A Grande Arte
Rubem Fonseca

Aos dezesseis anos, já grávida, Laurinda, segunda filha do casal, casa-se com José Priscilio Prado, então com dezessete. Têm três filhos: Fernando, Maria Augusta e Maria Clara. Quando o pai morre, moram em São Paulo. Enriquecidos com negócios bem sucedidos, os Lima Prado compram um palacete na Rua São Clemente, passando a ter também uma casa no Rio, próxima da mãe. Laurinda entrega vultuosas quantias para a mãe e a irmã viverem uma vida confortável e gasta seu tempo entre renomados artistas, patrocinando eventos literários e exposições de arte. O marido, enquanto isso, gasta enormes fortunas no jogo de pôquer. Após o assassinato da irmã, Laurinda fecha a casa da Rua São Clemente, e recolhe a mãe, que engordara muito e perdera a atividade física.

No dia 14 de julho de 1940, acontece a segunda grande tragédia da família. Priscilio, após passar a noite jogando pôquer, chega a casa de madrugada, deita-se ao lado da mulher e dá um tiro na cabeça. Nesse mesmo dia, o casal completava trinta e um anos de casamento, e Paris rendia-se ao exército alemão. José Priscilio está arruinado financeiramente. Laurinda vende sua mansão paulista e transfere-se com a família definitivamente para o Rio.

Seu filho, Fernando, que se casara em 1931 com Luiza Montílio, filha de um conhecido médico homeopata, mudou-se também para o Rio de Janeiro, onde arranjara emprego modesto na Prefeitura. Maria Augusta Lima Prado, que estava casada com um francês, Bernard Mitry, que se dizia conde, foi abandonada pelo marido quando se patenteou a bancarrota da família. Bernard voltou para a França, sem avisar a mulher. Assim, na casa da Rua São Clemente ficaram Laurinda e Maria Augusta com o filho, Roberto. Também ficou morando na casa a filha mais moça de Laurinda, que, como se dizia eufemisticamente "tinha problemas". Sofria de acessos de agressividade, atacando as pessoas à sua volta. Era também comum ela uivar como lobo. Vivia encarcerada no porão do palacete da Avenida Paulista e acompanhou a mãe na mudança para a casa da Rua São Clemente, onde também havia um porão, tão discreto e isolado quanto o outro.

As informações sobre a família Prado são descritas por Basílio Peralta em um livro intitulado Retrato de Família, publicado em 1949, fracasso de crítica e de público, pois a família Prado deixara de ser importante, e criaram-se outros clãs mais ricos, poderosos e atraentes. Boa parte dos livros são vendidos a peso para serem reprocessados, e um dos poucos exemplares restantes, encontra-se em poder de Thales Lima Prado, neto de Priscilio e de D. Laurinda, pelo irmão de Roberto Mitry. O exemplar do livro e dos Cadernos de Lima Prado chegam às mãos de Mandrake e é a partir daí que ele consegue conhecer a vida do financista Thales de Lima Prado.

Peralta coloca em seu livro os acontecimentos da família até 1949, um ano antes do suicídio de Fernando Lima Prado.

Thales tinha dezenove anos e já sabia, então, que não era filho do seu pai e sim do seu tio, o vigarista francês Bernard Mitry. Seu primo Roberto, quer dizer, seu irmão, também sabia, todo mundo sabia, todo mundo sabia e todo mundo fingia ignorar os fatos. Todo mundo, incluindo Laurinda. Fora Laurinda quem lhe dissera a verdade, que ele não era neto dela. Mas Laurinda amava Thales e detestava o neto verdadeiro, Roberto. Lamentável, o inofensivo Fernando. Diziam que, além de estéril, era impotente e tivera a má sorte de casar com uma adúltera.

Thales tem pendor para o pensamento clássico, mas por causa do avô que esbanjara fortuna, precisa ter vida mais prática, passando por academias militares, redutos de classe média baixa. Daí nasce o seu gosto pelos cavalos, única lembrança aprazível dos tempos de cavalaria. Por isso, Thales não tem a oportunidade de conhecer a história da família. Pouco antes de morrer, de uma queda da escada, a matriarca Laurinda chama Thales e lhe mostra um baú, onde guarda suas lembranças e lhe faz revelações pessoais, terminando com Maria Clara, que carrega a maldição da família, a loucura. Thales, no entanto, por não ser Lima Prado, estaria livre do estigma porque traz o sangue Montílio e Mitry. Mas a avó mente, pois através da carta de Luiza Montílio, sua suposta mãe, Lima Prado descobre a verdade sobre seu nascimento. Ele é realmente filho de Fernando com sua irmã Maria Clara, a louca que ficava presa no porão, sendo, portanto, fruto de um incesto. A questão da herança familiar volta, e Thales começa a acreditar que é o grande herdeiro da loucura familiar.

Lima Prado fazia questão de assinalar que não era nazista, mas Hiltler poderia ter sido o maior homem do século XX. Isso estava começando a ser reconhecido pela humanidade, lentamente, apesar de esforços que os "judeus e seus aliados dos dois lados, plutocratas e comunistas, faziam para que a memória do grande alemão continuasse a ser execrada através de campanhas permanentes de difamação e calúnia."
(Nesta parte dos Cadernos estava grafado, em letras de imprensa: O IMPORTANTE NÃO PELA VERDADE, MAS O SÍMBOLO, ARRAS. A tinta usada era a azul, indicativa dos assuntos da família. No início entendi que a frase significava que ele encarava a loucura da mãe apenas como um fato e não como uma "senha", mas depois achei exatamente o contrário. A loucura da mãe teria sido interpretada por Lima Prado como um sinal de garantia de um contrato pignoratício - o penhor da liberdade; a liberdade trocada pela sanidade. Era um raciocínio tortuoso e obscuro, o dele. E o meu.)

Os dados da árvore genealógica da família Prado estão desenhados nos Cadernos, mas, por algum motivo, nunca colocava Maria Clara como sua mãe.

Remexendo as coisas do quarto da avó, Lima Prado encontra os documentos do asilo e descobre que a mãe ainda está viva e chega a visitá-la no sanatório. Após os incidentes que provocam a morte de Hermes, Lima Prado, profundamente abalado, suicida-se. É encontrado quase morto pelo motorista, o Capitão Virgulino.

Quando chegou em casa, foi procurar o chefe para dizer que havia "entregue a moça". Encontrou-o caído no quarto, segurando a Roderick Caribou Chappel, a lâmina cravada na axila esquerda. Lima Prado ainda estava vivo, porém inconsciente, e sangrava abundantemente. Apesar do seu desespero, o Capitão Virgulino conseguiu ligar para o Hospital Miguel Couto, mas quando a ambulância chegou, Lima Prado estava morto.
Raul foi avisado e chegou à casa da Gávea Pequena depois que a perícia já fizera seu trabalho e o corpo fora removido para o Instituto Médico Legal.
Os Cadernos sobre uma mesa, na cozinha, ao lado de uma garrafa de álcool. Lima Prado havia planejado queimar os cadernos, mas por qualquer motivo, não conseguira fazê-lo.

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