Estado da
Paraíba
Poder
Judiciário
Comarca de Alagoinha
Proc. n.º
052950000795
SENTENÇA
ESTUPRO
TENTADO –
VIOLÊNCIA REAL – LESÃO CORPORAL LEVE – AÇÃO PENAL DE NATUREZA
PRIVADA – AUSÊNCIA DE REPRESENTAÇÃO PARA OS FINS DO § 2º, DO
ART.225, CP – INOCORRÊNCIA DE CRIME COMPLEXO –DENÚNCIA
REJEITADA.
“Somente nos crime sexuais
violentos, de que resulte a morte ou lesões graves na ofendida é que
se faz sentir o império do art.103 do CP (atual art.101),
justificando-se a iniciativa do Ministério Público para a ação,
mesmo sem representação. Para o estupro simples, porém, esta é
indispensável, já que a ação é de natureza privada, pela prevalência
da regra do art.225, norma específica, que derroga a genérica do
art.103 (atual art.101) do citado Código” (RT-
388/106).
Vistos, etc.
Sebastião Mariano de
Aquino, qualificado nos autos, foi denunciado pela Promotoria de
Justiça como incurso nas penas do art.213 c/c o art.224, alínea “a”,
na forma do art.14, II, todos do Código Penal.
Sustenta o Órgão do
Parquet, em síntese, que “...o acusado no dia 12 de fevereiro
do corrente ano, por volta das 16:30 horas, próximo ao Sítio Curral
Picado, neste município, tentou estuprar a menor (com 13 anos de
idade), Patrícia de Oliveira Quirino.
Entretanto, antes de
consumar-se o crime de estupro, a ação delitiva foi interceptada por
duas pessoas, que foram convocadas a prestar socorro a menor, pelas
colegas da vítima que conseguiram escapar das garras
criminosas”
(v.fls.02/03).
Auto de prisão em
flagrante, fls.05/10. Boletim individual, fls.18. A denúncia foi
recebida no dia 06.junho.95, pelo despacho de fls.02. Despacho
concessivo de liberdade provisória, fls.26/27.
Laudo de exame de
ofensa física realizado na vítima, fls.32. Interrogatório do réu,
fls.53/54. Defesa prévia, com rol testemunhal, ofertado através da
Assistência Judiciária, fls.58.
Foram ouvidas 03
(três) testemunhas ministeriais e 02 (duas) da defesa (fls.63;
93/94; 104/107). A ofendida prestou declarações em juízo, fls.64.
Não houve pedido de diligências na fase do 499, do
CPP.
Em alegações finais, o
Ministério Público requereu a procedência da ação penal, ao passo
que a Defesa pugnou pela absolvição do acusado, sob o argumento de
que “não há prova ocular nem
testemunhal da ocorrência, ficando vazio os depoimentos de tais
testemunhas” (v.fls.114/115 e 117).
É o relato do
essencial.
DECIDO.
Sobreleva registrar
que a ação penal em caso de estupro (tentado ou consumado), com
violência presumida, é de natureza privada. Entanto, se a violência
é real a ação passa a ser pública.
Por força do princípio
da subsidiariedade, quando do estupro (tentado ou consumado) resulta
lesão corporal leve, há de ser reconhecida a absorção penal. A
existência de crime complexo somente se impõe quando a lesão é de
natureza grave ou gravíssima, o que não é o caso dos
autos.
Ensina o mestre
Damásio E. de Jesus que “...a
ação penal por delito de estupro com lesão corporal leve, que não é
complexo, é regida pelo art.225, caput, do Código Penal: é de
natureza privada” (in Código Penal Anotado; edição 1989;
pág.234; editora Saraiva).
Constata-se que,
embora haja atestado de pobreza, confeccionado pela autoridade
policial que presidiu as investigações (v.fls.31), inexiste no
processo representação ofertada pelos responsáveis da ofendida, no
sentido de evidenciar o interesse na persecução criminal do réu,
consoante a exigência do § 2º, do art.225, do CP.
In casu, não bastam
simples declarações prestadas em juízo pela vítima menor.
Saliente-se que apenas o ofendido maior de 18 anos pode, por
si só, oferecer a representação respectiva (art.34, CPP – por
analogia). Inclusive, o prazo começa a correr a partir da data em
que atinge essa idade.
As lesões corporais
sofridas pela vítima P.O.Q. estão materializadas através do exame de
corpo de delito de fls.32. Cuida-se de lesão leve, absorvida, pois,
pelo estupro tentado, não tendo o Ministério Público legitimidade
para a promoção da ação penal.
A propósito, o
Superior Tribunal de Justiça, recentemente, decidiu que: “O estupro absorve as lesões
corporais leves decorrentes
do constrangimento, ou da conjunção carnal, não havendo,
pois, como separar estas, daquele, para se exigir a representação
prevista no art.88, da lei n.º 9.099/95” (6ª Turma; HC
98/0063395-2; Rel. Min. Anselmo Santiago; pub. no DJU de 23.11.98;
pág.212.).
Entendo que a regra do
art.225 prepondera sobre a do art.101 (crime complexo), ambos do CP.
Ademais, com o surgimento da lei 9.099/95 (art.88), que passou a
exigir representação para a ação penal em caso de delito de lesão
corporal leve e lesão culposa, a Súmula 608 do STF deve ser
interpretada com reserva.
Em abono da tese aqui
erigida, o saudoso Prof. Magalhães Noronha já proclamava que “o art.101 é genérico, refere-se
aos crimes complexos em geral, ao passo que o art.225 tem suas
vistas voltadas exclusivamente para os delitos contra os costumes. O
segundo dispositivo é norma específica, já que contém a outra –
pois, como o art.101, alude ao crime complexo – tendo, além disso,
circunstâncias próprias e especiais que importam ‘una descripción
más próxima o minuciosa de un hecho’, porque se refere
exclusivamente a uma espécie
de crimes: os contra os costumes” (in Dir. Penal;
pág.326;edição 1987).
Com efeito, as lesões corporais leves integram
a figura do estupro, sendo, portanto, necessária a representação do
ofendido ou do seu representante legal para ooferecimento da denúncia pelo Ministério
Público, quando ocorrente a hipótese inc.I, § 1º, do art.225, do CP.
Não há falar, in casu, em crime complexo. Este somente estaria
configurado se o estupro estivesse acompanhado de lesão grave ou
morte.
Observe-se que, como
disse, a lesão é leve, segundo o laudo pericial (fls.32), e não há
representação por parte dos genitores ou representantes legais da
vítima P.O.Q. para a “persecutio
criminis”.
A teor do exposto,
reconheço a ausência de procedibilidade para a ação penal movida
pelo Ministério Público e, via de conseqüência, rejeito a denúncia
formulada, nos termos do art.43, inc.III, do
CPP.
Aguarde-se o em
cartório a manifestação da ofendida até 06 (seis) meses a contar da
data do seu aniversário de 18 anos (prazo decadencial). Após, sem a
correspondente representação, voltem-me os autos conclusos para fins
de extinguir a punibilidade do réu.
P.R.I.
Alagoinha, 08 de julho
de 1999.
José
Herbert Luna Lisboa
Juiz de Direito Plantonista
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