CARNAVAL
"Chiquita bacana
Lá
da Martinica
Se
veste com uma casca
De Banana Nanica"
Precocemente
amadureci...
Concluído o ginásio no fim de 1948, voltei à Salvador para exercer
o cargo de auxiliar de escritório em um emprego que consegui na
Aliança do Lar Ltda., mediante carta de recomendação que tio Oscarzinho
fez para o Sr Antônio Valença, representante da empresa para
o estado da Bahia. Do curriculum constava o certificado de conclusão
do curso ginasial e o "diploma" de datilógrafo obtido em curso feito
em Catú patrocinado por tia Helenita. Na cabeça muita vontade de
vencer. De ser eu próprio. O salário R500$000/mês dava para eu me
sustentar e ainda mandar uma parte para minha mãe. O escritório
ficava na praça municipal, sobre a Confeitaria Triunfo. Bem no centro
do mundo. Ali estavam o Palácio do Governo, a Prefeitura, a Imprensa
Oficial, a Biblioteca Pública e a Cubana servindo milk chake e bolinhos
cobertos de amendoim. De um lado a rua Chile. Do outro a Misericórdia.
Em frente o elevador Lacerda. Uma verdadeira encruzilhada com tudo
para todo gosto. Neste cenário não foi difícil à minha ambientação
em Salvador. Mas é sobre o meu primeiro carnaval que eu quero falar.
Quinze
dias antes da festa de Momo já se realizavam os bailes pré-carnavalescos
ou gritos de carnaval. A minha turma era composta de: José Batista
Marques, meu primo, filho de tia Edith, irmã de meu pai, que trabalhava
na Farmácia Chile, Eugênio Bastos, filho de um engenheiro que foi
o verdadeiro descobridor do petróleo em Lobato e não Oscar Cordeiro
como a História registra, Albergaria, meu colega na Aliança do Lar,
e, Genésio Ramos que estava se iniciando em sua bem sucedida carreira
de radialista num serviço de alto-falantes que funcionava no mesmo
prédio da Pastelaria Triunfo. O grupo sempre se reunia nos fins
do expediente na esquina do Palácio ou na Cubana quando se tinha
alguma grana, para falar de tudo, e planejar os "babas" e as farras
de fim de semana. Inocentes farras: bailes no Itapagipe, nos Fantoches
e no Cruz Vermelha onde rolava uma cervejinha, conhaque, um namoro
sem compromissos ou uma briga com as turmas dos próprios clubes
que se indispunham com a nossa presença. O carnaval naquela época
consistia na realização de bailes pré-carnavalescos nos quinze dias
que o precedia. No sábado havia o desfile das grandes sociedades
(Associação Atlética, Fantoches da Euterpe, Cruz Vermelha e um clube
da Cidade Baixa cujo nome eu não me lembro agora) com os seus carros
alegóricos e moças bonitas ricamente fantasiadas. À noite tínhamos
os bailes à fantasia. Domingo era o dia da bagunça. A partir das
10 horas começava o desfile de mascarados ao som de pequenas orquestras
de instrumentos de sopro tocando marchinhas como: Chiquita Bacana,
Alá lá ou, e outras deliciosas marchas. À noite seguiam-se os bailes.
Segunda feira, o comércio abria normalmente e não havia movimentação
nas ruas. Prevalecia a ressaca. Em 1949 nossa turma programou o
seu próprio carnaval: Sábado nós nos encontraríamos no ponto do
Palácio para assistir o desfile, depois entraríamos na "marra" no
baile do Fantoches porque não passava na nossa cabeça pagar para
entrar em bailes de carnaval. Domingo e terça - feira seriam os
nossos grandes dias. Combinamos sair fantasiados de generais romanos.
José convidou Pedro Torres, trompetista do Rumba Dancing para tocar
para o nosso grupo, naquela hora, "bloco" . Depois do "desfile"
o grupo, somente o grupo, deveria ir comer uma feijoada na casa
da mãe de Eugênio em Nazaré. A fantasia seria trocada no serviços
de alto-falantes com plena autorização do seu proprietário que também
ia sair no bloco. Eugênio levaria as fantasias. O encontro na Pastelaria
Triunfo. Chegamos cedo. Carnaval no começo do mês, todo mundo com
dinheiro. Enchemos a cara. As 11:30 fomos vestir as fantasias. Para
minha surpresa eram lençoes Santistas que deveriam ser usados como
túnicas e os capacetes eram URINÓIS. Mas estávamos animados não
somente pelas cervejas mas principalmente porque Pedro Torres trouxera
quase toda a orquestra do Rumba e ainda Sandoval com sua roupa de
cantor de mambos com maracás e tudo. Logo na saída o bloco cresceu
com a presença de conhecidos e outros carnavalescos. Aí alguém entendeu
que os capacetes deveriam se transformar em canecas de chope. Grandes
canecas. A festa foi ficando animada. O calor aumentando. Os mantos
se transformaram em turbantes, uma loucura. Pedro Tôrres tocando
animado. Quando chegamos defronte a loja Duas Américas ele atacou
com Chiquita Bacana que agente cantava com uma letra bem obcena.
Era o máximo! Haja euforia. De repente eu vi tio Joaquim e Lourdes
postados ao longo do passeio da Sloper ( loja de departamentos)assitindo
o desfile. E agora? Como é que eu ia enfrentar aquela barra? Enfrentei!
Entreguei a "caneca" para o cara que estava ao meu lado vesti o
"manto" e gritei: Tio Juca! Ele e Lourdes sorriram e eu desci a
ladeira já com a "fantasia" recomposta, cantando: "Não usa vestido
Não usa calção, Inverno pra ela É eterno Verão, Existencialista
Com toda razão Só faz o que manda O seu coração. Chiquita bacana......