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Doutrina Católica

Festa da Sagrada Família: Jesus, Maria, José

31 de Dezembro de 2000

Eclo 3,3-7.14-17a; Cl 3,12-21; Lc 2,22-40

1. O Natal e a Família

O Natal, sob muitos aspectos, é uma festa doméstica. Ela reúne a família, os irmãos distantes e, sobretudo, encanta as crianças com seus pais ao perceberem como estes valorizam, nesta ocasião, a variedade de símbolos. O clima de amor e confraternização pervage a Solenidade do Nascimento do Senhor. Liturgicamente, a Igreja se detém no fato do Filho de Deus ter tido necessidade também de uma família que o acolhesse. Como homem, frágil e pequeno, precisou ser amado por um coração de mãe. Ele experimentou a dependência na submissão a seus pais. Ele vivenciou a contingência de crescer e aprender no interior de um lar e de uma cultura determinada. Eis o símbolo de Nazaré onde Jesus viveu e cresceu (Lc 2,39-40). O mistério inaudito da Encarnação se entrelaça, desta maneira, com a realidade da família, escola de amor e de fé, de inculturação e de sociabilidade.

Maria, a Virgem Mãe, acolhe na fé o mistério, fruto do seu ventre. São José também acolhe na Fé o mistério, adotando o Menino e recebendo a Mãe. Deste modo, assume a paternidade legal de Jesus, cumprindo com fidelidade sua altíssima e insubstituível missão: José, filho de Daví, não temas receber Maria, tua mulher, pois o que nela foi gerado vem do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho e tu o chamarás com o nome de Jesus, pois ele salvará o seu povo dos seus pecados (Mt 1,20-21). A oportunidade da festa da Sagrada Família, como decorrência do mistério do Natal que celebramos, nos proporciona apresentá-la como protótipo, exemplo e modelo para todas as famílias cristãs (cf.Familiaris Consortio, Conclusão; Redemptoris Custos, III, 21). Embora constituindo-se também um mistério especial pela natureza do amor e do matrimônio que uniam José e Maria, a presença inestimável do Filho de Deus, e a natureza das relações materno-paternais de Maria e de José para com Ele, esta Família é modelo nas virtudes teologais, a serem cultivadas por todas as famílias cristãs. O sentido de Deus, do sagrado e do mistério, norteava e unia a Família de Nazaré. Por isso, mesmo tendo vivido uma situação especial e única de um lar construído na castidade perfeita, a serviço da Encarnação, ela é a expressão mais nítida da vivência das virtudes familiares e teologais. Serve, então, de estímulo e de intercessão para todas as famílias que queiram vivenciar os valores evangélicos. A propósito, nos lembra o Papa:

Por misterioso desígnio de Deus, nela viveu o Filho de Deus escondido por muitos anos: é, pois, protótipo e exemplo de todas as famílias cristãs. E aquela Família, única no mundo, que passou uma existência anônima e silenciosa numa pequena localidade da Palestina;que foi provada pela pobreza, pela perseguição, pelo exílio; que glorificou a Deus de modo incomparavelmente alto e puro, não deixará de ajudar as famílias cristãs, ou melhor, todas as famílias do mundo,na fidelidade aos deveres quotidianos, no suportar as ânsias e as tribulações da vida, na generosa abertura às necessidades dos outros, no feliz cumprimento do plano de Deus a seu respeito (Familiaris Consortio, Conclusão). Hoje, na medida em que avança a secularização do pensamento e do comportamento, mesmo a família cristã se priva, muitas vezes, da sua dimensão sagrada. Mal se dá conta que o amor de Deus em Cristo a uniu, mediante o Sacramento do Matrimônio, para ser sinal visível e terno de sua presença em todas as expressões da vida conjugal e familiar. Quanto mais difícil se torna a proposta cristã para família contemporânea, mais imperioso se faz anunciá-la como boa e alegre notícia de salvação. Há um evangelho para a família. Evangelho que supõe uma espiritualidade conjugal e familiar e uma ética própria, baseada na abertura da família aos apelos de Deus, do meio social e cultural e das necessidades de seus membros. O critério supremo da vida conjugal e familiar é o amor ou a caridade como veículo da perfeição (Cl 3,16). Neste sentido, a família cristã se instaura no mundo e na Igreja como escola de amor a Deus e ao próximo, mediante o respeito aos mandamentos do Senhor, a oração e o diálogo entre as diferenças.

2. O Conteúdo das Mensagens Bíblicas

a) Ben Sirac apresenta, como pai, os deveres de seus filhos para consigo (Eclo 3,3-7.14-17a). Vivendo em Jerusalém numa época de forte influência helênica, tem consciência da importância da família como célula mantenedora dos valores tradicionais da sabedoria do seu povo. Dentro do horizonte da lei mosaica e do contexto patriarcal, Ben Sirac dá conteúdo concreto ao mandamento de Iahweh de honrar pai e mãe (Ex 20,12; Lv 19,3), exortando seus filhos a escutá-lo e a obedecê-lo (v.1) e a servi-lo como ao seu senhor (v.7). Assim como a lei expressava um interesse prático na honra aos pais pelo bem temporal do prolongamento dos filhos na terra (Ex 20,12), Ben Sirac acredita que não lhes faltará, além do tesouro das bênçãos temporais (vv. 4.15), as bênçãos espirituais, notadamente o perdão dos pecados (vv. 3.14).

b) São lidos alguns preceitos gerais da vida cristã e alguns preceitos particulares da vida familiar cristã (Cl 3,12-21). Paulo propõe um itinerário de santidade para os eleitos de Deus, expresso pelas virtudes humanas no relacionamento mútuo: sentimentos de compaixão, bondade, humildade, mansidão, longanimidade (v.12); suportação e perdão recíproco, à semelhança do Senhor que perdoa (v.13); a caridade, como vínculo da perfeição (v.14); o cultivo interior da paz de Cristo para formar um só corpo e o agradecimento (v.15). Acrescenta elementos práticos, típicos das reuniões litúrgicas, que podem ser adaptados à família reunida em oração: a presença habitual da Palavra de Cristo, a motivar o ensinamento e a admoestação mútuo, com toda a sabedoria, e a ação de graças a Deus, através de salmos, hinos e cânticos espirituais (v.16). Além disto, apresenta uma norma para qualquer palavra ou ação: tudo fazer em nome do Senhor Jesus, dando por Ele graças a Deus, o Pai (v.17). Expõe alguns preceitos que podem animar o relacionamento conjugal: a submissão das mulheres aos maridos, como convém ao Senhor (v.18); o amor dos maridos pelas mulheres pelo trato com bom humor (v.19). Insere também alguns preceitos que podem animar o relacionamento familiar: os filhos obedeçam os pais em tudo, pois isso é agradável ao Senhor; os pais não irritem os filhos para que não desanimem (v.21). Observe-se que para tais normas práticas, é exposta a motivação místico-espiritual do revestir-se de Cristo ou de viver em Cristo, ou como convém ao Senhor. Sem tal referência ao mistério a parênese cristã não se diferencia de um código social de ética. Entretanto, ao referir-se à vida nova da união com Cristo, Paulo define a moral cristã como manifestação do senhorio de Jesus sobre os que lhe pertencem e o exercício conseqüente da vocação dos fiéis no mundo, pelo cultivo da sociabilidade traduzida em gestos concretos de amor, caridade e compreensão para com todos e, particularmente, entre o casal e a família, no respeito pela função de cada um.

c) É apresentada a fuga da Sagrada Família para o Egito e seu retorno (Mt 2,13-15.19-23). Mateus descreve os fatos, utilizando-se do gênero midráxico, para mostrar como Jesus pode ser considerado: o novo Moisés e novo Jacó-Israel.

c.1- Jesus é o novo Moisés

À semelhança do faraó que ordena a matança dos filhos dos hebreus (Ex 1,15.22), Herodes decreta a morte de todos os meninos de dois anos para baixo (v.16). Assim como Moisés escapou do massacre das crianças (Ex 2,1-10) e, em seguida, livrou-se das mãos do faraó, refugiando-se no estrangeiro (Ex 2,11-15), Jesus livrar-se-á da matança dos inocentes, fugindo para o Egito (vv. 13-15). Como Moisés fora chamado ao Egito pelo anjo (Ex 4,19), igualmente Jesus é chamado para retornar à Palestina com José e Maria (v.20). Novo Moisés, Jesus é visto como o Legislador da nova Aliança (5-7) e também o Libertador que, assume a condição humana, para livrá-la e salvá-la pela escolha do messianismo do Servo (12, 15-21).

c.2- Jesus é o Novo Jacó-Israel

A fuga de Jesus evoca a descida de Jacó para o Egito com a promessa de subir de novo, tornando-se uma grande nação (Gn 46,2). A citação do Profeta Oséias que fala de Israel menino, amado por Iahweh ao chamá-lo do Egito como um filho (v.5; cf.Os 11,1), dá também ao relato da fuga de Jesus o sentido evocativo do novo Povo que se levantará de sua liderança. Da descida ao Egito, símbolo da perseguição e da rejeição até à morte de cruz, Jesus subirá ao nível de trazer consigo um novo Israel (28,18-20) confirmação de sua realeza ou messianidade, temida (v.3) e contestada (27,42) pelos inimigos. Aquele que é obrigado a fugir de seu povo ao nascer e que morrerá como estrangeiro, fora da porta (Hb 13,12) levantará consigo um novo povo que lhe pertence, a Igreja (At 20,28b).

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