Estado da Paraíba
Poder
Judiciário
Comarca de Santa Rita -2ª
Vara
Proc. n.º
033980004957
SENTENÇA
PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO - CRIME DE
CONDUTA ABSTRATA - PROVA CABAL - DENÚNCIA
PROCEDENTE.
Responde por crime de porte ilegal de arma de
fogo quem, mantém sob sua guarda, em roçado de sua propriedade, uma
pistola 380, em perfeita condição de uso, com licença vencida,
embora registrada em seu nome.
Vistos, etc.
SEVERINO COSMO
DAMIÃO ,
qualificado “ab initio”, foi denunciado pela Promotoria de Justiça,
com exercício junto a esta Vara, como incurso nas penas do art.10,
da lei n.º 9.437/97.
Ventila a peça
denunciatória, em suma, que “na tarde do dia 29 de abril de
1998, por volta das 16:00, num roçado localizado em Utinga, nesta
cidade, o indiciado detinha arma de fogo, de uso permitido, sem
autorização e em desacordo com determinação legal ou
regulamentar” (v.fls.02/03).
Auto de prisão em flagrante, fls.06/10. Recibo
da fiança paga, fls.13. Auto de apresentação e apreensão da arma,
fls.11. Boletim individual, fls.15. Certidão de antecedentes
criminais, fls.19. A ação penal foi recebida no dia 03 de agosto de
1998, pelo despacho de fls.02.
Interrogatório do réu, fls.24/25. Defesa Prévia
com rol testemunhal, fls.26. A proposta de suspensão do processo não
foi aceita pelo acusado e seu defensor particular, fls.34. O
processo seguiu o rito sumário em virtude de ser o delito punido com
pena de detenção. Foram inquiridas 04 (quatro) testemunhas durante a
instrução processual (v.fls.44/48 e fls.52/54).
Nas alegações últimas,
e em audiência, o insigne promotor de justiça, titular da 2.º
Promotoria, requereu a absolvição do acusado por entender que a arma
está registrada em nome do réu, e o porte deste encontra-se apenas
vencido. A defesa sustentou, em outras palavras, a mesma tese
ministerial (fls.53/54).
É o
relatório.
DECIDO.
Cuida-se de crime de perigo abstrato. A mera
conduta de sair de casa, ilegalmente, portando, ou mantendo sob sua
guarda, arma de fogo gera uma situação de risco à coletividade em
geral. Não tenho dúvida de que o interesse da lei é o de preservar o
estado de segurança dos cidadãos contra atos que os exponham a
perigo.
A
denúncia restou provada na sua inteireza, através da prova oral e
documental produzida, em que pese a tese da inexistência de conduta
típica, erigida pela novo Promotor de Justiça que funciona junto a
este juízo, quando das razões orais formuladas.
Ora, observa-se que a prisão em flagrante do
réu ocorreu no dia 29 de abril de 1998. A licença para o porte da
referida arma venceu no dia 03 de janeiro do mesmo ano, consoante se
verifica do documento de fls.30.
Como sabido, o simples registro da arma não
autoriza o respectivo porte, nem o livre trânsito. Esta observação,
inclusive, consta do verso do certificado de registro de propriedade
da arma, exarado pela própria Secretaria de Segurança Pública do
Estado, através da D.P.A. – Divisão de Polícia Administrativa
(v.fls.35v).
Data vênia, discordo do entendimento do nobre
Promotor de Justiça, Dr. Frederico Martinho Coutinho, que entendeu,
nas alegações últimas, pela inocorrência de crime. A meu sentir, a
licença vencida e não renovada é similar a falta de licença.
A lei n.º 9.437/97
continua a exigir documento hábil e válido, expedido por autoridade
pública competente, para afastar o porte ilegal da arma de fogo.
Essa, ademais, sempre foi a interpretação dada pelos Tribunais, ainda quando
o fato constituía contravenção penal (art.19 da LCP), senão,
vejamos:
“Porte de arma. Licença vencida.
Pratica porte ilegal de arma o agente que a traz consigo, fora de
sua residência, com licença vencida, pois, o fato de o mesmo possuir
o documento pressupõe que saiba da proibição de carregar a arma sem
a devida autorização legal” (TacrimSP; 6ª Câmara; Ap. Crim.
556.201; rel. Almeida Braga; julgado em 08.03.89; citado in ‘Arma de Fogo’, obra de Fernando Capez, pág.98, edição 1997).
As testemunhas indicadas pelo Ministério
Público confirmaram em parte a versão contada pelo réu, quando do
seu interrogatório judicial.
Eis a prova testemunhal:
“...no dia do fato estava
trabalhando no roçado do acusado Severino Cosmo Damião, quando a
polícia chegou e deu voz de prisão àquele, apreendendo a sua pistola
380” (testemunha
Antônio Carlos da Silva – fls.44).
“que assistiu a tudo, pois estava
trabalhando no roçado, pertencente ao acusado Severino Cosmo; a
polícia apreendeu uma arma calibre 380 de propriedade do Sr.
Severino Cosmo Damião; Que, a arma estava no acampamento do
roçado” ( testemunha José Lourenço da Silva –
fls.45).
A
abordagem dada ao réu não ocorreu de forma programada, vez que foi
em meio a uma operação policial que tinha como escopo capturar um
indivíduo foragido. O policial militar que comandou a operação,
ouvido como testemunha, disse:
“Que, foi convocado pelo Cap.
Gerônimo para capturar um elemento que estava sendo acusado de
assassinato...Que, ele depoente após a prisão do elemento procurado,
fez uma vistoria no acampamento do roçado e encontrou uma pistola
380; Que, o acusado Severino, na ocasião, afirmou que a arma lhe
pertencia; Que, ato contínuo, ele depoente e os seus companheiros
levaram o indivíduo procurado e o ora acusado para à Delegacia de
Polícia” (testemunha Luiz Carlos de
Souza-fls.46).
Por derradeiro, a
testemunha José Marinho do Nascimento asseverou: “Que, a pistola do acusado estava
dentro do acampamento, guardada”(fls.52).
A
Defesa alega, em suas assertivas, que houve abuso de autoridade por
parte dos policiais que efetuaram a prisão do réu, entrementes, tal
circunstância restou indemonstrada. A propósito, válido frisar, que
depoimentos de policiais merecem respaldo quando harmônicos com as
demais provas coligidas.
Nisso, a
jurisprudência não discrepa: “É inaceitável e preconceituosa a alegação
de que o depoimento de policial deve ser sempre recebido com
reservas, porque parcial. O policial não está legalmente impedido de
depor e o valor do depoimento prestado não pode ser sumariamente
desprezado. Como todo e qualquer testemunho, deve ser avaliado no
contexto de um exame global do quadro probatório” (TACRIM-SP –
RT 530/372).
Observe-se, ademais, que a materialidade
delituosa restou evidenciada por meio do auto de apreensão da arma
(v.fls.11).
A
teor do exposto, JULGO PROCEDENTE a
denúncia ministerial para, em conseqüência,
CONDENAR o réu SEVERINO COSMO
DAMIÃO
, qualificado nos autos, nas penas do art.10, caput, da
lei n.º 9.437/97.
Passo a dosar-lhe a pena:
Culpabilidade
comprovada. É inescusável o desconhecimento da lei. Os antecedentes
são bons. A conduta social é recomendável. Personalidade revela-se
normal. Os motivos do crime foram injustificáveis, embora tenha
sustentado o estado
de necessidade
de portar a arma. As circunstâncias lhe foram favoráveis, haja vista
que a arma encontrava-se no interior do acampamento. As
conseqüências de sorte não foram graves, vez que foi abordado apenas
mantendo a arma sob sua guarda. A coletividade, vítima nessas
hipóteses, em nada contribuiu para o âmago criminoso do acusado.
Arrimado nas
circunstâncias judiciais
acima, estabeleço
a pena base em
01(um) ano de detenção e 30(trinta)
dias-multa, pelo crime disposto no art.10, caput, lei n.º 9.437/97,
tornando-a definitiva à mingua de outras circunstâncias legais e de causas
especiais de diminuição e aumento de pena.
Com esteio nas condições econômicas do réu,
fulcrado no § 1.º, art.49, do Código Penal, fixo o valor do
dia-multa em um trigésimo do salário mínimo vigente ao tempo do
fato. Instituo o regime inicial aberto para
o cumprimento da reprimenda, por força da alínea “c”, do § 2º, art.33,
do CP. Como local de cumprimento designo o ergástulo público desta
Comarca.
Em vista do art.44, I, II, III e § 2º, do
Código Penal (nova redação dada pela lei 9.714/98), substituo a pena
privativa de liberdade imposta, por uma restritiva de direitos,
consistente em prestação de serviço à comunidade ou a entidades
públicas, ficando a cargo do juízo das execuções penais competente a
designação do local para as tarefas gratuitas, com observância ao
que dispõe o § 3º, art.46, do CP (nova
redação).
Com o trânsito em julgado, remeta-se o B.I.,
devidamente preenchido à SSP/Pb, anotando-se o nome do réu no rol
dos culpados e, em seguida, expeça-se guia de execução, remetendo-a
ao juízo das execuções penais correspondente (1ª Vara), mediante
ofício, com cópia desta sentença, certidão do trânsito e denúncia
para que promova a execução da pena restritiva de direito, nos
termos do art.147, da lei n.º 7.210/84.
Custas pelo réu.
P.R.I.
Santa Rita, em 30 de
abril de 1999.