A Criação (In)Humana

Capítulo 6 - Diagnóstico


Ritsuko entra em uma sala pouco ampla, mas com iluminação bem melhor do que a que está acostumada em sua própria. Após piscar algumas vezes, finalmente localizou a pessoa que procurava. Cabelos nigérrimos à altura dos ombros, envolta em um guarda-pó branco, bem parecido com o seu próprio. Ao contrário deste, o dela estava fechado.

- Doutora Sambuichi! Temos novidades?

- Ah! Doutura Akagi! Temo não poder assegurar uma resposta ainda. Agradeço pela chance de estudar este caso em particular.

- Você é a maior especialista que eu conheço. Quando vi os sinais e não pude compreendê-los, pensei logo em você. Mas não esperava que o caso fosse tão confuso assim!

- Compreendo. Mas veja - levantou-se, para permitir que a loura pudesse ver o monitor - os sinais estão bastante atípicos. Suspeitei de um linfoma não-Hodgkin a princípio, mas sem descartar também algum rabdomiosarcoma. Mas o quadro é compatível com metástase de 6 semanas ou mais. Fase IV. Ele deveria estar morrendo de dor!

- Por isso a chamei. Você viu o prontuário dele?

- Sim. E isso me espanta. Saúde perfeita, fora a parte psicológica, há meros cinco dias. O que aconteceu?

- Nenhum de nós tem certeza ainda. - suspirou Ritsuko - Radiações exóticas, talvez. Alguns assistentes que entendem mais disso que eu mencionaram que o que aconteceu antes de ontem devia ser reproduzida em aceleradores de partículas, para estudarem melhor as teorias envolvidas.

A oncologista deixou seu olhar perdido entre as informações que tentava absorver.

- Isso não faz sentido! - meneou a cabeça - Simplesmente não consigo acreditar que alguém com essa idade tenha desenvolvido de uma hora para outra uma doença rara só por exposição a alguma radiação alienígena.

- Sem querer parecer insensível, mas o comandante vai me perguntar isso: por quanto tempo ele poderá pilotar?

- Está no relatório que eu estava terminando. Estimo uma chance de sobrevivência de 35%, se começarmos o tratamento agora. Mas isso poderia intervir com sua habilidade de pilotar. Como o câncer parece ainda estar se alastrando, pode ser que ele viva um máximo de seis meses até que tenha sido todo tomado por ele. Meu único consolo é que ele ainda não está sofrendo por causa disso.

- Considero, então, que ele ainda não conhece seu estado.

- Não. Prefiro que ele não saiba antes do necessário. Mas isso também está no relatório, assim como minha opinião médica.

- Certo. Vou encaminhar seu relatório ao comandante, na íntegra. Mas se ele vai ler... Bem, e sobre aquele nosso outro assunto?

- Eu já telefonei. Ela é de confiança, e deve estar a caminho daqui neste momento.


Após uma consulta rápida a um dos relógios que estavam espalhados pela Nerv, Shinji decidiu que não valia a pena tentar pegar o resto do dia de aula. Dirigiu-se, então, para os alojamentos do geofront, onde Goten e Trunks estavam morando.

Curiosamente, as dependências que conhecia estavam vazias. Mais do que isso: a porta não cabia mais nos batentes, caindo desajeitadamente para um lado quando a tocou. Do lado de dentro, as camas do beliche, que ele esperava estarem ainda uma sobre a outra, estavam em lados opostos do quarto. Aliás, uma das camas estava incrustada na parede. Queimaduras e amassados decoravam as paredes. Pedaços de metal espalhados pelo chão. E nem sinal dos saiyajins.

Ainda examinando os escombros do alojamento, Shinji apurou o ouvido e ouviu sons de luta. Correu em sua direção até precisar desviar de uma grade de geladeira. “Grade de geladeira?” pensou. Incrédulo, deu de cara com um alojamento grande, com dois felizes saiyajins brigando feio.

- Hã... Gente! Posso entrar? - disse, batendo na parede com toda a força que podia fazer sem parecer mal-educado - Estou interrompendo alguma coisa? - Acrescentou, em um tom irônico.

- Que foi? - respondeu Trunks - Tá com ciúmes?

- Tá me estranhando? - respondeu o piloto, cumprimentando o príncipe dos Saiyajins - Como estão?

- Na chatice. - Goten respondeu, sentando-se após apertar a mão de Shinji - O comandante pediu pra gente não sair dos alojamentos antes de eles terminarem as investigações.

- Aí a gente resolveu passar o tempo treinando. - Trunks coçava a nuca - O resultado você deve ter visto lá no outro alojamento, hehe.

- E eu quase não saio do departamento médico. Hoje eu conheci uma doutora diferente. A Doutora Sambu... Quer dizer, Dra. Akoko. Akoko Sambuichi, mas ela pediu pra ser chamada só de Akoko. Estranho, né?

- Como assim, estranho? - interpelou Goten.

- Ora... Geralmente a gente só chama as pessoas pelo sobrenome!

- É mesmo? - Trunks parecia intrigado - No nosso mundo é comum a gente chamar as pessoas pelo primeiro nome.

Shinji balança a cabeça. “Outro mundo, mesmo...” E muda de assunto:

- Mas por que vocês não saem, simplesmente?

- Pra onde? - Trunks indaga - Só conhecemos vocês aqui neste mundo. E a Nerv ainda é nossa melhor chance de voltar. Resolvemos cooperar, por enquanto. Até porque tudo foi culpa de vocês dois!

Ambos Goten e Shinji coçam suas nucas simultaneamente.

- Bem, eu vou pra casa agora. - O piloto se despede - Um dia desses eu venho treinar com vocês.

- Té mais! - os saiyajins cumprimentam o amigo. - Só temos que tomar cuidado pra não destruir este quarto também!

Shinji deixa os guerreiros e busca as escadas rolantes que o levarão até a estação de monotrilho para fora do geofront.

- Pô Goten! - Trunks ralha - Vê se toma cuidado! Você amassou essa parede aqui!

- Eeeeeu! Nem vem, tá? Não passei nem perto daí.

Ambos observam a suave depressão na parede, bem junto à porta do quarto, se perguntando qual deles teria dado uma sucessão de pancadas justamente naquele lugar.

 

 

A Dra. Akagi fingia contemplar alguma coisa nas frias paredes do imenso escritório do Comandante da Nerv. Mas na verdade tinha grande parte de sua atenção focada no homem sentado cerca de dois metros à sua frente.

- Você poderia ter me mandado isto através do sistema - sua voz ressoou finalmente, após compreender minimamente o significado daqueles papéis recém-entregues.

- E você ia demorar algum tempo para ler. - respondeu a loura - Eu sei que tem coisas lá que você aprrova sem ler. E isso, creio eu, é importante o suficiente. “E eu queria ver sua cara ao se dar conta que não sabe tudo, calhorda!” pensou conscientemente, como que para encobrir a íntima vontade de ficar perto do homem que ama.

Gendou franziu a testa e dirigiu novamente o olhar para as folhas escritas à sua frente. À medida em que lia, uma sobrancelha se elevava aqui e ali. Ritsuko ria por dentro, ao imaginar o quanto ele estava espantado.

O Comandante tentava encaixar aqueles fatos nos outros que já conhecia. E o sentido ainda lhe faltava. O dia 15 de agosto de 2000 foi único por mais motivos do que ele antevira. Um contato alienígena poderia ter sido feito, não tivesse ocorrido o Segundo Impacto. E aquele aparente meteoro estranho, caído no subcontinente indiano que seria ainda devastado por uma curta guerra nuclear, estava repleto de tecnologia e material genético nunca antes visto pela Humanidade. E quem eram esses que se apossaram da nave caída? E com que motivo?

- Eu quero mais detalhes! - ordenou Ikari.

- Estão no sistema. - a doutora sorriu - Agora eu sei que você vai dar atenção. Olhe o workflow de pesquisas, o relatório completo está lá. Todo o resultado do material encontrado na Mongólia.

- Inclusive o caderno manuscrito?

- Não. Ele ainda não foi traduzido. Mas a pessoa confiável de que lhe falei deve estar a caminho para fazê-lo.

- Ótimo. Dispensada.

A mulher assentiu com a cabeça, e rodopiou sobre os calcanhares. O movimento realçou seus curtos cabelos, bem como elevou seu guarda-pó, dando uma visão de suas belas pernas cobertas pelas meias escuras que costumava usar.

- Ritsuko... Hoje à noite...

- Eu sei. - disse, virando parcialmente o rosto. - No seu alojamento. - e continuou sua caminhada rumo à saída do escritório.

 

 

Akoko se dirigia para o seu alojamento no Geofront. Estava cansada e resolvera descansar um pouco. Nada como morar perto do trabalho! “Mas que fome!” passou a mão na barriga. Desviou seus passos para o refeitório de superfície, um dos restaurantes com a melhor vista do lugar. Estranhou o movimento, pouco usual para aquela hora. Mais ainda que estivessem tantos agentes da Seção 2 urubuzando o local. Mesmo que todas as Crianças estivessem ali - o que era pouco provável - não haveria tanta segurança em forma de homens de preto. E eles costumam ser frios, distantes e discretos, não o enxame que estava ali. “Aí tem coisa...” pensou, enquanto abria a porta.

Nada poderia tê-la preparado para o que a aguardava lá dentro. Dois rapazes numa mesa - um de cabelos pretos espetados e outro de cabelo lilás escorrido - estavam cercados de pratos sujos e vazios, brandiam vorazmente seus hashis mandando diversas iguarias goela abaixo, esvaziando os pratos às suas mãos e pegando imediatamente outro da bandeja, continuamente reposta por garçons tão ou mais estupefatos que ela. “Os aliens. Tinha que ser isso!” concluiu. Olhando o resultado devastador em forma de pilhas de pratos, ela se perguntou como eles não mostravam sinais de empanturramento. E onde naqueles corpinhos tinha espaço para tanta comida? Seria essa a fonte do seu lendário poder (ela tinha ouvido falar das celas 3 e 4, ou o que restou delas, após um “treinamento” deles com força total, bem como da demonstração com os Evas ali mesmo no Geofront) ?

Não estranhando ter sido ignorada por vários minutos, Akoko chamou um garçom e fez seu pedido. Misoshiru, salmão grelhado, pão e café com leite de vaca. “Alguns hábitos são difíceis de largar...” finalizou o pedido. Ver aquela orgia pantagruélica quase estragou seu apetite. “Tenho que examinar esses dois pessoalmente.” propôs-se, anotando para si mesma que deveria evitar toques inadvertidos naquelas caudas que ela sabia eles terem - haja vista o resultado nos médicos residentes que ousaram fazê-lo quando eles foram descobertos.

A chegada de sua bandeja a despertou dos devaneios. O garçom parecia aliviado. Pudera, os rapazes pareciam satisfeitos, e conversavam tão animadamente quanto seus ventres inchados permitiam. Akoko sentiu um arrepiozinho na nuca. Aprendera a perceber pessoas diferentes do tradicional japonês fazia tempo. E também aprendera a nunca ignorar essa intuição, pois invariavelmente era uma conversa interessante que estava à sua frente. Agradeceu o garçom, pegou a bandeja e dirigiu-se à mesa dos rapazes.

- Com licença - dirigiu-se, animadamente, aos dois - posso me sentar com vocês?

- Pode sim, moça - Goten respondeu sem olhar para Trunks, que olhava com curiosidade para a mulher diante deles.

- Obrigada - sentou-se - Meu nome é Akoko Sambuichi, e o de vocês?

- Sou Goten!

- Trunks Briefs. Mas imagino que saiba quem somos...

- Bem, não nego que ouvi falar de vocês. São o assunto principal dos cafezinhos por aqui, e olha que nosso trabalho já é estranho! Mas nunca tive a chance de conversar pessoalmente com vocês.

- Drª Akoko - Goten leu no crachá - Então você atendeu o Shinji hoje de manhã, né?

- Sim, como você sabe?

- Ele contou pra gente. E aí? Ele tá legal?

A doutora segurou o impacto da pergunta e respondeu, com um sorriso amarelo:

- Sim, pelo menos até saírem os resultados dos exames que pedi... - disfarçou.

E seguiu-se uma conversa realmente diferente, sobre drenagem da Energia do Vácuo, universos paralelos e probabilidades quânticas. E como funcionava a cápsula de gravidade, e como eles gostavam de treinar lá dentro, e...

Pobre Akoko...

 

 

Misato saiu do seu escritório mais cedo. Planejava passar em casa antes de... “ Por que Maya está ruborizada?” se perguntou, enquanto a jovem passava ao seu lado, passo apressado, prancheta-terminal presa ao peito e ao queixo. Olhar maroto, mas assustado. A resposta estava diante da máquina de refrigerantes.

- Kaji! Você fica dando em cima da Maya só pra obter mais informação, tá? Não tem vergonha, não?

O espião, com a tradicional barba por fazer e gravata frouxa, estava com o paletó jogado sobre um dos ombros, enquanto esvaziava uma lata com a mão livre. Ao abaixar o rosto, o olhar dele a fez ruborizar.

- E não vem me olhar desse jeito não!

Sem dizer nada, o homem deu um passo em sua direção. Seu sorriso torto traía seu grande charme. Outro passo, e Misato sentiu o cheiro do seu amado.

- Por que eu ia querer a Maya, se posso ter você...

Misato quase que esperava que a mão que não segurava o paletó a agarrasse. Mas ela não ia se trair desse jeito, e se preparou para fugir do abraço... que não veio. Em vez de se dirigir à sua cintura, aquela mão se meteu debaixo do paletó e tirou uma pilha razoável de papel, amarrado com barbante e com um disco ótico preso no mesmo embrulho.

- Não precisa ofegar. Podemos fazer isso depois, quando você quiser.

Só então a Major percebeu que estava ofegando de vontade de beijá-lo como se fosse a última vez que o faria. Engoliu em seco, respirou profundamente e gritou.

- SEU CONVENCIDO! O QUE VOCÊ PENSA QUE SOU?

- Você fica linda quando está nervosa, sabia? Mas não é por isso que estamos aqui, não? - entregou o pacote para Misato - Eu já li, agora é sua vez.

- O que é isso? - perguntou, entre encabulada e surpresa, sem falar em curiosa.

- Dados brutos da investigação no site da Mongólia.

Ainda sem entender direito, a major começou a folhear as páginas que tinha recebido. Folha após folha, suas sobrancelhas se levantavam mais e mais.

No dia do Segundo Impacto mais de uma coisa estranha aconteceu. Um meteoro singular caíra no subcontinente indiano poucas horas antes do Segundo Impacto. Ele apareceu do nada minutos antes, sobre o Irã, cruzou velozmente o ar e bateu logo ao sul da Caxemira. Provavelmente foi a causa da Guerra que devastou a Índia e o Paquistão naqueles dias, como se o desastre não fosse suficiente.

Mais ainda, uma entidade secreta (tão secreta que pouco se sabe sobre ela, apesar de tudo o que se obteve na Mongólia) teve acesso ao meteoro e iniciou pesquisas genéticas, cruzando o DNA alienígena com o humano. Mas os embriões mais desenvolvidos foram os alimentados com células-tronco mesenquimais humanas... Misato parou para consolidar o que havia lido. Estalou os dedos:

- Agora ficou claro! Aquela coisa eclodiu num laboratório no meio do deserto e saiu à procura de pessoas para se fortalecer!

 

 

O Comandante já estava acostumado com isso. Reuniões numa saleta escura e fisicamente vazia. Falar com as paredes já era um hábito. Seria uma loucura se a tecnologia já não tivesse tornado esse um eficaz meio de comunicação: a teleconferência holográfica. De uns tempos pra cá, porém, seus interlocutores cada vez mais substituíam suas imagens pelas de monolitos negros com inscrições: SEELE-01, SEELE-02 e assim por diante. A novidade, porém, era a recomendação de que ele também o fizesse. Uma criptografia mais forte que a comum seria usada para essa reunião em particular, o que poderia inviabilizar a utilização de imagens em tempo real. O velho Ikari escolheu um ícone da Nerv, com a folha de figueira e tudo mais, para marcar seu monolito, e estabeleceu a conexão.

Lá estavam, pensou, os velhos de sempre, escondendo suas rugas e temores por trás dos hologramas frios de negros. A diferença é que ele também o fazia. “Estarei ficando velho, também?” relampejou por sua mente. Logo descartou o pensamento para se concentrar nos assuntos a tratar.

SEELE-01: Ikari, convocamos esta reunião porque há uma ameaça séria aos nossos planos. E ela não vem de você, como de costume.

Ikari: Não sei do que você fala - disse, tampando seu sorriso maldoso por puro hábito.

SEELE-01: Não se faça de tolo. A essa altura, você deve ter descoberto que há interesses distintos dos nossos, e eles estão em ação neste momento.

Ikari: Você se refere à criatura da Mongólia? Realmente é perigosa. Tenho evidências de que alienígenas como ela são capazes de emitir um padrão vermelho localizado.

Um murmúrio de admiração percorre a sala, enquanto os outros membros da SEELE não conseguem esconder sua estupefação.

SEELE-01: O que importa é que existem forças para as quais nós não tínhamos nos preparado. E agora temos que lidar com elas. A Nerv precisa enfrentá-las, quando for a hora. E daremos o reforço que achamos necessário no momento.

SEELE-02: A unidade russa será concluída em Tokyo-3, com peças que já foram despachadas da França e estão a caminho agora. Sabemos que você tem dois alienígenas sob sua custódia. Que ameaça eles podem oferecer ao Projeto?

O comandante hesitou um pouco antes de, ao suspirar profundamente, concluir que havia algo muito sério acontecendo. Sério o suficiente para eles mandarem uma unidade de Produção em Massa quase pronta, mesmo com o risco que isso seria para o cenário deles. Sério demais para tapear a velharada...

Ikari : Quase tudo o que sabemos da criatura da Mongólia foi inferido dos estudos sobre esses jovens humanóides. São extremamente fortes, mas não são Anjos. Conseguem perfurar um campo AT apenas reunindo todas as suas forças, de modo análogo ao raio positrônico que utilizamos contra Ramiel, gerado com toda a energia do Japão. Mas o mais fascinante é que eles têm a capacidade de se tornarem um só, por um curto período de tempo, formando um campo AT de padrão vermelho através de um ritual estranho que eles chamam de “Fusão Metamoriana”. O resultado é um guerreiro bem mais forte que a soma das forças dos dois, e é esse o que consegue atravessar o campo AT com menor dificuldade.

SEELE-03: E que relação essas criaturas têm com a da Mongólia?

Ikari: Os exames tradicionais, com resultado mais rápido, acusaram forte parentesco entre eles e todas as amostras recuperadas do deserto. O seqüenciamento dos DNAs não tem prioridade elevada, por isso ainda não está pronto. Mas apesar disso, pudemos descartar parentescos de 1° a 3° graus.

SEELE-02: E a duração do Padrão Vermelho?

Ikari: Menos de um segundo, mas com intensidade extremamente variável. Parece que o Padrão Vermelho não é um efeito consciente, mas apenas um meio para alcançar um fim.

SEELE-01: Assim como para nós. Eles poderiam estender esse Padrão Vermelho por mais tempo?

Ikari: Acredito que não. Mas a criatura da Mongólia - que, aliás, eles insistem em chamar dde Cell - pode ser. O espécime que está em liberdade tem 98% de chance de possuir material genético extraído de Ramiel, e acreditamos que ele possa ter vencido e devorado Bardiel.

Novo murmúrio. Ikari podia até imaginar o que eles poderiam estar comentando nos seus chats particulares.

SEELE-01: Por que os seus ... hóspedes chamam o monstro de Cell?

Ikari: Eles alegam que seus pais o enfrentaram... Ou enfrentaram o seu original, do qual nosso atual adversário pode ter sido clonado. E um deles morreu ao transportá-lo para longe da Terra, quando ele tentou se auto-destruir. Regenerado mais uma vez, foi finalmente vencido pelo filho do que morreu, irmão mais velho de um dos meus hóspedes.

SEELE-02: E a organização por trás do... Cell?

Ikari: Pouco sabemos. Digerimos todos os dados que podiam ser aproveitados do computador deles - que, aliás, pouco devia ao próprio Magi - e quebramos a criptografia de quase todos. O que achamos? Detalhes de experiências. Origem dos materiais genéticos, poucas menções à Nerv e à SEELE, memorandos internos administrativos e nem sinal dos cabeças. Provavelmente aquela unidade era uma apenas uma folha da árvore que enfrentamos.

SEELE-02: Mas essa folha deu um fruto que pode esmagar décadas de trabalho de nossa parte, sem falar nos custos! Seu trabalho será enfrentar o fruto. Deixe a árvore para nós.

SEELE-01: Ikari-kun, aguardaremos um relatório sobre a organização. Em contrapartida, lhe daremos as informações que tivermos sobre a criatura. Você agora está dispensado.

Com isso os monolitos desapareceram da vista do velho Ikari. O comandante divagou um pouco sobre como usava scripts nas salas de chat, em sua tempestuosa juventude, justamente para chutar pessoas para fora da mesma maneira que acabava de acontecer com ele. “Ironia”, suprimiu um sorriso.


A reunião, porém, continuava sem sua presença. Mal o monolito com o selo vermelho da Nerv desaparecera, outro surgiu em seu lugar. Seu símbolo era semelhante a um “V” maiúsculo de cabeça para baixo, ou um “A” sem a haste no meio.

SEELE-01: Você integrará a comitiva que vai acompanhar a Unidade 7 até Tokyo-3. Lá você vai desempenhar as seguintes missões: 1) Descobrir o paradeiro do operativo anterior, que rompeu contato recentemente. 2) Estabelecer contato com a Primeira Criança, obter amostras da mesma e estabelecer alguma confiança na relação. 3) Avaliar a extensão do envolvimento da Nerv com a Entidade inimiga. Alguma dúvida?

Operativo: O outro operativo pode ter desertado?

SEELE-02: Essa pergunta nós fazemos a você. A resposta está em seu destino.

Operativo: E Ikari? Pode-se confiar nele?

SEELE-01: É claro que não. Mas lembre-se: Ikari pode ser nosso maior inimigo. Mas hoje é o aliado que, com a Nerv, pode fazer aquilo que não podemos por nós mesmos. E afinal de contas, o monstro ameaça seu cenário também.

Com isso, a reunião foi encerrada.

 

 

“Bié? Luanda? São lugares. Já estive lá? Jordânia? Não. Mas algo veio de lá”

Em seu delírio onírico, Cell não tem certeza se está acordado ou dormindo. Pensamentos invasivos saltavam diante de sua consciência, sem que soubesse ao certo quais eram seus, e quais eram dos infelizes que absorveu.

Um velho. Um velho com entradas proeminentes, bem calvo, apesar de conservar longas as brancas madeixas dos lados da cabeça. Um autêntico careca-cabeludo. Cell já sonhara com ele antes, com seu bigode branco felpudo e os olhos verdes transbordantes de inteligência e maldade.

- Você será o mais perfeito de todos, - dizia o velho - basta absorver minhas falhas anteriorres...

E a partir daí ficava obscuro o que ele tinha a dizer. “O que viriam a ser essas 'falhas anteriores'? Quem era esse velho? Por que me sinto compelido a absorver mais e mais pessoas?” pensava o monstro. Já tinha absorvido centenas de milhares de pessoas, e ainda não se saciara. Sentia que muito mais havia para ser tomado, muito poder para ser adquirido. Tinha que achar outro igual àquele que o tinha atacado quando ele nasceu. “Penemue”? Quem é Penemue?


Na tarde daquele dia, o ar quente estava abafado. Provavelmente um temporal assolaria novamente a cidade. Mas as cigarras ainda cantavam, em um coro irritante, suas homenagens aos últimos raios de sol que a elas chegavam. A estação de trem tinha o movimento pequeno que a caracterizava durante os últimos meses. Como a troca de turnos se daria apenas uma hora mais tarde, apenas as pessoas que estavam de mudança estavam lá. Não que fosse muita gente: quem podia ter deixado a cidade com facilidade já o tinha feito. Mas não era assim para os funcionários públicos, trabalhando nas várias agências que tinham como sede justamente o epicentro dos ataques de criaturas misteriosas que ninguém via, mas ouvia através das vibrações das paredes dos abrigos. O movimento, então, se reduzira ao dos parentes dos que ficaram em Tokyo-3, que estavam paulatinamente sendo mandados para a segurança do interior do país.

Não era de se estranhar, portanto, que os trens chegassem quase vazios. Ninguém em sã consciência ia para a Capital sem um bom motivo. E mesmo esse motivo poderia ser motivo de ansiedade e medo, apesar de às vezes estar mesclado com alguma esperança. Visitas e emprego eram os mais comuns.

//Trem de Maebashi chegando pela linha 4. Por favor aguardem atrás da linha amarela até que a composição pare.// - a voz avisou pelo alto-falante.

As portas se abrem, deixando sair aproximadamente uma pessoa de cada vagão, três no máximo. Entre elas, uma garota de presumíveis 18 anos pensa nos dois motivos que a levaram à cidade tão mal falada por seus amigos de Oizumi. E novamente concluiu que valia a pena.

Sentiu uma presença atrás de si. Uma tensão não pôde ser evitada enquanto a moça se virava para ver quem era. Deparou-se com uma mulher de jaqueta vermelha e minissaia preta, com uma cruz reluzente pendurada no pescoço. “Seria cristã?” pensou num relance.

- Srta. Arimura?

- Sim. Mas pode me chamar só de Akane. Você deve ser a Major Katsuragi, certo?

- Eu mesma. Pode me chamar só de Misato. Mas por que você está rindo?

- É que me ligaram no celular e disseram que eu ia esperar muito. Mas ela estava enganada. Vocês apostaram alguma coisa?

- Ritsuko! - Misato cerrou o punho, falando com o ar ao seu lado - Eu vou te matar!

Mudando rapidamente do acesso de raiva para a afabilidade habitual, a Major voltou-se novamente para Akane.

- Deixa pra lá! É só brincadeirinha, hehe! - coçava a nuca - Vamos, vou levar você para seu alojammento. Mas antes eu preciso passar em casa, se importa?

- De jeito nenhum. - sorria - Vamos!

 


Notas do Autor

Apesar de considerar o formato script extremamente limitado, não consigo pensar em nada melhor para representar aquelas reuniões da SEELE. Afinal, aquilo é apenas um chat, quando todos são monolitos negros.

A Fusão Metamoru foi aprendida por Goku no planeta Metamor, então resolvi que Gendou utilizaria o termo “Fusão Metamoriana” ao invés de “Metamoru”, como aparece no anime DBZ.

Oizumi é uma vila onde, até a década de 1990, os brasileiros representavam mais de 10% da população. Lá eles chegaram a influenciar a economia e os costumes, tendo ocorrido até mesmo um carnaval nos moldes brasileiros, até o prefeito proibir a festa. Maebashi é a capital da província de Gunma, onde Oizumi fica.

Rabdossarcoma é um tipo de câncer muscular extremamente raro, que é identificado quase que só em crianças (não em adolescentes, como Shinji). Mas nada pôde ser identificado com certeza pela Dra. Sambuichi, porque não foi localizado nenhum tumor candidato a origem. Caso se confirme, a chance de sobrevivência é inferior a 40%, isso com tratamento adequado. Torçamos para que a Doutora esteja enganada... O que pode ser, já que não é possível atingir metástase em questão de dias. Mesmo tento o tempo dentro da cápsula sido diferente do percebido fora dela.

A referência à data do Segundo Impacto é o início de Death&Rebirth, onde o vídeo mostra aquela data, bem como o local: “UN Underground Base 02”.

Os mais curiosos podem tentar obter mais alguma informação na internet, se souberem o que procurar...

 

Capítulo 7

Capítulo 5

Index

Hosted by www.Geocities.ws

1