Boletim Mensal * Ano Vi * Outubro de 2007 * Número 55
COLUNA DOS VINHOS
Ivo Amaral Junior
Caros Compadres: no último artigo, prometi que escreveria
sobre o vinho “torna viagem”, a pedido do nosso editor Delmar Rosado, já que
é um assunto deveras intrigante. Mas, talvez por falta de conhecimento
específico sobre o tema (o qual prometo estudar com afinco antes de
escrever) e um pouco porque não consegui me desvencilhar de um outro assunto
–na realidade o mesmo do artigo anterior– qual seja, o prazer de comer e
beber, principalmente entre os amigos, não o farei nessas linhas desse mês,
talvez diafanamente, ao final.
Pois tal não foi minha surpresa quando fui
incautamente convidado para passar um fim de semana na belíssima casa de
Gravatá do amigo Urbano Vitalino Neto, a fim de desfrutarmos de algumas
degustações e harmonizações especiais planejadas por ele e pelo advogado e
dublê de chef, Eduardo Trindade. A pedida foi que levássemos vinhos
espumantes e tintos potentes, a fim de averiguarmos a viabilidade de certas
combinações. Portanto, aguardando as surpresas que estavam por vir, fui-me
embora para Gravatá, lá sou amigo de Urbano!
Logo que chegamos, na sexta-feira a noite, fomos
recepcionados pelo clima ameno e agradável, semi-europeu, da região. Já
inauguramos a noite com uma taça na mão e um vinho Paradigma, argentino dos
melhores, a nos trazer idéias na cabeça, além de queijos, pães e azeite (os
excelentes portugueses Cortes de Cima). Lá a existência é uma aventura e
partimos para comer Vieiras rapidamente fritas no azeite, ao molho de
mostarda, que como nas aventuras mais incríveis, harmonizou perfeitamente
com o Quinta do Mouro 2001, produzido no Douro e dificílimo de se achar.
Quem encontrar algum em suas andanças compre. E me traga um! Mas não
terminamos e de tal modo inconseqüente seguimos com um salmão embalado no
papel alumínio com legumes (acelga, mini-cenouras, brócolis, couve-flor e
cebolinha) com manteiga de ervas alemãs derretida.
Estirei-me languidamente na beira do açude que
adorna a propriedade, chamando Celinha para histórias me contar... Como o
tempo não para, é implacável, eu já comecei a pensar no que comer no dia
seguinte, mas então já era hora de dormir, então, dormi.
O sábado mal amanhecia e eu já estava pronto para
reiniciar os trabalhos e, qual não foi minha estupefação quando fui
presenteado por Duda com a realização do sonho que escrevi para vocês no mês
passado. Tomei café-da-manhã com champanhe Mumm francesa. Pelo visto tem de
tudo por lá. É outra civilização! E já estava pensando no que estava por
vir, afinal, hora de almoçar, almoçar. E o fizemos em grande estilo! Duas
garrafas de Moet & Chandon Rose e um Pêra Manca branco (parada para que eu
possa repetir que esse é o melhor vinho branco do mundo, pelo menos dos que
tomei), combinaram com lagostas ao molho de tomate e creme de leite fresco,
com polvo e pimentões coloridos, cebolas e alhos inteiros em profusão e
bacalhau a Gomes de Sá.
A essa altura do campeonato pedi para minha
Celinha ver como andava nosso estoque de cola ultra forte e de
anti-alérgicos, pois tinha plena convicção que a qualquer momento poderia me
deparar com a queda dos meus dentes, o inchaço da língua e o despelar do céu
da boca, pois eles (meus dentes e boca) nunca tinham visto uma mordomia
dessa. Lá nas plagas gravataenses sou amigo do Urbano.
Nem adiantou protestar pela barriga cheia, já
pensávamos no que comer mais tarde, só tivemos uma pausa para uma cochilada
– que nem chegou a ser concretizada – e, sub-repticiamente, lá estavam os
meus amigos a preparar lagostas e camarões, que foram degustados com o Luis
Cañas reserva, espanhol, de categoria, e com o imbatível Protos Reserva, da
Ribeira del Duero, que harmonizou perfeitamente até com o chocolate suíço,
avidamente degustado.
Na manhã de Domingo eu estava triste, triste de
não ter jeito, sabedor que deixaria os encantos de lá, mas que estaria logo
mais na minha Vila Cantanhede, repousando dessa maratona enológica e
gastronômica (hora de descansar, descansar!), quase sem conseguir me
levantar para voltar, mas reuni as forças que me restavam e assim tornei
viagem (eu não disse que falaria no assunto) – afinal estava chegando a hora
do almoço. E ninguém é de ferro!