.
As penetrações profundas dentro de seu corpo faziam Kurama gemer fracamente, as retiradas e entradas aumentavam os gemidos em seus lábios, as mordidas em seus mamilos faziam-no arfar, quase sem controle.
Foi quando Nazago decidiu mudar de tática.
Decidido, retirou o membro intumescido de dentro de Kurama num só golpe, fazendo-o arquear-se, assustado, ao mesmo tempo em que baixava por completo o corpo em cima do tronco esguio de Kurama, e sua boca iniciava um passeio na pele escaldante do Humano, descendo rapidamente tórax abaixo, enquanto suas mãos partiam para carícias na virilha da Raposa.
Kurama sentia-se enlouquecer: sentia aquelas mãos apalpando, envolvendo e apertando com força suas nádegas macias; a boca, que viera parar entre suas pernas, a língua que estava lambendo seu pênis sem parar; a suave carícia dos longos cabelos azuis; e dedos que finalmente encontraram o que procuravam, introduzindo-se no interior de Kurama, exatamente no mesmo lugar em que o membro de Nazago acabara de sair... No exato instante que a boca quente do Kairui abocanhava seu membro completamente.
As mãos de Kurama agarraram os lençóis de repente, sacudindo a cabeça sobre os travesseiros, emaranhando seu cabelo. Ele gritou, enquanto sentia o membro ser sugado vorazmente por Nazago. Sua respiração era descontínua, sua voz sem forças... Sua pele, suada, roçava nos lençóis agarrados por suas mãos à medida que suas pernas, suspensas, se apertavam, trêmulas, nas costas do Youkai, levado à completa loucura com seu pênis sendo chupado e sugado languidamente.
Sua cabeça se revirava nos travesseiros e sua voz se perdia entre a realidade e o sonho, a qual sua própria mente o levava, embriagada pela febre.
Um grito... Depois outro... Saindo como seu gozo, na boca do Kairui.
Depois de sugar seu sêmen, Nazago imediatamente enlaçou-o novamente pela cintura, penetrando-o ainda em meio ao orgasmo, estocando-o de uma vez até o fim, sem piedade, de tal maneira que o próprio Kairui perdeu-se no prazer e no gozo.
Gemidos e mais gemidos saiam de seus lábios, enquanto Kurama gritava:
"Hiei... HIEII!!!" - foi seu último grito, no fim do gozo esmagador.
O Kairui levantou seu rosto suado em direção aos olhos da Raposa, ao ouvir seu grito, e suas sobrancelhas crisparam-se ao notar o quanto aquele olhar verde estava apagado, revelando lágrimas e tristeza. Os lábios úmidos, entreabertos, sussurravam o nome de seu amante como num delírio constante de sua mente febril, a face avermelhada e suada grudava nos seus longos fios vermelhos, molhados de suor... Nazago falou, arquejante:
"Então... Está pensando nele ainda?? ... Sabia que não seria fácil esquecê-lo mesmo com minhas carícias... Mas tenha certeza que vou apagá-lo de sua mente; assim como todo seu passado - nem que leve anos! E quando isso acontecer, aí sim, você será só MEU!! Me ouviu?" - Ele ameaçou, afagando delicadamente seu tórax arfante com beijos, enquanto suas pernas se entrelaçavam ainda mais, nas coxas da Raposa, numa nova investida, para poder ouvir novamente seus doces suspiros, gemidos... e gritos mais fortes, descontrolados, saídos de lábios que lutariam até o fim, para não deixá-lo ouvir nenhum deles...
"Sim... Sim, Senhor... eu... ouvi... o que disse... Ele... ele me magoou com suas... palavras... mas nunca... nunca vou deixar de amá-lo... juro..." - Kurama lutava com a própria falta de ar e com sua mente febril, para tentar responder à ameaça feita pelo Youkai, enquanto sentia, ainda dentro de si, a pressão feita pelo membro de Nazago.
"Sim, eu sei... Mas um dia este sentimento vai morrer: desaparecerá como a brisa que toca as pétalas daquelas rosas, no jardim. E você, Raposa, se tornará meu escravo por completo, sem repúdio... sem memórias a lhe atormentar a mente." - Nazago agora o penetra devagar, como se a saborear a maravilha que era a posse do Kitsune.
"Não esquecerei, nunca... meu coração, ele... ele vai guardar...AHH!" - Kurama fecha os olhos, ao sentir uma estocada mais forte, diferente das demais: -"... isso tudo... minhas memórias... mesmo que lá no fundo... senhor..."
"Eu vou lhe vencer, Kurama... Esteja certo disso." - Uma última estocada o fez tremer pelo corpo todo, enquanto o orgasmo se aproximava: -"Você o perdeu, Kurama; agora, viva com isto. ACEITE."- Sua ordem calou fundo na mente de Kurama, ao mesmo tempo em que ele sentia o sêmen do Kairui inundar-lhe as entranhas, denunciando seu orgasmo: - "Mas hoje... hoje você não merece mais sofrimento... já teve o suficiente." - os movimentos dos quadris de Nazago tornam-se lentos, vagarosos, quase que acariciando o ânus do Kitsune, ao invés de machucá-lo; sua respiração foi se acalmando, os tremores e ligeiros espasmos, que percorriam-lhe o corpo, também, enquanto saboreava mais aquele orgasmo espetacular proporcionado por seu escravo preferido. Ainda um pouco arfante, aproxima o rosto do dele: -"Está cansado... não?"
"H-Hai..." - Kurama balança a cabeça, devagar; seu corpo soltando-se do domínio dos braços de Nazago, abandonando-se, exausto, sobre os lençóis.
"Muito... Seus olhos estão fracos, e seu corpo está tremendo... Acho que merece um sono melhor em todos esses meses, um conforto mais agradável nos braços acolhedores da noite... do perfume de suas rosas, e de maravilhosos lençóis lhe acariciando a pele..."
"Senhor?"
Kurama sentiu suas pálpebras pesarem ainda mais, até seus olhos se fecharem por completo... e ele dormir profundamente, vencido pelo cansaço e abatimento de meses, e pela tristeza em seu coração. As finas lágrimas que desciam por sua face, uma por uma de cada vez, eram o requinte final de sua dor.
O Kairui o olhou, observando-o atentamente sob a luz da Lua; enquanto retirava seu corpo calmamente de dentro do dele, afastando-se para o lado, deixando enfim, a brisa fria da madrugada secar-lhe a pele clara, molhada de suor. Com um simples toque de seus dedos, no alto da cabeça da Raposa, fez cair todos aqueles milhares de fios por sua face e travesseiros. Ele ergueu-lhe a cabeça para recostá-lo mais confortável nos travesseiros que enfeitavam a cama, descansando-o lá, e ficou a novamente a observar aquele belo rosto inclinado para o lado, onde se espalhavam centenas de fios ruivos. Um suspiro fraco e exausto escapou suavemente por entre seus lábios, ao mesmo tempo em que, dormindo, o Kitsune virava o corpo todo para o lado, encolhendo-se em torno do próprio corpo.
Nazago puxou uma coberta longa e cobriu a Raposa, ainda observando-o em seu sono profundo: a face tão pálida e clara marcada pelas lágrimas, às quais, baixando silenciosamente o rosto, Nazago as lambeu, uma à uma, dando, no fim, um pequeno beijo estalado em sua face. Seus caninos esboçaram um leve sorriso, enquanto acariciava os fios em sua face com os dedos, dizendo:
"Descanse, escravo... Tenha bons sonhos. Você me deu um grande prazer - apesar deste ter sido de curta duração; mas posso lhe garantir: um dia estará me cedendo tudo isto em um período longo, muito longo... Durma. Durma e sonhe com os Deuses... enquanto pode. HÁ! HÁ! HÁ! HÁ!"
***
"Hiei... Hiei... Não, pare com isto, por favor... Não! Não!... Me perdoe... perdoe-me... Não! Não!!"
Kurama gemia em dor e febre seqüencialmente, desde que Nazago saíra do quarto de manhã cedo. Ele suava em calafrios, por casa da alta temperatura, que fazia todo seu corpo tremer, agitando pernas e braços contra a cama, e o queixo trepidava de frio. A mente embaralhada por todos os acontecimentos dos últimos três meses, em especial os da noite anterior, faziam-no delirar em gritos e gemidos desesperados, enquanto revirava a cabeça na cama.
"Não!! Não façam isso comigo... eu imploro... Eu... Eu farei isso... tudo!!... mas não... Hiei, eu não tive culpa... não tive! Não me abandone aqui... por favor!!!"
Nazago-Sama havia saído para resolver alguns problemas no Castelo, e mandara seus Guardas visitarem Kurama, unicamente para levarem comida, e verificar se seu sono estava calmo. Mas assim que estes abriram a porta, deram com a terrível cena, largaram tudo, e saíram correndo, chamando pelo seu Senhor em meio aos Corredores.
"Senhor! Nazago-Sama!!! Senhooor!!!"
"Senhor!! Mestre, rápido!! Mestre!!!"
Nazago estava no Salão de Reuniões, com alguns dos seus Chefes do Exército, quando os dois entraram esbaforidos, Salão adentro, aos gritos.
"O que houve? Por que nos interrompem?"
"Por que... Mestre, o seu escravo, ele..."
"Aquela Raposa Maldita está..."
"Falem logo! Estão me enervando!! O que houve com meu escravo? Eu os mandei vê-lo e servi-lo, mas estão aqui... Falem o que fizeram com ele, ou os mato... AGORA!!" - O Kairui os intimidou com sua altura imponente, levantando-se, furioso.
"Não, Senhor, nós..."
"É que, quando entramos no seu quarto, o seu escravo estava gritando e se debatendo na cama como um louco!"
"O quê? Seus imbecis!! O que fizeram??"
Ambos encolheram-se de pavor, com a fúria na voz de Nazago.
"Nada, Senhor: Nada!! Viemos direto para cá, avisá-lo, Senhor!!"
"Ele parece estar doente!"
Quando o Kairui ouviu aquilo, saiu da sala feito uma bala, largando todos os Youkais na Reunião e correndo em direção ao quarto em que havia deixado Kurama pela manhã.
Chegando lá, levou um dos piores sustos com o que viu e ouviu:
"Não!! NÃO... PÁREM!!! Me tirem... daqui... Soltem-me... eu quero ir embora!! QUERO SAIR!! CHEGA!! As torturas... eu não quero mais...!! Hiei! Me ajude! Socorro!! SOCORRO!!!!"
Kurama gritava em pânico, seu rosto suado e vermelho, recoberto por lágrimas se sacudia para todos os lados na cama, os travesseiros estavam todos no chão, os lençóis amarrotados, encharcados de suor, aos quais ele se agarrava, debatendo-se. Os olhos abertos, cobertos por
vultos brancos, estavam horrorizados de dor com as imagens que a mente, alterada pela febre o fazia reviver.
Nazago viu aquilo e correu para a cama, numa tentativa de conseguir para-lo, segurando-o pelos braços, o que assustou Kurama ainda mais:
"NÃO!! Soltem-me!!... Meus braços... saiam de meu corpo!!!" - a Raposa debatia-se, quase incontrolável: -"SAIAM!!!... frio... muito frio... Larguem-me... NÃO!! PÁREM, POR FAVOR... CHEGAAA!!!"
Usando de sua força bruta, sem pena, Nazago consegui segurá-lo, imobilizando-o de vez pelos braços, impossibilitando seus movimentos, enquanto se dirigiu aos soldados, aos gritos:
"Parem de olhar e mexam-se! Chamem os médicos!!" - Gritou, num tom urgente.
"Sim, sim, Senhor!"
"Estamos indo, Amo!!" - e os dois desapareceram.
"Agüente firme, Kurama!"
"PÁRE!! PÁRE!!!"
Nazago o segurou fortemente entre os braços, e o apertou entre o peito, tentando aconchegar seu corpo, e melhorar sua dor e seu desespero. Foi quando a febre o fez ficar repentinamente inconsciente, perdendo de vez a consciência. Nazago assustou-se, pois sabia que, uma vez que ela o dominasse, acabaria matando-o, tal a violência do ataque. Rápido, o Kairui fez a única coisa que poderia impedir o avanço da febre e impedir que a inconsciência não significasse um colapso nervoso completo no seu organismo: usou seu You-ki.
Um verdadeiro espasmo percorreu o corpo de Kurama, ao sentir toda aquela violenta onda de energia invadir seu corpo tão debilitado, fazendo-o soltar um grito de dor, e, agora, cair sem sentidos nos braços fortes de Nazago, que disse, aproximando a boca de seu ouvido:
"Ouça bem: vocênão vai morrer e nem abandonar tudo... Meus escravos não recebem este direito."- Uma fúria surda ecoava em suas palavras. -"Eu gosto muito de você: é mais do que uma vingança contra Hiei; é o amante que sempre procurei: vai ser meu para sempre, Kurama... Não será uma simples doença que o tirará de minhas mãos!" - Vendo que o humano estremecia como se escutasse o que dizia, terminou: -"Esta sua febre vai ser muito bem cuidada, assim como você, meu escravo preferido... A dor vai diminuir e cessar, não se preocupe." - Disse, enquanto fazia o próprio nível de You-ki diminuir, até que restasse apenas uma leve vibração de energia envolvendo o jovem ruivo.
"Os médicos chegaram, Amo!" - anunciou Aiko, quase sem fala.
"Ótimo." - A voz gelada, quase indiferente de Nazago não denunciava nada do que sentia. - "Seu paciente está aqui, doutores."
Os médicos colocaram-no novamente na cama, onde analisaram com cuidado todo o corpo da Raposa, e aplicaram remédios para sua febre abaixar rapidamente. Eles pediram que chamassem as servas para dar-lhe um banho gelado, na finalidade de retirar o suor de seu corpo, o que foi feito após algumas ordens secas de Nazago; sendo que as mesmas, depois de banhá-lo, trocaram os lençóis por outros limpos, e o depositaram novamente la, agora com a febre bem mais baixa.
Seus tremores foram diminuindo, diminuindo, até cessarem, dando lugar à calmaria de seus suspiros.
Nazago se aliviou bastante ao ver seu escravo assim, perguntando então para os médicos o ocorrido, depois de ter ordenado a todos os Guardas e servas para se retirarem do recinto.
"E então? Qual foi o problema, senhores?"
"Senhor Nazago-Sama, o seu escravo ficou seriamente doente devido aos maus tratos recebidos" - disse um deles, mais corajoso: é certo que servindo a Nazago, já vira e cuidara de centenas de corpos de Youkais, mortos ou não, e já se acostumara com a selvageria de seu Senhor e amigos... Mas, naquele caso, o estado em que se encontrava o corpo daquele ningen era uma imagem digna de um verdadeiro inferno de horrores, o qual nem ele mesmo imaginara que um dia o Kairui poderia chegar, uma vez que, desde a captura do rapaz, nunca permitira que ele fosse tratado pôr nenhum deles. E... o que ganharia defendendo-o, afinal? Logo, logo, seu corpo não suportaria mais... e ele haveria de morrer, igual à dezenas de outros. Mas... -"Ele já estava enfraquecido, pelo que pudemos analisar: ele não vem sendo alimentado direito, não tem tido direito à dormir ao menos o necessário para seu corpo, humano, descansar; os serviços pesados, e... os contínuos açoites e torturas acabaram tanto com o corpo quanto com a resistência mental deste ningen, provocando este verdadeiro colapso, Senhor."
O olhar frio e implacável de Nazago caiu fulminante sobre o servo insolente, mas este não deixou-se intimidar, e continuou:
"Devo dizer ainda, Senhor, que ele agüentou muito, mesmo, por todo esse tempo: seu escravo é realmente forte e muito especial; seu espírito, sua alma, são de um lutador; qualquer outro, já teria sucumbido... à tudo, à muito tempo. Acreditamos que a única coisa que o abateu mesmo foi esta profunda tristeza, talvez... a visita de seus amigos, ontem à noite." - O olhar que lançou ao seu Amo não deixava dúvidas: com sua perspicácia, conseguira adivinhar o que realmente estava por trás da Comemoração que ele planejara.
"Eu já entendi: foi por causa daquele maldito Koorime." - foi a resposta cínica que recebeu de Nazago. -"Agora digam-me, ele vai ficar bom logo?"
"Si-sim, Senhor, ele..."
"Vai. Só aconselhamos ao Senhor a não exigir muito dele por hora - nem mesmo colocar suas algemas, ou, pior ainda, a Coleira de Contenção: ela drenaria seu You-ki, e é dele que ele mais precisa, agora, para poder restaurar seu corpo e sua mente. Garantimos que dentro de quatro ou cinco dias ele estará novo em folha para suas... obrigações."
"Isto é bom, muito bom. Deixem-me a sós com meu escravo. Agora."
"Sim, Senhor!"
"Sua vontade se faça, Nazago...-Sama."
Os dois saíram.
O Kairui se aproximou então do pequeno corpo da Raposa, que estava dormindo serenamente na cama, agora; a face mais calma, repleta de suas longas franjas ruivas, dando um ar meigo à tudo que compunha aquele Youko/Humano: o corpo levemente colocado sobre os lençóis, sem movimentos, a não ser o sobe-e-desce de seu peito, por causa da respiração. Nazago então colocou os braços para debaixo das cobertas, puxando-a até seus ombros.
Ele sentou suavemente na beira da cama e aproximou seus lábios do ouvido do Kitsune, sussurrando algumas palavras que o fizeram estremecer um pouco, talvez de medo.
"Escute-me, pequena Raposa: aproveite estes dias de descanso, pois estes serão seus últimos dias para pensar nele... Quando você acordar, sua vida vai ficar bem pior do que antes, e nem mesmo suas memórias dele servirão para curar sua solidão e dor." - Um sorriso perverso tomou conta de seus lábios: -"Entenda, caro Youko: agora, você pertence somente a mim, e a mais ninguém; não permitirei mais sequer um único pensamento seu para Hiei: eles agora pertencerão somente a mim, até chegar o momento em que ele não existirá mais na sua mente. Ele não vai vir lhe ajudar, não te ama mais e lhe esquecerá: siga seu exemplo... e esqueça-o! Na sua vida, a partir de hoje, só existirá uma pessoa: seu amo e senhor, Kairui Nazago!"
Kurama respondeu com uma única lágrima solitária, ao toque daquele Youkai em seus lábios indefesos, num beijo forte, encontrando sua língua e sugando-a, vorazmente.
Aquele beijo foi um símbolo das desgraças que ainda estariam por vir.
***
"KURAMAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA!!!!!!!!!!"
O grito cortou a escuridão da noite.
Os olhos vermelhos, arregalados, vasculhavam o negrume à sua volta.
O peito, pequeno, porém sólido e bem estruturado, subia e descia, sem controle, com a respiração aos trancos.
O coração parecia querer sair pela boca.
"Outro pesadelo..."
"MERDA!" - exclamou.
Outro raio de pesadelo!
"Por que, em nome dos Deuses, desde que deixei aquele maldito Youko, tenho tido estas visões? Por que não tenho tido... paz?" - Foram os pensamentos que invadiram a mente de Hiei, enquanto ele recostava-se novamente na parede de seu esconderijo.
"Por que? Não consigo mais dormir: em meus sonhos, as imagens dele que aparecem são sempre dele sofrendo, chorando... me chamando... sempre parecendo estar sendo torturado... Por quê? Eu não devia tê-lo em minha mente: ele brincou com meu amor, destruiu meu coração, trocou-me por outro... me destruiu. Quem está sendo torturado sou eu, enlouquecendo com suas lembranças, suas memórias; vagando por este maldito Makai, tentando esquecê-lo...ou achar uma lógica para Kurama ter feito aquilo comigo. Será que, desde o início, não passei de um... obstáculo? Um... desafio, para ser ganhado, vencido, conquistado... e depois, abandonado? Será que tudo... tudo mesmo, foi apenas uma mentira, do início ao fim? INFERNO!! Pare de pensar... Pare de pensar! Ah, porra!! Tenho certeza que vou esquecê-lo: tenho que conseguir! Preciso fazer isso... afinal, não sou nenhum ningen Estúpido que se arrasta por um sentimento idiota, imbecil, como a paixão: sou um Youkai, mestiço de Koorime, frio e assassino, que está pouco se lixando para... para... amores ou paixões!! Eu, Hiei Hino, não preciso disso!"
Hiei tentava se auto afirmar em pensamento, tentando desesperado, esquecer seu amante, impedir-se de analisar os fatos mais uma vez - afinal, era isso o que sempre fazia, todos os dias, todas as horas, em que procurava sobreviver no Makai.
É
simples: tudo o que preciso fazer é isso!! Sim. Ou ele - esse amor
- vai me destruir... primeiro."
Esquecer Kurama
era tudo o que queria: criar ódio em vez de amor em seu coração,
era sua meta de cada dia passado sem ele - mas não estava conseguindo...
Os sonhos mostravam que não.
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Fim do capítulo 02. ^________^