A Criação (In)Humana

Capítulo 1: Um prelúdio


AVISO: É recomendável ter assistido à serie Evangelion (pelo menos até o capítulo 19) e a DBZ (ou ter amplos conhecimentos das duas últimas sagas) para obter o máximo divertimento deste fanfic.
Mas, caso você não se importe com spoilers, vá adiante.
A propósito, sobre Dragon Ball: para este fic, DBGT não existe.

Shinji saiu da cozinha, deixada bem arrumada naquele final de noite. Faltava apenas a sala. Ritsuko tinha visitado Misato naquela noite. Tinham conversado e bebido bastante. Bem, Misato bebeu bastante. E agora estava ressonando pesadamente em seu quarto. Na verdade, apenas Shinji estava acordado, tentando arrumar a bagunça o mais silenciosamente possível, já que suas colegas de apartamento estavam dormindo.

A pequena sala era geralmente um desafio. Alguém desavisado poderia se perguntar como se fazia tanta desordem em um espaço tão pequeno. Shinji, porém, já tinha se adaptado aos costumes da casa, e sabia onde esperar uma lata amassada, outra ainda com um pouco de cerveja (coisa rara), e ainda onde tinha ido parar o cinzeiro que a Doutora tinha usado. Nenhuma experiência anterior, porém, pôde preparar o rapaz para o que estava no canto da televisão.

Ali havia um livro, ou melhor, um caderno, recheado de caracteres estranhos. Shinji apertou a vista para identificar o objeto e, conseqüentemente, seu possuidor. Havia uma escrita indecifrável. "Não, agora consigo reconhecer", ele pensou. Eram caracteres romanos desenhados à mão. Não eram como os em letra de forma, como estava acostumado a ver nos letreiros, cartazes e na tela do computador. Chamou-lhe a atenção ainda mais por ter sido recente uma experiência sua, em que foi obrigado a escrever em inglês num papel, para uma prova poucas semanas atrás. "Realmente, eu não consigo escrever assim em inglês", ele pensou, ao se lembrar do vexame daquela prova que nem ele conseguia ler depois. Podia, portanto, ser de Misato ou de Asuka. Tentou localizar algum sinal que pudesse identificar a dona do caderno, mas as letras eram muito diferentes do que estava acostumado a ver em japonês. Kanas-garranchos seriam de Asuka, enquanto Kanjis em abundância, delicados e firmes, seriam de Misato. Mas aquilo não era japonês. Pensando bem, não era inglês também. Uma palavra chamou a atenção. Esse, agá, i, ene, jota, i. Esse era o jeito de escrever seu nome em letras romanas! Outra palavra. Dê, u, eme, outro eme, ká, o, pê, éfe, .... "Já sei!". Estendeu as mãos para fechar o caderno, antes que sua tempestuosa dona desse por falta dele.

-Ai! - exclamou, ao sentir a forte pancada na cabeça.

- Seu idiota! - a ruiva falava, raivosa - Você não é capaz de respeitar a privacidade de uma garota? - Outra pancada na cabeça do pobre Shinji.

- S-sinto muito... - esfregava a cabeça dolorida.

- E vai sentir muito mais ainda! O que você leu?

- Nada, eu juro!

"Como ela espera que eu leia alemão?" pensou o rapaz.

- Como, nada? Você ficou um tempão ajoelhado aqui, olhando meu diário!

- Mas eu não entendi nada!

Outra pancada na cabeça. Dessa vez mais forte. Foi seguida de um "Dummkopf!", vários passos raivosos e uma porta batida em seu portal.

- Boa noite, também - Shinji esfregava sua cabeça ainda mais dolorida. "Por que Asuka escreveria meu nome no seu diário? Acho que a outra palavra também se referia a mim". Balançou a cabeça, logo antes de se levantar.


A ampla sala permanecia imersa na costumeira penumbra. Um ou outro reflexo da luz que se permitia entrar pela janela possibilitava ver estranhos desenhos no chão e no teto. No centro, um dos poucos objetos era uma impressionante mesa metálica, sobre a qual, ao invés das informações de sempre, seja em papel, seja na tela holográfica que dela se pode projetar, estava um simples tabuleiro de Go. De cada lado do tabuleiro, dois homens compenetrados se sentam em suas cadeiras, traduzindo por suas posturas uma tensão que nem sempre se relaciona com o jogo.

- É a sua vez, Fuyutsuki.

- Hã? Ah, o jogo!

Durante os longos jogos de Go, os comandantes da NERV conversam sobre os fatos e destinos da organização. O vice-comandante adicionou mais uma pedra ao tabuleiro, enquanto falava.

- Estava pensando em quem poderia ter feito isso... Se SEELE quisesse esse material, poderia ter simplesmente pedido, não?

- Creio que não. Embora não tenham pedido um relatório sobre a autópsia de Shamshel, suponho que eles esperavam algo. - respondia o sombrio homem - Pois que esperem!

- Os homens que interrogamos não conheciam as motivações dos compradores. Mesmo tendo citado vários nomes, continuo achando que são meros testas-de-ferro para um único interessado. Mas quem iria querer quase uma tonelada de tecidos de Ramiel?

- Teremos que descobrir. Embora o fato em si não afete nosso cenário, precisamos nos precaver.

O comandante adicionou sua pedra ao tabuleiro. Kouzo franziu a testa.

- Esse material todo... roubado bem debaixo de nossos narizes. E só agora é que descobrimos...

- É sua vez.

O vice-comandante olha pensativamente para o tabuleiro. Entre os dedos, a peça a ser colocada. Na fronte, a indecisão de onde colocá-la se confunde com a linha de pensamento que acalentava.

- O que diremos aos outros?

- Apenas o necessário.

 

 

Shinji dormia o sono dos justos. Ressonava suavemente em seu futon. Tinha a prazerosa consciência do repouso que estava gozando. Parecia até flutuar sobre as cobertas. Abriu os olhos. Estava realmente flutuando! Pela tênue iluminação que entrava pela janela, que não estava sozinho: centenas de corpúsculos esbranquiçados boiavam ao seu redor, no fluido turvo que preenchia seu quarto.

-Sangue! Este lugar tem cheiro de sangue!

Em desespero, flutuou até suas gavetas. "Mas a porta fica do outro lado!" pensou enquanto abria a gaveta mais alta. De lá saiu uma melancia, flutuando até suas mãos.

- Uma melancia? Como as do Kaji?

A melancia era quase perfeitamente esférica. Parecia pesada em suas mãos. Por que, então parecia flutuar naquele... fluido... que estava no lugar comumente ocupado pelo ar de seu quarto. Era verde, com raios quase retos percorrendo sua superfície em um tom de verde pouco mais claro que o do resto da casca. O rapaz gira lentamente a fruta, admirando os desenhos da superfície, quando percebe que as linhas formam o desenho de seu próprio rosto. E então a melancia-Shinji fala:

- Nossa vida não podia estar em melhores mãos!

Um borrão. Poderia ter se passado um segundo ou uma vida. E o borrão foi interrompido quando...

A melancia se rompeu. Seu interior era, como esperado, vermelho. E o vermelho se espalhou lentamente através do líquido sujo que o cercava. Aos poucos, foi ocupando todo o quarto. Shinji largou a fruta, arfando, enquanto o cheiro acre de hemácias preenchia seu olfato. Caiu para trás, e sentiu como se sua cama estivesse muitos metros abaixo. O chão/cama parecia sempre se aproximar, sem nunca chegar. E o vermelho ainda o sufocava. Após o que pareceu uma longa queda, Shinji acordou, ainda ofegante.

- Ainda sinto cheiro de sangue- murmurou. E lembrou-se de ter dito essas palavras no leito do hospital, após o combate com o 12° anjo.

Shinji levantou-se e foi silenciosamente para o banheiro. Queria tirar da boca aquele gosto de sangue, LCL, ou seja lá o que fosse aquele líquido do sonho. E como fazia calor! Ele estava bastante suado. Após escovar os dentes, resolveu lavar o rosto. Tirou a camisa úmida de suor. E molhou o rosto, pescoço e braços. Quando veio o alívio esperado, pensou em finalmente acender a luz. Como que em resposta a sua intenção, a luz do banheiro se acendeu. Foi a única coisa que percebeu antes do berro de Asuka.

- Seu pervertido! - gritou raivosamente - Como você fica tirando a roupa no escuro assim?

Shinji olhou pensativamente para o chão. Já devia ter se acostumado com essas explosões de Asuka. Mas não conseguia entender por que tanta raiva, por um motivo tão pequeno.

- Me desculpe.

- Pára com isso e sai daí! Eu quero usar o banheiro, baka!

Pegando a camisa caída no chão, o rapaz passou por Asuka sem uma palavra e foi para a lavanderia deixar a peça usada.

- E nada de pensamentos sujos comigo, hein?

- "É... Agora que ela falou nisso..." Shinji pensou, ao se dirigir para seu quarto "... bela camisola... e também... Shinji, deixa disso!" se auto-repreendeu, meneando a cabeça.

 

 

Sala de conferências da NERV, dia seguinte. Todo o alto comando presente. O tenente Hyuga encerra a pequena palestra que revisava os eventos dos últimos dias:

- ... Em resumo, é simplesmente coincidência demais: um padrão laranja e um azul na mesma região, sendo que o azul relampejou durante o transporte da Unidade 3 até aqui. Desde então, não temos mais informações.

- Podemos interceptar o anjo lá mesmo? - perguntou Misato

- Não. - respondeu Ritsuko - Tanto o padrão laranja de algumas semanas atrás quanto o azul de antes de ontem foram muito breves. O Magi não conseguiu localizar exatamente o anjo, e, portanto, só podemos aguardar.

- Vamos mandar a NERV de Beijing investigar o caso, bem como a relação, se é que existe, com a epidemia da Manchúria. Quero todos em alerta amarelo aqui na central a partir de agora. Dispensados - decretou Gendo.

Assentindo, Makoto Hyuga e as duas mulheres se afastam da sala, deixando Gendo e Fuyutsuki a sós.

- O décimo terceiro chegou - diz uma voz fria, de trás de suas mãos enluvadas.

- Mas esse comportamento está muito estranho. Raras vezes foram localizados anjos fora do Japão.

- De fato. - a expressão aparentemente imutável daquele barbudo deu um sinal de profundo aborrecimento, perceptível apenas por quem o conheça há muito tempo, como Fuyutsuki - Esperava que Bardiel atacasse a Unidade 3 durante o vôo. Por isso ordenei que os testes fossem em Matsushiro.

Kouzo franziu a testa. "O que mais esse ... homem... está escondendo?"

 

 

Misato e Ritsuko andavam lado a lado nos corredores da NERV. Enquanto se dirigiam a seus postos de trabalho, conversam:

- Como é que nós não conseguimos localizar as ocorrências na China? - pergunta Misato, bocejando.

- Se espera que todos os ataques ocorram em Tokyo-3, então nossos sensores são mais precisos aqui. Esse caso é um pouco semelhante ao do 6° anjo, que só descobrimos quando ele atacou a frota do Pacífico, onde estavam a Unidade 2 e Asuka. Nossos satélites apenas detectaram as ocorrências, mas não tiveram tempo de triangular sua localização exata. Misato, você está bem?

- Claro, claro. - bocejou novamente- Eu acho que me excedi um pouquinho ontem...

A cientista meneou a cabeça. Misato provavelmente encheu a cara de novo. "Ora, eu estava lá, sua alcoólatra. Eu vi o que 'pouquinho' foi esse!". Guardou para si o pensamento.

- Mas só uma ressaca não me deixaria assim. - a mulher de cabelo roxo parecia adivinhar os pensamentos da amiga - Asuka deu uns berros no meio da noite. Acho que com Shinji. Pobre rapaz. Resolvi ignorar um pouco e o barulho passou.

- Preciso lembrá-la que...

- Eu sei, eu sei. Fui eu que escolhi isso. Ritsu, eu devia mandar os dois dormirem com você pra você ver o que é bom pra tosse!

Diante do sorriso demoníaco de Misato, Ritsuko desenvolveu uma gota de suor em sua fronte e resolveu não responder. Depois disso, despediram-se. Como o turno de Misato estava no fim, ela foi tomar as últimas providências antes de voltar para casa. "Alerta amarelo significa vir mais à NERV" pensou ela "Tenho que maneirar na cerveja..."

Chegando em casa, Misato se surpreende com a calma reinante. Shinji estudava, Asuka e Pen-pen viam... Notícias?

- Asuka, não sabia que você gostava de ver notícias na TV! - diz Misato.

- Mas não gosto - explode Asuka - isso tá passando bem no meio da minha novela favorita!

- Shhh! Vamos ouvir...

A voz do locutor se fazia notar, agora que a ruidosa ruiva parou de falar.

- ...O governo chinês colocou em quarentena todos os que estiveram em Arxan nas últimas 72 horas. Embora não haja explicação para o desaparecimento de todos os seus habitantes, as suspeitas recaem sobre alguma doença desconhecida que tenha vindo do deserto. A qualquer momento retornaremos com mais notícias.

- Nunca ouvi falar de uma doença que faça alguém desaparecer - disse Shinji, timidamente.

- Eu já, baka! Você a tem, já que ninguém percebe você! Você desaparece no meio da aula e ninguém sente falta!

Shinji murmura algo e volta a estudar. Misato se limita a balançar a cabeça e seguir seu ritual etílico perante o refrigerador.

 

 

Na Manchúria, o céu estrelado cobre a imensidão vazia do Deserto de Gobi. Uma sombra ogival se move lentamente sobre as rochas e arbustos secos. A sombra se deforma estranhamente, enquanto seu dono move a cabeça para a grande lua crescente. Uma cauda verde e cheia de manchas negras bate na sombra torta, erguendo alguma poeira do chão. Dentro da estranha cabeça, uma mente confusa parece estar também dividida.

- Presenças... Muitas pequenas presenças. Eu as desprezo. Mas as grandes presenças me atraem. Estão longe. Vou comê-las. Mas estou faminto, e portanto, fraco. Como chegar lá?

Os passos vacilantes ziguezagueiam na imensidão, deixando umas poucas pegadas de seus pés de três dedos.

- Eu ... Sinto as presenças! - cobriu seu rosto reptiliano com as mãos escamosas. Quando baixou as mãos, seu bico se abriu para libertar um grunhido assustador, enquanto pensava:

- Tenho que comer... Os pequenos vão servir.

Passos mais certeiros conduziam até a cidade mais próxima.

 

 

Sexta-feira em Tokyo-3. Como de costume, a sala 2-A está preenchida por um zum-zum-zum constante, resultado da mistura da interminável palestra sobre os efeitos do Segundo Impacto sobre o planeta e das interações mal-disfarçadas entre os alunos. A chegada da hora do almoço é bastante comemorada pelos adolescentes. Os "três patetas", como sempre, vão comer juntos.

- Vocês viram as últimas notícias? - começa Kensuke - Parece que não é só em Tokyo-3 que as coisas estranhas acontecem!

- Do que você está falando? - resmunga Toji.

- Da coisa que foi vista lá na China. Quase todos os habitantes de Qiqihar e cidades próximas desapareceram!

- Onde diabos fica Qiqihar?

- Na Manchúria. É uma parte da China que não fica muito longe daqui. Mas o que mais chama a atenção é que alguns sobreviventes dizem ter visto uma criatura muito feia, com pele verde, que comeu todo mundo!

Toji e Shinji se entreolham, com ar gozador.

- Tô falando sério! - explode Kensuke.

 

 

Na mesma tarde, as escassas areias do deserto, embora úmidas, fogem do grande aparelho voador, que ostenta orgulhosamente as insígnias da NERV. Vários trapos do que outrora tinham sido belas tendas são arremessados, junto com uma ou outra pedra de gelo, ao encontro dos caminhões estacionados a certa distância. Vários homens em trajes amarelos hermeticamente fechados carregam uma grande caixa prateada ao descer da aeronave. Eles se dirigem para um buraco no chão cercado por barreiras de quarentena, todas com avisos de contaminação e bem guardadas por homens de preto armados. Os amarelões descem pelo que parece ser uma escada bem construída, levando para dentro do buraco.

Por algum tempo, os únicos sons percebidos são os passos das pesadas botas e a respiração opressiva dentro das máscaras. Os corredores escuros estavam "decorados" com uma estranha trilha cinzenta nas paredes e no teto. Aqui e ali pendiam gavinhas secas, como se as extensas manchas fossem algum tipo de planta morta. Mas a tensão do desconhecido era grandemente superada pela visão tenebrosa de roupas vazias espalhadas pelas salas e corredores. Estavam dispostas como se fossem pessoas. Os investigadores pararam de se agachar ao lado das roupas logo que perceberam que todas estavam vazias. Passaram a apenas fotografar e contar as ocorrências.

Devido à falta de energia, os terminais e computadores estavam desligados. Vários equipamentos estavam fora do lugar, avariados e às vezes cobertos com as misteriosas roupas. Uma das missões dessa equipe de reconhecimento era justamente obter os dados lá armazenados, mas primeiro teriam que garantir a segurança. As poucas anotações que estavam disponíveis eram cuidadosamente catalogadas e arquivadas. Uma ou outra impressão digital era colhida para posteriores investigações. Foi então que uma voz quebrou o silêncio do rádio.

-Capitão! Venha ver isso!

O homem que comandava a operação se dirigiu para uma das salas grandes que havia à direita do corredor principal. Havia um "2" imenso pintado na porta. Lá dentro, sua lanterna captou uma grande quantidade da "planta morta" em diversas posições, pontilhada em vários locais por cacos de vidro. Curiosamente, nesta sala não havia nenhuma das "roupas-fantasma". O responsável pelo reconhecimento da sala entregou um grosso caderno a seu superior. Abrindo-o, viu fórmulas químicas complexas, cronogramas e anotações. Seqüências de DNA estavam anotadas nas beiradas de cada página, com setas ligando-as a certas porções de texto.

- Quem se daria o trabalho de escrever num caderno, se tinha esses computadores à sua disposição? - perguntou a ninguém em especial.

- Eu não entendi nada, capitão.

Através da máscara, o outro homem pôde ver uma testa se franzindo perante a confusão de letras manuscritas. Realmente, não era um língua que ele conhecesse. Era ocidental, com certeza, mas não era inglês. Pôde reconhecer uma ou outra palavra de francês, o que indicava que poderia ser uma língua latina. Mas foram os katakanas, ou melhor, o nome que eles descreviam, o que fez seus olhos se arregalarem.

- Assuma o comando. Procedimento de busca padrão. Separe este caderno dos outros. - disse, tendo devolvido o volume logo antes de dirigir seus passos rápidos em direção à saída.

Fora da área de risco, tira sua máscara e pede um celular via satélite ao leão-de-chácara mais próximo.

- Aqui é o capitão Ling, da NERV-China. Me ligue com Tokyo-3. A Dra. Akagi precisa saber o que encontramos.

A boa notícia: Os testes de sincronização acabaram mais cedo hoje.

A má: Hoje, excepcionalmente, haveria treino físico após os testes.

- Pô, assim não vale! - Touji estava mais abatido que irritado - Achei que os treinos nunca coincidissem com esses testes de merda!

- Calma, Touji! - Shinji, já acostumado com a rotina, tentava pacificar o companheiro - Você acabou de chegar aqui e já tá reclamando?

- Os palhaços aí não vão calar as bocas, não? Vamos para o ginásio logo!

Sem nada dizer, Rei já se dirigia para o elevador. Os outros a seguiam. Ritsuko os observava em silêncio.

- Boa noite, Ritsuko-san - Shinji disse, parando para observar a cansada doutora. - Espero que tenha um bom sono!

- Obrigada, Shinji-kun - Ritsuko foi surpreendida pelo repentino interesse de Shinji - mas eu tenho muito trabalho esta noite ainda. Estão fazendo um upload no Magi, e eu quero conferir os dados mais relevantes ainda hoje. Temos a suspeita de um Anjo se escondendo lá no continente Asiático, e precisamos estar preparados.

- Ah! Boa sorte, então. - Shinji despediu-se, sorrindo.

"Ora, ora..." a doutora pensava "então nosso pequeno Ikari está abrindo um caminho entre seus espinhos... Isso é interessante!". Balançou a cabeça e foi para a ponte monitorar o upload. Nesse momento, ainda não tinha sido confirmada a sua suspeita de que essas notícias, entre outras, provocariam um turno extra da divisão 1 para digerir as informações noite adentro.

Dentro do elevador, Shinji se perdia em seus pensamentos. "Droga! Será que esse sonho tem explicação? Quem pode me ajudar? Pensei na doutora, mas..." sacudiu a cabeça, culpando-se pela falta de coragem de contar para quem quer que fosse, ainda contra a ânsia de compartilhar esse sonho com alguém.

- Que foi, Shinji?- Touji foi o único a reagir à manifestação silenciosa do amigo.

-Hã? Nada, Touji...

-Qualé, cara? Quem você tá querendo enganar?

-Ei, idiotas! O elevador chegou! Vocês vão ficar aí batendo papo?

Essa foi uma de poucas vezes em que Shinji achou boa a intervenção desdenhosa de Asuka, já que a aproveitou para correr para o ginásio.

-Vamos, Touji. Eu sei que do treinamento você gosta bem mais que dos testes de sincronização... - e desapareceu, passando inclusive Rei.

Touji deu alguns passos, semblante refletindo sua confusão interna.

-Ei, palhaço! A lerdeza do Shinji passou pra você?

-Não, demônio! - a agressão tirou o rapaz da letargia - Só estou pensando em como ele está diferente!

Dito isso, ele meneou a cabeça e correu da ruiva. "Espero que o sensei amanse essa megera!" pensou.

 

 

Uma certa estação de trens perto da Nerv. O último trem da noite chegava no momento em que dois estudantes ganhavam acesso ao pátio de embarque.

- Corre, molóide! - Asuka gritava para seu companheiro, já no topo da pequena escada.

- Já vou! - Shinji galgava os degraus com velocidade, mas com uma expressão de dor no rosto - Ui! Ai! Ai!

- Fracote! - Asuka se virou para o trem em desaceleração e pôs-se a correr.

Shinji alcançou o pátio e também correu. Foi o último a embarcar.

Ele logo encontrou Asuka. Olhou bem para ela. Quando ela olhou de volta, já com uma bronca na ponta da língua, ouviu a voz calma e clara de Shinji:

- Por que você não me esperou?

Tendo sido interrompida sua ação anterior, Asuka precisou de uma pausa para retomar sua metralhadora verbal.

- Você estava subindo muito devagar, seu idiota! Você é burro? Queria que a gente perdesse o trem? Queria ir a pé pra casa e passou pela sua cabeça a idéia absurda de que eu, a grande Asuka Langley Souryu, iria acompanhá-lo nisso?

A calma de Shinji se desvaneceu enquanto ele se encolhia diante dos berros de sua colega.

-É-é que eu nu-nunca tinha feito tantas abdominais no mesmo dia...

- MOLÓIDE! Foram só mil!

- Eu preferia o sensei que ensinava outras técnicas - seu rosto estampou a tristeza de sempre - Eu me sentia melhor aprendendo a controlar o Ki...

- NÃO MUDE DE ASSUNTO! MOLÓIDE!

O rapaz se encolheu novamente e não falou mais nada durante o resto da viagem.

 

 

Enquanto isso, nos arredores da cidade, uma explosão silenciosa atesta que os acontecimentos incomuns do dia ainda não terminaram. No centro do que foi a origem do clarão se encontra agora um dispositivo estranho e fumegante. Sua superfície brilhante cobria quase toda a extensão curvilínea do grande objeto. Uma porta nele se abre para deixar sair, entre a fumaça, dois adolescentes bem incomuns...

- Viu só, Trunks, no que deu a gente brincar com as experiências da sua mãe?

- Ah! Goten! Minha mãe nem tava mexendo nisso aqui! Como eu ia saber que ia explodir?

- A gente vai levar a maior bronca quando ela descobrir!

- É mesmo! Vamos esconder a máquina!

Olhando à sua volta, Trunks lança um olhar de estranheza e diz:

- Goten, a gente não tá mais na minha casa... Será que essa máquina era algum tipo de transportador?

- Sei lá. Mas é só esconder ela no bolso. Aí a gente pode usar a técnica do teletransporte que o meu pai nos ensinou e logo a gente volta!

- Tá bom.

Trunks então, pressiona um painel do aparelho que o faz desaparecer numa nuvem de poeira. No seu lugar apareceu uma pequena cápsula.

- Pronto! - disse Trunks, embolsando a cápsula - agora é só pôr no lugar mais tarde, quue ela nem vai notar. Vamos pra sua casa.

- Mas por que pra minha? A gente não tava na tua?

- Sim, mas a gente pode dizer que tava praticando o teletransporte, e não explodindo uma das máquinas da minha mãe!

- Ah! Tá! Vamos localizar o ki da minha mãe.

Ambos os adolescentes se concentram, com dois dedos da mão direita na testa.

- Goten, eu não consigo encontrar o ki da sua mãe. Tem alguém mais forte na sua casa agora?

- Meu pai deve estar lá.

Os meninos passam a procurar o ki de todos os seus conhecidos, sem sucesso.

- Trunks, o que a gente fez? - Goten já estava de olhos arregalados.

- Não sei - Trunks, cabisbaixo, estava de olhos fechados. - Achava que fosse só um carro maneiro... Mas não sei o que aquilo realmente fazia.

- A-a gente p-pode ter mat-matado todo mundo?

Uma pausa desagradável pareceu durar muito mais do que o tempo realmente transcorrido.

- É pouco provável, - respondeu Trunks - pois eu sinto presenças humanas. A única forma de ter acontecido... - o rapaz engoliu em seco - o que você sugeriu... seria a destruição de todos. E isso não aconteceu.

- É mesmo - o outro jovem soltou um suspiro de alívio - eu também percebi. Mas o que aconteceu, então?

- Bem... Você mesmo sugeriu que isso pode ser um transportador. A gente pode estar em outro planeta. - Trunks respirou fundo o ar da noite nublada - Mas não parece diferente da Terra.

- Olha só... - Goten pôs a mão no ombro do amigo - A gente tem que bolar um jeito de voltar. Mas esse papo todo me deixou cansado... - olhou para o céu - E, não sei por que, esse lugar me dá arrepios.

- Tem razão. Me sinto como se estivesse sendo vigiado

Muito acima de suas cabeças, um enorme satélite geoestacionário parecia dar razão a Trunks.

- Trunks, eu sinto uma grande quantidade de pessoas naquela direção - Goten apontou para as colinas não muito distantes - Podemos conseguir abrigo lá.

- Está bem. Vamos.

Os garotos flutuaram no céu e começaram sua viagem aérea até a megalópole metálica cujo nome - eles não poderiam saber - é Tokyo-3.

 

 

Em local ignorado do ciberespaço, um ambiente de escuridão parecia dar a seus ocupantes uma ilusão de ausência de limites. Sem limites também era a ambição dos que, representados por vários monolitos negros, dispostos em círculo, nesse ambiente se reuniam.

Seele-5: Deveríamos ter intervindo mais cedo.

Seele-2: Mas foi nossa intervenção que acarretou os acontecimentos que ora nos estorvam.

Seele-3: E essa intervenção foi aprovada por este comitê com unanimidade.

Seele-2: Minhas ressalvas estão registradas na ata. Já disse o que tinha que dizer.

Madrugada. Mesmo sabendo que para vários dos participantes da reunião o dia ainda não acabou, a escuridão virtual confere com a reinante ora no Japão. Será essa escuridão maior que a que existe no coração humano?

Seele-4: Aqueles bandidos... Não deveríamos tê-los subestimado!

Seele-6: Não supúnhamos que alguém além de nós teria acesso a esse material genético.

Seele-5: Ainda bem que a nossa tecnologia não foi comprometida. Imaginem o que eles fariam com ela...

Seele-1: Parem. Agora não é hora de reclamar, mas de agir. E vocês sabem muito bem qual é nosso modo de agir, e do que precisamos para tal.

Um outro monolito negro aparece no centro do círculo. Ao contrário dos costumeiros, esse não tem inscrições. Nem mesmo o "Sound Only" de sempre.

Seele-1: Nossos amigos se excederam em suas atividades, o que pode representar um risco ao plano que traçamos. Sua missão é descobrir como isso foi possível, e se há alguma forma de reverter o quadro para o nosso favor.

Operativo (com voz disfarçada eletronicamente): Compreendo. E se a NERV tiver acesso aos dados?

Seele-1: Deixe. Eles terão que enfrentar a ameaça em primeiro lugar. Nós decidiremos depois o que fazer. Reporte a este comitê todas as informações relevantes que encontrar daqui a dois dias. Caso surja algo crítico, e só então, nos contate antes. Dispensado.

O obelisco do operativo desaparece sem deixar vestígios.


Notas do Autor:

Bem, esse foi o primeiro capítulo. Acreditem, a primeira coisa que escrevi desse fic foi para a gaveta, de tão ruim que ficou ^_^;
Mas não foi trabalho inútil! Serviu para delinear na minha cabeça um pouco da "mitologia" desta série.
O que era o "segundo" capítulo evoluiu "pokemonicamente" para a obra que está agora diante de vocês ^_^
Como foi dito neste capítulo, isso se passa pouco depois do 12° Anjo (aquele Mar de Dirac que engoliu a Un.01). É aí que as coisas se tornam bem divergentes do que a série apresentou (embora haja precedentes que também são diferentes, eles serão comentados pelos personagens quando for oportuno).
Sobre DBZ, os meninos foram pegos cerca de 7 anos depois da saga de Boo.
Maiores detalhes no próximo capítulo.
Até lá!

Capítulo 2

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