DOUTRINA CATÓLICA

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João Paulo II: A paz está em Deus

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(2004-11-10)

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DOUTRINA CATÓLICA

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Comentário ao Salmo 61 durante a audiência geral

CIDADE DO VATICANO, quarta-feira, 10 de novembro de 2004 (ZENIT.org).

Publicamos a intervenção de João Paulo II na audiência geral desta quarta-feira, dedicada a comentar o Salmo 61, «A paz em Deus».

* * * Só em Deus descansa minha alma porque dele vem minha salvação; só ele é minha rocha e minha salvação, minha fortaleza: não vacilarei.

Até quando vos lançareis contra um homem todos juntos, para derrubá-lo como uma parede que cede ou uma cerca ruidosa?

Só pensam em derrubar-me de minha altura, e se comprazem na mentira: com a boca bendizem, com o coração maldizem.

Descansa só em Deus, alma minha, porque ele é minha esperança; só ele é minha rocha e minha salvação, minha fortaleza: não vacilarei.

De Deus vem minha salvação e minha glória, Ele é minha rocha firme, Deus é meu refúgio.

Povo seu, confiai nele, desafogai ante ele vosso coração, que Deus é nosso refúgio.

Os homens não são mais que um sopro, os nobres são aparência: todos juntos na balança subirão mais leves que um sopro.

Não confieis na opressão, não ponhais ilusões no roubo; e ainda que cresçam vossas riquezas, não lhes deis o coração.

Deus disse uma coisa, e duas coisas que escutei:

«Que Deus tem o poder e o Senhor tem a graça; que tu pagas a cada um segundo tuas obras»

1. Acabam de ressoar as doces palavras do Salmo 61, um canto de confiança, que começa com uma espécie de antífona, repetida na metade do texto. É como uma jaculatória forte e serena, uma invocação que é também um programa de vida: «Só em Deus descansa minha alma, porque dele vem minha salvação, só ele é minha rocha e minha salvação, minha fortaleza: não vacilarei» (versículos 2-3.6-7).

2. O Salmo, contudo, mais adiante põe em contraposição duas formas de confiança. São duas opções fundamentais, uma boa e outra perversa, que comportam duas condutas morais diferentes. Antes de tudo, está a confiança em Deus, exaltada na invocação inicial, onde aparece um símbolo de estabilidade e segurança, a «rocha», ou seja, uma fortaleza e um baluarte de proteção.

O Salmista confirma: «De Deus vem minha salvação e minha glória, ele é minha rocha firme, Deus é meu refúgio» (versículo 8). Diz isso após ter evocado as confabulações de seus inimigos que «só pensam em derrubar-me de minha altura» (Cf. versículos 4-5).

3. Mas está também a confiança de caráter idólatra, ante a qual aquele que ora fixa com insistência sua atenção crítica. É uma confiança que leva a buscar a segurança e a estabilidade na violência, no roubo e na riqueza.

Então se faz um chamado sumamente claro: «Não confieis na opressão, não ponhais ilusões no roubo; e ainda que cresçam vossas riquezas, não lhes deis o coração» (versículo 11). Evoca três ídolos, proscritos como contrários à dignidade do homem e à convivência social.

4. O primeiro falso deus é a violência À qual a humanidade segue recorrendo por desgraça também em nossos dias ensangüentados. Este ídolo é acompanhado por um imenso cortejo de guerras, opressões, prevaricações, torturas e assassinatos execráveis, cometidos sem remorsos.

O segundo falso deus é o roubo, que se manifesta na extorsão, na injustiça social, na usura, na corrupção política e econômica. Muita gente cultiva a «ilusão» de satisfazer deste modo sua própria cobiça.

Por último, a riqueza é o terceiro ídolo ao que «se apega o coração» do homem com a esperança enganosa de poder-se salvar da morte (Cf. Salmo 48) e assegurar-se o prestígio e o poder.

5. Ao servir a esta tríade diabólica, o homem esquece que os ídolos não têm consistência, e mais, são daninhos. Ao confiar nas coisas e em si mesmo, esquece que é «um sopro», «aparência», e mais, se se pesa na balança, seria «mais leve que um sopro» (Salmo 61, 10; Cf. Salmo 38, 6-7).

Se fôssemos mais conscientes de nossa caducidade e de nossos limites como criaturas, não escolheríamos o caminho da confiança nos ídolos, nem organizaríamos nossa vida segundo uma hierarquia de falsos valores frágeis e inconsistentes. Optaríamos mais pela outra confiança, a que se centra no Senhor, manancial de eternidade e de paz. Só Ele «tem o poder»; só Ele é manancial de graça; só Ele é plenamente justo, pois paga «a cada um segundo suas obras» (Cf. Salmo 61, 12-13).

6. O Concílio Vaticano II dirigiu aos sacerdotes o convite do Salmo 61 a «não apegar o coração à riqueza». O decreto sobre o ministério e a vida sacerdotal exorta: «hão de evitar sempre toda classe de ambição e abster-se cuidadosamente de toda espécie de comércio» (Presbyterorum ordinis, n. 17).

Agora, este chamado a rejeitar a confiança perversa e a escolher a que nos leva a Deus é válido para todos e deve converter-se em nossa estrela polar no comportamento cotidiano, nas decisões morais, no estilo de vida.

7. É verdade, é um caminho árduo, que comporta inclusive provas para o justo e opções valentes, mas sempre caracterizadas pela confiança em Deus (Cf. Salmo 61, 2). Deste ponto de vista, os Padres da Igreja viram no Salmo 61 uma premonição de Cristo e puseram em seus lábios a invocação inicial de total confiança e adesão a Deus.

Neste sentido, no «Comentário ao Salmo 61», Santo Ambrósio argumenta: «Nosso Senhor Jesus, ao assumir a carne do homem para purificá-la com sua pessoa, não deveria ter cancelado imediatamente a influência maléfica do antigo pecado? Pela desobediência, ou seja, violando os mandamentos divinos, a culpa se havia introduzido, arrastando-se. Antes de tudo, portanto, teve de restabelecer a obediência para bloquear o foco do pecado... Assumiu com sua pessoa a obediência para transmitir-nos» («Comentário aos doze salmos» --«Commento a dodici Salmi»-- 61, 4: SAEMO, VIII, Milano-Roma 1980, p. 283). [Tradução Zenit]

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