ARTIGOS AS RELAÇÕES DE ROCHA VIEIRA , Expresso, 5/2/00
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in Expresso, 5/2/00 Aquele aparecimento, ali, de Vasco Rocha Vieira, pareceu-me logo especial. Não por o ver entrar no bar do Grémio - onde de resto passou a ser presença habitual, desde o regresso de Macau -, mas sobretudo por se ter dirigido imediatamente, e sem hesitações, à mesa de Miguel Calatrava - o sócio vivo mais antigo do clube, que depois de uma longa e sinuosa carreira política, iniciada ainda durante a monarquia constitucional, se dedica agora ao exercício de influências, acomodado nas gratas funções de membro do Conselho das Ordens Honoríficas. Eu estava de pé, ao balcão, a comentar com Duarte Lima as últimas extravagâncias internas do PSD. Espicaçado pela curiosidade, puxei o meu interlocutor para a mesa que normalmente ocupo, logo ao lado da de Calatrava. E então irrompeu pelo bar a figura maciça de Helmut Kohl, determinada, de mão estendida, igualmente direito à mesa de Miguel Calatrava. Mas foi o general Rocha Vieira que Kohl saudou calorosamente, naquele seu inglês castigado pelo sotaque gutural germânico: «My dearrr guenerrral! How arrre you?» Depois dos cumprimentos, com os três já instalados nas suas cadeiras, Kohl deixou-se cair num queixume: «Que tragédia! É horrível! Estou desolado! Que catástrofe!» (Ele dizia textualmente: «What a trragedy! It's a shame! I'm devastated! What a catastrrofph!») «Sim, sim!» - corroborou Rocha Vieira. - «Mancham-nos assim uma carreira brilhante, e ainda tão a meio!...» «Bons tempos, em que tudo era controlável!» - lamentou Calatrava. «Mas você disse que nos ajudava!» - lembrou Kohl, com uma centelha de esperança no olhar. «Foi por isso que aqui viemos hoje ter consigo» - acrescentou Rocha Vieira, animando-se também! «E ajudo!» - garantiu Calatrava. - «Arranjo-lhes o melhor assessor nesta área.» Depois, deslizando a vista para a minha mesa, e fixando Duarte Lima, pediu-lhe: «O sr. dr., que tem experiência, é que podia ajudar aqui os meus amigos.» «Eu?!» - ofendeu-se Duarte Lima. - «Mas eu limitei-me a ter um honesto negócio de assessoria jurídica, similar ao seu! E nunca aceitei clientes tão descarados como esses seus dois amigos!» «Não são meus amigos» - esclareceu Calatrava, cortante. - «Limito-me a trabalhar para eles, como assessor especial.» «Amigos somos nós, eu e o querido general» - adiantou Kohl. E voltou-se para Rocha Vieira, com ternura: «Nunca esquecerei as suas ajudas! Você e o Mitterrand foram os amigos com que pude realmente contar nas aflições dos bons tempos! Naturalmente, foi por isso que também o encalacraram!...» «Não, não foi por isso» - descansou-o o general. - «Em Macau tínhamos sacos azuis completamente seguros! Desses ninguém fala! O que me encalacrou foi uma transferência perfeitamente legal e transparente, que fiz de uma fundação de lá, para abrir outra cá!» «E por que foi você fazer isso dessa forma transparente?» - espantou-se o alemão. «Pensava que as coisas em Macau se podiam fazer de qualquer maneira! - reconheceu o general, arrependido. - «Sempre fiz o que quis, e como quis, sem imaginar que isso ia mudar com os chineses!» «Não sabiam então como é perigoso perder o poder?!» - admirou-se Calatrava. «Perigoso?» - a palavra assustou Kohl. - «Mas você jurou que nos apresentaria um assessor jurídico que nos safaria!» «Sim, sim» - corroborou Rocha Vieira. - «E assegurou-nos que tem uma estratégia infalível para ultrapassar dificuldades destas!» «Dessas, e muito piores!» - assentiu Miguel Calatrava. E de olhos postos na porta no bar, soerguendo-se levemente, com um sorriso vivo, anunciou: «Aí vem ele! Pelo preço combinado, assessora-vos juridicamente em tudo, e ainda vos pode ajudar nos investimentos!» Era Pedro Caldeira, que entrava naquele momento, e avançava já confiante, para a mão estendida de Calatrava. Relatos do PEDRO BRAGANÇA [ Ler comentários ]
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