A rede digital na rede educacional:
um reencantamento

Luiz Carlos Neitzel
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O ser humano, desde os primórdios, procurou desenvolver utensílios que lhe facilitassem suas tarefas rotineiras. Durante sua evolução, vários acontecimentos assinalaram profundamente sua maneira de agir, de enfrentar os desafios, dando por vezes, novo curso a sua jornada. A descoberta do fogo, do ferro, da escrita, e tantos outros inventos e tecnologias foram surgindo frente às dificuldades que apareciam pelo caminho.

Debruçado sobre seus projetos, o homem avança destemidamente e transforma o presente e o futuro. Podemos observar que isto já aconteceu com vários processos evolutivos, sem que houvesse uma simples substituição, mas um "deslocamento de centros de gravidade." Tomemos como exemplo o automóvel, apesar de todo seu progresso tecnológico, coexiste com a carroça, seu antecessor longínquo, cada qual empregado da melhor forma por seu usuário.

Por isso, acredito em um movimento gerado, não forçosamente, no qual não há a substituição drástica do antigo pelo novo, mas sim, na existência de uma espaço onde ambos se harmonizam, coexistem. As tecnologias se sucedem uma a uma e o novo de hoje é fruto de um "amadurecimento", de uma evolução que se desenvolve progressivamente. Há um processo evolutivo das sociedades humanas, o novo de hoje é o avançado do ontem e o ultrapassado do amanhã. Dessa forma, o modo de vida das pessoas vai sendo modificado gradativamente.

Não há como ignorar, nem como evitar tais mudanças, pois estão tornando-se cada vez mais presentes no nosso dia-a-dia, seja através da televisão, do rádio, da telefonia e principalmente da informática. Lógico que não podemos afirmar que atinge a todos com a mesma intensidade e freqüência. Porém, observa-se que a informática avança com impetuosidade e velocidade, nunca observada em outras tecnologias já existentes anteriormente. Como diz Hobsdbaw, "a ciência, hoje, de fato altera o cotidiano das pessoas. Coloca-se na forma de tecnologia em todos os espaços, transformando o ritmo da produção histórica da existência humana."

A informação possui agora, comparativamente, a importância que a terra já possuiu durante o feudalismo, quando os grandes latifundiários, graças ao seu poderio, influenciavam e intervinham diretamente na política do Estado. Ou ainda, pensemos na importância representada pela escrita ao ser introduzida por civilizações como a Sumeriana, a Egípcia e a Chinesa. Ela passa a ocupar o espaço privilegiado no qual se assentava a tradição oral, substituindo a efemeridade pela permanência, introduzindo novos hábitos. A partir de então, o homem não precisou mais se preocupar com a questão do apagamento das memórias, suas lembranças não mais dependiam da transmissão oral, mas passaram a ser registradas pela escrita. Dessa forma, "divide-se a História em antes e depois do surgimento da escrita."

O homem, ainda não satisfeito, continuava a sonhar buscando formas de comunicação que aproximasse mais facilmente culturas e divulgasse o saber com maior rapidez e amplitude. Ele se empenhou na popularização da escrita. Em 1450 despontou a imprensa.

"Se o surgimento da escrita marca o início da história, a invenção, na Europa, da composição por tipos móveis e da técnica de imprimir ilustrações com chapas de metal gravadas, vai promover radicais mudanças no modo de pensar e de viver da sociedade. A divulgação do conhecimento se torna acessível a cada vez um número maior de indivíduos."

A imprensa foi, durante muito tempo, a principal tecnologia intelectual. Neste século, ela teve que dividir terreno com outros meios de comunicação: o rádio, o telefone, a televisão e, atualmente, a informática é a entidade que concentra maior capacidade de troca de informações com rapidez e segurança.

Na sociedade globalizada, em que tempo e espaço não seguem mais uma linearidade, as inovações tecnológicas evoluem a uma velocidade estonteante, de forma que acompanhar tais novidades, torna-se tarefa quase que impossível. No momento em que o ser humano se "apropria" de uma (parte da) "técnica", ela já foi substituída por outra, mais avançada, e assim sucessivamente.

Essas mesmas tecnologias, especialmente aquelas do campo das comunicações, vêm provocando intensas mudanças na vida e no cotidiano das pessoas. Criam-se novas formas produtivas, grupos de pesquisa, trabalhos a distância e produções compartilhadas. O avanço da tecnologia promove um redemoinho cultural nas interrelações de todos os sistemas do planeta, provocando uma reorganização, um redimensionamento nas relações dos indivíduos na sociedade.

A informática superou os outros meios de comunicação, principalmente pela velocidade em que as coisas se realizam. Neste universo, o básico é buscar e saber usar a informação. É mais importante adquirir habilidades para manusear um catálogo, uma enciclopédia, um dicionário, um CD-ROM, uma gramática, a Internet, do que a memorização de regras.

"Uma coisa é certa: vivemos hoje em uma destas épocas limítrofes na qual toda a antiga ordem das representações e dos saberes oscila para dar lugar a imaginários, modos de conhecimento e estilos de regulação social ainda pouco estabilizados. (...) uma nova relação com o cosmos, um novo estilo de humanidade é inventado."

Podemos afirmar que estamos vivendo uma "era digital", na qual transações comerciais são realizadas, pesquisas são disponibilizadas e discutidas. Grandes volumes de dados são transmitidos, transferidos de lugares distantes em questão de minutos, transformando o planeta numa imensa teia global de redes de comunicações das mais diversas.

Na grande maioria, essas mudanças só se fazem possíveis pela rápida evolução dos computadores, que desempenham funções cada vez mais diversas. Isso para muitos assusta, pois é um dos poucos inventos do homem que não possui uma função fixa. Sua utilização depende de quem se serve desta e do que se quer da mesma. LÉVY já diz que "a técnica em geral não é nem boa, nem má, nem neutra," então podemos dizer que tudo depende do uso que se faz da mesma, pois a transformação do mundo humano, na verdade, se dá pela intervenção do próprio homem.

O computador, inicialmente, não foi concebido para ser utilizado como o é hoje.

Pensou-se, a princípio, em uma máquina capaz de realizar cálculos complexos e reter uma grande quantidade de dados. Eles só eram manipulados por pessoas altamente especializadas em suas linguagens de programação, que não eram padronizadas, o que dificultava muito a sua utilização por outras pessoas que não fossem seus programadores. Eles serviam, principalmente, às grandes corporações e fundamentalmente ao Estado, para uso militar.

Em meados da década de setenta institui-se uma cultura da informática, na qual, segundo LÉVY,

"uma pitoresca comunidade de jovens californianos à margem do sistema inventou o computador pessoal. (...) Não o objeto definido simplesmente por seu tamanho, não o pequeno computador de que os militares já dispunham há muito tempo, mas sim o complexo de circuitos eletrônicos e de utopia social que era o computador pessoal no fim dos anos setenta: a potência de cálculo arrancada do Estado, do exército, dos monstros burocrático que são as grandes empresas e restituída, enfim, aos indivíduos."

Graças à ousadia desses grupos, a presença do computador, dos recursos informáticos, em geral, está atualmente nos atos mais corriqueiros das pessoas. Por exemplo, podemos citar os saques e pagamentos efetuados via caixas eletrônicos, leitores ópticos — que exibem os preços das mercadorias nos supermercados —, consultas em terminais de informações nos shopping-centers. Sua colocação em locais públicos é cada vez mais crescente e nos parece irreversível. Estamos tão habituados a estes que não nos apercebemos do uso de toda essa tecnologia no nosso dia-a-dia.

As pesquisas, as viagens espaciais, a genética, a medicina, enfim, os campos mais diversos da ciência estão palmilhados pela presença da tecnologia informático-mediática. São serviços que, para obterem um resultado profícuo, necessitam desta. As previsões

meteorológicas estariam seriamente comprometidas se não fosse a presença de supercomputadores. Essa é uma das áreas que mais os utiliza atualmente. O computador, assim, se faz presente na produção e difusão de todas as formas de conhecimentos da humanidade vigente, sua freqüência é quase que obrigatória.

Entretanto, ao mesmo tempo em que se divulga, se afirma que a informação no mundo globalizado é uma das maiores riquezas da humanidade, temos que coabitar com um elevado índice de analfabetismo, isto é um paradoxo. Este é mais acentuado, principalmente nas classes menos favorecidas da população. Assim como a Ferrari divide espaço com a carroça, a informática divide espaço com o analfabetismo — verdadeiro testemunho do desdém por uma das mais antigas formas de comunicação, a escrita.

Como já vimos, existem tecnologias de comunicação que disputam o mesmo território. Elas são utilizadas pelas sociedades globalizadas, ao mesmo tempo em que a técnica da oralidade ainda é praticada em muitas culturas como único meio de comunicação, única forma de difusão de seus conhecimentos e de suas idéias. Essa questão nos faz pensar na necessidade da "imbricação, na coexistência e interpretação recíproca dos diversos circuitos de produção e difusão do saber..."

A construção do conhecimento passa por um processo de transformação diante de todas as modernas tecnologias. Esse novo modo de comunicação altera a forma do sujeito receber e interagir. À medida em que a sociedade evoluiu, surgiram novos meios de

comunicação, muitas instituições educacionais procuraram se apropriar desses meios de conhecimento, entretanto, outras colocaram-se à margem desse processo.

Algumas redes de ensino preocuparam-se em equipar suas unidades com retro-projetores, vídeos cassetes, televisões, parabólicas e atualmente, concentram esforços na instalação de salas de informática. Gerou-se uma polêmica: muito se discute e se fala dos métodos de ensino aplicados, experimentados e substituídos por outros processos em voga, em dado momento histórico, sem ter, antes mesmo, colhido os resultados de propostas anteriormente aplicadas. Forma-se, assim, um eterno substituir de métodos, sem alcançar-se uma conclusão plausível sobre os benefícios representativos que estes trazem ao processo de construção do conhecimento. Lembramos que a informática veicula os conhecimentos já elaborados, conceitos antigos, possibilitando novas construções a partir destes. Buscamos em LÉVY o fortalecimento dessa idéia: "O desenvolvimento de um novo exército operatório não pode ser dissociado da atividade de reinterpretação de um material preexistente (...). Em cada caso, uma atividade manipuladora, tateante e interpretativa faz com que materiais já existentes penetrem em novos domínios de uso e significação."

Mesmo com todo esse esforço de modernização, existe uma resistência por parte de certos professores em fazer uso dessa tecnologia em sala de aula, preferindo apenas o quadro negro e longas horas de oratória. GATTI discorre a esse respeito:

"Sempre que uma inovação surge no horizonte dos educadores, observa-se, em alguns, deslumbramento em função das possibilidades aventadas por essas inovações e, em outros, ceticismo crônico provocado quer pela decepção que professores, diretores e técnicos em Educação vêm acumulando com as políticas e propostas de inovações educacionais mal-implementadas ou descontinuadas pelos sucessivos governos, quer pela acomodação natural que temos a nossas funções e pelo incômodo que inovações podem provocar, na medida em que estas exigem alterações de comportamentos e uso de espaços e tempo já bem cristalizados."

Dessa forma, o educando chega às instituições educacionais e encontra o mesmo ambiente, salvo algumas exceções, que seus pais ou avós encontravam quando chegavam às suas respectivas instituições educacionais.

Muitos educadores ainda não entenderam porque a criança que chega à escola, logo se desgosta da mesma. Na verdade, esta não se acabrunha com o ambiente educacional, mas sim com os métodos de ensino. Precisamos pensar na escola, como esta era em épocas passadas, mesmo poucas décadas atrás, e por quais evoluções passou. Além disso, necessitamos debater sobre as posturas e condutas do professor na sociedade a qual estava inserido no passado, e como ele vem se posicionando na atualidade.

Naquela época, esta era o ambiente da sociedade no qual as idéias mais avançadas, os conhecimentos mais atualizados eram vistos e apresentados aos alunos. A escola constituía-se, dessa forma, num espaço atraente onde o estudante tomava contato com o que de mais novo havia. Estes se deparavam com conhecimentos jamais presenciados até aquele momento de suas vidas. A instituição educacional — cujos instrumentos pedagógicos, eram apenas os livros, tidos como fonte geradora, além do giz e do quadro negro — era o centro gravitacional do conhecimento até então produzido pelo homem.

O professor era o indivíduo que detinha grande parte desses saberes, uma pessoa que desempenhava um papel importante na comunidade: fonte de referência dos conceitos e das noções em diversas áreas do conhecimento. Porém, tudo isso mudou, "a muito que o saber se acumula, cresce e fermenta, se altera e se estraga, funde e bifurca em uma grande rede mista, impura, fervente que parece pensar por conta própria." Com o volume de informações circulando presentemente, ninguém consegue ser detentor do saber, há de se refletir sobre esta realidade flutuante.

Vivemos hoje em uma sociedade com uma cultura mediática/mediatizante, onde as

mídias desempenham, uma função de formadoras de opiniões, alteram hábitos e costumes, influenciam nas mais distintas áreas, seja do conhecimento, da economia, do entretenimento... A criança de hoje, já vem com uma carga cultural de imagens que seus antecessores não possuíam. As mídias estão presentes no dia-a-dia das gerações atuais, principalmente a televisão, com sua diversidade de cores, sons e movimentos:

"A criança chega à adolescência depois de ter assistido a 15 mil horas de televisão e mais de 350 mil comerciais, contra menos de 11 mil horas de escola. A televisão é agradável, não requer esforço e seu ritmo é alucinante. É sua primeira escola. Quando chega aos bancos escolares, já está acostumada a esta linguagem ágil e sedutora. E a escola não consegue chegar perto dessa forma de contar. A criança julga-a a partir do aprendizado na televisão."

Não se conseguirá a atenção de um jovem ou criança nesse meio apenas com oratória, leitura e escrita. Ela já conhece outros meios mais atrativos de aprender. "Assistir" a uma televisão é muitas vezes, bem melhor do que "assistir" a um professor, convenhamos. Não que as mídias substituam o papel exercido por este, mas elas modificam a forma pela qual vemos o mundo.

Nesse novo ambiente, o aluno pode ser o dono de seu tempo, construtor de sua aprendizagem, e o professor exerce o papel de "ponte", orientando a busca das informações desejadas pelos seus alunos. Tem-se que partir para uma educação mais voltada a responder e a atender as dúvidas e os anseios do educando, tendo como espinha dorsal de trabalho, os objetivos voltados à formação de cidadãos reflexivos, conhecedores de seu potencial, de seus limites e respeitadores das normas que regem o coletivo, o social. Como o estímulo é natural, cabe ao professor um planejamento adequado, objetivos bem definidos para evitar um desvio de metas:

"A educação escolar precisa de uma nova perspectiva, mas esta não se reduz apenas à utilização de novas tecnologias. A midiatização do processo pedagógico garante meios, instrumentos versáteis e importantes, porém, por si só não muda a essência da ação pedagógica. A utilização de novas tecnologias pode se reduzir apenas à mudança na forma. A tecnologia não contém a verdade, não é algo incontestável (...). A educação tem por função a comunicação e a tecnologia é uma ferramenta básica."

Como a cultura da imagem é uma característica das novas gerações, ela deve ser explorada na escola. As notícias, as novidades do planeta estão expostas a todo momento a quem quiser assistir a uma televisão, por exemplo. Todavia, muitas vezes, a instituição educacional faz mau uso dessas ferramentas educacionais. Pouco explora, por exemplo, o potencial informativo e a qualificação atrativa da televisão como veículo da cultura imagística. Com a introdução da informática, do computador e da Internet na sala de aula, teremos que nos policiar para não cairmos no mesmo erro:

"É certo que a escola é uma instituição que há cinco mil anos se baseia no falar/ditar do mestre, na escrita manuscrita do aluno e, há quatro séculos, em um uso moderado da impressão. Uma verdadeira integração da informática (como do audiovisual) supõe portanto o abandono de um hábito antropológico mais que milenar, o que não pode ser feito em alguns anos."

A informática é um campo vasto e riquíssimo. Podemos utilizá-la como instrumento de comunicação, de pesquisa, de produção de conhecimento, utilizando sua interface ideográfica, característica das linguagens simbólicas. No computador, apresentam-se através de ícones, signos que simbolizam de forma gráfica objetos ou conceitos representados por aquela determinada imagem.

Podemos renovar a forma como a pesquisa vem sendo efetuada no sistema educacional. O caráter comunicativo da Internet altera totalmente esse processo de descoberta. Ao utilizá-la, o usuário se mantém em contato direto com os meios de comunicação da sociedade. Ao estar conectado ao mundo, o indivíduo tem assim acesso a tudo o que se produz no planeta e está disponibilizado na rede mundial de computadores. Voltaríamos, assim, a ter na escola, um ambiente rico de informações, de assuntos históricos e atuais, com capacidade de atender ao anseio natural que todo ser humano possui de buscar o novo.

A Internet se apresenta como uma mídia promissora devido às suas características abertas. Sem dono, ela permite a qualquer pessoa criar sua própria página, na qual difundirá seu conhecimento, sua produção. O uso da Internet é possibilitado via computador, modem, telefone e uma conta de acesso à rede mundial. Essa é uma ferramenta tecnológica de comunicação global. Com esse recurso, a escola abre as portas de um universo mágico aos seus alunos, como também derruba as fronteiras do tempo e do espaço. MORAN, já havia dito em 1995 que "as tecnologias permitem um novo encantamento na escola, ao abrir suas paredes e possibilitar que alunos conversem e pesquisem com outros educandos da mesma cidade, país ou do exterior, no seu próprio ritmo."

Frente a essas possibilidades, amplia-se o universo de pesquisa em todas as áreas do conhecimento humano. Tem-se, a partir de então, um meio de capturar textos, sons, imagens, vídeos, programas sobre temas específicos, como também exibir toda a produção realizada.

"Mesmo sem ser pirata ou hacker, é possível que alguém se deixe seduzir pelos dispositivos da informática. Há toda uma dimensão estética ou artística na concepção das máquinas ou dos programas, aquela que suscita o envolvimento emocional, estimula o desejo de explorar novos territórios existenciais e cognitivos, conecta o computador a movimentos culturais, revoltas, sonhos."

Constitui-se a rede em uma ferramenta atrativa ao estudante, pois é interessante a navegação em suas páginas hipertextuais, a descoberta de novos endereços, novos sites. A Internet também propicia a possibilidade de comunicação com colegas, pessoas desconhecidas, que tanto podem estar próximos como nas maiores distâncias geográficas, as quais já não se constituem mais em um problema para a comunicação.

Não há mais como negar a necessidade da utilização dos meios tecnológicos atuais no ambiente escolar. Estes podem ser empregados como uma forma de aproveitamento da "cultura da imagem" a qual nossas crianças e jovens possuem. Eles já não se detém mais no processo "ensino-aprendizagem" tradicional, no qual o professor, utilizando-se basicamente da oratória e da escrita, repassa seus conhecimentos para os alunos. Situação em que, para aprender, copiam e decoram conteúdos, continuando-se a exigência de que o aluno seja um "banco de dados".

É notório que o primeiro passo para que haja uma aprendizagem significativa é a disposição do indivíduo para o processo. Ele precisa estar aberto, interessado, curioso com relação ao assunto a ser tratado. Na rápida experiência que pude vivenciar em um laboratório de informática educacional, observei durante esse período, o interesse demonstrado pelos alunos antes e durante a utilização dos equipamentos. Uma atenção sempre presente ao pulpitar de cores, aos sons, aos textos e aos movimentos na tela do monitor, apesar de que os softwares em questão não apresentavam grandes oportunidades de interatividade realmente.

Tratavam-se de tutoriais e alguns jogos, os quais em meu entendimento, são úteis apenas como uma iniciação à utilização dos microcomputadores, pois restringem-se basicamente, a uma tarefa de repetição de estímulo resposta, as quais já vêm prontas, devendo ser exatamente aquelas pré-determinadas, caso contrário, o programa não as aceita. Apesar dessas limitações, o interesse pela informática renovou o ambiente escolar e motivou a grande maioria a fazer diversas descobertas.

Encontramo-nos em um desses momentos históricos em que podemos "(...) usar o computador como prótese da inteligência e ferramenta de investigação, construção, representação, verificação, análise e produção de conhecimento." Essas tecnologias de comunicação nos induzem a refletir e nos preparam para uma "sociedade planetária", onde os seres deverão ser capazes de se comunicar e dialogar num mundo, ao mesmo tempo interativo e interdependente. "Vivemos hoje num mundo globalmente interligado, no qual os fenômenos biológicos, psicológicos, sociais e ambientais são todos interdependentes. Para descrever esse mundo apropriadamente, necessitamos de uma perspectiva ecológica que a visão de mundo cartesiana não nos oferece."

Com a evolução para sistemas sociais mais complexos, as técnicas que se baseavam em conhecimentos e recursos locais evoluíram para sistemas globalizados. Elas alteraram conceitos de produção, trabalho e conhecimento compreendidos como produção inteligente do ser humano. Cabe à escola "(...)desenvolver novos hábitos intelectuais de simbolização e formalização do conhecimento, de manejo de signos e representação, além de preparar o indivíduo para uma nova gestão social do conhecimento, apoiada num modelo digital explorado de forma interativa."

Sabe-se que a produção de conhecimento pode se dar também através de práticas reconhecidas pedagogicamente como producentes. A sua utilização não nega a possibilidade de uma "comunhão" com a máquina. Propõe-se a utilização do computador como um elemento auxiliar, uma ferramenta poderosa.

"(...)o computador deve ser utilizado como um catalizador de uma mudança do paradigma educacional. Um novo paradigma que promove a aprendizagem ao invés do ensino, que coloca o controle do processo de aprendizagem nas mãos do aprendiz, e que auxilia o professor a entender que a educação não é somente a transferência de conhecimento, mas um processo de construção do conhecimento pelo aluno, como produto do seu próprio engajamento intelectual ou do aluno como um todo."

Ele possibilita a utilização de recursos multimídia e oportuniza uma produção e crescimento tanto individual como coletivamente, respeitando a diversidade de conhecimento e a capacidade criativa e produtiva de cada indivíduo. "As possibilidades de uso do computador como ferramenta está crescendo e os limites dessa expansão são desconhecidas."

A preocupação básica que ronda o professor é sobre as formas de explorar, incorporar e utilizar as potencialidades desses meios de comunicação informatizados no meio educacional. Preocupação legítima, uma vez que a grande maioria de professores e alunos não tem apropriação tecnológica. E pensando nesta, propomos, passo-a-passo, uma inserção da tecnologia de forma menos traumática.

Pode-se utilizar, inicialmente softwares tutoriais que, de uma forma geral, possuem uma estruturação linear e não permitem a interatividade. Geralmente apresentam estímulos a respostas que já estão prontas, inibindo o espírito criativo do aluno. Porém, têm como característica positiva sua facilidade de uso e seu manuseio auto-instrutivo, o que facilita uma adaptação inicial ao uso dessa nova tecnologia.

Em seguida, tendo-se realizado uma certa apropriação tecnológica do uso dessas ferramentas, pode-se inserir softwares de simulação. Estes, como a própria denominação indica, possibilitam criar situações da realidade na tela do computador. Constituem-se em verdadeiros laboratórios, onde o aluno, em seus experimentos, pode manipular uma série de variáveis que irão influenciar no resultado final. Ele tem a oportunidade de poder observar, passo-a-passo, todo o processo de desenvolvimento da experiência em questão, e ainda conta com o recurso de que a mesma pode ser refeita inúmeras vezes, se necessário.

O próximo passo pode ser o manuseio de softwares de autoria. Neste, o aluno torna-se autor, produz e apresenta a sua produção utilizando-se de todos os recursos multimídia atuais. Pode montar, ele próprio, seus projetos de pesquisa e segundo o conhecimento de seu interesse, ou ainda, conforme o que lhe for proposto. Será de sua competência a forma, aspecto, apresentação e o seu desenvolvimento.

Salienta-se aqui, que não há a necessidade de softwares de autoria requintadíssimos, como por exemplo, do Director ou de qualquer outro nesta mesma linha. Pode-se utilizar um bom editor de textos que possibilite o uso de recursos multimídia, ou ainda, programas de apresentação. Um exemplo seria o PowerPoint do pacote MsOffice97 da Microsoft.

Se houver possibilidades de adquirir um programa de autoria pode-se, entre outros, utilizar o Everest, software da Complex, empresa catarinense. Este possibilita a produção de aplicações com muita facilidade, através de suas ferramentas que permitem o desenvolvimentos de projetos com os mais variados recursos de multimídia.

Há ainda a possibilidade da programação. O estudante, utilizando-se de linguagens voltadas ao objeto, já não necessita mais ser um profundo conhecedor em programação para produzir seus próprios programas. Essas linguagens, com seus tutoriais, facilitam a tarefa do usuário, o qual pode produzir aplicativos sem mesmo escrever uma só linha de programa. Essas linguagens se encontram transformadas em comandos simplificados e apresentados em forma de ícones, os quais contém as informações necessárias para a execução de determinada tarefa.

Paralelamente, temos a possibilidade de uso da Internet que vem constituindo-se, cada vez mais, numa ferramenta hipermídia. O conhecimento elaborado, os hábitos e costumes, a economia, entre outros aspectos que formam e unem os povos estão disponíveis ao acesso de qualquer pessoa que viaje pelas suas páginas. A grande maioria dessas, na forma de

hipertexto, possibilita a quem de interesse, acessá-las e adquirir um material riquíssimo, um caldo de culturas, para ser explorado. Este pode constituir-se numa ferramenta de pesquisa sem precedentes.

As páginas hipertextuais possibilitam a navegação por textos linkados, ícones, sons, imagens intregrando os mesmos em um grande banco de dados multidirecional, multifuncional, multidisciplinar, multidimensional e cada vez menos linear. São tantas as conexões possíveis que é preciso ter bom senso em direcionar a busca, para que não se afunde na tempestade de informações disponíveis.

"De maneira análoga, diversos sistemas de registro e de transmissão (tradição oral, escrita, registro audiovisual, redes digitais) constróem ritmos, velocidades ou qualidades de história diferentes. Cada novo agenciamento, cada ‘máquina’ tecnossocial acrescenta um espaço-tempo, uma cartografia especial, uma música singular a uma espécie de trama elástica e complicada em que as extensões se recobrem, se deformam e se conectam, em que as durações se opõem, interferem e se respondem. A multiplicação contemporânea faz de nós nômades de um novo estilo: em vez de seguirmos linhas de errância e de migração dentro de uma extensão dada, saltamos de uma rede a outra, de um sistema de proximidade ao seguinte. Os espaços se metamorfoseiam e se bifurcam a nossos pés, forçando-nos à heterogênese."

A possibilidade da utilização do hipertexto informatizado na instituição educacional nos possibilita uma dimensão de aprendizagem mais aberta: "Desterritorializado, presente por inteiro em cada uma de suas versões, de suas cópias e de suas projeções, desprovido de inércia, habitualmente ubíquo do ciberespaço, o hipertexto contribui para produzir aqui e acolá acontecimentos de atualização textual, de navegação e de leitura."

Para que a veiculação e a difusão das reinterpretações, reinvenções e bricolagens dos alunos/autores se tornem homepages na Internet, é necessário a utilização de softwares que possibilitem a transformação dos conteúdos produzidos em arquivos hipermídia, que possam ser visualizados e acessados nas páginas da rede mundial de computadores.

Isso é possível, utilizando-se softwares específicos de produção de homepages, ou pode-se recorrer a programas que possibilitam tais conversões de seus arquivos em "htm". Cita-se, como exemplo de produtos com tais características, softwares como o editor de textos Word, o PowerPoint (já referenciado nesta), ambos com tal possibilidade disponível em sua versão mais atual. Há ainda o EVEREST, também já citado anteriormente, entre outros que disponibilizam tais recursos de conversão automática de arquivos produzidos nestes para páginas da Internet, sem a necessidade de conhecimentos em linguagens de programação para tal fim.

O hipertexto não se trata de algo totalmente novo, pois a existência do mesmo é percebida em outras formas de comunicação escrita. Bom exemplo são os textos literários cujo entendimento está sujeito a diferentes interpretações. Estas dependerão das experiências próprias de cada leitor que busca em outras referências e meios bases para o seu entendimento, constituindo-se uma forma de hipertexto. Outro exemplo, são alguns livros didáticos que utilizando o enunciado: "Para complementar a leitura, vá para a página tal", sugerem ao leitor que o mesmo se desloque da página em que se encontra para outra anterior ou posterior. Podemos ainda, pensar nas notas de rodapé que nos remetem a informações auxiliares, configurando-se uma forma de afastar-se da linearidade do texto.

Apesar das semelhanças encontradas entre o hipertexto e outras formas de comunicação, existe o caráter novidadeiro da estrutura das páginas da Internet. Explorando a utilização do hipertexto, o usuário não só "navega" como interage com o texto lido de forma imediata, havendo a possibilidade de exposição e discussão de suas idéias entre várias pessoas de diferentes lugares on-line. Está aí o seu aspecto de nova forma de produção de conhecimento, a "mediática-imediática".

A pesquisa — uma das formas de busca e construção de conhecimento cuja elaboração de saberes faz-se em resposta aos questionamentos do aluno/pesquisador —, com a utilização dessas tecnologias, passa por um processo de renovação e se torna uma prática fundamental no processo de construção do conhecimento. É necessário perguntar-se qual a amplitude do hipertexto, uma vez que ele está à disposição a qualquer usuário e possibilita o acesso direto a informações científicas (ou não), via a rede mundial de computadores.

Para algumas unidades de ensino — cujas bibliotecas possuem um acervo bibliográfico insuficiente para todo o corpo discente — o hipertexto pode ser utilizado como fonte de leitura e produção literária. Isso é possível, porque o hipertexto introduz um novo elemento que é o aparecimento de várias informações de forma instantânea e simultânea, coisa que o texto escrito não proporciona. Existe um trabalho combinado do leitor e autor — grande novidade desse meio — configurando-se um texto escrito por várias mãos.

O hipertexto é como uma dobra que vai se abrindo, a cada link ele se desdobra multiplicando-se, uma palavra pode ser a porta para um outro capítulo, uma nota pode ser mais longa que o texto original, compondo um outro trabalho ou unidade. As palavras entram em ebulição e descobrimos um confluir de idéias, "de fundo falso em fundo falso," uma camada recobrindo a outra.

As "interfaces homem/máquina", dos programas utilizados atualmente pelos

computadores encontram-se voltados ao objeto (WYSWYG: what you see, what you get). Ao utilizar um determinado software, você não imagina e nem percebe todos os cálculos e processamentos efetuados pela máquina. Para tal, o usuário não necessita programar o computador. Por exemplo, ao editar imagens, as quais se deseje mudar a cor de uma determinada parte, basta selecioná-la e clicar sobre a paleta de cores. Altera-se a cor no monitor sem se aperceber de todo o complexo processamento que ocorreu no sistema operacional do equipamento. Esses recursos auxiliares da tecnologia informática atual simplificaram, e muito, a utilização dos computadores pessoais para usuários domésticos.

As razões que levam o ser humano ao uso de todos esses meio de comunicação é a necessidade de expressão do pensamento. Todos esses meios foram criados movidos pela necessidade do homem de se comunicar. Por isso, não se deve reduzir o uso da tecnologia na instituição educacional ao simples uso da técnica. A informática abriu possibilidades de novas relações entre os homens, e estes estão inseridos numa ordem social diferente da anterior.

Trabalhar com a informática sem antes pensar no agente com suas relações de afetividade, suas percepções, sua expressão, seus sentidos, sua crítica, sua criatividade é ignorar o sujeito dessa história. "Os produtos da técnica moderna, longe de adequarem-se apenas a um uso instrumental e calculável, são importantes fontes de imaginário, entidades que participam plenamente da instituição de mundos percebidos."

A internalização do saber implica na modificação do indivíduo com o seu grupo. O contexto designa a configuração de uma rede de sentidos, este não é só um processo técnico pois está em jogo não só o chip, mas as pessoas. Por isso, pode-se afirmar que não há só uma rede digital, mas uma rede humana.

O conhecimento adquirido pela Internet estabelece uma dinâmica diferente daquela encontrada nos livros, na medida em que aproxima o indivíduo não só de outras realidades (pois isso a impressão já o faz), mas determina-se pela mutabilidade, pela agilidade, inserindo a comunicação na esfera da fluidez. A Internet constitui primeiro um meio de contato social com outras pessoas, ela promove diferentes formas de pensar, de viver. Uma mudança, inclusive, na forma de tratar o conhecimento. Todo esse processo é um outro tipo de acesso ao patrimônio da cultura humana, uma prática cujo princípio norteador é a interatividade. É um conhecimento vinculado à prática que também exige uma ação reflexiva, uma conduta criativa.

Um texto (escrito, falado ou de imagens) sempre é plural e exige do leitor/ouvinte uma reflexão e interpretação que estará calcada nas informações que lhes chegam pelos meios, pelas suas sedimentações, pelos seus referenciais de mundo. Portanto, não há espaço para profecias catastróficas que prevêem a "robotização do ser humano", e conjecturam que a comunicação via computador eliminará a convivência social do homem. Por acaso, isso já não acontece com a escrita? O indivíduo no ato de ler não tem um "prazer solitário?" Logo, essa idéia deve ser superada.

Em certos momentos sócio-históricos, surgem novas formas de uso das tecnologias existentes, novas idéias e meios de superar os desafios encontrados, por vezes, de forma pouco sistemática e organizada. O que se concebe é que, a princípio, nada está definido e acabado, há sim um constante evoluir, uma reinterpretação da sociedade e da cultura.

O ser humano está inserido num emaranhado de conexões cujo centro é móvel, pois muda-se de uma representação para outra. "Não há informática em geral, nem essência congelada do computador, mas sim um campo de novas tecnologias intelectuais, aberto, conflituoso e parcialmente indeterminado. Nada está decidido a priori."

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Luiz Carlos Neitzel

  Publicado em 23/07/1999

Última atualização: 09/03/07 15:46:57

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