Canção da saudade
Eu finjo que não sinto a tua falta.
Como a planta que necessita viver no deserto finge não precisar da água; e a todos os dias esmiúça o céu, buscando nuvens de chuva.
Aprendi a viver sem ti.
Assim como o peixe ,confinado em um aquário, aprende a viver sem o mar.
Entretanto, não sou completo.
Pois tanto te dei de mim, que hoje me falta a porção que confiei às tuas mãos.
Vivo.
Pois a saudade deixa intacto o corpo, enquanto dilacera a alma.
Já não preciso ouvir a tua voz.
Pois, em todo esse tempo, ensinei os meus ouvidos a esquecer a esperança.
E não preciso do calor dos teus braços.
Consegui acostumar-me ao frio em que a tua ausência envolveu a minha alma.
Já não vejo o mundo pelos teus olhos.
E, assim, sou como o cego que abençoa a escuridão que o envolve.
Entretanto, embora a razão me tenha ensinado a viver sem ti, o que direi ao coração que te pertence?
Não choro por ti.
Hoje, apenas acalento esta saudade. Como a mãe que adormece no berço do filho que se foi.
Pois as lágrimas do coração nem sempre escorrem pelos olhos; são, as vezes, como raízes que crescem sob a terra.
E é assim o meu amor.
Que nada exige, apenas existe. E, sem ti, é como um céu que houvesse perdido as suas estrelas.
Ou como um sonho, que teme esfumar-se ao nascer da manhã.
Mas os dias continuam a passar. E o mundo não se detém em respeito à minha saudade.
Por isso, eu continuo a viver. Para que um dia me possas encontrar, se acaso me buscares.
Acredita! Eu sempre estarei à tua espera.
Mas, enquanto não voltas, preciso fingir que não sinto a tua falta.
Como se alguém pudesse esquecer a própria vida...