Natal
_______________________________________Adveniat Regnum tuum
Populus Qui Habitabat In Tenebris Vidit Lucem Magnam
________________________________________Dom Dadeus Grings - O mistério da encarnação
Porto Alegre (RS), 21/12/2004
Na certeza de que, na origem do universo, está Deus, cheio de sabedoria e bondade, temos facilidade em ver a harmonia de sua constituição e de sua evolução. Há um plano que rege tudo. Na nossa profissão de fé reconhecemos não só a existência de Deus - o que é comum a todas as religiões -, mas de um Deus criador e Pai. E, aceitando Deus como criador de todas as coisas visíveis e invisíveis, fazemos nossa profissão de fé neste mundo, obra sua. Este mundo é bom e bem feito. Se existe o mal, não é por culpa de Deus. Não está, pois, na sua natureza criada. Podemos desvendar os mistérios da natureza e chegaremos, no final da pesquisa, ao mistério da criação.
Ninguém jamais saberá como Deus criou o universo. Não entra em nossos esquemas mentais fazer algo do nada. Nossa ação é apenas de transformação do que já existe. Por isso os pagãos concebiam Deus apenas como o ordenador das coisas. Também o Gênesis apresenta uma tradição nesse sentido: a Terra estava informe, vazia e escura. Deus intervém organizando-a, iluminando-a e a povoando. Passaram-se milênios. Na plenitude dos tempos, que Deus marcou com sua presença, Ele enviou seu Filho. Mas não foi uma aparição semelhante às que aconteceram no Antigo Testamento. Ali Deus se deu a conhecer como que de fora do tempo e fora da criação. Apenas falou e desapareceu. Na plenitude dos tempos, Ele assumiu a criação, encarnando-se nela. Não só inculturou nele sua mensagem, não só falou com palavras humanas, mas tornou-se verdadeiro homem. Conhecêmo-lo pelo nome de Jesus Cristo.
Os teólogos cristãos perguntaram-se por muito tempo: por que Deus tornou-se homem? É a pergunta de Santo Anselmo, tornada título de seu livro: 'Cur Deus homo?'. Duas hipóteses disputam o páreo da explicação, sem evidentemente se excluírem mutuamente: uma diz que Ele veio para reparar a criação dos males causados pelo pecado humano. O objetivo de sua vinda seria, nesse caso, a redenção da humanidade. Se não tivesse havido pecado, Deus provavelmente não se teria encarnado. Outra, pelo contrário, sustenta que a encarnação do Filho de Deus teria acontecido mesmo que não tivesse havido pecado. Veio, em primeiro lugar, para plenificar a criação e elevar-nos à dignidade de filhos de Deus.
Nós partimos de uma constatação. Vivemos num mundo de insegurança. A humanidade está dividida. Os homens não só se ofendem mutuamente, mas se contrapõem e até se matam. Não são como Deus os havia criado. Entrou o mal no mundo. Era, pois, preciso que Deus viesse, em pessoa, para nos reconciliar. A primeira reconciliação é com o próprio Deus, tornando-O Pai de todos os homens. Cristo veio revelar o rosto misericordioso do Pai. Convenceu-nos de que somos amados por um amor infinito. Mudou nossa auto-estima, dando-nos primeiramente a sensação de sermos amados e, por isso, de valermos não porque fechados sobre nós mesmos e confinados ao aqui e agora, mas porque filhos de uma Pai muito querido. Isso dá equilíbrio emocional, alegria e paz interior. Abre-se aos outros e a toda a criação. Por isso a segunda reconciliação, que promana da primeira, é com o próximo. Formamos a família de Deus. O amor, que Deus tem por mim, é o mesmo amor que Ele tem para com meus irmãos. Por isso devo amá-lo, porque ele é amado por Deus, que me ama tanto a mim como a ele.
O Concílio Vaticano II nos assegura que Cristo veio revelar o homem ao homem. Todos já estávamos convencidos de que Jesus nos revelou Deus Pai. Sem Ele, de fato, não conhecíamos Deus nessa profundidade. Ninguém jamais O conheceu a não ser Ele. E Ele no-lo revelou. Mas, encarnando-se, veio revelar-nos também a nós mesmos. De fato, nós não nos conhecíamos bem. As concepções acerca do homem não chegam à plenitude. Não se apresenta um novo conceito ou uma nova filosofia do homem. Pilatos foi inspirado quando nos apresenta Jesus, no seu pretório: 'Eis o homem'. Nele, o Cristo, nosso irmão, nós nos vemos a nós mesmos e vemos nosso próximo, todo homem. Nós somos como Ele, porque Ele se tornou como um de nós! Mas, como no Pretório de Pilatos, nós o vemos coroado de espinhos e marcado pelos flagelos.
Dom Dadeus Grings - Arcebispo Metropolitano de Porto Alegre
______________________________Et vocabitur Princeps pacis, cujus regni non erit finis
Lux fulgebit hodie super nos
Apparuit benignas et humanitas salvatoris nostri Dei
Hodie in Terra Canunt Angeli, Laetantur Archangeli