DOUTRINA CATÓLICA

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PERGUNTE E RESPONDEREMOS

VIVA O PAPA!

Orlando Fedeli

O Sr. Orlando Fedeli argüi os últimos Papas de ter incorrido em erros doutrinários, apesar de gozarem do carisma da infalibilidade quando se pronunciam ex-cathedra, ou seja, como Mestres da fé e da Moral em caráter definitório. - Tal atitude não condiz com o pensamento da Igreja, que recomenda aos fiéis respeito às afirmações do Santo Padre, mesmo quando não fala ex-cathedra. O Papa não se pronuncia levianamente, mas sempre após ter estudado e ponderado cuidadosamente os pontos que aborda.

O Sr. Orlando Fedeli é membro dissidente da TFP (Tradição, Família e Propriedade), mas ainda professa concepções nem sempre fiéis ao Concílio do Vaticano li. Publicou um folheto intitulado "VIVA O PAPA!", em que professa crer na infalibilidade do Sumo Pontífice quando fala ex-cathedra, mas atribui ao Papa erros de doutrina e procedimento quando se manifesta por outra via. Visto que tal folheto tem causado certa perplexidade nos leitores, vamos, a seguir, analisá-lo e comentá-lo.

1. O Texto em Foco

Eis os dizeres que importa considerar:

"O Concílio Vaticano I - realizado em 1870 - proclamou o dogma da infalibilidade papal, estabelecendo que, quando o Papa ensina "ex-cathedra"; isto é, como Vigário de Cristo, com o poder dado por Nosso Senhor a São Pedro, ensinando toda a Igreja sobre questões de Fé ou de Moral, com a vontade explícita de definir uma doutrina e condenando a sentença oposta, o Papa é infalível.Esse dogma da infalibilidade do Papa - ao qual aderimos do mais profundo de nossas almas - é a garantia de que a Igreja jamais errará. O próprio Nosso Senhor Jesus Cristo, ao dar as chaves a Pedro, lhe disse: `Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja. E Eu te darei as chaves do Reino dos céus. Tudo o que ligares na terra será ligado no céu. Tudo o que desligares na terra, será desligado no céu. E as portas do inferno não prevalecerão contra ti' (Mt 16, 18s).É sobre essas palavras santíssimas de Nosso Senhor que a Igreja se baseou para proclamar a infalibilidade papal. É nisto que se fundamenta a devoção que todo católico deve ter pelo Papa, seja ele quem for.

Os inimigos da Igreja sempre quiseram criar confusões acerca desse ponto, ora atribuindo ao Papa enquanto tal, e à Igreja, os pecados em que um Papa pode cair como pessoa particular, ora estendendo a infalibilidade a qualquer ação do Supremo Pontífice... São João Bosco, que vivia então em Turim, ordenou a seus alunos que jamais gritassem Viva Pio IX' e sim 'Viva o Papa!'. Com isso, D. Bosco desfazia a manobra carbonária. Devemos gritar sempre 'Viva o Papa, pouco importando o nome daquele que está no trono de Pedro. Seja ele santo ou pecador, devemos manter ao Papa, `doce Cristo na terra, como dizia Santa Catarina de Siena, nossa devoção filial e nossa fidelidade a tudo o que ele ensina, como legítimo sucessor de Pedro e com o poder das chaves. Hoje a compreensão desses princípios é muito necessária, pois somos ameaçados por dois erros opostos com relação ao Papa: o sedevacantismo e o infalibilismo universal. Nós rejeitamos a ambos". Após esta apologia muito viva, o tom muda um tanto: "Há quem afirme que os últimos Papas, por sua adesão aos erros do Vaticano II - Concílio meramente pastoral e não dogmático, portanto falível e que, por isso, ninguém esta obrigado a aceitar - teriam perdido o pontificado. Tese temerária, aventureira e imprudente, pois até hoje ninguém a demonstrou com provas claras e irrefutáveis. Essa tese põe os fiéis à beira do cisma, senão dentro dele. De outro lado, os modernistas e progressistas, que viram suas idéias errôneas triunfarem no Vaticano 11, procuram impingir aos fiéis católicos esses erros do último Concílio, como se fossem dogmas de Fé, o que é absolutamente falso. Mais ainda, os defensores do infalibilismo absoluto e universal do Papa, procuram fazer com que os católicos julguem qualquer discurso do Papa - até mesmo um simples discurso de acolhida de turistas - como se fosse um dogma de fé, nivelando um texto pastoral, ou um discurso de cortesia, aos pronunciamentos "ex-cathedra" : Isso também nós não podemos aceitar. O Papa, não é demais repetir, só é infalível quando ensina "ex-cathedra". Fora disso, pode errar. Por isso, é legítimo rejeitar os erros do Vaticano 11 e tudo o que se tem feito com base neles, na medida em que contrariam os ensinamentos de todos os Papas anteriores. Por exemplo, a famosa jornada de orações pela paz, realizada em Assis por João Paulo II, em 1986, se opôs frontalmente a tudo o que a Igreja sempre ensinou quando, em reiterados pronunciamentos dos Papas, condenou o interconfessionalismo e o indiferentismo. Tal jornada é inaceitável.

Até aqui o Sr. Orlando Fedeli.

2. Que dizer?

Serão propostas três observações.

2.1. A autoridade do Papa e dos Bispos ao ensinar Como colegiado, os Bispos, unidos ao Papa, executam o magistério da Igreja, desde que ensinem, com unanimidade moral (não aritmética), alguma verdade atinente à fé ou aos costumes. Quando reunidos em Concílio Ecumênico legitimamente convocado pelo Papa e por este presidido, podem exercer magistério extraordinário, definindo proposições, com aprovação do Sumo Pontífice. Este, por sua vez, pode exercer a sós seu magistério ordinário (que merece sempre reverência, embora não promulgue sempre definições de fé ou Moral), como também seu magistério extraordinário, definindo proposições ex-cathedra. O Concílio do Vaticano I incutiu o magistério da Igreja nos seguintes termos:: "Devem ser acreditadas, como de fé divina e católica, todas as coisas contidas na Palavra de Deus escrita ou transmitida de viva voz e que são propostas como divinamente reveladas pela Igreja, quer em solene afirmação, quer no magistério ordinário e universal" (Denzinger-Schõnmefzer, Enchiridion n° 3011(1792)).

Definiu também a infalibilidade do Papa, quando, ao desempenhar sua função de doutor de todos os fiéis, define uma proposição de fé ou de Moral; a sua sentença então é irreformável e não precisa do consentimento da Igreja. Cf. Dz. Sch. n° 3073s [1839]. Na base de tais afirmações, pode-se fazer o seguinte gráfico relativo ao magistério da Igreja:

Magistério: Ordinário:: os Bispos em união com o Papa em unanimidade moral

Magistério Extraordinário: - definição solene de um Concílio; Ecumênico aprovada pelo Papa definição ex-cathedra do Sumo Pontífice

O Concílio do Vaticano II explicou estas modalidades de magistério: "Embora os Bispos individualmente não gozem da prerrogativa da infalibilidade, contudo, mesmo quando dispersos pelo mundo, guardando, porém, a comunhão entre si e com o sucessor de Pedro, e quando ensinam autenticamente sobre assuntos de fé e de Moral, concordando numa sentença que deve ser professada de modo definitivo, então enunciam infalivelmente a doutrina de Cristo.

Isto aparece ainda mais claramente quando, reunidos em Concílio Ecumênico, são mestres e juízes da fé e da Moral para toda a Igreja. Às suas definições os fiéis devem prestar adesão com o obséquio da fé... O Romano Pontífice goza de infalibilidade, como Chefe do colégio dos Bispos, em virtude do seu encargo, quando, num ato definitivo, como Pastor e Mestre Supremo de todos os fiéis que confirma seus irmãos na fé (cf. Lc 22, 32), proclama uma doutrina atinente à fé ou aos costumes... Suas definições são irreformáveis por si mesmas e não em virtude do consentimento da Igreja... Não precisam da aprovação de ninguém, nem admitem apelação para algum tribunal.

Religiosa submissão da vontade e da inteligência deve ser, de modo particular, prestada ao autêntico magistério do Romano Pontífice mesmo quando não fala ex-cathedra. E isto de tal forma que seu magistério supremo seja reverentemente reconhecido, suas sentenças sinceramente acolhidas, sempre de acordo com sua mente e vontade. Esta mente e vontade consta principalmente ou da índole dos documentos ou da freqüente proposição da mesma doutrina ou de sua maneira de se exprimir" (Const. Lumen Gentlum n° 25).

Como se vê, o documento recomenda mesmo os pronunciamentos do Papa que não sejam definições de fé ou de Moral, ou seja, as Encíclicas, as Exortações Apostólicas, as Cartas, os Motu Proprio, as Bulas... A autoridade desses textos há de se depreender do estilo e da linguagem utilizada pelo Papa em cada caso.

2.2. O Concílio do Vaticano II

O Concílio é acusado de ter incidido em erros - o que não é verdade. Os intérpretes do Concílio é que deturparam os seus documentos, instituindo inovações não fundamentadas, que resultaram em detrimento do Concílio aos olhos do grande público. Quem lê o documentário do Concílio, verifica que intencionou atualizar a doutrina e a praxe da Igreja a fim de as tornar mais significativas para o mundo de hoje, todavia sem trair as verdades da fé e os princípios da Moral católicas. O ponto mais nevrálgico foi a Declaração sobre a Liberdade Religiosa, que alguns entenderam como se significasse que a Religião é algo de indiferente, ficando ao bel-prazer de cada ser humano ter ou não ter Religião, professar este ou aquele Credo. Tal entendimento é falso; o que o Concílio quis dizer é, de um lado, que a procura da verdade em matéria religiosa se impõe a todo homem (pois equivale à procura do sentido da vida), mas, de outro lado, essa procura não pode sofrer coações nem da parte de regimes políticos ateus ou materialistas, nem da parte de alguma instituição religiosa; respeite-se a liberdade de opção que toca a todo homem, contanto que não perturbe a boa ordem da sociedade. A mesma Declaração afirma que somente a Religião católica professada pela Igreja que Jesus confiou a Pedro e seus sucessores, foi revelada por Deus e se impõe como caminho de salvação a quantos a reconhecem como tal. São palavras textuais do documento conciliar Dignitatis Humanae (sobre a Liberdade Religiosa) n° 1:

"Em primeiro lugar, professa o Santo Sínodo que o próprio Deus manifestou ao gênero humano o caminho pelo qual os homens, servindo a Ele, pudessem salvar-se e tornar-se felizes em Cristo. Cremos que essa única verdadeira Religião subsiste na Igreja Católica e Apostólica, a quem o Senhor Jesus confiou a tarefa de difundi-Ia aos homens todos, quando disse aos Apóstolos: Ide, pois, e ensinai os povos todos, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-lhes a guardar tudo quanto vos mandei' (Mt 28, 19s). Por sua vez, estão todos os homens obrigados a procurar a verdade, sobretudo aquela que diz respeito a Deus e à sua Igreja e, depois de conhecê-la, a abraçá-la é a praticá-la". O fato de ter sido o Concílio de índole pastoral, não proferindo definições dogmáticas, não quer dizer que não tenha autoridade; é uma expressão do magistério ordinário da Igreja, que goza da especial assistência do Espírito Santo para não induzir em erro os fiéis católicos.

3. O Encontro de Assis

Tal assembléia reuniu, pela primeira vez na história, representantes da Igreja Católica, de outras comunidades cristãs e das principais religiões do mundo inteiro, a fim de se dedicarem ao jejum e à oração em prol da paz mundial. É de notar que o Encontro de Assis não discutiu doutrinas. Não tentou encontrar um mínimo denominador comum de todos os Credos. Mas baseou-se no fato - eloqüentemente comprovado pela história das religiões - de que todo e qualquer homem, além de ser homo faber, honro ludens, homo saplens, é também homo religiosus..., homem que acredita numa Realidade absoluta e que tem por experiência fundamental a experiência do Sagrado. Foi em função desta dimensão comum e fundamental que os homens se reuniram em Assis; a oração é a expressão mais espontânea e universal dos anseios religiosos do ser humano, anseios que a Declaração Nostra Aetate assim escreve: "Por meio de religiões diversas procuram os homens uma resposta aos profundos enigmas para a condição humana, que tanto ontem como hoje afligem intimamente os espíritos dos homens, quais sejam: o que é o homem, qual o sentido e o fim de nossa vida, o que é bem e o que é pecado, qual a origem dos sofrimentos e qual sua finalidade, qual o caminho para obter a verdadeira felicidade, o que é a morte, o julgamento e a retribuição após a morte e, finalmente, o que é aquele supremo e inefável mistério que envolve nossa existência, donde nos originamos e para o qual caminhamos" (n° 1).

Para evitar toda aparência de ecleticismo e por respeito aos diversos Credos, não houve uma fórmula única de oração, mas cada grupo rezou a seu modo em presença dos demais. No ponto culminante do Encontro de Assis, ou seja, na tarde de 27/10/86, houve especial empenho por evitar todo sincretismo: na praça adjacente à Basílica inferior de São Francisco, foi colocado um estrado, ao qual tiveram acesso sucessivamente os diversos grupos religiosos, a fim de proferir a sua oração; os demais representantes religiosos, dispostos em semicírculo, assistiam em silêncio. Assim foram mantidas as diferenças num clima de aspirações convergentes e expressões similares. Deu-se um passo inédito no sentido de aproximar os homens entre si, salvaguardada a identidade religiosa de cada qual - o que está bem na linha do diálogo religioso preconizado pelo Concílio do Vaticano li. Eis quanto convinha observar em resposta ao Manifesto do sr. Orlando Fedeli, sem ferir a consideração que tal irmão merece. { Extraído da Revista Pergunte e Responderemos, nª 464 }

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